Discurso durante a 153ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso do Dia do Cerrado.

Autor
Rodrigo Rollemberg (PSB - Partido Socialista Brasileiro/DF)
Nome completo: Rodrigo Sobral Rollemberg
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Registro do transcurso do Dia do Cerrado.
Publicação
Publicação no DSF de 12/09/2013 - Página 62381
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, DIA NACIONAL, CERRADO, IMPORTANCIA, COMBATE, DESMATAMENTO, ECOSSISTEMA.
  • APREENSÃO, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REDUÇÃO, DIREITOS, INDIO, TRANSFERENCIA, PRERROGATIVA, CONGRESSO NACIONAL, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, CERRADO.

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco Apoio Governo/PSB - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Parlamentares, hoje, dia 11 de setembro, se comemora o Dia do Cerrado.

            O cerrado é um bioma que está presente em oito Estados da Federação, mais o Distrito Federal, e ocupa quase 24% do território brasileiro. No entanto, temos pouco a comemorar e temos uma série de preocupações no momento em que se comemora esta data.

            Cinquenta por cento do bioma cerrado já foi antropizado, já foi convertido, já foi desmatado. E hoje esse bioma, que é a savana com maior diversidade do mundo, que é o segundo bioma brasileiro em biodiversidade, uma diversidade fantástica - temos algo em torno de 12 mil espécies de plantas conhecidas no bioma cerrado, das quais 4.400 são endêmicas, são plantas que só existem no bioma cerrado -, embora sejamos o berço das águas brasileiras - 70% das águas das Bacias do Paraná, do Tocantins e do São Francisco nascem no bioma cerrado -, embora tenhamos uma grande diversidade étnica e cultural com diversas populações, povos indígenas que residem e sobrevivem do cerrado, além de populações quilombolas, populações ribeirinhas, os geraizeiros, esse bioma sofre algumas ameaças.

            Ainda temos um desmatamento muito forte de parte do cerrado para a produção de carvão, que abastece especialmente as siderúrgicas do Estado de Minas Gerais.

            O bioma sofre também uma pressão muito grande porque as pessoas veem a região do Cerrado apenas como uma região de expansão da agricultura, muitas vezes intensiva, e, muitas vezes, da pecuária extensiva, que vem pressionando a fronteira agrícola e áreas protegidas do bioma Cerrado.

            Nós estamos acompanhando, pela imprensa, diariamente, os conflitos entre produtores rurais e populações indígenas, algumas que já tiveram suas áreas demarcadas e sofrem uma pressão muito grande no entorno dessas áreas demarcadas, e outros povos indígenas que ainda não conseguiram garantir a demarcação das suas terras.

            O fato é que esse bioma encontra-se ameaçado, e isso é muito ruim para a qualidade de vida futura da população brasileira. Por quê? Eu já tive a oportunidade de dizer, desta tribuna, que o pesquisador da Embrapa, Eduardo Assad, Secretário de Políticas de Mudança do Clima, do Ministério do Meio Ambiente, já alertou que o Cerrado é um grande laboratório de genes, porque nós temos aqui plantas adaptadas, há milhões de anos, a grandes períodos de estiagem, a mudanças de temperatura radicais entre o dia a noite e, no ambiente de mudanças climáticas, no ambiente de aquecimento global, podem estar, nos genes dessas plantas, a sustentabilidade da agricultura brasileira, a adaptação das variedades de milho, de soja, de sorgo, de feijão, de arroz a períodos de estiagens, a temperaturas mais elevadas. No entanto, essa biodiversidade presente no Cerrado vem se dissipando.

            Por outro lado, há a questão das águas. Um bioma conhecido como o “Berço das Águas do Brasil” não pode ter as suas águas ameaçadas, porque isso pode comprometer a sustentabilidade da agricultura brasileira, bem como as unidades de conservação. Embora nós já tenhamos 50% do Cerrado desmatado, o Cerrado ainda é um bioma com um baixo percentual de unidades de conservação, e grande parte dessas unidades de conservação encontra-se em propriedade privada. E não há uma percepção clara ainda por parte da população da importância dessas unidades de conservação, da importância das próprias terras indígenas na regulação do clima, na regulação das chuvas, também importante para a sustentabilidade da agricultura.

            Se nós já conseguimos, no Brasil e até no mundo, uma consciência em relação à importância da preservação da Floresta Amazônica, à importância da preservação da Mata Atlântica, que conquistou uma lei de proteção própria após ter grande parte da sua vegetação, da sua biodiversidade dizimada nas ocupações litorâneas, especialmente no nosso País; embora tenhamos já conseguido uma mobilização em torno do Pantanal, em relação ao Cerrado nós não conseguimos, ainda, essa conscientização. Como disse, as pessoas ainda veem o Cerrado como uma área de expansão da produção de alimentos.

            Não somos contra. Entendemos que o Cerrado cumpre um papel importante na produção de alimentos, mas entendo que devemos investir fortemente em ciência, tecnologia e inovação, no sentido de garantir que possamos fazê-lo de forma adequada, possamos fazê-lo a partir de um zoneamento ecológico e econômico, desenvolvendo metodologias como a integração lavoura-pecuária-floresta, o plantio direto, fazendo com que, com o aumento da produtividade, possamos conseguir ampliar a produção de alimentos sem precisar avançar sobre áreas preservadas do Cerrado.

            Quero, também, manifestar nossa preocupação em relação à pressão sofrida pelos povos indígenas que vivem no bioma Cerrado. São vários. Podemos citar os Krahos, os Yawalaptis, os Kuikuros, os Kalapalos, os Kamaiurás, os Avá-Canoeiros, os Xavantes e diversos outros povos indígenas que se encontram, neste momento, ameaçados, vivendo numa profunda tensão, e que, depois de uma conquista histórica, que foi a Constituição de 1988, veem seus direitos ameaçados com algumas propostas que tramitam no Congresso Nacional, especialmente na Câmara dos Deputados.

            Está se preparando uma grande mobilização das populações indígenas brasileiras quando da celebração dos 25 anos da Constituição, para demonstrar a irritação, para demonstrar a indignação, para demonstrar a revolta contra essas propostas de mudanças que vêm reduzir os direitos das populações indígenas. Uma delas, a PEC que procura transferir ao Congresso Nacional a atribuição, a prerrogativa de demarcação de terras indígenas e até a redução de terras já demarcadas.

            Nós sabemos que, se isso acontecer, nós não teremos mais terras indígenas demarcadas neste País, pela própria configuração a que estamos assistindo nos últimos anos. Portanto, nós não podemos admitir esse que seria um retrocesso dentro da política indigenista do nosso País.

            Preocupa-nos, também, a autorização, a partir de projeto que tramita na Câmara dos Deputados, de mineração em terras indígenas. Eu fico imaginando que será uma tragédia para os povos indígenas se autorizarmos a mineração em suas terras. As consequências para as populações indígenas serão gravíssimas.

            Já tive a oportunidade, Sr. Presidente, de visitar alguns territórios indígenas. Estive nos Krahos, no norte de Tocantins, onde, no ano passado, assisti a uma das cerimônias mais lindas que tive a oportunidade de assistir na minha vida, o Quarup, no Parque Nacional do Xingu, lá no território dos Yawalaptis, e pude perceber a importância que foi a visão estratégica de grandes brasileiros, como os irmãos Orlando Villas-Bôas e Cláudio Villas-Bôas, que, há 50 anos, anteviram a necessidade de guardar grandes áreas territoriais para que essas populações pudessem viver mantendo as suas tradições, mantendo a sua cultura, mantendo...

(Soa a campainha.)

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco Apoio Governo/PSB-DF) - ... mantendo o seu povo.

            E eu fico imaginando as oportunidades que o Brasil tem, efetivamente, de inaugurar neste Planeta uma forma de desenvolvimento diferenciado, um desenvolvimento que possa incorporar, que possa incluir essas populações com toda a sua diversidade cultural; que perceba as populações indígenas não como um empecilho ao desenvolvimento, mas, pelo contrário, como populações que também têm muito a nos ensinar, de como conseguiram conviver harmonicamente com a natureza ao longo de todos esses anos e que têm as suas manifestações culturais, que devem ser reconhecidas como da maior importância nessa diversidade que compõe a Nação brasileira.

            Quero, aqui, dizer que é inadmissível que, em pleno século XXI, 25 anos após a promulgação da Constituição de 1988, o Cerrado e a Caatinga ainda não estejam reconhecidos na Constituição Federal como patrimônios nacionais, a exemplo do que já acontece com a Floresta Amazônica, com o Pantanal, com a Mata Atlântica, com a Serra do Mar e com a Zona Costeira.

            Como é que um bioma como o Cerrado, com toda essa diversidade, com toda essa diversidade cultural, com toda essa biodiversidade, com toda essa capacidade de produção de águas, com tudo isso não é reconhecido como patrimônio nacional na Constituição Federal?

            Eu entendo que a composição conservadora do Congresso Nacional se expressa de forma contundente no trato das questões ambientais, numa visão imediatista, numa visão exclusivamente economicista, perdendo a capacidade de ter uma visão mais holística, uma visão histórica da compreensão da necessidade de convivermos pacificamente, de garantirmos formas de convivência. É absolutamente possível, num país com as dimensões continentais do Brasil, que possamos ampliar nossa capacidade produtiva, através dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação, mas tenhamos a generosidade de reconhecer a contribuição marcante, a contribuição significativa que esses povos trazem à formação brasileira, pelo que devem ser reconhecidos, pelo que devem ser valorizados e devem ser incorporados.

            Portanto, fica aqui a nossa manifestação de preocupação com as ações que tramitam no Congresso que buscam reduzir o direito das populações indígenas, que colocam em ameaça esse bioma estratégico para o Brasil, desejando que o bom senso prevaleça, que o Congresso mude de posição e, assim, que possamos, muito em breve, aprovar a proposta de emenda à Constituição que torna o Cerrado patrimônio nacional e arquivar, definitivamente, essas propostas que colocam em risco a própria sobrevivência das populações indígenas do nosso País.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/09/2013 - Página 62381