Discurso durante a 139ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a situação educacional do Estado do Mato Grosso; e outro assunto.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO PENAL. EDUCAÇÃO.:
  • Preocupação com a situação educacional do Estado do Mato Grosso; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2013 - Página 57100
Assunto
Outros > CODIGO PENAL. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, REFERENCIA, RELATORIO, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, CODIGO PENAL, ENFASE, PENA, CRIME, VIOLENCIA, VITIMA, ANIMAL.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, LOCAL, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), CRIAÇÃO, PROGRAMA, INCENTIVO, PERMANENCIA, ALUNO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, NIVEL MEDIO, OBJETIVO, REDUÇÃO, ANALFABETISMO.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, amigos que nos acompanham pelos vários canais de comunicação do Senado da República, amigos das redes sociais, subo à tribuna para tratar de dois temas.

            O primeiro, muito rápido, para dizer que apresentei o relatório preliminar do Código Penal, semana passada, e algumas pessoas - e eu gostaria de me dirigir a elas - estão fazendo críticas a que eu, como relator, teria reduzido a pena dos crimes praticados, perpetrados contra animais; críticas terríveis, alguns prometendo me espancar na rua. Estão protegendo os animais, mas querem espancar um animal racional, ao menos relativamente racional. Estão pedindo respeito aos animais irracionais e estão agindo de forma também irracional, porque não leram o projeto - não leram o projeto.

            Eu gostaria de citar a Samara Reis, o Leo Telles, a Célia Kaffer, uma atriz famosa - ou que consta famosa -, Hellen Jabour, uma outra, Thaila, Aila - parece-me que é esta a pronúncia, que eu não a conheço, nunca assisti a nenhuma novela com ela -, Giulia Daniel, Juliano Lopes, Thalita Pires, Simone, Célia Menezes, críticas assim, querendo me espancar, dizendo que sou reacionário, por ter diminuído a pena, ou as penas, dos crimes contra os animais.

            Quero dizer que uma das características que nos diferenciam dos animais irracionais é que o homem pode pensar, o homem tem inteligência para formular; o homem e a mulher possuem inteligência, não podem ter preconceito. Aliás, a Constituição da República, Senador Agripino, estabelece o dever fundamental de ser diferente ou olhar o outro com os olhos dos outros. Portanto, uma das nossas diferenças com os animais irracionais é justamente que nós possamos ter a razão como instrumento de nossas atuações.

            Em nenhum momento foi diminuída a pena dos crimes praticados contra animais. Aliás, a Lei nº 9.605, de 1998, estabelece os crimes contra a fauna - a fauna silvestre, a fauna doméstica, a fauna exótica, a fauna ictiológica. Para os crimes ali previstos, no relatório, as penas foram aumentadas como instrumento de proteção. O que houve foi que a Comissão de Juristas, encarregada de elaborar o anteprojeto, estabeleceu penas para proteção dos animais de forma exasperada, penas exasperadas.

            Para que V. Exª tenha ideia, uma das penas, especificamente para o caso de maus-tratos a animais, era mais elevada do que a pena do infanticídio. Isso não se apresenta como razoável, e eu, como Relator do Projeto do Código Penal, tive por bem estabelecer a chamada razoabilidade ou proporcionalidade da pena.

            Assim, ao oferecer a proposta de emenda substitutiva, foi proposto, energicamente, o aumento do rigor penal no combate aos crimes contra os animais, diferente do que estão dizendo aí: em um só post, mais de cinco mil pessoas querendo me espancar na rua como se espancam animais irracionais, Srs. Senadores!

            Hoje a matéria, basicamente, como disse, regulamentada pela Lei nº 9.605, de 1998, demonstra-se insuficiente para a efetiva proteção que a questão exige. Como exemplo, menciono o crime de matar animal silvestre sem autorização da autoridade competente. Atualmente, tal crime é apenado com detenção de seis meses a um ano mais multa - seis meses a um ano mais multa. Está na Lei nº 9.605, de 1998. Mediante o substitutivo que apresentamos, a pena passará a pena de prisão de dois a quatro anos. É o art. 405 do substitutivo.

            Outro exemplo pode ser apontado: o crime de maus-tratos aos animais. Hoje essa matéria, Senador Agripino, é regulada pelo art. 32 da Lei nº 9.605, de 1998, de que um conhecido Ministro do STJ, de grande conhecimento nessa área, Herman Benjamin, foi um dos grandes colaboradores. A pena lá estabelecida é de detenção de três meses a um ano e multa. No nosso substitutivo, a pena para esse mesmo crime passa a ser de seis meses a três anos - está no art. 408.

            Portanto, não houve, de nenhuma maneira, redução do que já existe; o que houve foi que nós fizemos a adequação, porque não é possível que o crime de maus-tratos a animais possa ser penalizado, no preceito secundário da norma penal, mais elevado do que o crime de infanticídio e do abortamento, porque isso não se apresenta como razoável, porque o bem jurídico que possui a maior dignidade penal é a vida daqueles animais que são racionais - ao menos alguns são racionais.

            Então, eu quero dizer para estes cidadãos aqui que a democracia exige responsabilidade. Antes de criticarmos, nós precisamos conhecer o que está escrito. Eu quero expressar a estas pessoas o meu respeito, porque, como Senador da República, eu acredito que a pressão só é importante para transformar o carvão em diamante, e Senador e Deputado Federal não podem ser daqueles que não aguentam pressão.

            Senador Agripino, apresentei o relatório. As penas para os crimes de maus-tratos a animais são penas mais elevadas do que estas que estão estabelecidas hoje na Lei 9.605. Mais elevadas, como aqui eu citei algumas. E a estas pessoas que estão agindo de forma irracional eu expresso o meu total respeito, porque, na democracia, até pronunciamentos irracionais devem ser respeitados.

            Muito bem. O segundo tema que aqui eu venho tratar é um tema paroquial, mas, por ser paroquial, não significa que seja desimportante. Eu quero tratar da educação no Estado de Mato Grosso. Dia após dia, estamos a demolir o chamado Estado Social, o Estado do Bem-Estar Social. Falo daquele Estado que aponta para o futuro, promovendo políticas e regras voltadas para a igualdade e para a diminuição das diferenças entre os cidadãos. Aquele Estado que trabalha para se aproximar daquilo que chamamos de sociedade de semelhantes, para que cada ser humano seja considerado e respeitado. Repito: para que cada ser humano seja considerado e respeitado, ele precisa ter uma vida digna, não pode ser transformado em mero objeto do Estado, porque o Estado existe em razão do cidadão. Quando falamos em dignidade da pessoa humana, pressupõem-se algumas condições básicas de existência, entre as quais a educação está inserida. E não há que se falar em educação sem pensar num dos principais atores envolvidos no processo educacional, que são os professores.

            Lamentavelmente, nesta segunda-feira, dia 26 de agosto, os professores das escolas públicas do Estado de Mato Grosso, Estado que eu aqui, com muita honra, represento, estão em greve há 15 dias, Sr. Presidente. Estão em greve há 15 dias. A insatisfação quanto aos salários defasados, ambiente de trabalho inapropriado e baixo investimento efetivo em educação são apenas alguns dos fatores que construíram um sentimento comum, que culminou na paralisação de 36 mil profissionais e que deixou cerca de 430 mil alunos fora das salas de aula. Repito: 36 mil profissionais em greve, e cerca de 430 mil alunos fora das salas de aula.

            E qual seria a razão dessa insatisfação, Srªs Senadoras, Srs. Senadores? As reivindicações são novas?

            Cidadãos do Estado de Mato Grosso que nos acompanham pelos instrumentos de comunicação desta Casa, na pauta de reivindicações, os professores exigem:

            - reajuste salarial de 10,41%;

            - dobrar, em 7 anos, o poder de compra da categoria, hoje considerada uma das menos valorizadas do serviço público mato-grossense;

            - aplicação dos 35% dos recursos na educação como prevê a Constituição Estadual;

            - viabilizar maior transparência na aplicação dos recursos educacionais;

            - integralizar o piso salarial;

            - aplicar a hora-atividade aos professores contratados;

            - dar posse aos classificados no último concurso público para a área da educação;

            - melhoria na estrutura das escolas.

            O movimento ganhou força, e, na semana passada, os professores das escolas públicas de Cuiabá também entraram em greve - das escolas públicas municipais - para reivindicar reajuste salarial. A categoria municipal, que já recebeu reajuste de 6,97%, luta agora por mais 4% de aumento, o que representa um reajuste, somado, de 10,9%. Nós confiamos no Prefeito Mauro Mendes, temos certeza de que ele vai resolver esse impasse.

            Srs. e Srªs Senadores, eu conheço muito bem essa sensação de indignação dos professores. Também conheço a realidade dos alunos das escolas públicas. Afinal, fui aluno de escola pública, e a minha mãe aposentou-se como professora, Senador Alvaro. Do ponto de vista do aluno, sei o que é ter raiva de querer e não poder ir à escola. Facilmente se ouvia: "É culpa dos professores que entraram em greve!" Se, por um momento, cheguei a concordar com essa afirmação, logo passei a discordar. Desde criança, eu já pude entender: a culpa não é do professor!

            Cresci vendo minha mãe cercada de um arsenal de trabalho que ela levava pra casa: eram diários de classe, planos de aula, elaboração de atividades, provas, trabalhos, correções, projetos, lembrancinhas para as festas de datas comemorativas. Ou seja: depois de cumprirem sua jornada de trabalho, depois de se submeterem muitas vezes a situações de violência moral e até mesmo física, os professores não deixam de trabalhar. E o salário? Como diria o professor Raimundo, personagem do nosso famoso humorista Chico Anysio: "O salário? Ó!" - é muito pequeno o salário.

            Não é de hoje, Senadores, que a educação brasileira atravessa uma crise. A pauta de reivindicações dos professores não é nova. São anos de descaso do Poder Público, que são evidenciados pelo levantamento do Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público do Estado de Mato Grosso (Sintep-MT), que aponta que o percentual de adesão à greve ultrapassa 80%.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os exemplos da falta de estrutura são retratados diariamente na imprensa local. Em Rondonópolis, por exemplo, cidade que fica a 218km de Cuiabá, as atividades físicas na Escola Estadual Prof. Carlos Pereira Barbosa foram interrompidas, porque a obra da quadra iniciada há cinco anos não foi concluída. Há cinco anos! O terreno de areia é o único espaço para que os alunos possam desenvolver suas atividades físicas. O prédio foi construído há mais de vinte anos. A falta de estrutura também é observada na Escola Estadual Prof. João Batista, de Tangará da Serra, que fica a 242km ao norte de Cuiabá. No colégio, que tem cerca de 950 alunos, muitas carteiras estão quebradas, e o teto também está cedendo. O prédio tem 30 anos e nunca passou por uma reforma.

            Isso nos faz refletir, Srªs e Srs. Senadores, sobre as prioridades. Em outra ocasião, já falei sobre os lamentáveis índices da educação pública em Mato Grosso, que conseguem ser piores que os do resto do Brasil. Em abril deste ano, a Secretaria de Educação do Estado teve as contas de 2011 rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado. O Tribunal de Contas apontou uma série de práticas irregulares de gestão: são descontroles e desatendimentos às legislações licitatória, contábil e de responsabilidade fiscal.

            Como se já não bastasse o atestado de deficiência na gestão dos recursos públicos voltados à educação, ainda temos que conviver com novas situações como o famoso caso do salmão. O Secretário de Educação do Estado comprou milhões de reais, ao que consta, em salmão. Ele deve ser um aficionado por este tipo de iguaria. Salmão... Quando ele deveria comprar um pintado, um matrinxã, um pacu, que é um peixe da região, mas salmão?! Muito bem. Muito bonito isso. Até parece que vivemos em outro país.

            Chega a parecer piada ter conhecimento de que a Secretaria de Educação do Estado iria desembolsar R$7,7 milhões para alimentação de servidores durante o curso de formação continuada, com um cardápio que previa pratos sofisticados como salada de mariscos e salmão ao molho tártaro. Bonito isso, não é? Salada de mariscos e salmão ao molho tártaro. Confesso que eu prefiro ventrecha de pacu; eu prefiro pintado ao escabeche ou uma Maria Isabel ou, quem sabe, uma mojica de pintado.

            Sr. Governador, tudo isso enquanto os professores estão em greve.

            Encarar o desafio de fazer uma profunda reforma no sistema educacional não é tarefa fácil. Não são apenas os professores que clamam, justamente, pelos seus salários. O Sintep estima que hoje o Estado precisa contratar mais 5 mil profissionais para atender as demandas.

            O Tribunal de Contas do Estado também já fez muitas recomendações e apontou dezenas de falhas.

            Enquanto isso, salada de marisco; enquanto isso, salmão ao molho tártaro.

            Precisamos aumentar, de forma gradativa, o investimento em educação no Estado para 5% do PIB; criar ações de incentivo à permanência na escola do aluno do ensino médio, que apresenta altas taxas de abandono e repetência; ampliar ações para redução das taxas de analfabetismo escolar. Em Mato Grosso, o analfabetismo ainda atinge 7,4% da população de 15 anos ou mais, o maior índice da Região Centro-Oeste. Entre os jovens de 18 a 24 anos, a situação é bastante grave. Apenas cerca de 30% dessa população é coberta pela escolarização formal.

            Precisamos ainda, de acordo com o Tribunal de Contas, criar grupos de estudos para definição de ações emergenciais e de caráter continuado em educação que garantam uma evolução da qualidade do ensino nos seguintes indicadores: permanência de crianças de 4 a 17 anos na escola; taxa de conclusão do ensino médio aos 19 anos; anos de atraso escolar; escolaridade média em anos de estudo das pessoas com 25 anos ou mais; taxas de aprovação, abandono, evasão, repetência e reprovação no ensino estadual; qualidade da educação por meio da análise do desempenho médio na prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb); e número de docentes com curso superior, no ensino fundamental.

            Amigos do Estado de Mato Grosso, o Estado que respeita os direitos fundamentais do cidadão continua sendo, como expressão de poder e organização fundamental da sociedade, importante para o futuro do nosso povo. Abandonar a educação pode significar o suicídio do processo de libertação dos cidadãos que ainda não têm acesso a essa garantia constitucional.

            A Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual somos signatários, afirma, de forma expressa, que a educação deve:

[...] visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos [...]

            Estamos seguindo esse caminho? Penso que não.

            Tratar da educação hoje não significa apenas mudar a realidade desta geração, o que fizermos para beneficiar todos os envolvidos neste processo vai decidir nada mais, nada menos que o futuro de um país. Aquilo que aprenderem agora, na escola, vai decidir se o País estará à altura dos desafios do futuro, e podemos iniciar esta transformação ouvindo as reivindicações dos professores.

            Quero, aqui, expressar meu apoio aos professores do Estado de Mato Grosso e dizer menos salada de marisco, menos salmão ao molho tártaro e mais educação e mais respeito aos profissionais da educação.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2013 - Página 57100