Discurso durante a 168ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Indignação com a política do Governo Federal de perdoar dívidas de países ditatoriais; e outro assunto.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Indignação com a política do Governo Federal de perdoar dívidas de países ditatoriais; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 01/10/2013 - Página 67522
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • REPUDIO, POLITICA EXTERNA, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, OFERECIMENTO, PERDÃO, DIVIDA, DITADURA, PAIS ESTRANGEIRO, ZIMBABUE, SENEGAL, GANA, CUBA, SOLICITAÇÃO, MESA DIRETORA, INCLUSÃO, PAUTA, PROJETO DE LEI, DISCUSSÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO.
  • CRITICA, NOMEAÇÃO, CARGO PUBLICO, DIREÇÃO, AGENCIA REGULADORA, CRITERIOS, POLITICA, DEFESA, NECESSIDADE, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, SERVIDOR ESTAVEL, CARGO DE DIREÇÃO, ENFASE, AUSENCIA, COMPETENCIA, AGENCIA NACIONAL DE TRANSPORTES AQUAVIARIOS (ANTAQ), REFERENCIA, DIFICULDADE, CONSTRUÇÃO, PORTO, ESTADO DO PARANA (PR).

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Obrigado.

            Presidente Suplicy; Srs. Senadores, Srªs Senadoras, por diversas vezes, nós nos manifestamos indignados com a política adotada pelo Governo brasileiro de concessão de benefícios a ditaduras mundo afora.

            Há pouco tempo, debatemos, na Comissão de Assuntos Econômicos, o perdão de dívida a países africanos envolvidos com regimes autoritários - autoritários e corruptos, alguns deles. A nossa rejeição, portanto, a essa política adotada pelo Governo brasileiro é reiterada.

            Hoje, eu gostaria de usar a tribuna do Senado Federal - e o estou fazendo - para repudiar a abertura de uma linha de crédito de US$98 milhões do BNDES ao governo do ditador Robert Mugabe, do Zimbábue. Os recursos serão direcionados para compra de equipamentos agrícolas - tratores, máquinas, material de irrigação e terraplanagem.

            Nós não podemos esquecer que o Sr. Mugabe, no poder já há 33 anos, tomou posse agora, outra vez, no dia 22 de agosto, para um sétimo mandato como presidente daquele país africano. Vejam os senhores: 33 anos de ditadura! Os observadores enviados pela União Africana para acompanhar a eleição apontaram várias irregularidades, mas o fato é que o ditador está no poder.

            Nós queremos lamentar profundamente. Eu creio que seria a preliminar indispensável verificar o regime imposto a populações como essas da África do Sul.

            O BNDES também abriu linha de crédito para o Senegal (US$95 milhões), para Gana (US$95 milhões) e para Cuba (US$210 milhões).

            É uma contradição inaceitável, Sr. Presidente, anistiar dívidas de alguns países, enquanto a população brasileira é obrigada a amargar a má qualidade de serviços essenciais, como saúde, educação, transporte, infraestrutura e segurança pública.

            Nós lamentamos, mais uma vez, porque já o fizemos em outras oportunidades.

            Não se trata de fazer cortesia com o chapéu do povo brasileiro ao se perdoarem essas dívidas para abrir perspectivas de novas concessões, de novos empréstimos através do BNDES, mesmo que seja a pretexto de exportar tecnologia?

            Há um projeto de resolução de autoria do Senador Pedro Taques, cujo Relator foi o Senador Aloysio Nunes, já aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos e que aguarda inclusão na Ordem do Dia. Esse projeto foi consequência desse debate, o debate que travamos naquela Comissão em razão do perdão de dívidas de países africanos envolvidos em regimes autoritários e com governos corruptos como naquela oportunidade destacamos.

            Esse projeto, que aguarda inclusão na Ordem do Dia, estabelece como pré-requisito da renegociação de dívidas externas, das quais o Brasil é credor, a qualidade da democracia e da governança do país tomador do empréstimo. Nada mais justo. Não creio que seja adequado a um país democrático fortalecer economicamente um país autoritário, um país que esmaga a sua população com um regime prepotente e, sobretudo, corrupto, como verificamos em várias oportunidades já no debate que travamos sobre o perdão dessas dívidas.

            Nós estamos solicitando, portanto, à Mesa do Senado Federal a inclusão na pauta do Projeto 43, de 2013, que estabelece esse pré-requisito que nós consideramos fundamental. Que regime vigora no país beneficiado? É democracia? E qual a qualidade desse regime democrático? Evidentemente, nós esperamos que o Senado Federal adote uma postura, sobretudo em defesa das tradições democráticas do nosso povo.

            Eu gostaria também de aproveitar esta segunda-feira, Sr. Presidente, em que há muita concessão em relação ao tempo dos oradores, para trazer à tribuna um tema que também é recorrente. Não adianta atrair investidores para a infraestrutura no nosso País se não dispusermos de agências reguladoras capazes de monitorar com eficácia as atividades empresariais respectivas, coibindo práticas incompatíveis, anticompetitivas, exigindo qualidade na prestação do serviço e o cumprimento dos cronogramas de investimentos.

            O que se observa é a ampla politização nas nomeações para essas agências. Pessoas ligadas a partidos políticos são nomeadas para a direção das agências com alta probabilidade de acabarem servindo a interesses privados em vez de buscarem o bem-estar dos consumidores.

            Não se observa qualquer movimento no sentido de blindar as agências e torná-las politicamente independentes. Funcionam, muitas vezes, como simples braços operacionais dos ministérios setoriais. Não raro seus cargos de direção ficam vagos por meses, impedindo que decisões colegiadas sejam tomadas. É o caso da Antaq. Esta Casa rejeitou a indicação do nome sugerido pela Presidência da República para a Antaq. Pois bem, a Presidente Dilma utilizou-se do expediente do decreto para nomear interinamente outros nomes. Já decorreram meses. Não sei há quanto tempo o Senado rejeitou o nome indicado. Já há um bom tempo houve essa rejeição. E, desde então, há interinidade. Os nomes foram indicados pela Presidente.

            Consta que há um nome, sugerido pela Presidência da República, que se encontra em uma das comissões da Casa e que está, simplesmente, em uma espécie de geladeira. Não há deliberação sobre esse nome por razões de natureza política. Portanto, não cremos que as agências reguladoras tenham sido instituídas, há algum tempo, há vários anos, no governo de Fernando Henrique Cardoso, para que elas pudessem ser utilizadas politicamente, para que fossem aparelhadas, como estão aparelhadas hoje.

            Vou trazer um exemplo da consequência disso, um episódio que ocorre no Paraná, no âmbito da atuação da Antaq. A Porto Pontal Paraná Importação e Exportação Ltda. é signatária do contrato de adesão do Ministério dos Transportes nº 47, de 31 de dezembro de 1996. Prestem atenção: é de dezembro de 1996!

            Tal contrato tem por objeto a outorga de autorização a Porto Pontal para construção e exploração de Terminal Portuário de Uso Privado Misto no Município de Pontal do Sul, no Estado do Paraná.

            Após procedimento de fiscalização, realizado pela equipe da Antaq, em julho de 2007 - ou seja, passados mais de 10 anos -, foi constatado que o empreendimento possuía uma série de pendências que impediam o início de suas operações. Assim, através de decisão proferida pela diretoria colegiada da Antaq, foi determinado o início de tratativas, visando à celebração de um termo de ajuste de conduta com a Porto Pontal, a fim de que fossem fixados prazos para regular a implantação do Terminal.

            Peço a atenção da Assessoria Parlamentar da Antaq, para que transmita essa nossa cobrança. Estamos pedindo informações sobre esse episódio. Creio que devo satisfação ao Paraná, especialmente ao Município de Pontal, e gostaria que a Antaq pudesse me oferecer as informações para que as transmita ao povo do Paraná.

            Nesse itinerário, em 25 de março de 2009, foi firmado o Termo de Ajuste de Conduta n° 3, tendo a Porto Pontal assumido o compromisso de regularizar a implantação do Terminal, conforme estabelecido na norma aprovada pela Resolução 517, da Antaq, no prazo de 24 meses.

            Não bastasse a atípica situação instituída pelo TAC, supracitada, de prorrogar, passados mais de 13 anos sem que a Porto Pontal tivesse, de fato, iniciado a implantação do terminal que lhe foi autorizado, por mais dois anos, o cumprimento dessas obrigações, fato é que a Porto Pontal não cumpriu com os termos ajustados. Significa dizer: mesmo com estas infindáveis prorrogações, não houve o efetivo e integral cumprimento das obrigações assumidas.

            Agora, mesmo com a inusitada situação de passados quase 17 anos desde a celebração do contrato de adesão - veja que estamos nos referindo a um horizonte temporal de 17 anos, não são poucos dias, não são poucas semanas, não são poucos meses; são 17 anos desse contrato de adesão -, o projeto não entrou em operação. Diante de um novo marco regulatório instituído pela Lei 12.815, deste ano, a Antaq pretende, sob o manto de adaptar a autorização concedida, permitir à Porto Pontal a realização da construção e exploração de uma operação muito diferente daquela originalmente outorgada - pelo menos é o que pretendeu fazer através da decisão colegiada proferida na reunião ordinária.

            Sr. Presidente, eu gostaria que a Antaq prestasse informações sobre isso. É verdade isso que estamos relatando da tribuna do Senado Federal ou há algum questionamento a fazer a respeito da veracidade desses fatos? É essa a história real desses 17 anos de omissão? Nós queremos que a Antaq possa nos responder.

            Sem adentrar o mérito do tema, a simples narrativa fática acima já dimensiona a pouco usual maneira com que a Agência tem tratado, para dizer o menos, o descumprimento contratual perpetrado por essa empresa. Não sei se a Antaq existe exatamente para isso.

            Reitere-se: passaram-se 17 anos sem que a empresa conseguisse, de fato, dar início à implantação do projeto com que se obrigou em 1996. Agora, diante de um novo marco regulatório, essa mesma Agência pretende agraciar a empresa inadimplente com a outorga de uma autorização absolutamente descolada da realidade posta no contrato original. A ilegalidade é ostensiva! Além da ilegalidade apontada, há um prêmio à inadimplência, ao descumprimento de contrato. Exige-se muito, no Brasil, cumprimento de contratos, e essa exigência sempre é dirigida ao poder público, que há de cumprir sempre os contratos celebrados. Mas cabe ao poder público também exigir que se cumpram os contratos que são celebrados com ele. E esse é o caso.

            O artigo 59 da Lei 12.815, utilizado como norma autorizadora da adaptação pretendida pela Antaq, preceitua:

As instalações portuárias enumeradas nos incisos I a IV do caput do art. 8º, localizadas dentro da área do porto organizado, terão assegurada a continuidade das suas atividades, desde que realizada a adaptação nos termos do art. 58.

            Como já afirmamos, a Porto Pontal nunca conseguiu, de fato, dar início à implantação do projeto com que se obrigou em 1996. Logo, não poderá o dispositivo legal mencionado dar guarida à sua pretensão pelo simples fato de que não se está diante da "continuidade das suas atividades". Em síntese: não há como garantir-se a continuidade de algo que nunca se iniciou.

            Por fim, mas não menos importante, ressaltamos que a decisão da diretoria da Antaq foi tomada por diretores "em regime de substituição" e em detrimento de outros votos que já haviam sido declarados por diretores que acabaram sendo exonerados. Tal procedimento, por um lado, fere a racionalidade das decisões colegiadas da Antaq e, por outro, afasta a garantia de autonomia e independência dos diretores de agências reguladoras.

            Sr. Presidente, fica a impressão de ter havido um lóbi poderosíssimo envolvendo a Antaq. Isso é preciso ser esclarecido. Por que essa mudança de votos? Diretores votaram de uma forma; eles foram exonerados de suas funções; e outros, votaram de forma diferente. Mas já não havia um processo de votação em curso para que essa alteração pudesse ser promovida? Nós precisamos entender isso. E nós não queremos de forma alguma nos precipitar acusando, denunciando. Nós queremos informações, nós queremos esclarecimentos. É isso que estamos pedindo da tribuna do Senado Federal.

            Há uma sombra pairando sobre um processo absolutamente atípico na esfera de uma agência reguladora, nesse caso, a Antaq.

            Este episódio, esta história chegou ao nosso conhecimento. E aquelas que não chegam até nós? Seria só este fato? Este fato isolado? Creio que não. É importante destacar que as agências reguladoras foram aparelhadas ao longo dos últimos anos a exemplo do que ocorre com a Administração Direta e Indireta.

            Este aparelhamento do Estado brasileiro com o loteamento de funções, de cargos e de recursos públicos estabelece uma relação de promiscuidade do Poder Executivo com a classe política de modo geral, já que há presença dos partidos políticos na indicação dos integrantes destes órgãos de toda a área administrativa direta e indireta do Governo Federal.

            Portanto, Sr. Presidente, é mais um fato, é mais um relato, é mais um indício de irregularidade, e nós estamos, inicialmente, pedindo esclarecimentos. Vamos aguardar os esclarecimentos para que, eventualmente, possamos voltar ao assunto e pedir providências efetivas.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/10/2013 - Página 67522