Discurso durante a 140ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da violência contra a mulher no Brasil.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL, POLITICA SOCIAL, FEMINISMO.:
  • Considerações acerca da violência contra a mulher no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2013 - Página 57458
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL, POLITICA SOCIAL, FEMINISMO.
Indexação
  • REGISTRO, COMPARECIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, LOCAL, CONGRESSO NACIONAL, OBJETIVO, RECEBIMENTO, PARECER, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, COMENTARIO, ATUAÇÃO, COMISSÃO, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, BRASIL.

            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - Sem apanhamento taquigráfico) - Srªs e Srs. Senadores, a sessão solene realizada hoje pela manhã nesta Casa Parlamentar, com a presença da Presidenta da República, Dilma Rousseff, foi, sem sombra de dúvidas, um momento histórico de enorme significação, para todas as mulheres brasileiras.

            A presidenta Dilma recebeu de nossas mãos, o Relatório Final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência Contra a Mulher (CPMIVCM), que investigou a situação da violência contra a mulher no Brasil e apurou denúncias de omissão por parte do poder público com relação à aplicação da lei, criada para proteger as vítimas da violência de gênero.

            Nós, que integramos a CPMI, ficamos muito contentes, com a atenção dada pela nossa Presidente, ao convite que lhe fizemos, para vir aqui, nesta Casa, que é a Casa do povo brasileiro, e receber de nossas mãos, um relatório, que é o resultado de um exaustivo trabalho parlamentar.

            Fruto da sensibilidade e compromisso da senadora Ana Rita (ES), sua relatora, o Relatório Final foi produzido, primordialmente, a partir de dados, denúncias, testemunhos e depoimentos, que foram levantados durante as visitas feitas aos estados.

            Em 1.045 páginas, o Relatório Final da CPMI nos mostra a terrível situação a que são submetidas as mulheres vítimas da violência de gênero no Brasil. É, nobres colegas, um panorama assustador sobre a prática deste crime que é recorrente em todos os estados brasileiros.

            Falo a partir da realidade de violência vivida pelas mulheres do meu Estado de Roraima, detectada pela CPMI, durante a diligência que fez, em dezembro de 2012, em nossa capital, e que está exposta neste Relatório Final.

            Unidade da federação que aparece em 13º lugar, no Mapa da Violência de 2012, Roraima apresenta uma taxa de homicídio de mulheres da ordem de 5,0 por 100 mil mulheres, média que está acima da nacional, que é de 4,6 por cada 100 mil mulheres.

            Boa Vista, nossa capital, aparece na 18ª posição entre as capitais mais violentas do nosso País em homicídios de mulheres, com uma taxa de 5,6 assassinatos para cada grupo de 100 mil mulheres.

            Mas, pasmem, senhores senadores e senadoras, indiferente à violência de gênero, o poder público de Roraima não é apenas tolerante, mas, principalmente, omisso diante da dor e do sofrimento das vítimas deste tipo de crime.

            É sintomático, portanto, que a CPMI não tenha obtido do Governo do Estado de Roraima e dos órgãos do Poder Judiciário, respostas sobre as informações requisitadas, e que ajudariam a traçar o panorama da real situação de violência contra a mulher em nosso Estado.

            A falta de informações, conclui a CPMI, não apenas inviabilizou suas análises, como também prejudicou uma avaliação sobre o atendimento a mulheres em situação de violência sexual e a notificação compulsória.

            Após detectar realidades parecidas em outros Estados, o Relatório Final da CPMI nos diz que não podemos mais aceitar passivamente esta situação. Muito menos a omissão dos poderes públicos diante de uma realidade cruel, que nos mostra, que a cada duas horas, uma brasileira é assassinada.

            Este cenário de horror, é responsável pelo fato de nosso país ocupar o 7ºlugar entre 87 países que mais matam mulheres em todo o mundo, com uma taxa de homicídios da ordem de 4,4 assassinatos em cada grupo de 100 mil mulheres, conforme aponta o Mapa da Violência 2012.

            De acordo com o Mapa da Violência, entre 1980 e 2010, mais de 92 mil mulheres foram assassinadas no Brasil, sendo que, 43,7 mil somente na última década, período em que, o número de mulheres assassinadas passou de 1.353 para 4.465, representando um aumento da ordem de 230%.

            O Relatório Final da CPMI nos conduz à conclusão de que as vítimas continuam a ser atacadas, porque o poder público não cumpre as determinações da Lei 11.340/2006, chamada Lei Maria da Penha, em vigência há sete anos; uma conquista, aliás, que também comemoramos nesta solenidade.

            E aqui reside nossa maior apreensão, pois falamos de uma lei, que se transformou em principal medida oficial de enfrentamento à violência contra a mulher e que já livrou da morte centenas de mulheres, como nos mostram os registros, feitos pelo governo federal, por meio do Ligue 180.

            Falamos de uma lei, senhores parlamentares, que não foi imposta de cima para baixo, mas que é fruto de um longo, rico e legítimo processo de negociações políticas, realizadas neste Legislativo, entre governo federal e movimentos organizados de mulheres.

            Por isso mesmo, com base nas apurações que fez, a CPMI encaminhou a vários órgãos dos três poderes das esferas públicas, 73 recomendações, para o enfrentamento da violência contra a mulher.

            Esta Casa de Leis, dando o pontapé inicial às recomendações feitas, já pós em pauta, sete dos 13 projetos de lei de autoria da CPMI. Durante a sessão solene de hoje, o presidente desta Casa, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), disse, perante a Presidenta Dilma Rousseff, disse esperar que o Senado conclua, ainda nesta semana, a votação desses projetos de lei.

            Um deles, o PLS 292/2013, inclui no Código Penal a figura do feminicídio, que é o crime de assassinato praticado contra a mulher, por alguém que com ela tinha relação íntima. Este projeto define o crime de feminicídio como uma "forma extrema de violência de gênero que resulta na morte da mulher", inclusive, com a mutilação ou desfiguração da vítima.

            Outro projeto já em pauta nesta Casa é o PLS 293/2013, que inclui a discriminação de gênero nas razões do crime de tortura. Há, ainda:

            - O PLS 295/2013, que visa inserir nas diretrizes e princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), os serviços públicos especializados do atendimento às vítimas de violência doméstica;

            - O PLS 298/2013, que cria o Fundo Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, e o PLS 296/2013, que permite às vítimas receber da Previdência uma ajuda temporária, decorrente de risco social, no caso, a situação de violência de gênero. Temos, também, o PLS 294/2013, que sugere alteração na Lei Maria da Penha (11.340/2006), com vistas a estabelecer o comunicado ao juiz e ao Ministério Público, dentro de 24 (vinte e quatro) horas, do encaminhamento da ofendida ao abrigamento.

            A CPMI sugere, por fim, no PLS 297/2013 - Complementar -, a determinação de que os recursos arrecadados com multas decorrentes exclusivamente de sentenças condenatórias em processos criminais que envolvam violência doméstica e familiar, sejam aplicados na manutenção de casas de abrigo destinadas a acolher vítimas de violência doméstica.

            Convoco, desde já, meus colegas de Parlamento, para votarmos, a favor destes projetos de lei, como forma de darmos nossa contribuição à luta das mulheres brasileiras, pelo fim da violência doméstica e sexual.

            Nobres pares, a CPMI da Violência contra a mulher visitou vários estados, ouviu vítimas e familiares, buscou informações, se apropriou de documentos e produziu o Relatório Final que agora, está nas mãos das autoridades brasileiras.

            Assim, criou as condições para agirmos, fazendo valer o que disse o escritor e jornalista uruguaio, Eduardo Galeano, que “a primeira condição para modificar a realidade consiste em conhecê-la”.

            Penso que, agora, que conhecemos a realidade, precisamos mudá-la. E mudar a realidade, exige, urgentemente, reação à omissão institucionalizada em muitos Estados do país, como é o caso de Roraima.

            Governo Federal, Parlamento e Poder Judiciário têm condições de encaminhar todas as recomendações feitas pela CPMI para o enfrentamento à violência de gênero.

            Enfim, é dever de todos nós, homens e mulheres, que fazemos política, construirmos um país verdadeiramente democrático, sem violência contra as mulheres.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2013 - Página 57458