Discussão durante a 166ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referente à PEC n. 43/2013.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
Outros:
  • Referente à PEC n. 43/2013.
Aparteantes
Alvaro Dias, Ana Amélia.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2013 - Página 67071

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema do suicídio é um dos que mais provoca perplexidade entre nós, seres humanos, de todos os pontos de vista.

            O suicídio já foi tema de dramas, já foi tema de música, já inspirou grandes ensaios filosóficos, até mesmo estudo sociológico, um estudo fundamental para o início da elaboração do método sociológico por Émile Durkheim, que escreveu um clássico livro sobre o suicídio.

            As motivações sempre ficam dentro da esfera do insondável. Algumas de ordem pública. O suicídio de Sócrates, talvez o mais célebre. Sócrates foi obrigado a se suicidar e submeteu-se a essa obrigação bebendo cicuta, porque assim determinava a lei de Atenas. Há suicídios em sinal de protesto contra uma situação dramática vivida por um povo, por uma corrente de opinião. O suicídio, por exemplo, de Walter Benjamin. O suicídio de Stefan Zweig, aqui no Brasil. Às vezes o suicida comete esse ato para punir não a si próprio, mas para punir os outros, aqueles que sobrevivem.

            Bom, Sr. Presidente, estamos nos encaminhando, nós, o Congresso brasileiro, para uma espécie nova de suicídio, que é o suicídio institucional. O Congresso brasileiro está se encaminhando para se autoimolar, para perder voluntariamente prerrogativas que garantem a sua independência e que garantem a sua posição dentro de um jogo intrincado de equilíbrio entre Poderes, o Poder Legislativo e o Poder Executivo, quando se prepara para votar, sem a menor reflexão de natureza institucional, apenas julgando interpretar a voz das ruas, para eliminar o voto secreto em todas as circunstâncias aqui no Parlamento.

            Esse assunto foi aprovado aqui, há muitos anos. Depois ficou na Câmara, parado, para reflexão maior dos Deputados. De repente, uma pirueta do Presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, coloca na Ordem do Dia a PEC do Voto Aberto em qualquer circunstância.

            Houve quem imaginasse que se tratava aí de uma manobra para afogar o peixe, para diluir o tema da cassação do voto secreto nas deliberações sobre cassação de Parlamentares, logo apóa a não-cassação do Deputado presidiário, incluindo esse tema num contexto mais amplo, de tal forma que criasse dificuldades para a sua aprovação aqui no Senado.

            Não houve reflexão maior. Isso foi decidido, Senador Jorge Viana, de uma hora para outra. Uma pirueta do Presidente da Câmara, que foi seguida por todos de uma maneira, para mim, incompreensível, porque isso colocou falsamente aos olhos da opinião pública uma ideia de que o Congresso delibera tudo secretamente e de que o voto secreto é a regra no Congresso Nacional.

            Todos agora - as chamadas mídias sociais, muitas delas arregimentadas por partidos políticos, por grupos políticos - divulgam a ideia de que vamos acabar com o voto secreto no Congresso, como se as nossas deliberações legislativas fossem secretas, quando não são. Todos sabemos que as deliberações legislativas no Congresso Nacional são feitas mediante voto aberto e, muitas vezes, mediante voto nominal. Faço exceção, e volto a ela mais tarde, para o veto, que é uma deliberação legislativa, da qual, aliás, nós, Congressistas brasileiros, estávamos desacostumados, há muito tempo, e agora estamos começando a praticar.

            O Senado já havia aprovado a emenda que estabelecia o voto aberto na cassação de Parlamentares. Ele o fez pela primeira vez ao aprovar a PEC de autoria do meu Líder, Alvaro Dias, e reiterou essa vontade ao votar a PEC nº 18, do Senador Jarbas Vasconcelos. Mas a Câmara parece que não tomou conhecimento desse assunto. E esse assunto, sim, suscitava e suscita hoje, penso eu, interesse grande por parte não digo dos brasileiros no seu conjunto, mas dos setores mais informados da população.

            Defendo, meu caro Presidente, o voto aberto na cassação de mandatos parlamentares, embora eu tenha dúvida, por exemplo, se, com o voto aberto, a Câmara teria mantido o mandato do Deputado Márcio Moreira Alves. Somente o voto secreto, naquela ocasião, permitiu que a Câmara afirmasse a sua independência, preservando o mandato do Deputado Márcio Moreira Alves, lá atrás, em 1967.

            Mas defendo o voto aberto por uma razão: é que, no momento em que eu voto, em que eu profiro a minha decisão, que não é uma decisão de caráter legislativo, mas uma decisão quase que de caráter jurisdicional, sobre se a conduta de um Parlamentar é ou não compatível com o decoro parlamentar, eu estou, por isso mesmo, dizendo à opinião pública, explicitando ao País qual é a minha visão de decoro parlamentar, qual é a minha visão dos requisitos de respeitabilidade do Congresso Nacional. Por isso, defendo o voto aberto nessas circunstâncias, embora eu repita que não sei se com o voto aberto a Câmara teria preservado o mandato de Márcio Moreira Alves, como preservou em 1967.

            O Congresso, há muitos anos, mantém o voto secreto para algumas deliberações. Essas, sim, são exclusivas do Senado e estão incorporadas hoje à nossa tradição constitucional. E não é por acaso.

            A nomeação de magistrados. A nomeação de magistrado para Tribunal Superior é um ato complexo, que envolve a indicação do Presidente da República e, em seguida, a deliberação do Senado Federal, mediante voto secreto, para todos os magistrados dos Tribunais Superiores, inclusive os Ministros do Supremo Tribunal Federal, que são aqueles que têm a competência constitucional para nos julgar - a nós, Parlamentares -, na eventualidade de sermos processados criminalmente. O Procurador-Geral da República também é indicado pela Presidência da República, e a sua ratificação se dá pelo voto secreto, em seguida, anteriormente à nomeação.

            Na história constitucional brasileira, Srs. Senadores, mesmo nos períodos mais duros do autoritarismo, a escolha de magistrados se fez mediante voto secreto. Nem mesmo a chamada Constituição de 69 aboliu o voto secreto para a escolha de magistrados, inclusive preservou o voto secreto na escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente, assim como dos ministros do Tribunal de Contas da União.

            Agora, a Constituição de 88 acrescentou a possibilidade, implementada depois por lei, do voto secreto para a escolha de membros das agências reguladoras. Por que isso se dá? Foi uma invenção de uma hora para outra? Não, não.

            Se nós analisarmos, Sr. Presidente - e eu analisei -, os Anais da Constituinte, posso afirmar a V. Exª que em nenhum momento se questionou o voto secreto nessa circunstância de deliberação não legislativa do Senado da República. Em nenhum momento. Por quê? Porque, evidentemente, se compreende que o Senado, quando atua nessas circunstâncias, atua não como Casa legislativa, nem muito menos como Casa onde estão, predominantemente, representados os interesses dos Estados, mas ele atua como um contrapeso à vontade do Presidente da República. É um mecanismo importante do sistema de checks and balances, de equilíbrio, pesos e contrapesos, que é essencial para a preservação das liberdades públicas. Não é por acaso. Isso não foi inventado desde 1891 por acaso e nem pode ser mudado por uma decisão, por uma pirueta institucional irrefletida da Câmara dos Deputados.

            Nós estamos tratando de instituições. É claro que as instituições são, evidentemente, compostas de indivíduos, mas, na medida em que eu deixo um indivíduo que compõe o Congresso Nacional - um, isoladamente - no confronto direto com a Presidência da República, detentora de poderes quase imperiais - e eu estou falando aqui na presença de um ex-Presidente, que se curvou a uma decisão judicial -, na medida em que coloco um Parlamentar em confronto com a Presidência, que tem poder, que tem verba, que tem mídia, eu estou promovendo um confronto desigual.

            Alguns Parlamentares têm, sim, condição de independência, de dizer: “Eu enfrento”. Mas outros não têm. Outros não têm!

            Veja, Sr. Presidente, a Câmara dos Deputados inventou agora uma coisa esdrúxula, digamos assim, estranha, esquisita, que é a execução obrigatória das emendas parlamentares. Foi um recurso extremo diante da fragilidade do mandato individual quando confrontada a Presidência da República.

            Eu disputei cinco eleições de Deputado. Sempre fiz eleições regionais, artesanais, de base, de militância, numa mesma região no Estado de São Paulo. Pois bem, eu tive, ao longo dos meus cinco mandatos, uma atividade parlamentar intensa, que me deu oportunidade de relatar projetos importantes. Apresentei projetos que marcaram a fisionomia institucional do meu Estado, o Estado de São Paulo, aqui mesmo, no Congresso Nacional, mas, na hora da eleição, quando eu chegava lá na minha região, lá em José Bonifácio, lá em Jales, em Votuporanga, em Olímpia, o cidadão queria saber o seguinte: “Deputado, tudo bem, o senhor foi o Relator da Lei dos Direitos Autorais, disso, daquilo, mas o que o senhor fez para a nossa região? O que o senhor fez para a nossa região”?

            E este “o que o senhor fez para a nossa região?”, Sr. Presidente, cada vez mais, hoje, depende da boa vontade do Executivo Federal, que centraliza as verbas, que concentra rendas, que concentra poder.

            Veja, eu sei que existem, na Câmara dos Deputados, Deputados que hoje têm total liberdade de ir para a tribuna e de expor a sua opinião abertamente, sem contraventos e marés. Mas eu sei também, meu caro Senador Moka, que muitos colegas congressistas nossos não têm essa condição.

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - E quando penso numa instituição, tenho que pensar nos elos mais fortes da cadeia, mas também nos elos mais frágeis. E eu não estou me referindo apenas a instrumento que garante a independência do Parlamentar diante do Executivo. Eu quero me referir também à independência do Parlamentar e na sua consciência em determinadas deliberações, mesmo diante da disciplina partidária. Em alguns momentos, uma vez que nós não temos no Brasil o mandato imperativo, é preciso que o Parlamentar tome as suas decisões com a mais absoluta liberdade de consciência, mesmo enfrentando, mesmo contrariando a orientação e a disciplina do seu partido.

            Ora, alguns dentre nós têm todas as condições de fazê-lo. Mas vamos pensar naquele Deputado ou naquele Senador que não terá condições de enfrentar uma decisão da cúpula do seu partido, que lhe imporá voto numa determinada direção para a escolha de ministro de um tribunal, de membro de uma agência reguladora, sob pena de negar-lhe, por exemplo, a legenda para concorrer à reeleição, ou negar a legenda a um Senador para disputar um cargo no seu governo - partidos cujas cúpulas estão, hoje, cada vez mais encasteladas nos recursos que detêm de fundo partidário, etc., e que fazem acordos entre eles e que não podem vincular a decisão de todos os seus membros.

            Há momentos em que o Deputado ou o Senador pode e deve tomar uma decisão consultando apenas sua consciência, sem temer nenhuma pressão, nem do Executivo, nem do seu partido e muito menos das poderosas corporações, corporações da mídia, corporações da sociedade.

            Estou falando em nome da defesa de uma prerrogativa essencial - essencial! - para o cumprimento de um mandato independente. E falo isso com absoluta tranquilidade, Sr. Presidente, porque muitas vezes tomei atitude, exprimi minha opinião - e esta talvez seja uma dessas ocasiões - sem me preocupar com aquilo que dirão os outros. Sempre tomei decisões de acordo com a minha consciência e com aquilo que me parecia correto e certo, e não é correto e certo.

            Enfraquecemos o Congresso Nacional, tirando dele algumas prerrogativas essenciais para a independência de cada um dos seus membros, tanto daqueles que são mais fortes, mais poderosos, mais prestigiosos como daqueles que são mais frágeis.

            Chego logo ao veto. Nós começamos a deliberar...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Se me permitir, vou concluir, Sr. Presidente.

            Essa coisa estava aqui há muito tempo esperando a ocasião de ser dita.

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - É pena que no plenário estejam tão poucos Senadores hoje.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Nós tivemos há pouco tempo uma deliberação sobre a multa dos 10% do FGTS. E logo todos disseram: “Está vendo? Se não fosse o voto secreto, não teria caído a multa.” Pose ser verdade. Talvez seja verdade, porque eu não sei qual foi a votação na Câmara - não sei. Sei que, aqui no Senado, exatamente porque os Senadores têm uma condição política de maior independência, nós quase derrotamos o Governo. Na Câmara, eu não sei, porque a apuração ficou secreta. E vou levantar essa questão de ordem mais tarde no Congresso Nacional, para que o Presidente apure a votação da outra Casa.

            Existem questões, Sr. Presidente, que não chamam a atenção...

(Interrupção do som.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) ... ou de setores esclarecidos da opinião pública, como essa do veto dos 10% do FGTS, mas que talvez sejam mais melindrosas, mais delicadas e de maior gravidade do que essa do FGTS.

            Considero que, se não tivermos o voto secreto no veto, deixaremos o Parlamentar, individualmente, de um lado e, de outro lado, o todo-poderoso Poder Executivo, e eu quero que esse desequilíbrio não ocorra.

            Posso até, Sr. Presidente, daqui a algum tempo, rever minha posição, desde que essa prática recentíssima, que é a deliberação sobre os vetos, nos dê elementos para julgar o bom fundamento da disciplina atual.

            Na verdade, nós tivemos apenas duas sessões, em anos, para deliberar sobre vetos - apenas duas -, contra toda uma história da República, que, com exceção do período autoritário, jamais deixou de assegurar ao Deputado e ao Senador o sigilo do voto na deliberação sobre o veto.

            Na Constituinte - examinei os Anais -, apenas duas objeções ao voto secreto na deliberação do veto: uma do Senador Virgílio Távora - oposição frontal - e outra do Deputado Nilson Gibson, não que ele fosse contra qualquer hipótese de voto secreto, mas considerava que essa devia ser uma decisão do Congresso diante de cada caso, como era, aliás, no regime da Constituição de 1891.

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Por isso, Sr. Presidente, vou levantar essa discussão e desejo que ela envolva cada vez mais Senadores, para que nós possamos refletir sobre isso. E começaria essa discussão, se V. Exª permitir, com a bondade extraordinária que revela em relação a mim, ouvindo o aparte do Senador Dias e, depois, o da Senadora Ana Amélia.

            O Sr. Alvaro Dias (Bloco Minoria/PSDB - PR) - Senador Aloysio, eu estava encantado com o discurso de V. Exª e até havia desistido do aparte. Os argumentos de V. Exª merecem todo o respeito. Não vou discutir mérito agora. Retorno ao início do seu discurso, quando abordou a posição da Câmara de retirar da gaveta essa proposta, que é do ex-Deputado Fleury, uma proposta antiga, como uma espécie de antídoto para uma proposta pronta, que deveria ter sido deliberada já há mais tempo, porque diz respeito à cassação de mandato, fato momentâneo. A Câmara estava cassando o mandato parlamentar do Deputado Donadon, deliberando sobre essa cassação, e estava na iminência de ter que deliberar sobre outras cassações de mensaleiros. Não fossem os embargos regimentais acolhidos, a Câmara já estaria discutindo essas cassações. Por isso, houve, sim, uma deliberada manobra de protelação em benefício dos mensaleiros. Foi uma manobra desnecessária, como se viu, porque o Supremo acabou acolhendo os embargos infringentes e protelou uma decisão que poderia ter ocorrido. Mas, sem dúvida, dois partidos, especialmente, manobraram para proteger os mensaleiros, e só por isso essa matéria foi aprovada na Câmara e remetida ao Senado. Eu creio que seria o caso até de questionarmos a postura ética de a Câmara legislar sobre matérias que dizem respeito ao Senado Federal. Eu creio que a origem de uma matéria dessa natureza, que decide voto aberto para questões que são da incumbência do Senado Federal, deveria ser o Senado Federal e não a Câmara dos Deputados. Abordo apenas essa questão - ainda não estou discutindo o mérito -, colocando essas objeções em relação à postura adotada na Câmara dos Deputados, que ficou sob suspeição, a meu ver.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Obrigado, Senador Alvaro Dias. V. Exª tem toda razão.

            Eu comecei com o meu argumento de que foi uma decisão precipitada da Câmara - V. Exª reforça esse argumento -, decisão precipitada que não pode alterar determinadas regras de equilíbrio institucional e determinados postulados que devem ser preservados.

            Vejam V. Exªs que existem determinadas autoridades que ocupam funções...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - ... que foram concebidas para representar o Estado brasileiro, como as agências reguladoras, como as missões diplomáticas permanentes. Não convém abrir o voto, porque a consequência da abertura do voto é submeter essas indicações aos acordos partidários.

            Todos vimos aqui no Senado um balé estranho acontecendo na indicação de dois membros para agências reguladoras. Nós sentimos isso, e tenho a preocupação com o aparelhamento dessas agências, com a sua utilização por partidos políticos para implantar os seus objetivos particulares em agências que deveriam ser públicas, servir o Estado. O voto aberto levará, necessariamente, à partidarização exacerbada dessas escolhas.

            Mais ainda, outra função...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - ... que, no meu entender, deve ser preservada de forma absoluta da partidarização: a escolha dos membros dos tribunais superiores. Lembrem-se os Srs. Senadores de que hoje nós vivemos, felizmente, um período de longo desenvolvimento democrático, com presidentes que se sucederam, todos eles, desde o Presidente Sarney, com o compromisso com a democracia. Mas, quando legislamos, nós não estamos imunes. Quando olhamos a nossa vizinhança, quando verificamos o desprestígio, hoje, das instituições representativas no Brasil, percebemos que nós não estamos imunes a que, no futuro, venha surgir um aprendiz de ditador bolivariano cuja primeira providência será tomar conta do Poder Judiciário, impondo ao Congresso, para esses órgãos, nomes de pessoas feitas a sua imagem e semelhança.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP. Fora do microfone.) - Concedo um aparte à Senadora Ana Amélia.

            A Srª Ana Amélia (Bloco Maioria/PP - RS) - Senador Aloysio Nunes Ferreira, eu faço este aparte de pé, em homenagem, respeito e admiração pela forma como V. Exª defende as suas ideias e as suas convicções. V. Exª certamente é um dos exemplares parlamentares aqui em matéria de coerência, de atitude e de crença. Então, por isso, estou fazendo este aparte de pé.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Bondade sua, minha querida amiga.

            A Srª Ana Amélia (Bloco Maioria/PP - RS) - Eu queria dizer ao senhor que já tive dúvidas a respeito do voto aberto para a derrubada de vetos e para a escolha de Ministros para os tribunais superiores. Tive dúvidas, dúvidas porque, quem tem a caneta na mão e o Diário Oficial pode muito sobre os Parlamentares, e pode mais ainda enquanto o Orçamento desta Casa for autorizativo apenas e não impositivo, quando os deputados...

(Soa a campainha.)

            A Srª Ana Amélia (Bloco Maioria/PP - RS) - ... e o prefeito perguntam “O que o senhor está fazendo para a nossa comunidade?”, e esse toma lá dá cá persistir. Aí, voto aberto é um desastre, porque aquilo que ele está fazendo para beneficiar sua comunidade - que é um direito legítimo quando bem feito, bem aplicado, com ética e com correção - não deveria...

            O Orçamento impositivo serve para que aquilo que mandamos para a comunidade, para o nosso Estado, para a nossa região...

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Chegue à ponta.

            A Srª Ana Amélia (Bloco Maioria/PP - RS) - ... chegue à ponta, sem interferência, sem intermediários, sem terceirização e sem corretagem - especialmente, sem corretagem. Então, esse é um ponto relevante. Tive dúvidas também sobre a escolha dos ministros dos tribunais superiores, até pela prerrogativa da independência dos Poderes. Hoje, já não tenho mais dúvidas, Senador, nem sobre veto e nem sobre autoridade do Supremo. Quem tem ficha limpa não pode temer alguma retaliação futura nem temer o problema da independência. Eu tenho a convicção, Senador Aloysio, com a mesma fé de V. Exª, que é um dos mais coerentes Parlamentares desta Casa - e aprendo cada dia que V. Exª fala ou se manifesta -, de que esta Casa mostra mais à sociedade como está agindo quando mostra como está votando. E é exatamente isto que a sociedade quer de nós: não ter medo do partido e não ter medo do Poder Executivo, que hoje é tremendamente poderoso. Estamos sufocados, aqui, com medidas provisórias e por uma série de mazelas que nem conseguimos respirar direito. E o problema da pressão, Senador... Nesta semana, na votação de uma PEC extremamente importante para a cultura brasileira, a PEC da Música, o que vimos aqui?

(Soa a campainha.)

            A Srª Ana Amélia (Bloco Maioria/PP - RS) - Galerias lotadas, artistas famosos de todo o Brasil, do meu Rio Grande, pressionando, com legitimidade. Na PEC da Música, o Deputado Otavio Leite, do seu Partido, trabalhou muito, assim como vários Senadores, nesta Casa, e a Ministra Marta Suplicy. E, aqui, três Senadores enfrentaram toda a oposição do Plenário e dos seus próprios partidos: Senador Eduardo Braga, Senadora Vanessa Grazziotin e Senador Alfredo Nascimento, do Amazonas, que não apoiaram a PEC da Música. Queriam uma emenda para beneficiar o Estado deles. E aí foi revelado que, apesar da pressão, eles tiveram coragem de defender a posição dos interesses do Amazonas, correspondendo, certamente, ao eleitorado do Amazonas, que os mandou para cá. Então, eu penso...

(Interrupção do som.)

            A Srª Ana Amélia (Bloco Maioria/PP - RS) - ... que, de fato, esse é um (Fora do microfone.) tema que precisa mesmo continuar sendo debatido. E eu já derrubei todas as minhas dúvidas a respeito da questão da derrubada do veto e da questão relacionada às escolhas das autoridades. Respeito enormemente a sua posição, a sua convicção e a sua coerência, mas penso como diz o Cazuza: Brasil e Congresso, mostrem a tua cara. Obrigada, Senador.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Agradeço muito as considerações, sempre tão simpáticas e benevolentes de V. Exª. Eu já estou de pé, porque estou na tribuna, e ficaria mais de pé ainda para responder ao aparte de V. Exª. Eu precisaria de um banquinho. Mas eu volto ao meu argumento, Senadora. Quando falamos do equilíbrio institucional, temos que pensar que nem todos são iguais a V.Exª.

            V. Exª citou Cazuza, eu citaria Antônio Carlos Jobim: nem todos são iguais a você. A nossa Casa...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - ...o Congresso Nacional, não só este, é composto por pessoas que têm o gosto pela independência e que afrontam, sem receio, o vento contrário. Outros, não. Quando penso em uma instituição, tenho que pensar que a instituição é composta de diversidade enorme de pessoas, cada uma com o seu temperamento, com a sua formação, com a sua maneira de fazer política, com a sua concepção de mandato parlamentar. Não posso pensar em equilíbrio institucional olhando apenas os casos excepcionais.

            Quanto às pressões localizadas, elas nos levam a aprovar a PEC da Música, que é, efetivamente, algo muito benéfico. Mas nos levou, por exemplo, Senadora, convenhamos, à lei que institui a profissão dos vaqueiros. Ora, a profissão do vaqueiro existe desde o momento em que o homem saiu das cavernas e aprendeu a domesticar o boi, há milênios. Não esperou que o Congresso Nacional, que o Senado, em uma noite, criasse a profissão do vaqueiro. Chegou ao ponto, essa lei, de detalhar o que faz o vaqueiro: cura bicheira, alimenta o boi, vai atrás do gado, da rês desgarrada, aplica vacina. Agora, não acrescentou um único direito, nada, ao direito dos trabalhadores rurais que se dedicam a essa profissão. Nada. Se nós examinarmos a lei que nos aprovamos aqui, com festas, com aboio, nós verificamos que não houve nenhum centímetro, nada ganho por eles. Eles saíram daqui do mesmo tamanho que entraram. Apenas guardando no bolso a foto tirada ao lado do Presidente Renan Calheiros.

            O direito que eles tinham já têm.

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - É o direito da lei trabalhista, que foi estendido aos trabalhadores rurais no bojo das lutas sociais dos anos 60, luta do Presidente João Goulart, do PTB, dos comunistas, dos democratas cristãos, que estenderam a legislação trabalhista urbana para os rurais. Eles já estavam contemplados há 50 anos!

            Veja V. Exª que essa questão da pressão localizada na galeria pode nos levar, às vezes, a ilusões e, às vezes, a equívocos. Tem razão V. Exª. Vamos pensar bastante antes de votar, refletir.

            Muito obrigado.

            Mais uma vez, Senador Jorge Viana, agradeço enormemente a sua generosidade para comigo e a sua liberalidade em matéria de tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2013 - Página 67071