Discurso durante a 140ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso do Dia do Vaqueiro, em 29 de agosto.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Registro do transcurso do Dia do Vaqueiro, em 29 de agosto.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2013 - Página 57281
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, VAQUEIRO, DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, REGULAMENTAÇÃO, PROFISSÃO.

            A SRa LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB-BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sra Presidenta, Senadora Ana Amélia, Srªs e Srs. Senadores, quero também concordar integralmente com a fala de V. Exª a respeito desse episódio e com a fala do nobre Senador pelo Acre, Jorge Viana.

            Todavia, dirijo-me a esta tribuna hoje, Srª Presidenta, para registrar que, no próximo dia 29, quinta-feira, comemora-se o Dia Nacional do Vaqueiro, instituído pela Lei no 11.797, de 2008. A figura do vaqueiro tem presença marcante na cultura brasileira ao longo da história do nosso País. Está presente nas obras de José de Alencar, Euclides da Cunha, Guimarães Rosa, Ariano Suassuna e nos trabalhos de Luís da Câmara Cascudo, entre outros grandes escritores e estudiosos. No cinema, tem sido tema de inúmeras películas, inclusive personagem da abertura do filme do genial cineasta baiano Glauber Rocha, em Deus e o Diabo na Terra do Sol. No folclore, sua imagem ganha dimensões grandiosas, tratado como super-herói e, algumas vezes, apresentado até como ser mitológico.

            Contudo, sua real presença se faz notória em fazendas espalhadas pelos sertões do Brasil, envergando a vestimenta típica, o gibão de couro, que, além de instrumento de trabalho, pode ser comparado às armaduras usadas pelos soldados e guerreiros que seguiam para as grandes batalhas.

            E quero aqui chamar a atenção para o fato de que essa roupa é o único traje brasileiro de trabalho que tem quase a idade do País e que ainda hoje pode ser encontrado em uso no sertão, só superado pelas indumentárias à base de pinturas e penas usadas pelos nossos índios.

            A presença do vaqueiro no Brasil remonta ao século XVI, quando foram trazidas, de Cabo Verde, as primeiras cabeças de gado para a capitania de São Vicente, em 1534; depois, para Recife, em 1535, e Bahia, em 1549. Segundo pesquisa do professor e antropólogo Washington Queiroz:

Tem-se notícia de que o registro oficial do primeiro pagamento a um homem por sua lida com o gado aconteceu, no Brasil, em agosto de 1549, e foi feito na Bahia por Thomé de Souza, quando foram pagos a Pedro Gonçalves D'Alpendrinha trinta réis pelo seu ofício, podendo ser considerado o primeiro vaqueiro.

            Um ano depois, em 1550, Tomé de Sousa trouxe novo carregamento para Salvador, de onde a pecuária se estenderia pelo Nordeste, particularmente Pernambuco, Maranhão e Piauí, constituindo-se na força motriz da expansão pastoril. O vaqueiro é aquele que contribuiu de forma decisiva para a criação do fenômeno socioeconômico da pecuária, no Nordeste, mas também em outras regiões do País.

            Foram os vaqueiros os principais desbravadores do interior nordestino, que o povoaram em decorrência da expansão da pecuária, principalmente ao longo do Rio São Francisco, também conhecido, à época, como o “Rio dos Currais”. Ao vaqueiro coube contribuir para ampliar a geografia da então Colônia, trocando o canavial pela caatinga e a roupa de algodão pela roupa de couro.

            Praticamente, o processo de ocupação e expansão territorial, tendo como sujeito o vaqueiro, prolongou-se até as primeiras décadas do século passado, com o desenvolvimento da atividade pecuária nas diferentes regiões do País.

            Nesse breve histórico, constata-se a presença do vaqueiro, desde o período colonial, influenciando nossas manifestações artísticas e culturais e também o rico e diversificado folclore brasileiro, que o alçou no imaginário popular à condição de herói do sertão.

            Srª Presidente, destaco ainda que o vaqueiro - símbolo nordestino e brasileiro - é também o grande responsável pela criação de um vasto acervo sociocultural.

            Injustificadamente, quase cinco séculos se passaram, e até agora este homem, um dos mais antigos profissionais do País, ainda não tem sua profissão reconhecida. Esse vaqueiro, desbravador de fronteiras, responsável pela ocupação e expansão territorial do Brasil, tão presente no dia a dia das fazendas, está ausente na nossa legislação trabalhista devido à falta de reconhecimento da profissão.

            Na Bahia, o ofício de vaqueiro foi reconhecido como Patrimônio Cultural, em agosto de 2011. Também tramita processo no Iphan para que esse ofício, os seus saberes e fazeres, se torne Patrimônio Cultural Nacional.

            A ausência do reconhecimento dessa importante profissão, mais que configurar, atesta o desconhecimento sobre a importância de uma das mais antigas profissões exercidas no Brasil, aprendida, geralmente, ainda na infância, quando a criança acompanha, observa e dá os primeiros passos em direção ao ofício do pai.

            Tramita nesta Casa o Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 83, de 2011, dos ex-Deputados baianos Edigar Mão Branca e Edson Duarte, ambos do PV, e que tem como Relator aqui, no Senado, na CAS, o Senador, amigo, Paulo Davim, também do PV, que trata do reconhecimento da profissão de vaqueiro.

            Quando do encerramento dos trabalhos, em torno do mês de julho, quando nós entramos num período de suspensão das nossas sessões, solicitei ao Presidente da Casa, Senador Renan Calheiros, que nós pudéssemos colocar esse projeto em pauta, na chamada agenda positiva do Congresso Nacional. Logo depois, o Senador Davim já solicitou uma audiência pública na CAS, e espero que possamos realizá-la o mais breve possível, para que este Senado possa aprovar a matéria na CAS e, depois, imediatamente, trazê-la ao plenário, fazendo esse reconhecimento histórico, indispensável, à figura do vaqueiro em nosso País.

            Acho que, mais do que isso, há uma disposição das associações de vaqueiros do Nordeste de aqui comparecerem com seu traje próprio para acompanharem a nossa votação.

            Os vaqueiros tiveram partes destacadas em alguns momentos históricos da vida nacional. É o caso da Guerra de Canudos; é o caso do 2 de julho, na Bahia, da luta pela independência do Brasil.

            Portanto, por toda a história da sua vida, pela contribuição na expansão das fronteiras do nosso País, pela pecuária, como atividade econômica, e por toda a contribuição sociocultural, quero deixar registrada aqui - porque não estarei presente no Senado, no dia 29, por participar de missão deste próprio Senado - a minha justa homenagem a esses homens e mulheres. Há mulheres vaqueiras, mas, principalmente, há um grande número de homens, de meninos, de aboiadores, de cantadores, que, nas vaquejadas da Bahia e do Sertão nordestino inteiro, fazem o conhecimento e a afirmação dessa sua contribuição cultural ao nosso País.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco Maioria/PMDB - SC) - V. Exª me concede um aparte, Senadora Lídice da Mata?

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - Pois não.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Maioria/PP - RS) - Senador Casildo, apenas para aproveitar, eu queria dizer, Senadora Lídice da Mata, a senhora que é da Bahia, do PSB, uma grande Senadora, que estão aqui, nas nossas galerias, membros do Sindicato do Poder Judiciário da Bahia. Então, como a Senadora da Bahia está aqui, fazendo o uso da palavra, eu queria saudá-los em nome dos demais Senadores aqui presentes.

            Bem-vindos ao plenário!

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - Sejam bem-vindos!

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Maioria/PP - RS) - Desculpe-me, Senador Casildo. Com a palavra para um aparte à Senadora Lídice da Mata.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco Maioria/PMDB - SC) - Eu queria me associar à Senadora Lídice da Mata em relação a essa proposta de V. Exª, a esse reconhecimento aos vaqueiros.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco Maioria/PMDB - SC) - A senhora falou muito bem, recordando os vaqueiros na Guerra de Canudos, nas vaquejadas, nas lutas bonitas. E, quando falo na Guerra de Canudos, lembro da Guerra do Contestado, que teve início em 1912 e foi até 1916, na região do oeste catarinense. Começou numa parte do Paraná, naquele oeste, indo até o Rio Grande praticamente. Foi dizimada muita gente que lutava, principalmente o caboclo daquela região. Lutavam para manter suas terras e a estrada de ferro. Os americanos da época iam afastando. Lembro dos vaqueiros, das vaquejadas também das nossas regiões íngremes. Eu, aliás, quando menino, andava muito a cavalo também, naquela região. Fomos criados naquelas áreas. Fico feliz em ouvir essa proposta de V. Exª. Não é a vaquejada só da Bahia, eu diria. É do Brasil. As vaquejadas viriam das campanhas no Rio Grande do Sul.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco Maioria/PMDB - SC) - E aí vêm subindo por aquela parte ocidental do Brasil, pela fronteira com a Argentina, vem subindo para o oeste catarinense, vem andando. Faziam esse trecho até a cavalo naqueles tempos. Acho que essa contemplação, esse reconhecimento que V. Exª está a propor vai embalsamar o Brasil inteiro.

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - Muito obrigada pelo aparte, nobre Senador, que muito me honrou.

            Para concluir, Srª Presidente, reafirmo que é urgente que o Senado Federal possa proceder nesse reconhecimento à profissão do vaqueiro. Em seus 464 anos de existência, eles nos pedem que reparemos esse débito social, histórico, e que produzamos esses benefícios sociais indispensáveis.

            Quero dizer que me orgulho muito pelo fato de que essa proposta, na Câmara, tenha partido de dois Deputados baianos. Novamente eu os homenageio: o Deputado Edigar Mão Branca, um cantador sertanejo, e Edson Duarte.

(Soa a campainha.)

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - Termino, lendo alguns versos de Euclides da Cunha, em homenagem aos vaqueiros:

Fez-se homem, quase sem ter sido criança.

Cedo encarou a existência pela sua face tormentosa.

É um condenado à vida.

Compreendeu-se envolvido em combate sem tréguas, exigindo-lhe imperiosamente a convergência de todas as energias.

Fez-se forte, esperto, resignado e prático.

Aprestou-se, cedo, para a luta.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2013 - Página 57281