Discurso durante a 144ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo por maior atenção governamental à educação pública; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. EDUCAÇÃO.:
  • Apelo por maior atenção governamental à educação pública; e outro assunto.
Aparteantes
João Capiberibe, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 31/08/2013 - Página 58634
Assunto
Outros > HOMENAGEM. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, DISCURSO, AUTORIA, LIDER, IGREJA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), LUTA, DIREITO A IGUALDADE, NEGRO.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, EDUCAÇÃO BASICA, DEFESA, FEDERALIZAÇÃO, EDUCAÇÃO, BRASIL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Paim, Sr. Senador Pedro Simon, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, a maior parte dos nossos discursos políticos são irrelevantes. Não impactam, não duram. São esquecidos rapidamente. Eu diria que a quase totalidade deles. Mas há outros que são marcantes, que são definitivamente marcados na história do País de quem faz o discurso.

            Nesta semana, faz 50 anos que Martin Luther King, negro, pastor, líder, prêmio Nobel, fez um discurso desses, marcantes e transformadores, inesquecível, e lido por um país, o seu país, diferente hoje do que era quando ele o pronunciou. E diferente, graças a ele.

            Naquele dia, 28 de agosto de 1963, na frente do monumento Abraham Lincoln, diante de 250 milhões de pessoas e de uma grande marcha pelos direitos civis, ele fez um discurso que ficou conhecido como “eu tenho um sonho”, que, até hoje, é lembrado por um país que já não é igual àquele quando ele falou.

            Naquele discurso, entre outras coisas - um discurso curto -, ele disse, abro aspas: “Tenho o sonho de que um dia esta nação vai se levantar e viver o verdadeiro significado do seu credo”. O credo da democracia, que caracteriza a nação norte-americana; da liberdade, da busca da felicidade, como está escrito na sua Constituição. E ele disse mais: “Tenho o sonho de que meus quatro pequenos filhos, um dia, viverão numa nação onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas pelo conteúdo de seu caráter”.

            Cinquenta anos depois em que ele disse que sonhava que um dia seus pequenos quatro filhos, negros, viveriam em numa nação onde não seriam julgados pela cor, o Presidente é negro. Em grande parte, essa negritude do Presidente se dá pela luta de Martin Luther King, pelos direitos humanos, direitos civis, direito de os negros serem tratados igualmente aos brancos.

            Cinquenta anos depois, Senador Pedro Simon, esses dois sonhos de Martin Luther King podem ser traduzidos e adaptados ao Brasil de hoje. No lugar do sonho que ele tinha, de que o futuro não dependeria da cor da pele, hoje, eu tenho o sonho de que todos os filhos de minha Pátria viverão em uma nação onde eles não serão educados conforme a renda dos pais, conforme a cidade onde vivem. Eu tenho o sonho de que eles serão educados por um sistema educacional com a mesma qualidade. Não importa onde nasceram, nem de quem nasceram.

            Eu tenho o sonho de que os filhos dos trabalhadores estudarão na mesma escola dos filhos dos patrões, de que os filhos das favelas, nas mesmas escolas de qualidade dos filhos dos condomínios. Que os filhos do mais pobre brasileiro terão uma escola com a mesma qualidade do filho do mais rico.

            Esse é um sonho que Martin Luther King teria hoje, se falasse no Brasil, em vez de ter falado no seu discurso “tenho um sonho”, cinquenta anos atrás, nos Estados Unidos.

            É inspirado por ele que nós podemos ter o sonho de que essa escola, que seria igual para os filhos dos trabalhadores, dos patrões, dos moradores da favela e do condomínio, dos pobres e dos ricos, essa escola terá a qualidade da técnica, da ética, do conhecimento e das crenças igual às melhores escolas do mundo.

            Nós queremos que todas as escolas tenham a mesma qualidade para nós e que tenha a mesma qualidade das escolas dos países que já investiram tanto em educação. Que o Brasil - é um sonho - será o campeão em educação.

            Esse é o sonho que Martin Luther King teria hoje, se fosse brasileiro e se vivesse nesses dias. Se fosse daqui e de agora, com nossos problemas em nossos tempos.

            Eu também tenho o sonho de que minha Nação brasileira, um dia, vai acreditar que isso é possível, porque uma coisa é você ter o sonho sozinho; outra coisa é você querer que todos tenham esse sonho. E para que todos tenham esse sonho, é preciso que acreditem. Não basta para nós ter o sonho. É preciso ter outro sonho, Senador, o sonho de que o povo vai acreditar, porque, se o povo não acreditar no sonho, o sonho não se realiza.

            O povo acreditar que é possível oferecer escola com a mesma qualidade a todos os filhos da Nação. Deixar de falar nos filhos dos pobres e dos ricos, do condomínio e da favela, dos trabalhadores e dos patrões, e falar nos filhos do Brasil. Na hora em que a gente tiver a sensação de que os filhos são do Brasil, nós não vamos tratá-los diferentemente. Eu tenho o sonho de que, um dia, o Brasil vai acreditar que é possível isso acontecer. Acreditar nisso, na crença de todos, no sonho da gente, é também um sonho em si.

            Mas não adianta apenas isso. Eu sonho também que, acreditando no seu sonho, o Brasil se levantará para realizar o sonho, porque o sonho só se realiza quando ele não é solitário. E também não se realiza quando o sonhador continua deitado em berço esplêndido. Só quando o sonho de todos, e todos se levantam, é que ele começa a ter a chance de ser realizado. Se nós acreditarmos, se nós nos levantarmos, será realizado o sonho da igualdade de oportunidade para cada brasileiro.

            Esse é o sonho que Martin Luther King teria hoje, no Brasil, que, filosoficamente, não é diferente daquele que ele teve 50 anos atrás, nos Estados Unidos. Ele queria igualdade de oportunidade, independentemente da cor da pele. Nós queremos igualdade - e sonhamos com isso - de oportunidade, independentemente da renda dos pais, independentemente da cidade onde se nasceu e de onde se vive.

            Senador Paim, em consequência deste sonho de garantir oportunidade igual para todos, outros sonhos serão realizados, porque, além de uma escola com a mesma qualidade da das melhores do mundo e igual para todos os brasileiros, nós temos outros sonhos: o sonho de que nossa economia será eficiente, competitiva e distributiva, e isso passa pela educação de qualidade para todos. O sonho de que nossa sociedade não será dividida entre incluídos e excluídos da modernidade, e isso passa pela educação de qualidade para todos. Temos também todos os sonhos de que o Brasil será um celeiro não apenas de soja, de milho, de ferro, mas também de conhecimento, de ciência, de tecnologia, de arte, de cultura, a serviço da humanidade, e esse sonho também passa pela educação de qualidade para todos. Temos também o sonho, Senador Paim, de que as ruas de nossas cidades, um dia, serão pacíficas, e isso passa pela educação de qualidade para todos. Temos o sonho de que o nosso País não terá vergonha da corrupção na política e na sociedade, porque ela também existe. E não apenas não haverá corrupção no comportamento dos políticos, mas também não haverá corrupção nas opções de prioridades da política, e isso também passa pela educação de qualidade para todos.

            Tenho o sonho, plagiando Luther King, de que, um dia, o Brasil seja o Brasil dos nossos sonhos, e esse sonho passa pelo sonho de que um dia os filhos dos mais pobres estudarão nas escolas com a mesma qualidade dos filhos dos mais ricos.

            Por isso, para construir o Brasil dos nossos sonhos, é preciso sonhar, acreditar e levantar-se para fazer com que neste País uma criança não tenha o seu destino definido pela renda dos pais, nem definido pela cidade onde ela vive, mas, sim, pelo talento, pela persistência, pela vocação e também pelo esforço próprio de galgar patamares, às vezes superiores, sim, pela força pessoal, e não pela oportunidade que lhe dá a sorte. Este é um sonho: que o futuro de uma criança neste País não dependa da sorte de onde nasceu e de quem nasceu, mas, sim, do seu esforço, do seu talento, da sua persistência. Esse é o sonho, Senador Paim, que eu creio que Luther king faria hoje, 50 anos depois do seu discurso em Washington.

            É esse, Sr. Presidente, o meu discurso, mas aproveito, com muita satisfação, para ouvir o aparte do Senador Capiberibe.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - Senador Cristovam, Sr. Presidente Paim, Senador Pedro Simon, eu também participo desse sonho, e acho, e creio, e acredito que o instrumento para a realização dos nossos sonhos é a política, em que pese situações como a que nós vivemos essa semana na Câmara dos Deputados. Mas o que torna a política, o que faz com que a sociedade generalize e desqualifique todos os políticos... Ainda assim, é bom destacar que há, sim, políticos que sonham com um País justo, com um País melhor, com um País com educação de qualidade para todos, com liberdade para a gente ir e vir nas ruas. Nós temos belas cidades, temos um povo generoso, e nos falta liberdade para usar os espaços públicos que nós temos. E o instrumento dessa construção é a política. E não é verdade que todos são iguais. Há políticos diferentes, há políticos que insistem em usar a política como instrumento de transformação e de avanço para a sociedade. Agora, são minorias. Esses políticos não representam a maioria do Congresso, não representam a maioria nas Assembleias Legislativas. E essa compreensão de que não se pode generalizar e colocar todos na vala comum da desonestidade e da corrupção é fundamental que a sociedade tenha, e que possa também operar a diferenciação entre os agentes eleitos. Esta Casa, assim como a Câmara, foi atingida pela decisão da Câmara. Eu não vejo tanta diferença no grau de constrangimento por que passaram as Deputadas que querem uma sociedade melhor e que esbarram numa maioria que, exatamente, trabalha o contrário. Também nos atinge aqui no Senado. Portanto, eu faço parte daqueles que sonham com um Brasil muito melhor do que o que já temos hoje. Eu acho que houve avanços, mas está muito aquém daquilo de que a sociedade brasileira, este povo diverso e generoso, precisa.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador Capiberibe. Eu creio que a gente pode dizer que tem, entre muitas categorias, três tipos de políticos: os que só pensam no presente, os que projetam o futuro como continuação do passado e os que sonham com um futuro diferente - são estes que constroem o País com que sonhamos. Há aqueles que não se contentam em projetar como é que vai ser o Brasil daqui a 20, 30 anos, conforme ele vem sendo construído ao longo dos últimos 50, mas há aqueles que usam o sonho para imaginar o futuro desejado para o Brasil. São esses que mudam, quando eles conseguem fazer com que todos acreditem no sonho e, depois de acreditar, se levantam do berço esplêndido e vão para as ruas, para as urnas, às vezes até para as armas, para conseguir realizar o sonho de um futuro diferente. É isso, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Meus cumprimentos, Senador Cristovam, pelo pronunciamento. Todos nós somos eternos sonhadores...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - O Senador Paim pediu...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Como eu estava fazendo um aparte a V. Exª, eu terminei...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Ah, desculpe.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - ... antes que V. Exª se retire da tribuna...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Desculpe.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Não, e eu percebi o movimento do Senador Pedro Simon, que lhe pede um aparte.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Não, mas o aparte da Mesa é mais importante. Eu espero.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu só fiz o aparte até que V. Exª...

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Eu espero V. Exª, por favor.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Nada, eu já fiz. O meu aparte era só para esperar V. Exª.

            O Sr. Pedro Simon (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Senador Cristovam, há pessoas pelas quais, na minha vida, eu tenho muito respeito e muita admiração. E o grau desse meu respeito e dessa minha admiração não está ligado ao fato de ela ser importante ou de ser vitoriosa, mas à pessoa como ela é. V. Exª é uma pessoa que eu conheci lá no Ministério da Justiça, com o nosso amigo Fernando Lyra. Quando eu perguntei por V. Exª, as pessoas me disseram: “Esse é a garantia de que o Fernando Henrique vai bem porque, na hora de trancar, ele vai saber o que deve ir e o que deve parar”. E, de lá para cá, foi essa a atuação de V. Exª, que foi uma pessoa muito importante e de quem o Fernando Lyra precisava, naquela hora difícil dele, como Ministro da Justiça, o verdadeiro representante do Dr. Tancredo, de conviver com um governo novo, completamente diferente daquilo que nós tínhamos almejado. E ele desempenhou um papel realmente muito importante. Todas as pessoas - e eu participava do governo - salientavam que era a posição de V. Exª que estava ali. No Governo do Estado, V. Exª... Tenho falado por várias vezes que a gente diz que o povo brasileiro não tem regras, não tem linha, não tem comportamento. Em Porto Alegre, há o problema do desrespeito que os motoristas têm para com a faixa de pedestres. Eu me emociono, porque é só aqui, não há dúvida. Eu fico, às vezes, até chateado com o meu motorista, mas nem abro a boca. O cara vem vindo lá atrás, e eu penso que ele poderia passar, não atrapalharia, mas não, o cara está vindo, ele já para aqui. Isso foi uma campanha que V. Exª fez, na qual insistiu. Aqui em Brasília é natural, mas em Porto Alegre não se consegue fazer nada disso. O cidadão que vai atravessar a faixa atropela o carro e o carro que vai atravessar a faixa atropela o cidadão. Um querendo chegar na frente do outro. Por que aqui conseguiu e lá não conseguiu? Por que isso já está na índole do povo aqui de Brasília? É o estilo de V. Exª. A passagem de V. Exª pela universidade, uma época difícil, uma época, realmente, entre o sonho dos que afundaram e os dias que viveram... Foi muito duro. Acho que agora é que a universidade vai retomar. E eu tenho a convicção de que ideias como as de V. Exª vão fazer com que ela, realmente, ocupe o lugar que V. Exª e que Darcy Ribeiro sonharam para ela. Como Ministro da Educação, eu entendo. V. Exª é simples, tem um linguajar positivo, intelectual, mas é a pessoa mais humilde. Mas o Lula, ao chegar ao governo, não podia entender V. Exª. Lula queria mais isso, mais aquilo, as coisas na hora ali, e as coisas na hora não aconteciam. V. Exª via. Então: “Esse homem sonha demais, é um grande professor, mas eu quero um cara que resolva o negócio aqui”. Eu até respeito o Lula, não foi má-fé, nem má vontade, foi a falta de... Talvez, hoje, se o Lula voltasse, V. Exª seria o Ministro da Educação dele, e se dariam muito bem, porque hoje o Lula entendeu, está entendendo, há coisas em que ele evoluiu, em que ele avançou, mas naquela época, não. Naquela época, V. Exª era muito intelectual, era muito sonhador, sonhava alto, filho de pobre estudar junto com filho de rico e não sei mais o quê. V. Exª foi. E, aqui no Senado, V. Exª é um símbolo - é um símbolo - e representa... Há pessoas que o admiram muito. O Teotônio. Houve um momento em que o Teotônio era da Arena, era arenista e fazia os discursos dele como membro da Arena, cobrando da Arena, porque a Arena tinha feito uma revolução pela moral, pela dignidade, pela seriedade. E ele foi avançando. E os membros da Arena começavam a se retirar quando ele falava. A ordem era se retirar. E, à medida que os membros da Arena se retiravam, nós do MDB vínhamos para cá. Com o tempo, o Congresso inteiro vinha para cá assistir aos discursos dele. Teotônio era um produtor de cana-de-açúcar, que, lá pelas tantas, largou tudo para os filhos, quando ele viu essas coisas, e se dedicou. Mas os discursos que ele fez aqui foram memoráveis, com coragem de enfrentar. Andou pelo Brasil semeando esperança. Você não calcula como eu tenho saudade daquilo. Ele, com duas bengalas, quatro cânceres, o povo chorava quando ele falava. Ele chegava à tribuna, onde está V. Exª, botava as duas bengalas em cima da mesa e dizia: “Eu estou aqui, com as minhas duas bengalas, com os meus quatro cânceres. Os meus médicos dizem que eu devia ir para Paris, porque hoje a minha doença é irreversível, mas há métodos e formas de conviver com a minha doença, e eu posso vivê-la sem o sofrimento”. Então, disseram: “Vai para Paris, vá viver esses anos que te sobram”. Ele disse: “Mas eu não vou. Eu estou aqui”. Cobrava isso e depois dizia: “E você? Você que tem saúde, que tem as duas pernas, que tem os dois olhos, que enxerga, que fala? Nós temos que ir para as ruas!”. E olha, quando a gente fala da mocidade, porque, naquela época, não havia as redes sociais nem coisa nenhuma, e quando a gente começou a falar em ir para as ruas, era meia dúzia de pessoas, ninguém ia. Quem começou a trazer, e vinha, e vinha, e vinha, foi uma pessoa como o Teotônio. O Darcy Ribeiro foi uma pessoa dessas. Este Senado, às vezes, é uma vergonha. A Lei de Diretrizes e Bases estava ali para ser... Anos e anos e anos e anos, e nada. O Darcy Ribeiro fez sozinho. Fica até feio dizer isto, mas o Darcy fez sozinho, o resto da Comissão assinou. Marcava reunião, não vinham. E ele perguntava: “O que eu faço?”. “Olha, Darcy, faz tu!”. Então, ele pegou alguns. Eu fui um dos que o ouviram falar: “Eu não sou o dono, eu tenho que ter alguém que me diga se a coisa é por aqui ou por ali”. Mas fez o negócio dele. V. Exª é um homem desses. V. Exª não calcula a felicidade que tenho em dizer que sou amigo de V. Exª. Quando eu vou à sua casa, a sua esposa é uma pessoa espetacular. Olha, é a convivência, os dois formam um casal realmente impressionante. Começa que lá, na sua casa, os quadros que estão ali, que rememoram o que V. Exª acha importante, eu fico ali, às vezes, parado, e repito, e vou vendo... Eu acho que V. Exª está sendo mal aproveitado aqui. Mas V. Exª tinha que ser um pouco mais executivo. V. Exª vai falar mais 20 anos ali da tribuna, um discurso mais bonito que o outro, e mais positivo, “Façam”, e não vão fazer. Alguém tem que fazer. V. Exª devia entrar nisso. Pega dois, três, não importa, eu já estou falando em partir para uma... Mas eu acho que, neste momento, nós estamos vivendo uma hora muito difícil. Como é que tu vais dividir esse movimento de rua? Como é que tu vais colocar cada um no seu lugar? Tu não podes confiar no Governo. Quer dizer, o movimento mais bonito, que é o dos jovens, o Governo é contra. Se depender do Governo, ele liquida. Tu não podes confiar nas Centrais Sindicais, nem na UNE, porque essa turma está toda cooptada. Elas foram hoje para as ruas fazer as coisas a favor do Governo. Essas teses que ela apresentou, repare, não têm nada a ver. São todas uma mais importante que a outra, Paim, mas não é hora. A hora é outra. Mas isso é feito para direcionar, para mostrar que eles estão na rua porque todos estão cobrando que eles não estão na rua: “CUT, onde é que tu estás? UNE, onde é que tu estás?”. Isso os está deixando em uma situação muito ruim. Então estão indo para a rua. Eles estão fazendo um mau papel. Um mau papel? Mas estão defendendo uma tese mais importante que a outra! Mas há momento para tudo, há momento para tudo. Agora, eles estão jogando é na divisão. Na hora em que... Nós vimos o que fizeram, o que o PT e essa gente toda fez com relação ao Procurador-Geral, com relação à emenda, para terminar, com relação a boicotar o que aconteceu. Então, agora, neste momento, em que nós temos que avançar, ver alguma coisa de positivo, eles estão boicotando. Aí que eu acho que V. Exª deve entrar. Eu me coloco à disposição de V. Exª como andarilho, para fazer, executar tarefas como: “Vai falar com fulano. Vai falar com beltrano...”. Mas acho que V. Exª deve fazer isso.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado.

            O Sr. Pedro Simon (Bloco Maioria/PMDB - RS) - E não ficar, apenas, só entre nós aqui, porque, na verdade, na verdade, eu não sei, mas a gente não se acerta. Eu não sei. Sinceramente, eu tenho uma desilusão com esta Casa. Cheguei aqui 36 anos atrás, e acho que a gente tem que pegar gente aqui da Casa e pegar gente lá de fora. Vamos pegar! O ex-Presidente da OAB é sensacional. O atual também é sensacional. Lá, no Rio Grande do Sul, o ex-Presidente da OAB é sensacional. O atual também é sensacional. Há gente que quer. Vamos reunir. Eles têm raiva de político, mas vamos falar com eles. Nós não queremos aparecer. Nós não queremos fazer uma entidade em que nós estejamos à frente. “Nós queremos conversar, para vocês irem, e nós ficarmos.” Mas vamos estabelecer uma forma de avançar. Faça isso! V. Exª é o homem para fazer isso. V. Exª é muito humilde. Fala, quer fazer e fica com vergonha. Não; fale e saia na frente. Eu sou dos primeiros que estão atrás de V. Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado, Senador.

            Eu peço ao Senador Paim para dizer. E essa fala, Senador, eu não quis poluir colocando aqui como fazer isso, mas para mim está muito claro. E tentei com o Ministro. Acontece que eu tentei fazer muito pela alfabetização e educação de base, e o Presidente Lula tinha clareza de que, para ganhar votos, tinha que investir mais em universidade. Daí por que eu sempre defendi dois Ministérios separados: da educação de base e do ensino superior. Porque, nessa disputa por recursos entre os dois, ganha a universidade, como vai levar a maior parte do dinheiro do pré-sal. Em vez de aprovarem a minha proposta, com o Senador Aloysio Nunes, de o dinheiro ir todo para a educação de base, colocaram que irá, prioritariamente, à educação de base - inclusive, deve ser o único caso, na histórica jurídica, que entra a palavra prioritariamente. Não quer dizer nada.

            Pois bem. A proposta está clara. Eu resumo chamando federalização de educação de base. É o Governo Federal assumindo cidades com escolas do tipo do Colégio Pedro II, dos colégios militares, dos institutos de aplicação, com a carreira nacional do magistério.

            Essa proposta, Senador, foi entregue à Presidenta Dilma, em 11 de julho de 2011, como resumo de uma proposta muito mais complexa que eu tenho publicada. Eu fiz uma carta em quatro páginas, com mais uma no meio, dizendo quanto custa e o gráfico da implantação. A gente não vai dar o salto melhorando o atual sistema. Tem que se fazer o que Brizola sonhou, que era um sistema novo, que ele chamou de Cieps, só que atualizado para o mundo de hoje - não tem mais nada a ver com aquele -, sem aquela preocupação com a edificação daquele tipo, mas, sim, com edificações de alta qualidade, e fazer por cidade, não por unidade escolar, como ele fez e o Presidente Collor também. Nunca houve uma resposta da Presidente Dilma. Isso foi entregue por mim à Ministra Gleisi, nossa colega daqui. Nunca houve.

            E o que eu soube, depois de algum tempo, pelos cochichos que circulam em Brasília, é que eles acharam engraçado que eu propunha para essa nova carreira do magistério um salário de R$9 mil por mês, para atrair os melhores jovens da sociedade. Isso, para ser implantado em 20 anos, algo que custaria 6,4% do PIB, o que não é muito, já que vão aprovar no PNE 10%. Nem dos 10% se precisa.

            Eu acho que não há o sentimento. Por isso, digo que um dos sonhos é que acreditem que isso é possível. Não acreditam.

            Aí o que a gente está fazendo hoje? A criação da Frente Parlamentar pela Federalização, que já tem o número suficiente aqui e na Câmara. Conseguimos mais de 140 Deputados, até quinta-feira.

            A partir daí é tentar aprovar a PEC que coloquei, a PEC nº 32, que diz que a União é responsável pela educação das crianças brasileiras. É este sonho de dizer que toda criança brasileira é brasileira, não de tal e tal cidade apenas. Essa é a ideia de que o Brasil tratará as crianças brasileiras como se fosse uma grande família. Essa é a ideia de que a Senadora Heloísa Helena falou aqui uma vez - e não esqueço -, de que bastava o Brasil adotar uma geração de brasileiros, que essa geração depois adotaria o Brasil inteiro.

            Isso é possível. Sabe-se como fazer, precisa-se de vontade política. E aí tentei - mas, vamos falar com franqueza, sabendo que não ia dar em nada, a não ser divulgar a ideia -, quando fui candidato a Presidente e tive 2,5% dos votos.

            É um Presidente que vai fazer isso ou uma Presidente. Ministro não faz nada, se o Presidente não quiser. Nada, nada, nada. Aliás, ministro não faz nada que o Presidente não queira e que o Ministro da Fazenda não queira. Ele está abaixo disso, no caso do Brasil. Então, tem de haver um Presidente que faça com que o Ministro seja seu porta-voz. O Ministro da Educação de um país que quer ser educado é o Presidente da República, que põe alguém ao lado dele, para executar as coisas.

            E, finalmente, sobre sonhos.

            O senhor lembra, quando fui Reitor, tínhamos muita convivência - o senhor no Ministério da Agricultura - e chegamos a fazer trabalho juntos. No meu Conselho, estava Paulo Freire. E um dia apresentei o meu projeto de universidade para ele, logo nas primeiras semanas.

            Depois de apresentar, Senador Paim, eu disse: isso aqui é o que acho possível, mas o que gostaria é isto aqui. E era uma universidade revolucionária, em núcleos, em departamentos, convivendo com a sociedade. Ele olhou para mim e disse: “E por que você não apresentou isso para nós?” Falei: “Porque isso é um sonho muito grande.” E Paulo Freire disse - e é algo que jamais esquecerei -: “Cristovam, nunca corte as asas dos seus sonhos. Já há gente demais usando tesoura neste País”.

            Então, nós temos que ter este sonho do futuro e procurar fazer o exercício da engenharia de realizá-lo. Aí sim, senão vira um simples sonhador, que eu respeito muito; um profeta, que eu respeito muito. Tem que haver o lado da engenharia.

            E quero falar em engenharia no que se refere à faixa de pedestre. Por que não deu certo em outras cidades? Porque eles buscam a solução na engenharia; nós buscamos na educação. Não conseguimos que todos aqui respeitassem a faixa de pedestre por termos colocado leis. Não. Ganhamos conquistando as crianças, para que elas conquistassem os pais motoristas. Foi uma campanha de educação. E interessante é que ela foi levada adiante por um engenheiro, o engenheiro Miúra, que era o Chefe do Departamento de Trânsito, que me trouxe a ideia. E a maioria dos assessores me disseram: “Não vá em frente, porque você vai matar gente com isso”. E ele disse: “Se ficarmos seis meses educando a população, colocando uns palhaços - palhaços mesmos - nas faixas, dando florzinha a quem parar, convencendo as crianças de que aquilo é bonito...”. Dava poder às crianças de mandar o pai parar e dava poder ao pedestre de colocar a mão e o carro parar. Então, foi uma campanha educacional.

            Por isso, dá vontade até de pegar o meu discurso e acrescentar mais uma coisa: sonho que todas as cidades do Brasil terão faixa de pedestre. E aí concluo com a mesma frase que eu disse dos outros sonhos: para isso, é preciso educação de qualidade para todos.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/08/2013 - Página 58634