Discurso durante a 155ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Expectativa com o julgamento do caso “Mensalão” pelo STF.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • Expectativa com o julgamento do caso “Mensalão” pelo STF.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 14/09/2013 - Página 63358
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, JUDICIARIO, EXPECTATIVA, DECISÃO, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DENUNCIA, PAGAMENTO, MESADA, CONGRESSISTA, TROCA, APOIO, GOVERNO FEDERAL, DISCUSSÃO, CABIMENTO, EMBARGOS INFRINGENTES.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, comentário paralelo aos debates da manhã de hoje.

            O Globo publicou no dia 3 do mês:

Ex-dirigentes do Banco Nacional são presos no Rio por crime financeiro. Ação da Polícia Federal prendeu quatro integrantes da cúpula do banco. Todos foram condenados em processo na 1ª Vara Federal do Rio. O Banco Nacional sofreu intervenção do Banco Central na década de 90. Marcos Magalhães Pinto, Arnoldo Oliveira e Clarimundo Santana, além de um quarto cuja identidade não foi confirmada, foram condenados por crimes contra o sistema financeiro, de forma definitiva, em ação penal que tramitou na 1ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro. As penas variam de oito a dezessete anos. O advogado Nélio Machado, que defende os três acusados, informou por telefone à TV Globo que vai entrar com recurso. Segundo ele, provavelmente será um habeas corpus.

            Comentário.

            Após 23 anos, os indiciados são condenados em primeira instância na Justiça Federal. Aquele célebre caso - e eu já estava aqui - que ocorreu no Banco Nacional de Minas Gerais, e com o dinheiro enorme que o Banco do Brasil colocou lá. Depois de 23 anos, os seus diretores foram para a cadeia, foram condenados.

            Essa é uma notícia do dia 3 de setembro. Às 15h18 do dia 3 de setembro agora, eles foram presos. Os três ex-dirigentes do Banco Nacional foram presos porque foram condenados em primeira instância pela Justiça Federal. No mesmo dia, algumas horas depois, o Tribunal Regional Federal concede habeas corpus ao ex-dirigente do Banco Nacional.

            Diz a matéria:

Quarteto foi preso por crime contra o sistema financeiro da década de 90. Horas depois da prisão, liminar garantiu liberdade temporária.

Os quatro ex-dirigentes do Banco Nacional presos na manhã desta terça-feira (3) receberam um habeas corpus algumas horas depois da operação [...], segundo o Tribunal Regional Federal. Segundo Manuel de Jesus Soares, advogado de um dos clientes, eles serão soltos ainda nesta noite.

            Essa é a realidade do Brasil. Por isso, o Brasil é considerado o País da impunidade. É o País da impunidade, como se falou na sessão de ontem no Supremo. Como falou aqui o Senador Pedro Taques, do Mato Grosso, o Código Penal tem de deixar de ficar apenas na favela, nos lugares humildes, e tem de subir ao topo do conjunto da Nação.

            Essa é a realidade do Brasil. Esta é a realidade da Justiça no Brasil: recurso, mais recurso, mais recurso, mais não sei o quê. E o cidadão, 23 anos depois, é condenado em primeira instância, fica por quatro horas na cadeia e é solto. E, agora, serão mais 20 anos para eles serem condenados em segunda instância.

            Quantas vezes a gente vê no jornal a notícia de que uma mãe foi pega em flagrante no supermercado roubando um litro de leite ou uma bolacha para dar para o seu filho miserável e de que ela foi para cadeia! Não passa pela Justiça, não passa nem pelo delegado! O guarda, o fiscal do supermercado já tem a coordenação. Um soldado que está na frente do supermercado fazendo guarda leva-a para o camburão, e ela vai para a cadeia.

            Esse é o grande debate ao qual estamos assistindo no Supremo Tribunal, que vive o momento mais extraordinário e mais importante da sua vida. O Supremo, como nós do Congresso Nacional, temos muitos erros, muitos equívocos. E, às vezes, aqui e ali, muita coisa grave é praticada com a nossa ação ou com a nossa criminosa omissão.

            Por isso, em todo este ano, o Brasil olhou para o Supremo. Nunca aconteceu nada parecido! Não apenas a TV Justiça - e não sei se existe outro tribunal no mundo com uma televisão própria que transmita ao vivo as sessões do pleno do Supremo -, mas também o Canal 40 da Globo News, com comentarista ao lado da jornalista, transmitiram ao vivo todas as sessões, todos os debates no Supremo Tribunal.

            O Relator, hoje Presidente do Supremo, está firme e convicto nas suas ideias, e o Revisor, mais ainda; falou até mais do que o Relator, foi mais duro, apaixonado na defesa. É uma pessoa em relação à qual alguns têm restrições, e não ficaram muito claras as suas posições perante a sociedade brasileira. Mas ele debateu, discutiu ao máximo do possível.

            Chegamos ao dia de ontem. O ilustre Ministro analisou. O quórum estava mudando ali porque os três Ministros novos indicados pela Presidência da República decidiram, votando do mesmo lado. Nós, aqui, discutíamos e debatíamos, o Supremo cobrava. Mas por que tanto tempo, por que tanto tempo? Por que não aparece o nome, por que não se vem para debater a questão? O Revisor fazia tudo para prorrogar, prorrogar, prorrogar. Havia votos de três a quatro horas de matéria já julgada. Ontem, ele falou por dez minutos, porque queria resolver logo. Mas a Presidenta levou tempo, levou tempo, tempo, tempo, tempo, e a verdade veio ontem. Os três indicados pela Presidenta mudaram a decisão do Supremo. E fica para a figura de Celso de Mello a grande decisão.

            Gostei da manchete do Correio Braziliense com a figura do Ministro Celso e com o dizer: “Um País à espera da justiça”. Na verdade, não me lembro, na história do Supremo, de um momento como este e de uma expectativa como esta.

            Sempre tive o maior respeito pelo Ministro Celso de Mello. Inclusive, nesse processo, ele foi o juiz mais enérgico, mais duro e mais rígido na condenação de alguns atos de alguns réus. E ele lamentava, porque eles, sendo importantes e responsáveis por altos cargos da República, tinham cometido exatamente os crimes que não poderiam ter cometido. Na quarta-feira, ele decide.

            Eu repito aqui o que considero interessante: um juiz novato, brilhante, Luís Roberto Barroso, disse que não julga para as multidões, mas para as pessoas. E diz que, se, no meio da multidão, for perguntado a um pai ou a um filho se ele está preocupado e o que ele quer, ele vai querer a absolvição do seu filho ou do seu pai. Eu não achei feliz a manifestação de S. Exª. Hoje, acho que eu diria desta tribuna que, se um filho meu praticasse um ato dessa natureza, ele deveria pagar pelo que fez. Mas não posso garantir isso. Eu perdi um filho num acidente de automóvel, sei que não há dor maior no mundo do que um pai enterrar o próprio filho e não saberia dizer o que fazer numa situação como essa.

            Creio que, na multidão, quando esta é orientada no sentido do debate de uma questão nacional e quando essa questão é esclarecida, como foi o caso da ficha limpa, não há ninguém que não debata e não vote conhecendo, sabendo o que quer. No caso do mensalão, as várias manifestações de rua foram no sentido de cobrar e, mais do que cobrar, de exigir justiça, uma grande justiça.

            Volto a repetir: isso é interessante. O velho e querido Ulysses, quando lhe disseram que Médici, respondendo a uma manifestação, disse que jamais agia sob pressão e não se preocupava com pressões de massa, respondeu ao general de plantão no Planalto: “Eu só ajo sob pressão.” Na verdade, ele e aquela equipe que lutou e se esforçou para trazer a democracia, nós tínhamos na nossa frente e atrás de nós a pressão popular, a pressão da sociedade. E foi essa pressão, foi o povo na rua que conseguiu a democracia para o nosso País. Mas o Congresso não conseguiu aprovar a emenda das Diretas Já. Apesar de todo o esforço de milhões na rua, ela foi rejeitada. Mas o povo continuou, e, na hora da votação, à revelia de tudo que se imaginava, a ditadura foi derrotada, e Tancredo foi eleito.

            O ilustre e extraordinário Ministro Celso de Mello disse, e muito bem, já ter o seu voto, já ter o seu pensamento e estar tranquilo para quarta-feira. Creio que o Ministro Celso de Mello e todos os brasileiros acompanharam, 50 anos depois, o remorso da Rede Globo.

            A Rede Globo, num mea-culpa admirável, reconheceu seu erro de ter apoiado o Golpe de 64, que derrubou a democracia e impôs ao Brasil 21 anos de ditadura.

            A Nação não pode esperar, nesta hora e neste momento, ilustre Ministro Celso de Mello. Nós vivemos uma etapa importantíssima da nossa caminhada, com o jovem na rua, cobrando de nós, Congresso Nacional, e conseguindo, como ocorreu na Câmara dos Deputados, por ampla maioria, absolver o Deputado da cassação. Alguns dias depois, com os jovens na rua, cobrando, por unanimidade, determinaram a cassação. Isso foi a multidão na rua. Isso é o povo que está cobrando, que está avançando, e podemos dizer que, por todos os lados, o Brasil está caminhando.

            Quem estava na frente de toda essa caminhada não era o Congresso, muito menos o Executivo. Era o Supremo Tribunal. Pela vez se via o Supremo Tribunal funcionando, agindo, tomando posição. Não nos esqueçamos de que esse Deputado, cassado pelo Tribunal, absolvido pela Câmara dos Deputados e depois condenado, ao que sei, foi o primeiro Deputado cassado pelo Supremo.

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Nós, aqui na Câmara, já cassamos dezenas e dezenas de Deputados e Senadores. Nós, aqui, já cassamos Senadores e cassamos Deputados. No Supremo, o primeiro foi esse que aconteceu agora.

            Então, era de se entender a expectativa da sociedade brasileira em cima do Supremo, que vinha agindo com muita dignidade.

            Eu não fui muito simpático à ação do Revisor, um homem que eu respeito, um homem de bem, que tem as suas ideias, mas o seu estilo, a sua forma, o seu exagero em boicotar, em chegar ao final... Mas se chegou ao final. Agora, na quarta-feira, com a palavra Celso de Mello.

            V. Exª, Ministro Celso, é decano da Corte. Como é bonito ver um homem há vinte e tanto anos no Supremo, inabalável! A credibilidade e o respeito a S. Exª!

            Quando a imprensa toda já se manifestava no sentido de que seria uma pressão horrível, sexta, sábado, domingo, segunda, terça, quarta, ele falou à imprensa com a maior tranquilidade: “Eu já tenho o meu voto. Eu já tenho a minha decisão. Nada vai me influenciar. Não tenho nenhuma preocupação com quem quer que seja que imagine que possa ter uma influência sobre mim”.

            Eu creio nisso. Eu não tenho nenhuma dúvida. Inclusive, o Sr. Celso foi o Ministro mais rígido. O seu voto foi o mais duro com alguns dos réus, pelos crimes praticados. Disse S. Exª que as pessoas, pelas posições que tinham, pela esperança que o Brasil depositava nelas, não podiam fazer o que fizeram: uma traição à Pátria e ao povo brasileiro.

            Agora, a discussão é interessante sobre esse embargo infringente. Para nós, até ontem, havia um Supremo Tribunal Federal que era a palavra definitiva, era quem dava a voz final e o julgamento definitivo. O Supremo decidiu, está decidido. Vamos recorrer a quem?

             Interessante que muitos Parlamentares agora estão querendo sair do Supremo e ir para a Justiça Comum, para começar lá. Mas, nesses 40 anos, nenhum Senador, nenhum Governador, nenhum Deputado, nenhum Prefeito quis ser julgado pela Justiça Comum. Todo mundo queria um juizado especial. Infelizmente, isso ficava na gaveta do Supremo e não ia adiante. O Deputado e o Senador preferiam fórum especial: “Vai lá no Supremo!” Mas o motivo era um só: da gaveta do Supremo não saía.

            Muitas vezes, como durante os oitos anos de Fernando Henrique, não saía da gaveta do Brindeiro, Procurador, conhecido mais como arquivador lá no Supremo Tribunal.

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Agora, de repente, nós ficamos sabendo, meus amigos, que o Supremo Tribunal Federal não é o último recurso. O Supremo Tribunal não dá a última palavra. Quem é a última palavra? Chama-se “embargo infringente”. Quer dizer, é condenado no Supremo Tribunal, é condenado em última instância pelo Tribunal importante deste País. Mas há o embargo infringente.

            Desculpem-me, Srs. Ministros do Supremo, mas soa mal à sociedade buscar lá na gaveta um tal de embargo infringente que nunca foi usado nessa circunstância. Nunca foi usado nessa circunstância!

            O ilustre Sr. Barroso, homem de Justiça, de capacidade, de competência imensa, se orgulha de dizer isso. Foi buscar, lá na gaveta, um artigo do Regimento do Supremo. Depois desse artigo do Regimento do Supremo, veio a Constituição libertária de 1988, porque esse artigo do Supremo foi feito na época da ditadura, na época em que os Marechais, Presidentes nomeados faziam o que queriam. Depois dele, veio a Constituinte; e, depois da Constituinte, veio uma lei, e nessa lei não há isso.

            Nunca se discutiu. Agora, vem dizer: “Mas há um embargo infringente”! É piada! Desculpem-me, meus irmãos. Numa hora dessas, num momento desses, o Brasil vivendo a sua hora mais importante, mais significativa, a ligação não tem explicação.

            Um processo que foi o mais democrático. Eu duvido de que, em algum lugar do mundo, em alguma época, um processo foi tão aberto, foi tão democrático, foi tão acompanhado pela sociedade do Brasil e do mundo. Televisão ao vivo. Muitas vezes, ouvi, em debate nos Estados Unidos, eles dizendo: “Eu não entendo como uma decisão do Supremo Tribunal Federal é transmitida ao vivo”. Pois foram transmitidas ao vivo todas as sessões. A TV Justiça, tudo bem, mas a Globo News, uma empresa particular, transmitiu ao vivo, com um jurista de cada vez, com independência, com absoluta independência, não fazendo o pensamento da Globo ou de quem quer que seja. Não. Um jurista mostrava o pensamento e explicava à sociedade, explicava aos que estavam apreciando, aos que estavam assistindo as coisas que estavam acontecendo. Durou o tempo que quis. O Sr. Revisor falou pela vida inteira. Bateu seu recorde ao falar. Os advogados tiveram todas as amplas oportunidades.

            Agora, meu querido Ministro Celso de Mello, porque lá não sei onde V. Exª fez uma referência a um embargo infringente e diz que V. Exª está preso àquela declaração? V. Exª está preso ao Brasil de hoje!

            A Globo, digo de novo, fez o mea-culpa 50 anos depois. Foi um ato admirável da Globo botar uma página de jornal dizendo: “Nós erramos ao dar apoio ao golpe e à ditadura. Nós erramos. Praticamos um erro muito grave”.

            Será, Ministro Celso de Mello, que, depois do seu voto, nós vamos ter que esperar 50 anos para o senhor pedir desculpa? “Mas eu não imaginava!” Imagina as consequências do seu voto! Imagina o banho, a catarata de água que cairá em cima da gente, o desânimo, o ridículo que vai ser o ano que vem, um ano eleitoral!

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Provavelmente, mais dois Ministros se aposentarão. Então, a D. Dilma botará mais dois. Com os três que ela colocou, serão cinco para votar de um determinado jeito.

            E aí, sim, nós vamos ouvir, às 9 horas, no espaço eleitoral gratuito da campanha para Presidente, e às 5h e às 6h da tarde a TV Justiça transmitindo. Não sei o que ela vai transmitir. Não sei o que vão dizer. Não sei qual vai ser a argumentação. Em primeiro lugar, ninguém está acreditando. Sempre se pensou que o Supremo é o Supremo. Decidiu está decidido. Mas agora...

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - E se novamente nessa votação de 11, houver mais votos com relação aos réus? Quem disse que não pedirão um novo embargo infringente? Se dão um, por que não dão dois? Não há lugar nenhum que diz que não pode. Lugar nenhum diz que não pode! Apenas estamos encerrando que o Supremo não é a última instância.

            Sr. Presidente, fui uma pessoa que, quisera as circunstâncias, eu, guri, 15 anos, estivesse em São Borja, no enterro de Getúlio Vargas. Eu me lembrei que falou Tancredo, falou Jango, mas as palavras de Oswaldo Aranha ficaram para o resto da vida gravadas em mim. De lá até aqui, sou uma testemunha viva que acompanhou todas as restrições.

            Acreditei que com o Plano Real o Brasil tinha encontrado um caminho.

            Infelizmente, o Fernando Henrique, o ilustre imortal - aliás, está em um lugar que achei que ele sempre deveria estar, ele merece, a Academia Brasileira de Letras foi feita para o Fernando Henrique -, Presidente da República eu não sei, foi um acaso. E cometeu equívocos, entre os quais privatizar de graça a Vale do Rio Doce, comprar no voto a reeleição.

            E veio o Lula. Na primeira vez, votei no Lula. O PT parecia realmente aquilo que eu tenho dito, eu, guri, no fim do PTB e no início do MDB, eu me sentia quase como um apóstolo...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... apaixonado pela bandeira, pela causa. Quem estava conosco no MDB, lá no Rio Grande do Sul, eram pessoas apaixonadas. Estar no PTB ou no MDB do Rio Grande do Sul era pegar cadeia, era ser cassado, era ser preso, era não ter vaga na escola, era não ter nomeação, não ter coisa alguma. No entanto, fizemos um trabalho fantástico. E eu me sentia quase um homem em busca da salvação do Brasil.

            Chegamos ao governo e o MDB deixou de ser o MDB. Na minha desilusão, passei a ver com carinho e respeito o PT. Quando Evaristo Arns, reunindo aquela gente simples e humilde, de pé descalço, que nas eleições ficava lá com um cachorro-quente, um sanduíche, uma garrafa de Coca-Cola ou de Guaraná, de pé descalço, na madrugada, até o fim da noite, distribuindo propaganda, sem praticamente receber nada ou R$5,00, para o PT. Gente apaixonada. Gente apaixonada. E eu acreditei. Até que eles chegaram ao governo.

            Já falei daqui mais de dez vezes, e falo pela décima primeira. Fui falar com D. Evaristo Arns: “Mas o senhor ensinou o PT, uma maravilha o que o senhor fez com o PT. Mas ensinou a ser oposição, não o ensinou a ser governo. No governo, ele está igual a todo mundo”. Nunca vou me esquecer da resposta dele: “É, meu filho, nisso você tem razão. Mas era uma gente tão simples, tão digna, tão apaixonada que, se eu pudesse, nomeava todos padres”.

           E lá se foi o PT. A CUT saiu da rua e foi para o fundo de pensão da Petrobras. A UNE saiu da rua e foi construir a sede mais espetacular do mundo. Foi fazer um fundo nas carteiras, um monopólio que lhe dá um mar de dinheiro. E terminou com o mensalão.

           Agora, fruto desse julgamento do Supremo, fruto dessa ação do Supremo, desse debate do Supremo, de, finalmente, a justiça ser para todos, o Brasil está mudando, as pessoas estão preocupadas e mudando.

           Na quarta-feira, o Ministro Celso de Mello dará a última palavra. Desculpem-me, mas eu digo, e com o maior respeito: o Ministro Celso de Mello pode dar um voto na quarta-feira do qual, daqui a alguns anos, terá de fazer o discurso de arrependimento. Terá de ver que, ao contrário de toda a vida dele, na hora mais importante que o destino lhe destinou... E olha que o destino... Dizem que destino é o nome que se dá a Deus em determinados momentos. Quando se diz: “Foi o destino que levou à escolha do Papa Francisco”, na verdade, se diz: “Foi Deus quem escolheu o Papa Francisco”.

            Pois o destino - ou Deus - entregou ao Sr. Celso de Mello essa decisão. Suas palavras têm sido notáveis. Firmeza, dignidade. Votará de acordo com a sua consciência, eu não tenho dúvida nesse sentido. Eu não tenho dúvida. Posso ter dúvida em relação a outros votos. Quanto a esse, eu não tenho dúvida. Vai votar de acordo com o que ele acha...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... eu apenas quero dizer - e agradeço a gentileza de V. Exª - que aquilo que ele acha não pode ser uma palavra escrita, uma declaração, tendo, do outro lado, o mundo que está aí. Tendo do outro lado o mundo que está aí!

            E a decisão de quarta-feira. Quarta-feira, o condenado é uma página do passado. O Supremo segue adiante, e nós, o Congresso Nacional, ficaremos com a responsabilidade de fazer a nossa parte. O Supremo, com isso, mudará. É um novo sentido, é um outro Supremo. É outro Supremo! E obrigará este Congresso a ser um outro Congresso. O Supremo, voltando a ser o que era, dando mais uma votação daquelas que tantas vezes deu no passado, é um Supremo que não terá credibilidade. E digo ao ilustre novato, brilhante, que ele pode não votar com o povo, e eu concordo que ele queira votar com a sua consciência, mas ele tem que votar com o melhor para o povo e para a sociedade.

            E o nosso ilustre Celso de Mello... É interessante. Eu não me lembro de tantas ocasiões como esta, em que foi colocada nos ombros de uma pessoa uma responsabilidade tão intensa. Eu não me lembro.

            Eu me lembro de João Goulart. Eu estava lá, na casa do Comandante do Terceiro Exército. O Brizola insistia para que ele resistisse. O Comandante do Terceiro Exército estava disposto a iniciar a resistência. Mas quando veio a informação de que a tropa naval estava na fronteira do Rio de Janeiro, pronta para entrar, ele preferiu a renúncia. Ele preferiu a renúncia. Foi uma decisão fantástica. Ele estava entre renunciar e ficar uma ditadura ou ele resistir e irmos para uma guerra civil.

            Mas agora é ainda mais tranquilo. Porque lá o Jango era responsável pelos acontecimentos. Como presidente, derrubou o parlamentarismo - o que achei muito triste; por mim, continuava o parlamentarismo. Uma das grandes coisas que vi serem feitas foi criar o parlamentarismo, que, na minha opinião, devia ter ficado. Ele era agente responsável pelos atos, corresponsável.

            Aqui, não. Aqui nós temos um juiz, com uma biografia na qual não se vê, não se tem conhecimento de um fato, de uma vírgula que não seja de bem. E olhem que até no Supremo já tivemos condenações, discussões de A com B, algumas muito pesadas. Ele tem a tranquilidade e o direito de tomar a sua decisão, que vou respeitar, seja ela qual for; vou dizer que ele a tomou do fundo do coração, do fundo da sua capacidade, mesmo que seja contrária àquilo que estou pensando.

            Mas não tenho dúvida alguma, ilustres membros do Supremo...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - ... se a decisão for uma, nós teremos um novo Brasil a partir de quarta-feira. As coisas se modificarão. Os debates aqui, da reforma política, desse jovem Senador do Norte, serão bem diferentes, porque estaremos debatendo dentro de uma nova realidade. Se for outra a decisão, estaremos assistindo como se fora o repeteco de um filme que a gente não gostou e mandou passar de novo para mudar o final.

            Eu creio em Deus e tenho respeito pelas figuras humanas. De hoje a quarta-feira, o Ministro estará nas minhas orações. Peço a Deus que o ilumine. Peço a Deus que ele continue a ter a tranquilidade que tem. E peço a Deus que nada modifique a sua paz de espírito e a sua serenidade em poder sentir todos os fatos. E que ele, que desta vez vai dar um voto que não é apenas uma decisão sua, tem de pensar também nisto: é um voto, mas vai votar pelo Brasil inteiro; vai votar pelos milhões de brasileiros que estarão olhando para ele.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Pedro Simon, eu não faço comentários sobre a decisão, sobre a vontade dos ministros. Eu estou aqui do meu lado, como político, e eles do lado do Judiciário. Mas, da mesma maneira como o senhor, eu tenho uma profunda preocupação com o Brasil que nós vamos herdar na quinta-feira, dependendo do voto que for dado pelo Ministro Celso de Mello, de acordo com sua consciência e sua análise fria dos fatos. Eu temo, Senador Mozarildo. Vejamos algumas coisas do cenário. Primeiro, como vai ficar o Presidente do Supremo, Dr. Joaquim Barbosa, na quinta-feira, se toda a defesa que ele fez, se todo o relatório que ele fez - ele foi o relator - for desmoralizado? E ele como Presidente? Que autoridade ele vai continuar tendo? Será possível que, na ideia dos infringentes, tem clareza de que isso não afetou a sua autoridade, de que ele não estava errado, de que isso é apenas uma mecânica natural das coisas? O primeiro ponto é esse. Segundo ponto. Como explicar? Eu creio que o juiz tem suas razões, mas a gente tem a obrigação de fazer com que as razões sejam explicadas. Quando uma pessoa é condenada por um crime ou absolvida por um crime de que foi suspeito, há uma explicação. Não houve provas, foi absolvido; houve provas, foi condenado. E agora? Houve ou não houve provas? Se não houve provas, posso dizer que tudo isso foi uma farsa? Se houve provas e os infringentes dizem: “Vamos dar mais uma chance”, havia a possibilidade de o resultado ter sido diferente do que foi até aqui? E se o resultado for diferente, vão pedir desculpas dos erros - os que ainda estão lá, diferentemente dos dois novos - por terem votado erradamente? Vão pedir desculpas ao povo, não só aos que foram condenados, sem deverem ter sido condenados, porque foram absolvidos? Eles vão pedir desculpa a esses condenados, pelo sofrimento por que eles passam, e ao povo, porque em algum momento sentiu que a impunidade tinha acabado? Como é que eles vão ficar para explicar ao povo que absolverão? E se não absolverem, como vão explicar essa perda de meses e meses da reanálise de um processo em que, no fim, poderão condenar da mesma maneira de antes? E se não condenarem sem que nenhum mude o voto, que todos votem igualmente, mas não havendo condenação por haver dois novos votos? Como fica a estabilidade jurídica sabendo que, a cada vez que muda um juiz, muda a condenação? E se todos os presos deste País entrarem com os seus - entre aspas - “infringentes”, quando morrer o juiz que o condenou? Ele pode pedir, de novo, uma reavaliação disso? Caricaturando um pouco, eu reconheço. Então, como explicar ao povo, aos jovens deste País, a instabilidade jurídica que nós estamos vendo de ser ou não ser, de ser 4 a 5, de ser 5 a 6? Como a gente vai explicar isso? É uma preocupação que eu tenho para quinta-feira. Outra é a ampliação do divórcio do povo das suas instituições. Conosco já está claro esse divórcio; nós, políticos. Agora, fica o divórcio com as instituições jurídicas. Como é que vai ficar o povo brasileiro quando perder, com clareza, a confiança em todas as suas instituições? Esse é um problema que virá para cá. Nós que vamos ter de resolver isso, não o Supremo. Nós somos os representantes do povo; nós somos os líderes desta Nação. Pelo menos, deveríamos ser. Como é que a gente vai agir com a pressa que será necessária para refazer o casamento do povo com as suas instituições, da Nação com o Estado, da população com seus Líderes, dos eleitos com seus eleitores? São divórcios que foram feitos, nesses últimos anos, por conta de uma dívida que nós fomos acumulando com o povo brasileiro por não fazermos corretamente o nosso dever de casa, de construir uma sociedade estável, pacífica, eficiente e justa. Nós não fizemos isso. A nossa sociedade não é justa; a nossa sociedade não é eficiente; a nossa sociedade não é estável; a nossa sociedade não é pacífica. Falha nossa. E quando eu digo nossa, eu não digo de uns ou outros aqui; eu digo de todos. E mais: não digo todos de hoje, não; eu digo todos do passado também. E aí vem mais um fato agregando a indignação com o divórcio, porque o que há de diferente hoje de alguns meses atrás é que antes já havia o divórcio, mas os parceiros não tinham percebido - um deles - a situação. Agora, ele percebe e fica indignado. O voto da quarta-feira é jogar gasolina no fogo da indignação popular. Não vou discutir se é certo ou errado. Até entendo que o juiz deve tomar as suas decisões sem olhar o povo, mas o problema vai chegar para gente. Vamos ter que enfrentar o incêndio que, provavelmente, se ampliará na nossa sociedade. E com razão, porque eles não vão entender. Se tivesse havido, se tivessem sido inocentados logo no começo, as pessoas poderiam até ficar indignadas, mas teriam que se submeter a uma lógica, até porque há muita gente que fica indignada porque não gosta dos que estão sendo julgados, ou porque não gosta do partido que está sendo julgado, mas, depois de eles terem sido condenados, voltar atrás, nós vamos ter muita dificuldade de explicar ou de refazer o pacto social diante da indignação.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Finalmente, para colocar só mais um ponto, que é a suspeita que já levantei mais de uma vez aqui. Eu nem acho que, na prática, haja razão para essa suspeita, mas ela existe. Há uma suspeita de que o voto de um juiz dependo do Presidente que o nomeou. O julgamento dos últimos meses mostra que isso não acontece. Muitos foram nomeados - quase todos - pelo atual Governo ou pelo governo anterior, que é uma continuidade - como a própria Presidente Dilma disse, o Lula nunca saiu do Governo -, eles foram nomeados e, mesmo assim, condenaram. Isso apagou um pouco a suspeita, mas, durante meses, se discutiu uma espécie de suspeição, o que é lamentável, é triste. Daí termos que mudar os critérios para escolha dos ministros do Supremo e outras personalidades. De tal maneira que não seja algo que pareça nomeado apenas com uma sabatina que, sabemos, tem sido de faz de conta. Aí passa a ideia de nomeação. Os outros juízes são concursados. Por que há juízes, em instâncias superiores, nomeados? Tem que ser até escolhidos, se não forem fruto de um concurso. Escolhido não é o mesmo que nomeado. A diferença entre nomeado e escolhido é que o nomeado depende de uma pessoa, o escolhido depende de forças diferentes sendo consultadas e analisadas. Hoje, os Ministros do Supremo são nomeados, com uma passagem por aqui numa sabatina...

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Simbólica.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... que é proforma, tanto que, em toda a história da República, se não me engano, um só indicado pelo Presidente da República não foi aprovado pelo Senado; um só, e, mesmo assim, foi por razões políticas aqui de dentro, uma razão má, não uma razão boa. Pois bem, na quinta-feira, nós podemos acordar com uma tremenda ressaca social, política, cultural, uma profunda angústia de muitos milhões de brasileiros diante do resultado que acontecer. Eu não quero, com isso, influenciar o Ministro Celso de Mello. Eu quero é chamar a atenção de nós, que estamos aqui e que vamos continuar, no dia seguinte, a dirigir - pelo menos, deveríamos - os rumos deste País, porque nós vamos ter um País muito, mas muito mais complicado; nós vamos ter uma população muito menos, mas muito menos ainda confiante em todos nós que fazemos parte dessas instituições. O desafio para nós é tão grande quanto o do Ministro Celso de Mello. A diferença é que o desafio dele está personalizado; no nosso caso, nós diluímos entre todos nós, os muitos políticos que temos neste País, mas a nossa responsabilidade vai ser refazer o pacto posteriormente, e deixando claro que a quebra do pacto não é culpa dele nem do Supremo, é culpa nossa, mas aconteceu. O que eles vão fazer pode agregar...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... gasolina a essa falta de um casamento, de um pacto, a essa sensação de divórcio entre o povo e os seus líderes, entre os eleitos e os eleitores, entre o Estado e a Nação. Cabe a nós, na quinta-feira, trabalharmos para reconstituir esse pacto, dependendo do voto da quarta-feira.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Eu agradeço demais o aparte de V. Exª, o conteúdo social, uma serenidade bem melhor do que a minha. Eu não nego que faço um esforço muito grande para não externar uma paixão. Eu venho, há tanto tempo, assistindo a tantas causas, e perdemos tantas oportunidades. Será muito triste, realmente, se esta for mais uma.

            Por isso, Senador Cristovam, admiro a profundidade do conteúdo, mas a serenidade do que V. Exª expõe. Eu, aqui, confio na decisão de Celso de Mello; confio. S. Exª é um homem reto, com pensamento determinado, deve ficar com uma interrogação: mas eu, no dia tal, disse isso e, agora, vou dizer isso? Que é o que estão fazendo alguns Ministros, alguns advogados e alguns homens de imprensa, cobrando exatamente isso.

            Que Deus inspire o Ministro Celso a termos uma página branca na história deste País, termos uma página que o destino colocou na frente de S. Exª, depois de uma guerra, de uma luta, que lá se vão tantos anos, milhares de pessoas, e não sei quantas milhares e milhares de páginas tem o processo, quantas dezenas e centenas de processos se acumulam. Mas, finalmente, chega o dia de quarta-feira e uma página em branco será escrita pelo Sr. Celso de Mello, que dará o destino final.

            Interessante como, na vida, há isto, Sr. Presidente: briga para lá, para cá; debate-se, leva-se, tenta-se avançar, recua-se, não se consegue, não sai, não se avança e, de repente, aparece isso. Um dia para valer, um dia definitivo, e a palavra é do Sr. Celso de Mello.

            E, aqui, já digo antecipadamente, seja qual for a decisão de S. Exª, tenho certeza de que S. Exª fará, de acordo com a sua consciência, o que achar melhor. Que Deus o inspire! E que os brasileiros rezem para que Celso de Mello siga o bom caminho.

            Muito obrigado pela tolerância de V. Exª, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/09/2013 - Página 63358