Discurso durante a 163ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre a entrevista do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, à revista Veja.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA, CORRUPÇÃO.:
  • Comentários sobre a entrevista do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, à revista Veja.
Publicação
Publicação no DSF de 24/09/2013 - Página 65554
Assunto
Outros > IMPRENSA, CORRUPÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, ENTREVISTA, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, ASSUNTO, DEFESA, NECESSIDADE, COMBATE, CORRUPÇÃO, CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNADOR, ESTADO DE RORAIMA (RR), MOTIVO, DESVIO, RECURSOS, CARATER PUBLICO.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco União e Força/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado ...

            O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Minoria/PSDB - SP) - V. Exª me permite?

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco União e Força/PTB - RR) - Permito.

            O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Minoria/PSDB - SP) - É para anunciar a presença entre nós, com muita honra, do Deputado Mauro Benevides, que por muitos anos representou o seu Estado do Ceará aqui no Senado e presidiu esta Casa, com o respeito e a admiração de todos.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco União e Força/PTB - RR) -É sempre bem-vindo.

            Sr. Presidente, eu - e creio que a maioria dos brasileiros - li a reportagem das páginas amarelas da Veja, a entrevista do novo Procurador-Geral da República. E entre os diversos pontos que ele, muito apropriadamente abordou, há um que tem sido tema de repetidos pronunciamentos meus aqui, que é o combate à corrupção. Eu acho que tem de haver um combate sistemático em relação a isso, pois não basta nós reclamarmos.

            Debatemos aqui, numa reunião temática, a questão do financiamento da saúde. Ficam lamentando a extinção da CPMF: que é um cadáver insepulto; que a saúde não funciona direito; que faltam recursos em razão da CPMF. Só que se esquecem de dizer que, quando a CPMF caiu, aumentou-se o IOF. Diziam que a CPMF era um imposto que somente aqueles que movimentavam conta bancária pagavam, o que não era verdade.

            Um produtor rural, quando vendia o seu produto, pagava CPMF. O comprador, que, por sua vez, fornecia aquele produto para o supermercado, pagava CPMF. E o que acontecia ao final, quando alguém, até mesmo do Bolsa Família, ia comprar o produto, o arroz, o feijão? Pagava a CPMF, que estava embutida, nem que levasse só o cartãozinho ou o dinheiro tirado do Bolsa Família.

            Pois bem, mas nós estamos discutindo o passado. O que queremos é discutir o presente e preparar o futuro. Nesse sentido, eu gostei muito das afirmações do novo Procurador-Geral da República, porque entendo que só uma campanha sistemática e permanente de combate à corrupção, desde o Município, passando pelas Câmaras de Vereadores e pelo prefeito; nos Estados, pelas Assembleias Legislativas, pelos governos estaduais e outros órgãos do Estado... Por exemplo, no meu Estado existe um órgão que se transformou num verdadeiro antro de corrupção, e é justamente o Instituto de Terras de Roraima, responsável pela titulação das terras, que, depois de longa briga, o Governo Federal repassou ao Estado, porque essas terras estavam registradas em seu nome quando nós éramos Território Federal.

            Pois bem, aqui, eu acho que foi o Senador Simon quem citou, já realizamos a CPI das ONGs. Foram duas CPIs das ONGs. A primeira, em 2003, presidida por mim. Conseguimos - a duras penas, Senador Aloysio, porque é impressionante a proteção que havia em relação a essas ONGs - identificar dez casos com claros indícios e comprovações de má aplicação, de corrupção mesmo, de dinheiro público.

            A segunda CPI, presidida pelo Senador Heráclito Fortes, foi mais longe e apurou mais coisas. A nossa tinha o foco voltado para ONGs que intervinham em questões indígenas, minerais, etc. Mas o que é certo é que agora - aliás, a Presidente Dilma, logo no início, suspendeu convênio com várias ONGs por causa de corrupção - nós vemos no Ministério do Trabalho a mesma coisa: ONGs criadas justamente para pegar dinheiro. Por exemplo, são criadas para qualificar profissionais, e não dão nenhuma aula; para especializar determinados setores, e não dão nenhum curso. Pegam o dinheiro e o colocam no bolso de seus proprietários. Essas instituições chamadas ONGs são um foco fácil para esvair o recurso público.

            É lógico que há exceções. Não vamos aqui dizer que todas são corruptas. Existem exceções que poderiam servir de exemplo realmente para uma ONG.

            O Governo Federal deveria estabelecer normas rígidas para a criação de ONGs. Aliás, na primeira CPI das ONGs, encaminhamos um projeto que normatizava a criação e o funcionamento das ONGs.

            Eu estou falando de ONGs, mas esta é apenas uma parte do que é permanentemente feito em termos de corrupção neste País. Existe corrupção na saúde, e a esse respeito já votamos que se trata de crime considerado hediondo, mas temos que ser mais rígidos ainda.

            Creio que deveria haver um mutirão permanente dos órgãos de fiscalização, começando pelos Municípios, que têm o Tribunal Municipal de Contas, pelos Tribunais de Contas dos Estados, pelo Tribunal de Contas da União, pela CGU (Controladoria-Geral da União), por todos os órgãos envolvidos, de fato, na obrigação de fiscalizar. Os Ministérios deveriam ter uma auditoria permanente de fiscalização de convênios, de aplicação de recursos públicos, do andamento desses convênios a que se destinam, mas o certo é que, se não houver, realmente, um combate sistemático, permanente, e uma punição exemplar, tudo isso permanecerá.

            A corrupção eleitoral, por exemplo, é outra coisa inadmissível neste País. Eu dou o exemplo do caso do Governador do meu Estado, que se elegeu no segundo turno cometendo as corrupções mais terríveis que eu já vi na minha vida. E o fazendo escancaradamente. Inclusive, na Veja da semana anterior, saiu uma matéria com o título: “Farra na floresta”, em que se diz que o Governador, apesar de ter sido eleito mediante corrupção eleitoral - tanto é que está no TSE desde 2011 uma representação contra ele com o parecer do Ministério Público pela sua cassação e, no entanto, o TSE não julga -, está na segunda metade do terceiro ano deste mandato obtido por corrupção e não há um julgamento.

            Eu entendo, Sr. Presidente, que nós, do Legislativo, deveríamos fazer um mutirão, Câmara e Senado, cortando na nossa própria carne. Por exemplo, é inadmissível que o voto para cassação de mandato seja secreto. Não deve ser secreto. Como o caso que aconteceu recentemente na Câmara, de um Deputado condenado e recluso na penitenciária, ser absolvido na votação para manter o seu mandato. Quer dizer, a Câmara o absolveu, mantendo o seu mandato, e logo depois uma decisão da Mesa suspendeu, temporariamente, o seu mandato. Então, é preciso que nós sejamos bastante claros.

            E eu quero aqui, também, concitar a sociedade, porque, aliás, naqueles movimentos de junho, o que nós mais vimos foram exatamente faixas e cartolinas pedindo fim à corrupção. Porque, se nós não combatermos, e aí eu quero conclamar a sociedade toda, porque tudo isso começa dentro da família, dentro de casa; se um pai vê o filho voltar da escola com um lápis que não é dele, com uma borracha que não é dele, ele tem que fazer aquele filho devolver. Começa aí um pequeno ato que parece que não é de corrupção, mas é. Um brasileiro, quando fura a fila, quando estaciona num local para deficientes físicos, e tantas outras coisas do dia a dia são corrupções, pequenas, mas são. Para mim não interessa se o cara roubou um tostão ou um milhão. Acho que tem de haver, realmente, a consciência, por parte da sociedade, das instituições que a representam, como é o caso do Congresso, da Presidência da República.

            Agora, Senador Aloysio, um ministro da Presidente Dilma, de quem foi detectado um ato de corrupção com várias ONGs, disse que não iria pedir demissão e que, se o demitissem, iria falar coisas que seriam até impublicáveis. Entendo que só essa ameaça já deveria fazer com que a própria Presidente Dilma o demitisse. Senão, fica a impressão de que ele tem dados que se forem levados a público vão, realmente, comprometer muitas pessoas.

            Sempre digo aqui que aliado bom não é aquele que sempre está de acordo com o que é feito pela Presidente e por seus ministros; ao contrário, acho que o bom aliado é aquele que adverte, que mostra, que comenta. Nós não podemos ficar aqui e nos esquecer de um dos principais papéis que tem o Parlamento, que é o de fiscalizar, o de denunciar, o de apurar, para que o dinheiro público seja devidamente bem aplicado. É lógico que nós temos outras funções como legislar, aprovar autoridades, etc., mas a essência da criação do Parlamento no mundo foi evitar que os reis, naquela época, arrecadassem os impostos que quisessem e os gastassem na construção de palácios, na promoção de festas, uma atrás da outra. Enfim, eram os reis, suas cortes e os plebeus. Hoje, não podemos mais aceitar isso. Estamos numa República proclamada há bastante tempo, há mais de um século. Nós não podemos aceitar que nesta República, que quer dizer res publica, coisa pública, existam essas coisas que a Presidente chama de malfeitos. Acho que essa palavra malfeito não substitui a palavra corrupção. Malfeito pode ser um deslize que não cause prejuízo a ninguém, mas corrupção é uma coisa que não pode, realmente, ser tolerada.

            Por isso eu queria aqui fazer um registro de que a entrevista do novo Corregedor-Geral da República, além de ser uma fala sensata, uma fala, de fato, que tem a ver com o papel do Ministério Público é, sobretudo, uma fala que conclama a todos para que possamos ter um combate permanente a essa corrupção que, infelizmente, teima em permear governos e mais governos. Se ela existe... Como dizem, onde há um ser humano pode ocorrer corrupção. Muito bem. É possível, sim. Um governador pode ter um auxiliar lá na ponta que faça uma corrupção e ele pode até não saber. Mas se ele souber e não punir, ele é conivente; está, portanto, como comparsa dessa corrupção.

            No meu Estado, por exemplo, lamentavelmente - eu falei aqui só da corrupção eleitoral -, acontece uma coisa atrás da outra em todos os setores, na saúde, na educação, na infraestrutura. Além disso tudo, o Governador ainda tem a coragem - se é que isso pode ser chamado de coragem - de, publicamente, fazer, primeiro, uma estrada asfaltada em uma vicinal que dá acesso ao local de um terreno que ele comprou de um jovem de 19 anos, um terreno de um milhão de metros quadrados por R$25 mil - uma jogada clara, usando um laranja e comprando um terreno por esse preço. Mas ele asfaltou e fez uma mansão, realmente para o nosso Estado, uma mansão com uma piscina ainda, para esnobar mais, com a primeira letra do nome dele: J. A Veja publicou isso na edição da semana passada.

            Isso são coisas que fazem com que o cidadão comum, o eleitor perca, realmente, a fé na Justiça, a fé de que ele pode influir para acabar com a corrupção. Aliás, Rui Barbosa, cujo busto está na nossa sala, já dizia em 1914 que de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver agigantar-se o poder na mão dos maus e de tanto ver prosperar injustiça, o homem honesto chegava até ao ponto de descrer e ter vergonha de ser honesto.

            É verdade, há pouco tempo, um colega meu de infância, me disse assim: “Mozarildo, você é muito bobo, porque está já há quatro mandatos, dois como Deputado e dois como Senador, e fulano, que chegou aqui ontem, já tem fazenda, rádio, televisão, e você não tem nada disso.” Eu disse: “Olha, eu tenho só uma coisa para te dizer: o meu vencimento de Senador, abatidas as minhas despesas, não é suficiente para ter esses bens. Se existem outros caminhos, eu não quero nem conhecê-los e nem tenho inveja de quem os conhece e obtém vantagens por esses caminhos. Eu tenho uma coisa que essa pessoa outra que você cita não tem, que é a tranquilidade de consciência, é poder dormir em paz, e não ter dúvidas de que meus filhos, amanhã, terão orgulho de mim pelo meu comportamento.”

            Isso é o que eu acho que todo cidadão tem que ter. Coisas que não se podem negociar são justamente a dignidade e a honestidade do cidadão.

            Muito obrigado, Senador Cristovam.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/09/2013 - Página 65554