Discurso durante a 157ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a Semana Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS.:
  • Comentários sobre a Semana Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência.
Publicação
Publicação no DSF de 17/09/2013 - Página 63616
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • REGISTRO, ABERTURA, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, SEMANA, PESSOA DEFICIENTE, IMPORTANCIA, DEBATE, ACESSIBILIDADE, AUTONOMIA, PESSOAS.
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ESTATUTO, PESSOA DEFICIENTE.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senadora Ana Rita, Presidente da Comissão de Direitos Humanos, que preside a sessão neste momento, hoje pela manhã, pela sua orientação, nós abrimos, lá na Comissão, a Semana da Pessoa com Deficiência e é desse tema que eu falo da tribuna.

            Começou hoje, a partir da Comissão de Direitos Humanos, presidida por V. Exª, uma semana diferente, uma semana carregada de emoções e de significado. Do dia 16 ao dia 20, estaremos lembrando a Semana Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência e apontando para o grande dia nacional dessa luta, que é 21 de setembro.

            Hoje pela manhã, a Comissão de Direitos Humanos realizou audiência pública em parceria com o Programa de Acessibilidade do Senado Federal. A audiência teve como principal objetivo celebrar o início da divulgação da luta desse segmento, que contou com a presença de representantes das pessoas com deficiência de diversas áreas em nível nacional. Nesta semana, convidamos a todos para refletirem sobre o tema da acessibilidade, que é o maior anseio das pessoas com deficiência.

            Esta fitinha de cor amarela, que estamos usando aqui no braço neste momento, foi distribuída na porta de entrada da Comissão e tem essa cor não por acaso, o amarelo é a cor da acessibilidade. Simbolicamente, a cor amarela significa atenção. Então: atenção, atenção, atenção! Paremos para refletir sobre a importância da acessibilidade, um dos itens primordiais para a autonomia da pessoa com deficiência.

            É preciso, neste dia, nós nos perguntarmos: será que as nossas ruas são acessíveis? Será que os nossos espaços são acessíveis? Nós estamos buscando a acessibilidade nas atitudes de verdade? No serviço de comunicação e informação dos ambientes físicos e arquitetônicos, estamos com essa preocupação? Será que estamos lutando em favor de um mundo mais acessível, no qual as pessoas se tornem mais acessíveis com o outro? Estamos lutando por um mundo em que existe respeito e compreensão dos limites e potenciais de cada ser humano, independentemente de ser ou não uma pessoa com deficiência? Será que compreendemos o direito constitucional de ir e vir de todos? Será que lutamos e desejamos mesmo um dia alcançar um modelo baseado no desenho universal?

            Lembremos, então, da luta do movimento das pessoas com deficiência. Lembremos dos avanços e conquistas, das vitórias, que são muitas, e de outras pequenas, mas também delicadas derrotas. Mas não vamos nos esquecer do quanto ainda podemos caminhar, lembrando o poeta espanhol que disse que o caminho a gente faz caminhando.

            O dia 21 de setembro está institucionalizado como o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência.

            Isso se deu por meio da Lei nº 11.133, de 2005, Lei que foi criada a partir de um projeto apresentado por nós, em 2003, e que hoje é Lei.

            Assim, o que propomos nesta semana é um mergulho no significado desta data: 21 de setembro, início da primavera e ao mesmo tempo Dia Nacional da Pessoa com Deficiência.

            A importância desse dia está vinculada ao momento de transformação que a natureza experimenta pela chegada da querida estação primavera.

            Dessa forma, a data simboliza as mudanças que as pessoas com deficiência ainda esperam. Mais de um quarto dos brasileiros, segundo dados do IBGE, ainda esperam ver concretizados os principais caminhos que levem à acessibilidade, à inclusão e à emancipação.

            Mas, como foi dito hoje pela manhã, um quarto, envolvendo os familiares, com certeza, passaremos de 50% ou de 70%, chego a dizer, da população que espera por essa mudança.

            As conquistas dessas pessoas foram grandes, mas os desafios também foram muitos, fizemos muito, mas ainda há muito por fazer.

            Acessibilidade, mais do que as adaptações, prende-se à concepção de espaços, produtos e serviços que devem contemplar a todos indistintamente.

            Acessível é tudo aquilo que pode ser acessado, usufruído, usado por qualquer pessoa com ou sem deficiência. Repensar o mundo sob essa ótica abrangente é respeitar o ser humano em suas diferenças.

            Na semana passada, tive oportunidade de ler uma matéria no jornal Diário do Sudoeste de Santa Catarina com uma bela palestra do arquiteto e urbanista Mário Cezar da Silveira sobre o tema da acessibilidade, o que está sendo visto com um olhar muito respeitoso em todo o território nacional.

            Nas palestras, Silveira aparece sentado em uma cadeira de rodas. Durante sua fala, de inesperado, Silveira se levanta, provocando assim surpresa na plateia.

            O arquiteto não tem nenhuma limitação física, o seu objetivo é mostrar que acessibilidade deve ser pensada para todos e todas as pessoas, tendo ou não deficiência.

            Em nosso senso comum, esperamos que a acessibilidade e outros temas ligados à deficiência sejam abordados por pessoas com deficiência, mas quando uma pessoa sem nenhuma limitação de ordem física, mental ou sensorial fala sobre isso, nos faz refletir de forma diferente, nos colocando no lugar do outro.

            Conforme a fala de Silveira, o maior desafio na aplicação das leis que garantem mobilidade a todos está na forma de encarar o assunto. Diz ele:

Como pensador de espaços, jamais havia pensado na possibilidade de que alguém não pudesse entrar em um lugar que eu projetei porque nós, engenheiros e arquitetos, costumamos pensar as cidades para a pessoa padrão, como se elas nascessem e morressem do mesmo tamanho, sem que as consequências de sua fragilidade pudessem atingi-la, ou seja, como se ele não estivesse suscetível às perdas funcionais.

            A sociedade tem procurado incorporar esses novos conceitos, principalmente após a ratificação da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em Nova Iorque, no ano de 2007, mas essas mudanças de paradigmas fazem parte dos debates políticos, nos movimentos das pessoas com deficiência mundo afora, desde meados da década de 1970.

            No Brasil, a luta ganha impulso sob uma perspectiva revolucionária, desde 1979. Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Pernambuco, Goiás, Pará foram Estados onde essa luta surgiu com muita força. As entidades e, principalmente, as pessoas com deficiência começaram a mobilizar-se, debatendo as questões e pedindo mudanças.

            Nessa perspectiva revolucionária, obtivemos uma nova forma de compreender a deficiência. Ela passou de uma visão exclusivamente biomédica para uma percepção mais humana e social, na qual a deficiência passa a ser entendida pela perspectiva da diversidade, e não na ótica da falta de um membro ou função.

            O século XX foi marcado pela inventividade e engenhosidade, quando percebemos vários avanços em prol da pessoa com deficiência no campo, principalmente, da tecnologia. Foi possível estender o acesso a todos os recursos da comunidade: ambientes físicos, sociais e culturais, transporte, informação e tecnologia, meios de comunicação, educação, justiça, serviço público, emprego, esporte e recreação, locais de votação e espaços de expressão religiosa.

            No século XXI, nós precisamos estender esse acesso para todos, eliminando todas as barreiras ambientais, eletrônicas e atitudes que vão contra a plena inclusão dessa parcela na vida comunitária, parcela tão importante.

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É nesse contexto, Srª Presidenta, de mudança, de transformação de conceito da deficiência, que nasce a proposta do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que apresentamos há anos e que, agora, parece que, enfim, a Câmara vai votar e voltará para a revisão final do Senado.

            Surge, então, um documento com o propósito de atender aos anseios dessas queridas pessoas, é a passagem de uma visão assistencialista para uma percepção política da pessoa com deficiência, atendendo o indivíduo como um agente de sua promoção social.

            Já não é mais aceito, então, o isolamento dessas pessoas e o fazer de conta de que elas não existem, tampouco a simples noção de que elas precisam de proteção e assistência. As pessoas com deficiência passam, agora, a buscar o reconhecimento político de suas diferenças. O que elas querem é oportunidade.

(Interrupção de som.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Indo para as ruas, apresentando as demandas, por acessibilidade arquitetônica, mostrando a existência de barreiras no acesso aos serviços e sistemas de comunicação e informação. Elas mostram a fragilidade e a timidez das concepções de inclusão que ainda fazem parte da compreensão geral sobre deficiência. E, por outro lado, elas expõem a naturalidade das relações pessoais e as identidades existentes entre as pessoas com e sem deficiência.

            Ainda nessa mesma linha, cito o pensamento de Boaventura de Souza Santos:

"O universalismo que queremos hoje é aquele que tenha como ponto em comum a dignidade humana. A partir daí, surgem muitas diferenças que devem ser respeitadas. Temos direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza e direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza".

            Srª Presidenta, à medida que as conquistas sociais avançam e o conceito de cidadania se sedimenta, é fundamental que se compreenda que as questões de diferenças físicas, mentais ou sensoriais, étnicas, de faixa etária, gênero, e de orientação sexual, entre outras, permeiam…

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - (…) as relações sociais e têm reflexos concretos na vida de largas parcelas da população.

            Cidadania, vista assim, não significa apenas a extensão de direitos conquistados, mas pressupõe construção coletiva, generalizada e inclusiva, ou seja, construir as condições de liberdade, equiparação de oportunidades e igualdade para todos.

            Essa visão de cidadania, como elemento essencial da democracia social, deve articular as demandas dos diversos setores excluídos e incorporar uma nova visão na concepção global do programa de governo democrático, construindo, na prática, um novo paradigma que sintetize direitos humanos como transformação democrática.

            Associado ao resgate político dos cidadãos está o enfrentamento ao modelo civilizatório dominante, baseado no desperdício da sociedade de consumo que transforma os seres humanos,…

(Interrupção de som.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - (…) em objetos de mercado e destrói a natureza.

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Srª Presidente, consolidar a cidadania é imprimir novos valores, colocando seres humanos e a natureza no centro do sistema; é criar um novo modo de vida social e comunitário, mais orgânico e solidário, sustentado no respeito à diversidade, sem opressão, discriminação ou preconceito. A ação dos governos e da sociedade é fundamental para a gestação desse processo em nosso País.

            Essa visão do papel social do Estado só será efetiva, de fato, se, ao contrário de omitirmos e negarmos, afirmarmos a existência das desigualdades e das diferenças. Friso que o Estatuto da Pessoa com Deficiência representa essa visão.

            Cumprimento, aqui, a Deputada Mara Gabrilli, Relatora, que está construindo a redação final. Tenho certeza de que essa matéria será votada com rapidez no Plenário da Câmara. Não temos dúvida de que o Estatuto será um instrumento de libertação, num reconhecimento da luta histórica das pessoas com deficiência.

            Finalizo, agora, sim, citando Oliver Sacs, neurologista, biólogo, químico e escritor. Sacs é anglo-americano e, em seu livro, “Um Antropólogo em Marte”, faz uma interessante provocação ao lembrar a frase de William Osler, que diz: “Não pergunte que doença a pessoa tem, mas que pessoa a doença tem.". Essas palavras conduzem a uma revisão geral do conceito de deficiente.

            Quando se pensa em deficiência, o que vem à cabeça de todos são as limitações e as dificuldades que essas pessoas enfrentam. Esquece-se de que, por trás da doença ou da deficiência, existe um ser humano…

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - (…) rico em possibilidades e experiências de vida recheadas de criatividade e soluções diferenciadas.

            Basta uma breve conversa com uma pessoa com deficiência para percebermos que não há nada de trágico na vida dessas pessoas. Elas levam suas vidas em condições de igualdade, superam seus limites e, com inteligência e intuição, se sobressaem.

            A vida, para qualquer um, exige esforço, mas das pessoas com deficiência exige um pouco mais. Existem mais barreiras a se enfrentar e os desafios são maiores, com certeza. Existe, ainda, o preconceito, ou seja, o desconhecimento sobre o assunto, que leva à exclusão.

            Todos nós temos nossas potencialidades, nossa imaginação, nossa inteligência e não prescindimos de força de vontade, coragem e disposição. Precisamos olhar para o que nos identifica…

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - (…) como pessoas e não para o que nos diferencia.

            Nesse sentido, Presidenta, algumas das maiores necessidades do ser humano são a de encontrar, a de interagir, a de se comunicar, a de ter oportunidade. Não estou falando apenas de necessidade de recurso tecnológico, de acesso aos meios de comunicação e de informação, mas da urgência para vencer os obstáculos íntimos, aqueles limites que trazemos no olhar de um para o outro e para o diverso.

            Estamos sempre numa postura de fechamento em nós mesmos. Normalmente, não atentamos para os que estão ao nosso lado, à nossa volta. Não estamos abertos para aquilo que desafia a nossa noção de padronização que nos ensinaram. Preferimos não ver, não pensar e, dessa forma, deixamos de entrar em contato com o mundo vasto de experiências, de sentimentos, de expectativas, com as fraquezas e as belezas…

(Soa a campinha.)

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - (…) cada um no seu visual do que é bonito.

            Neste um minuto é a última frase. Enfim, espero de coração que esta semana, que está iniciando, seja marcada pelo engajamento dos Parlamentares e da sociedade em geral nessa luta das pessoas com deficiência, que é, de verdade, uma luta de todos nós.

            Srª Presidenta, muito obrigado pela tolerância. Assim, eu fiz na íntegra o pronunciamento, que foi uma forma de estar junto com V. Exa, que propôs que nós déssemos toda a força para a abertura da Semana da Pessoa com Deficiência.

            Um abraço e meus cumprimentos, Srª Presidenta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/09/2013 - Página 63616