Discurso durante a 132ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Satisfação com a aprovação de proposição que destina royalty do petróleo para a educação e a saúde e alerta para a insuficiência desses recursos para promover as mudanças necessárias na educação.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO, POLITICA ENERGETICA.:
  • Satisfação com a aprovação de proposição que destina royalty do petróleo para a educação e a saúde e alerta para a insuficiência desses recursos para promover as mudanças necessárias na educação.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira.
Publicação
Publicação no DSF de 17/08/2013 - Página 54557
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO, POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, REFERENCIA, DESTINAÇÃO, RECURSOS, ORIGEM, ROYALTIES, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, APLICAÇÃO, EDUCAÇÃO, SAUDE, COMENTARIO, APREENSÃO, ORADOR, MOTIVO, EXPECTATIVA, EXTINÇÃO, RECURSOS MINERAIS, AUSENCIA, OBRIGATORIEDADE, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Senador. É sobre isso -- não é surpresa para ninguém, portanto -- que venho falar.

            Venho falar sobre algo histórico que nós conseguimos ontem, no Congresso brasileiro, que foi a aprovação da destinação do royalty do petróleo para a educação e também para a saúde, um trabalho que se deve a muita, muita gente, mas especialmente ao Deputado André Figueiredo, que, nos últimos meses, assumiu isso como uma coisa dele, como uma missão na sua carreira política. Antes de ontem, depois da aprovação, falei com ele. É como se ele tivesse justificado sua passagem pelo Congresso só com esse ato.

            Entretanto, ao mesmo tempo em que comemoro, venho trazer alguns alertas.

            Esse projeto, Senador Paim, começou em 2008. Eu apresentei esse projeto no Senado visando a que os royalties do petróleo fossem para a educação. Em 2011, três anos depois, esse projeto foi arquivado. Foi arquivado no dia 03/11/2011, porque a base do Governo, aqui no Senado, não quis aprovar 100% dos royalties para a educação.

            Há também uma emenda apresentada, creio que pelo Senador Valadares, que previa 50%. A base do Governo não quis, Senador Aloysio Nunes, aprovar a destinação dos royalties do petróleo para a educação.

            Em 2011, apresentei outro projeto, juntamente com o Senador Aloysio Nunes, que está aqui, que voltava à mesma coisa: 100% dos royalties do petróleo para a educação. Só que o dinheiro não sairia diretamente do poço de petróleo para a educação. Ele ia para um grande fundo. E esse fundo teria uma rentabilidade, que iria 100% para a educação de base. Esse dinheiro seria distribuído entre Estados e Municípios, proporcionalmente ao número de alunos na escola. O projeto está em andamento, depois de outro também ter sido arquivado, que apresentei entre o de 2008 -- recusado -- e esse novo, juntamente com o Senador Tasso Jereissati, nas mesmas características do que apresentei com o Senador Aloysio Nunes, já que o outro havia sido arquivado. É uma luta antiga, é um processo demorado.

            No ano passado, a Presidenta Dilma -- não sei o que deu -- despertou para o fato de que isso poderia ser uma boa coisa. E eu a parabenizo por isso, mas ela podia ter feito a aprovação disso em 2008, e impediu, através da sua base, não sei se com o conhecimento dela, mas, dificilmente, fariam isso sem ter o conhecimento do enlace dela com o Congresso pelo menos.

            Pois bem, ela teve, finalmente, a lucidez, o bom senso, a sensibilidade de defender 100% dos royalties para a educação. O processo seguiu. Foi preciso fazer uma conciliação, reservando uma parte para a saúde, embora eu preferisse 100% para a educação, porque uma pessoa, um povo bem educado, cuida melhor da saúde, mas acho que foi uma concessão que tinha que ser feita. Está correto. O problema que me preocupa, Senador Aloysio, tem três características: a primeira é que foi aprovada aquela ideia do uso direto do royalty imediatamente para a educação. Isso significa que, quando o royalty acabar -- porque o petróleo acaba --, o dinheiro acaba. A ideia que tínhamos…

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Se V. Exª me permite, Senador…

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Pois não, Senador.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco Minoria/PSDB - SP) - A metáfora que V. Exª usa, creio que deveria ser repetida. A do ouro do Brasil, o destino do ouro encontrado no Brasil, o destino que Portugal deu foi exatamente este: esgotou-se, transformou-se em belos altares, bonitos, ornamentados, obras de arte extraordinárias que até hoje causam admiração, mas não serviu para alimentar o desenvolvimento, foi algo que se esgotou no próprio consumo, um consumo artístico, um consumo que gerou beleza, mas que se acabou.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Agradeço, Senador, a lembrança dessa metáfora que sempre uso. O Brasil, durante um século e meio, foi o grande produtor de ouro e prata do mundo. Não ficou nada, porque nós mandávamos esse ouro para Portugal, que, por sua vez, mandava para a Inglaterra, onde se fazia a revolução industrial, graças a certo nível tecnológico. E, no fim, ficaram alguns altares em Lisboa, e a Inglaterra, desenvolvida. Se tivéssemos usado aquele dinheiro para educação, ciência e tecnologia, em Portugal e no Brasil, permitam-me dizer, o Brasil seria a Inglaterra e Portugal seria a Inglaterra.

            Desta vez vai ser um pouquinho melhor porque vai ser usado para a educação, mas vai se usar um recurso finito no imediato, mesmo que para fazer um produto que é permanente. Esta é uma preocupação: não fazer com que esse dinheiro seja permanente, é como se a geração atual se considerasse dona do petróleo, e não a Nação brasileira em sua perspectiva histórica das próximas décadas e séculos.

            Mas a maior preocupação ainda não é essa, há mais duas características. Uma, é para onde vai o dinheiro.

            Nosso projeto, do Senador Aloysio e meu, previa que fosse para a educação de base. O projeto diz: prioritariamente para a educação de base. Mas prioritariamente não quer dizer nada numa lei. Eu tenho a impressão -- e eu não sou advogado -- de que não deve haver muita lei no Brasil dizendo prioritariamente. O que quer dizer prioritariamente? Não quer dizer nada do ponto de vista legal, eu imagino. O que importa, então, se é prioritariamente e se tem liberdade para o resto, Senador Mozarildo, é que as forças para se apropriar desse dinheiro vão ter uma luta, e, provavelmente, quem vai ganhá-la é a universidade, porque tem força, porque tem associações, porque tem UNE, tem Crub, tem associações de reitores diversas. Esse dinheiro, provavelmente, será canalizado para a universidade ou, pior ainda, para outros programas educacionais em geral.

            Qualquer grupo que tenha uma ONG que faz educação pode pegar esse dinheiro. Aliás, os partidos políticos podem pegar esse dinheiro para a formação de seus quadros, porque é prioritariamente para a educação de base, não é vinculado à educação de base. Essa é uma preocupação.

            Esse dinheiro sendo usado para a educação de ensino superior mata a base do próprio ensino superior.

            É como se a gente usasse o dinheiro para o telhado enquanto o pilar de baixo está caindo. A melhor maneira de melhorar a universidade é investir na educação de base. E, além disso, nem todos têm que ir para a universidade, mas todos têm que terminar um ensino médio de qualidade.

            Eu temo muito que, da maneira como ficou aprovado, por pressão das entidades universitárias, porque a ideia inicial está na educação de base -- aí já mostra a suspeita que a gente tem direito de ter --, esse dinheiro poderá não chegar à educação de base, poderá não chegar às crianças.

            Mas há uma preocupação maior do que todas essas, Senador Mozarildo, que são as incertezas e a ilusão que a gente cria, de uma renda, que são os royalties, resultado de algo que não é certo.

            Quem garante que há esse petróleo nessa quantidade? Quem garante que tecnologicamente nós estamos habilitados a explorar a 7 mil metros, 5 mil abaixo do mar e mais 2 mil abaixo da terra? Quem garante que vai ser possível transportar? Quem garante que vai ser possível refinar? E, sobretudo, quem é que imagina o preço do petróleo daqui a 15 anos, com as novas técnicas que estão sendo desenvolvidas no mundo e com os riscos do uso do combustível fóssil sobre o meio ambiente? Quem garante que vai estar em US$100,00 por barril? É muito provável que não esteja.

            E há mais uma preocupação, Sr. Presidente. É que, supondo que tudo dê certo, a gente vai ter R$179 bilhões em dez anos, ou seja, R$18 bilhões por ano. Vou repetir: se tudo der certo, nós vamos ter R$18 bilhões por ano, dos royalties. E eu sou favorável, sim, e já são uma ajuda os R$18 bilhões. Por isso que eu briguei tanto por esse projeto, por isso que eu fui o primeiro a dar entrada em um projeto desse tipo no Senado, e o Deputado Brizola Neto a dar entrada em um desses, igual, até antes de mim, na Câmara. Mas eu sempre alertei que esse dinheiro não pode iludir, como estão fazendo: “Calma, gente, quando chegar o petróleo, estará tudo resolvido”.

            Senador Paim, se tudo der certo, são R$18 bi por ano. E nós precisamos, Senador, de R$450 bilhões por ano para fazer a educação funcionar. São R$450 bilhões por ano! Porque um aluno, numa escola boa, pagando-se R$9.500,00 por mês a um professor -- sem isso a gente não consegue atrair os melhores quadros, nem que se dediquem plenamente --, custa R$9 mil por ano. Nove mil reais, por ano, por aluno. Ainda é menos do que cobram as escolas particulares de qualidade por aí. Nove mil reais. Nós temos 50 milhões de alunos: dá R$450 bilhões por ano.

            Nós vamos ter R$18 bilhões. Eu lutei para ter esses R$18 bilhões na educação. Mas não podemos mentir nem enganar dizendo que aí está a solução do problema educacional. A solução do problema educacional está num pré-sal muito maior, que é o PIB, e a receita estatal brasileira. R$450 bilhões correspondem, exatamente, a 10% do PIB. Ou seja, se nós viéssemos gastando R$450 bilhões -- àquela época menos --, se nós viéssemos gastando 10% do PIB, hoje o Brasil teria uma educação da máxima qualidade. Mas preferimos não gastar isso. Preferimos não gastar isso, e agora estamos iludindo a opinião pública de que vamos ter o dinheiro suficiente e a melhor educação do mundo com o dinheiro do pré-sal.

            Se esse dinheiro vier, ele corresponde a apenas R$18 bilhões, de R$450 bilhões; ou seja, pouco mais de 20%. Não, desculpem: 45 é 10%; então, menos de 5% do necessário.

            Nós precisamos alertar, com isso, de que, muito bem, correto, comemoremos a aprovação dos royalties, mas nem esperemos por eles, nem nos contentemos com eles. Eu vou repetir: nem esperemos por eles, nem nos contentemos com eles. Não esperemos porque é incerto; não nos contentemos porque é pouco. Nós temos é que fazer um esforço com os recursos de que nós já dispomos. Este é um país rico. Este é um país que é a sexta, a sétima economia do mundo. Não tem que esperar pré-sal, e nem pré-sal chegando vai bastar. Não vai bastar. É pouco ainda. Agora, não adianta investir 10% do PIB sem decidir como, aonde. Se não soubermos e não cuidarmos de onde e como investir bem o dinheiro, ele chega a uma escola e vira lama, como acontece se chover num quintal cédulas de R$100,00. Você pode fazer um helicóptero circular pelo País, soltando cédulas de R$100,00 no quintal das escolas, com a primeira chuva, viram lama, porque não se definiu como esse dinheiro vai chegar à cabeça das crianças, por meio de um professor bem remunerado, bem preparado, bem dedicado, com equipamentos modernos, em prédios bonitos, em horário integral. Se nós não fizermos isso, esse dinheiro vai acabar, e nós corremos o risco, Senador Aloysio, de, sob o nome de educação, jogar o dinheiro fora outra vez.

            Por isso, Senador Paim, eu deixo aqui a minha grande comemoração pela aprovação da reserva dos royalties do petróleo, na quase totalidade, para a educação e a outra parte para uma boa finalidade, que é a saúde.

            Eu parabenizo o Deputado André Figueiredo, que foi o artífice disso, e a Presidenta Dilma também, porque teve a iniciativa de mandar isso cinco anos depois do projeto que nós apresentamos. Mesmo assim, ela mandou. Mas eu alerto: nem esperemos esse dinheiro, nem nos contentemos com ele. Ele é incerto e pouco. E nossas crianças, primeiro, merecem muito mais e, segundo, não podem esperar. Não há como fazer as crianças esperarem para crescer quando chegar o pré-sal. Elas crescem na hora. Elas crescem no dia. E o tempo está passando.

            Já deixamos passar muitas décadas sem usar o “pré-sal” -- entre aspas -- do PIB, da receita, de maneira correta, de maneira certa, porque o correto não é destinar à educação; o correto é destinar à educação de tal, e tal, e tal, de tal forma que dê resultado.

            Deixamos passar muitas décadas sem fazer isso. Não esperemos décadas futuras com base em um recurso incerto e pequeno. Viva o royalty para o petróleo! Mas não basta o royalty do petróleo para mudar a educação brasileira.

            É isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/08/2013 - Página 54557