Discurso durante a 129ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca da existência de uma “simbiose” entre as manifestações populares, ocorridas recentemente, e o professado pelo Papa Francisco em sua visita ao Brasil.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Comentários acerca da existência de uma “simbiose” entre as manifestações populares, ocorridas recentemente, e o professado pelo Papa Francisco em sua visita ao Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/2013 - Página 53651
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, VISITA, PAPA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DISCURSO, TRANSMISSÃO, POPULAÇÃO, COMPARAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, OCORRENCIA, PAIS.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, atrasado, mas não poderia deixar de falar a esta Casa e para a história do Brasil sobre esse assunto.

            Se me perguntarem qual tem sido a grande marca de 2013, ainda que mal tenhamos passado a metade deste ano, eu afirmo que é a volta do povo às ruas. Há mais de 20 anos, não se via tamanha mobilização popular, na busca legítima pelos direitos mais que sagrados da cidadania.

            O povo cansou das decisões impostas de cima para baixo, de dentro para fora, decididas e refrigeradas nos gabinetes, quase sempre para atender a interesses individuais e de grupos, que sempre gravitam em torno do Poder, em todos os níveis; grupos que financiam campanhas políticas, que cobram depois agiotagem macabra de superfaturamento das obras e dos serviços públicos.

            O povo brasileiro deu provas de que não quer ser mais mero objeto da história. Quer ser sujeito, quer ser o senhor do seu destino, quer ser protagonista, e não apenas figurante. Esse mesmo povo quer derrubar esse verdadeiro muro da vergonha, que segrega, que exclui e que constrói o aparthaid social que ainda mantém milhões de brasileiros na fome, no analfabetismo e na dor das filas dos hospitais.

            Mais de 1,5 milhão de brasileiros foi às ruas a exigir que esse mesmo muro seja derrubado, que a corrupção causadora dessas e de tantas outras mazelas seja extirpada, em nome da democracia e em nome da verdadeira cidadania.

            O povo recorreu à história, porque as grandes mudanças políticas e as grandes mudanças institucionais dos últimos tempos só foram possíveis com a pressão das ruas, na luta por eleições diretas, pela anistia e pela ética na política.

            De repente, no meio de tantas e tamanhas manifestações populares, o Brasil recebe a visita do Papa, e quis o destino ou a decisão do Criador que o Papa anterior renunciasse. Não fosse assim, talvez assistíssemos, aqui também, às homilias de gabinete, voltadas para o silêncio das sacristias, decisões dogmáticas e burocratizadas, acompanhadas pelas penitências relativas aos eventuais pecados mortais ou veniais. Mas o Papa Bento XVI, considerado um dos maiores teólogos de todos os tempos, renunciou e, no passo e na coincidência histórica da população, foi eleito um Papa com uma homilia mais próxima do povo, longe do silêncio das sacristias, tal e qual a proximidade que esse mesmo povo agora exige dos gabinetes que também pareciam, até aqui, ditar dogmas e construir sacrilégios.

            O povo quer a inclusão dos milhões que ainda permanecem do lado de lá do muro da vergonha. O Papa quer o fim da "globalização da indiferença". O povo quer cidadania e que todos tenham lugar na mesa de decisões. O Papa quer todos juntos na mesa de comunhão, ainda que seja "com muito mais água no feijão". Não é à toa, portanto, que o Papa pôde andar no meio do povo de coração e vidros abertos.

            O Papa prega a cultura do encontro e do diálogo.

            O povo quer participar da construção dos seus destinos. Portanto, nunca um Papa foi tão bem-vindo. E parece nunca ter havido tamanha simbiose entre o desejo de um povo e a pregação de um Papa.

            Não é à toa que ele escolheu o nome Francisco. O Santo, no seu tempo, também revolucionou a Igreja. O Santo também marchou contra a cultura do consumismo, tal e qual a pregação do agora Papa que leva o seu santo nome.

            São Francisco disse ter recebido uma mensagem divina no sentido de reconstruir a Igreja. Ele imaginou, de início, tratar-se da igreja matéria, nas ruínas dos seus tijolos. Percebeu, depois, que se tratava da Igreja no seu sentido mais amplo, imaterial, não consumista, fora das sacristias. E ninguém ousa discordar de que São Francisco foi um revolucionário no seu tempo. Era um momento de início do capitalismo como o conhecemos hoje, segregador, excludente, consumista. Imagine-se, então, alguém que, filho de um representante desse mesmo modelo voltado para os bens materiais, despe-se de todas as pompas, de todas as circunstâncias, do dinheiro, das posses e da própria veste que significava o poder material e atrai seguidores para uma vida extremamente simples, extremamente franciscana, como se diria hoje.

            O Papa Francisco também abriu mão dessas mesmas pompas e dessas mesmas circunstâncias. Abriu mão do ouro e de todas as ostentações que sempre marcaram os pontificados. Abriu mão das vestes do poder material e, até mesmo, do ouro da cruz. Ele deixou de ser o Papa das aparências, para ser um Papa mais próximo do povo.

            Eu sempre imaginei como viveria São Francisco de Assis nos dias atuais. Talvez fosse execrado, mantido com os outros milhões, do lado de lá do muro da vergonha. Oito séculos se passaram e, tudo indica, o primeiro Papa que escolheu o nome do Santo nos traz, alma e gesto, uma revolução não só na Igreja, mas na maneira de ser de cada um de nós, cada brasileiro, cada homem, cidadão do mundo.

            O Papa Francisco, como o Santo, é um revolucionário do nosso tempo. Quem sabe ele possa, então, inspirar as mudanças que o povo deseja de nós, representantes desse mesmo povo, para o qual teimamos em permanecer de ouvidos moucos.

            Não se segue a Cristo sem tentações, disse ele. Nem na religião, nem na política, digo eu. Na política, a tentação rima com corrupção. E a história mostra que há vendilhões do templo tanto nos gabinetes como nas sacristias.

            Para o Papa, não bastam as mudanças na estrutura da Igreja. É preciso que sejam adotadas novas atitudes. Na política, também será insuficiente um povo sem um novo aparato legal se não houver mudanças nas posturas desse mesmo povo.

            Do mesmo modo, não se exerce a política sem ser revolucionário, principalmente em um país onde muitos ainda caminham indefesos longe das trincheiras dos abrigos. São queimados vivos sob marquises. São metralhados pela mesma polícia que deveria protegê-los. Desaparecem, viram cruzes nos protestos na praia de Copacabana ou no gramado do Congresso. São Josildos ou Amarildos. São João Hélios ou Izabellas, arrastados pelas ruas ou atirados pelas janelas.

            Daí que a escolha do novo Papa e a sua vinda ao Brasil me renovam a esperança. A Igreja, a escola e a família sempre foram, para mim, os melhores pilares para a construção de uma sociedade mais justa e mais humana. O diálogo familiar e a orientação escolar foram trocados, desde muito tempo, pela mensagem comercial da TV, que impõe o ter como condição para o ser.

            Não há como negar, também, que a Igreja andava na contramão da fraternidade e da solidariedade, muito mais preocupada com as sacristias do que com as ruas. No limite, vendia indulgências. Tudo indica que o Papa Francisco é o mais indicado para resgatar aqueles mesmos pilares, sem os ranços pessoais, ideológicos e discriminatórios...

            (Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... que pareciam tomar conta das nossas relações sociais.

            O Papa Francisco orou por nós. Mas ele, reiteradas vezes, pediu para que também rezássemos por ele. Tomara que as orações dele tragam os resultados que tanto almejamos. Nelas, mais que “o pão nosso de cada dia”, ele pediu justiça, paz, solidariedade e compaixão. Tomara que as nossas orações sejam ouvidas pelo Criador.

            Que o Papa Francisco tenha longa vida, porque a história também mostra o quanto são difíceis os caminhos de quem quer mudar as estruturas carcomidas pelo poder, carcomidas pelo luxo, sejam elas leigas ou eclesiásticas.

            De minha parte, rezo pelo Papa, para que ele consiga realizar as mudanças propostas nos altares por onde passou. Rezo também para que as orações do Papa sejam ouvidas a fim de que também se concretize o que pregamos das tribunas por onde passamos. Rezo, enfim, para que a fraternidade, a solidariedade, a compaixão e a humanidade não sejam apenas meros recheios de discursos de homilias.

            Recebi com profunda emoção a presença do Papa. Assisti emocionado, fiquei praticamente três dias na frente da televisão, principalmente da Globo News e das duas tevês religiosas...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... que transmitiram tudo da visita do Papa.

            Achei impressionante a manifestação do povo brasileiro. Achei profundamente comovente 1,5 milhão de jovens, debaixo da chuva, do vento e do frio, ali, na frente das ondas do mar, fazendo uma noite de vigília para a jornada de despedida.

            Achei, realmente, que é importante essa análise. Achei que os milhares do mundo inteiro, 150 ou mais países que vieram aqui, receberam uma imagem muito feliz do povo brasileiro.

            Que bom que isso tenha acontecido. Que bom que a figura do Papa Francisco revolucione as horas que estamos vivendo. Que bom ver o Papa Francisco agora sair do Vaticano e andar pelas ruas do mundo inteiro não num carro o mais nobre possível, mas num Ford, um Ford Focus,...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... simples e singelo. Que bom o Papa Francisco não andar com aquela capa dourada ou de ouro, mas andar de maneira simples e humilde, com um anel de ferro prateado, sem joias, sem o sapato vermelho que o tornava diferente de todo mundo, mas com o mesmo sapato preto que ele usava. Não foi nem sapato novo, foi o mesmo.

            Que bom que o Papa Francisco não quis as instalações enormes e bonitas do Vaticano e ficou numa espécie de hotel de passagem, onde os bispos e os cardeais do mundo se hospedam quando estão no Vaticano. Em um desses quartos, lá está o Papa, que, em vez de almoçar e jantar sozinho...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... nas suas instalações, conversa e dialoga com os cidadãos da Igreja do mundo inteiro. Esse é o Papa.

            Se no Brasil, até hoje, um presidente de banco ainda não sabe o que é cadeia, o Presidente do Banco do Vaticano está na cadeia. Esse é o Papa, que, realmente, dá uma demonstração importante.

            Quando terminou a Grande Guerra, fizeram a reunião que determinou o futuro da humanidade, e dela participaram Churchill, Roosevelt e Stalin. Churchill propôs que se convidasse o Papa. Stalin perguntou: “Quantos exércitos ele tem? Quais são as forças que ele representa?”. Não foi convidado.

            Mas, hoje, quando, no mundo inteiro, vemos um vazio crescente; hoje, quando inclusive um presidente que foi recebido com o aplauso do mundo, o Sr. Obama, para Presidente dos Estados Unidos, justifica que os americanos, usando da moderna tecnologia, entrem nos dados pessoais de bilhões de pessoas no mundo inteiro para saber desde os dados pessoais até os que interessam à economia daquele país...

            Se o Brasil, amanhã, lançar a concorrência para saber quais são as empresas que vão adquirir terrenos para fazer a exploração do pré-sal, os americanos já terão toda a fórmula para obter os estudos, o preparo, os números, para que possam, na hora de apresentar, estar em primeiro lugar. 

            Acho que podemos iniciar um debate novo e diferente. E acho que se o Papa for nessa linha isso será possível. Não é o que estava acontecendo no Brasil, a igreja tal com a igreja tal, discutindo qual é a televisão que reúne mais gente ou qual o templo maior, mas debatendo o verdadeiro sentido da palavra, da dignidade e da honra de um povo.

            Fico feliz porque acho que foi uma das semanas mais bonitas da história da humanidade moderna. E fico na expectativa de isso possa continuar.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/2013 - Página 53651