Discurso durante a 192ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Governo Federal por pretender financiar exportações à Venezuela com o Proex.

Autor
Paulo Bauer (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Paulo Roberto Bauer
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR.:
  • Críticas ao Governo Federal por pretender financiar exportações à Venezuela com o Proex.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2013 - Página 77073
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, PRETENSÃO, FINANCIAMENTO, EXPORTAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, TESOURO NACIONAL, FALTA, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAGAMENTO, EMPRESA NACIONAL.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Angela Portela, é um grande prazer poder conversar com V. Exªs, Senadores e Senadoras presentes, apresentando neste meu pronunciamento informações que considero muito importantes para o Brasil e para o momento em que nos encontramos.

            No próximo dia 11 de novembro, o Parlamento do Mercosul se reunirá em Montevidéu para, em sessão plenária, instalar os trabalhos de mais um período legislativo. Na qualidade de vice-presidente da Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, estarei presente, juntamente com outros colegas Parlamentares que representam nosso País no Parlasul.

            Essa sessão plenária está atraindo particular atenção, pois será a primeira desde a admissão da República Bolivariana da Venezuela como membro do Mercosul. Lamentavelmente, a Venezuela fará sua estreia no Parlasul já devendo explicações, Senador Mário Couto.

            Matéria da Folha de S.Paulo, publicada anteontem, trouxe novamente à tona a inadmissível questão dos débitos venezuelanos junto aos exportadores brasileiros. É verdade. Empresas brasileiras que foram estimuladas pelo Governo Federal a aumentar suas exportações para a Venezuela estão tendo dificuldades para receber o pagamento pelos produtos que fornecem. Os atrasos chegam a quatro meses, segundo apurou a reportagem da Folha de S.Paulo.

            A culpa, Senador Wellington Dias, ao contrário do que se pode pensar, não é das empresas importadoras venezuelanas. É o governo da Venezuela que impede o pagamento às empresas brasileiras, para conter a saída de dólares do país.

            As regras comerciais na Venezuela são diferentes daquelas empregadas no Brasil e na maior parte do mundo. Vou exemplificar: quando uma empresa brasileira compra produtos importados, ela faz o pagamento em dólares diretamente ao fornecedor estrangeiro, ao fornecedor da mercadoria; ou seja, a empresa brasileira usa o seu dinheiro, os seus reais, para comprar dólares, oficialmente, e paga diretamente ao seu fornecedor. Na Venezuela, não é assim. Quando uma empresa venezuelana compra produtos brasileiros, por exemplo, ela não pode fazer o pagamento em dólares diretamente ao fornecedor, é obrigada a depositar o pagamento em bolívares no Banco Central boliviano, em um órgão chamado Cadivi - Comissão de Administração de Divisas. É esse órgão, Senador Aloysio Nunes Ferreira, o Cadivi, que repassa o pagamento em dólares para o fornecedor brasileiro. No entanto, para preservar as reservas cambiais venezuelanas, o Cadivi segura, por vários meses, o pagamento, trazendo graves prejuízos para as empresas exportadoras brasileiras, aquelas que empregam gente brasileira, aquelas que fazem o nosso País crescer. Imaginem V. Exªs o impacto para o fluxo de caixa de uma empresa de levar até quatro meses para receber cada pagamento devido.

            Os calotes - e acho que é justo que se chame assim - do regime chavista não são novidade. Lá atrás, no dia 9 de dezembro de 2011, a revista Istoé Dinheiro trazia a seguinte manchete:

O Calote de Chávez.

Política de câmbio centralizado do governo da Venezuela, regula liberação de dólares e deixa importadores sem divisas para pagar fornecedores brasileiros. Boticário, Dudalina, Alpargatas e Picadilly são algumas das companhias que estão na fila para receber.

            Naquele momento, os atrasos estavam concentrados nos setores que a Venezuela considerava “semiprioritários”, como confecções e calçados. O Governo brasileiro, ideologicamente alinhado ao regime de Hugo Chávez, fechava os olhos para o problema. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio afirmou à revista, na época, desconhecer a questão.

            No ano seguinte, o problema se agravou. No dia 14 de dezembro de 2012, o jornal Brasil Econômico estampou a seguinte manchete - abro aspas novamente: "Exportadores não recebem por vendas à Venezuela - novo membro do Mercosul atrasa pagamento de empresas brasileiras. Órgão que controla o câmbio veta as divisas" - fecha aspas.

            Na matéria, as mesmas queixas e também a notícia de que os calotes estavam também afetando os exportadores brasileiros de autopeças e do setor de carnes.

            De lá para cá, a situação degringolou. Os calotes da Venezuela já atingem até mesmo os exportadores brasileiros de grãos, que estão sendo cada vez mais importados por aquele país, dada a crise de abastecimento que a Venezuela atravessa.

            A grande novidade da recente matéria da Folha de S. Paulo foi a informação de que o Ministro Fernando Pimentel e o assessor Marco Aurélio Garcia estiveram, semana passada, na Venezuela para tratar do assunto.

            Segundo a Folha, oficialmente, a missão brasileira teve como objetivo reforçar a disposição brasileira de ajudar o parceiro comercial a superar sua crise de abastecimento, mas os pagamentos atrasados foram um dos temas principais, Senador Clésio Andrade.

            Hoje, o jornal Valor Econômico publicou uma matéria esclarecedora. O título - abro aspas: "Brasil quer financiar exportação à Venezuela para driblar atrasos" - fecho aspas.

            Segundo o jornal Valor Econômico apurou, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio do Brasil quer utilizar recursos do Proex - Programa de Financiamento às Exportações para financiar as exportações brasileiras à Venezuela.

            Deve-se fazer uma observação. O Proex existe para financiar exportações que ainda vão ser feitas. Ele não pode ser utilizado para exportações já feitas, porque as já feitas estão incluídas em um outro sistema, em outra prática comercial. 

            Pelo modelo proposto, a Venezuela tomaria empréstimos do Banco do Brasil para pagar os exportadores brasileiros e, depois, quitaria a dívida de forma parcelada.

            Isso é incrível! Mais uma jabuticaba brasileira, Senador Mário Couto! Mais uma jabuticaba!

            Pelos planos do Governo Federal, a Venezuela deixaria de dever às empresas brasileiras e passaria a dever a todo o povo brasileiro. Sim, porque os recursos do Proex saem do Tesouro Nacional, é dinheiro dos impostos que nós, brasileiros, pagamos, mensalmente, diariamente.

            Notem bem, Srªs e Srs. Senadores, a que ponto chega o alinhamento ideológico do Governo brasileiro com o regime chavista, que ainda perdura na Venezuela, mesmo após a morte de Hugo Chávez. Primeiro, o Brasil declara total apoio à Venezuela em sua crise de abastecimento e, depois, passa a financiar o consumo dos venezuelanos.

            Pensem bem: se o governo venezuelano já não paga o que deve quando os credores são os exportadores brasileiros, será que vai passar a pagar quando o credor for o Tesouro Nacional do Brasil? Obviamente que não.

            As empresas brasileiras, quando não recebem o que é devido, reclamam, pressionam, insistem. Será que o Tesouro Nacional, que é gerido pelo Governo Federal, vai reclamar, quando ele for o credor e o débito não for pago? O mais provável é que a Venezuela atrase ainda mais os pagamentos, e o Governo brasileiro faça vista grossa. O mais provável e que essa conta só seja cobrada no dia em que os chavistas deixarem o poder, se é que isso vai acontecer.

            O regime destruiu a economia da Venezuela, levou o país a uma crise absoluta de abastecimento, e agora conta com a mão amiga do Governo brasileiro para sobreviver - para o regime sobreviver, que fique bem claro!

            Não pensem, Srªs e Srs. Senadores, que o Brasil estará ajudando o povo venezuelano, ao pagar a conta pelo consumo deles. O Brasil estará, na verdade, prejudicando o povo venezuelano, pois estará ajudando a dar sobrevida a um regime que, para se manter no poder, posterga um inevitável ajuste em seu modelo econômico.

            Vamos acompanhar com muita atenção o desenrolar dessa idéia do Governo brasileiro de financiar o calote da Venezuela. Certamente isso resolveria o problema dos exportadores brasileiros, mas criaria novos problemas para o Brasil.

            Nós já tomamos um calote da Venezuela...

(Interrupção do som.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - A estatal venezuelana do petróleo não pôs um tostão na obra até hoje. Agora, ficou o dito pelo não dito. A Petrobras incorporou a parte que caberia à Pedevesa, e ficamos com um mico, pois a refinaria foi construída para o petróleo pesado venezuelano, e não para o petróleo leve extraído no Brasil.

            A idéia de cobrar do governo venezuelano o que ele deve nem passou pela cabeça do Governo brasileiro, e, agora, o Governo brasileiro quer criar uma nova dívida da Venezuela para com o Brasil.

            Na semana que vem, Senador Roberto Requião, teremos uma reunião na Comissão Mista de Representação do Parlamento Brasileiro no Mercosul. Eu irei apresentar um requerimento para a convocação do Ministro Pimentel, para que ele relate os resultados de sua recente missão oficial à Venezuela e esclareça seus planos de usar recursos do Proex, do Tesouro Nacional, para pagar essa pendência venezuelana com as empresas brasileiras.

            O Brasil não pode criar subterfúgios para manter a relação com a Venezuela. Nós precisamos exigir que ela se comporte como uma verdadeira parceira comercial: com lealdade e respeito aos contratos. O foro adequado para isso é o Mercosul . A Venezuela faz parte do bloco - isso é fato consumado, ninguém mais discute. Precisamos cobrar dela respeito às regras.

            Vejo que o Senador Suplicy me pede um aparte.

            Com prazer, ouço V. Exª

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Prezado Senador Paulo Bauer, avalio que a oportunidade da reunião dos Parlamentares do Mercosul, programada, como V. Exª mencionou, para os dias 11 e 12, em Montevidéu, é uma oportunidade até para que os representantes do Brasil, da Venezuela e de outros países possam dialogar a respeito da problemática que V. Exª aqui coloca, porque é natural que ali possam os Senadores brasileiros expressar o quão importante é que a Venezuela cumpra os compromissos assumidos pelo governo venezuelano e pelas empresas venezuelanas que fizeram parceria com a Petrobras e com empresas brasileiras. Então, eu quero dizer que, inclusive, estou programado, fui convidado para ser um dos representantes do Senado e, no dia 11, deverei estar lá. Acho que é importante esse tema, sim. Mas eu gostaria também de cumprimentá-lo, como Presidente do Grupo Parlamentar de Amizade Suíça-Brasil, por ter trazido aqui, hoje, cinco Senadores da Suíça. Tivemos um diálogo muito interessante com eles. Inclusive eu próprio conversei com o Senador Hannes Germann, juntamente com V. Exª, e conversei com eles, os cinco Senadores, sobre algo tão relevante que vai ocorrer ali na Suíça. No dia 4 de outubro último, 116 mil cidadãos suíços entregaram uma solicitação ao Parlamento. Quando mais de cem mil fazem isso na Suíça - o objeto da petição, no caso, é para que se realize em referendo sobre se a Suíça vai adotar ou não uma renda básica incondicional para todos os seus cidadãos -, isso deve ser objeto de um referendo, após debate organizado pelo Parlamento e por toda a população suíça, dentro dos próximos quatro anos. Trata-se de um exemplo - a hora do plebiscito, do referendo - que nós temos na Constituição, mas não praticamos tão frequentemente como os suíços o fazem. Então, é importante essa interação, para que aprendamos mais com os colegas Senadores da Suíça. Meus cumprimentos também por V. Exª ter organizado um encontro com eles.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Muito obrigado, Senador Suplicy. Acolho o aparte de V. Exª e o incorporo ao meu pronunciamento.

            E concluo, dizendo que esperamos, sem dúvida nenhuma, que, no dia 11 e 12, lá em Montevidéu, possamos discutir com os novos integrantes do Parlasul, que representam a Venezuela, de que forma é possível não apenas liquidar a pendência existente, mas também estabelecer mecanismos de avanço nas negociações, no comércio bilateral entre o Brasil e a Venezuela. Afinal, não há nenhum preconceito em vender à Venezuela, não há nenhum preconceito em financiar vendas a outros países, absolutamente. O Brasil tem mecanismos para isso e os pratica em larga escala, há muito tempo, e não precisa, nem vai ser diferente em relação à Venezuela. Porém, o que não podemos concordar...

            (Soa a campainha.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - ...é que o negócio seja feito de uma forma e por uma regra e, depois, o pagamento seja feito por outra forma e por outra regra.

            Portanto, esperamos que, naqueles dias, tenhamos condições, Presidente Sarney, de tratar do assunto em nível de Parlamento do Mercosul com nossos colegas venezuelanos, defendendo os interesses do Brasil e principalmente das empresas brasileiras que se encontram em dificuldades muito sérias por não poderem receber o que lhes é devido pela venda realizada.

            Consulto o Senador Requião e o Senador Sarney se desejam fazer um aparte.

            Então, Senador Requião, por gentileza, V. Exª tem a palavra.

            O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Senador Paulo Bauer, na verdade, essa pendência de empresários brasileiros com a Venezuela me intriga. Acho muito importante sabermos o que realmente existe: se existe a dívida; se não pagam aos empresários brasileiros, por que não o fazem; qual é a posição deles. Nós, hoje, que temos uma reserva cambial de cerca de US$350 a US$370 bilhões, não temos a metade da reserva cambial em dólar da Venezuela. O problema do governo venezuelano não é a falta de dinheiro.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Então, quero louvar sua atitude, sem prejuízo algum a respeito do que possa estar ocorrendo, sem juízo algum. Vamos esclarecer o que realmente ocorre, inclusive a desistência da Venezuela em participar da Usina de Pernambuco. Acho muito interessante que esclareçamos isso. E, para isso, serve o Mercosul. Vamos conversar com os Parlamentares, porque o interesse deles na defesa do seu país é igual ao nosso na defesa do Brasil, e existe um interesse comum, que é o fortalecimento do mercado do Mercosul. Parabéns pela iniciativa.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Agradeço a V. Exª.

            Volto a registrar: a minha preocupação primeira é com as empresas brasileiras que, estimuladas, fizeram negócios de exportação para as empresas venezuelanas, que, segundo se sabe, teriam feito o pagamento ao governo daquele país. E o governo daquele país é que não providencia o repasse dos dólares, dos valores devidos, para as empresas brasileiras.

            Essa é uma questão que efetivamente merece e precisa ser analisada com muito cuidado, com muito critério, não apenas pelo Poder Executivo, que já se manifestou e procurou informações a respeito, mas também pelo Parlamento do Mercosul, que todos nós integramos como representantes desta Casa.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2013 - Página 77073