Pela ordem durante a 170ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a Mobilização Nacional Indígena.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela ordem
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS, POLITICA INDIGENISTA.:
  • Comentários sobre a Mobilização Nacional Indígena.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2013 - Página 68721
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS, POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, MOBILIZAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, REFERENCIA, DEFESA, DIREITOS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REPUDIO, IMPEDIMENTO, PRESENÇA, GRUPO INDIGENA, LOCAL, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, SENADO, CRITICA, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, AUTORIZAÇÃO, EXPLORAÇÃO, ATIVIDADE ECONOMICA, TERRAS INDIGENAS.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, solicito a V. Exª que divulgue nos meios de comunicação do Senado o meu discurso, que gostaria de dar como lido e que se chama “Mobilização nacional indígena e ofensiva anti-indígena”.

            Vou passá-lo à Mesa, para que seja divulgado nos meios de comunicação do Senado.

            Muito obrigado.

 

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR JOÃO CAPIBERIBE

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os povos indígenas se mobilizam por seus direitos em todo o País. A Mobilização Nacional Indígena promove manifestações em várias cidades do País. Hoje, a manifestação está sendo realizada em frente ao Congresso Nacional. A mobilização, convocada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), defende os direitos indígenas previstos na Constituição e protesta contra a ofensiva anti-indígena promovida pela bancada ruralista associada às grandes empresas de mineração, de energia e de insumos agrícolas.

            Hoje, pela manhã, 70 lideranças indígenas, convidadas pela Comissão de Direitos Humanos do Senado, para debater, em audiência pública, os 25 anos da Constituição, com foco em conquistas indígenas e ameaças de retrocesso, foram impedidas de entrar nas dependências dessa Casa. Foi necessária a intervenção da Presidente da Comissão, Senadora Ana Rita, e a minha, junto ao Presidente do Senado para garantir a entrada dos indígenas convidados para o debate. Eu nunca havia presenciado situação tão constrangedora.

            Repudio veementemente essa atitude do Senado de impedir a entrada dos companheiros indígenas na casa dita do povo. Vergonhoso! Esse fato é uma demonstração que vivemos em uma democracia precária, onde os direitos dos povos indígenas assegurados pela Constituição Federal, ainda são desrespeitados, como se ainda vivêssemos no Brasil Colônia, Essa é uma verdade nua e crua que nos obriga a reivindicar uma total reestruturação do Pacto Federativo do nosso País.

            Na verdade, nós estamos assistindo como os representantes dos ruralistas intensificam as ações contra os direitos dos povos indígenas. A ofensiva é feita diretamente no campo, com o aumento dos níveis de violência e também alcança o Judiciário, o Legislativo e o Executivo.

            Evidentemente que essa nova conjuntura não é estranha ao fato de que os ruralistas estão cada vez mais organizados e que o preço das terras agrícolas está em alta. Tampouco não é estranha ao fato de que a atividade primária assumiu uma posição de destaque no nosso PIB e na pauta de exportações. A participação de nossos produtos industriais tem diminuído sua importância relativa a cada ano, tanto no mercado interno, quanto no externo.

            A ofensiva do setor ruralista brasileiro também não pode ser dissociada das previsões sombrias da FAO, órgão que pensa o futuro da agricultura mundial a médio e longo prazo. Segundo estudos, a demanda por alimentos por parte da população mundial será superior à capacidade de produção atual, conseqüência do aumento da renda, bem como da população.

            Ora, como também sabemos, o Brasil - que já é uma potência agrícola » é um dos poucos países com possibilidades de aumentar de maneira significativa a produção agrícola nesse quadro de futura escassez alimentar. Claro que os representantes dos ruralistas sabem disso e essa é mais uma das razões dessa investida contra os direitos dos indígenas.

            Evidentemente, que o Brasil deve aumentar a sua presença no mercado agrícola mundial Mas, isso não pode ser feito em detrimento das populações indígenas, nem tampouco da degradação do meio ambiente, através do desmatamento de nossas florestas, de nosso cerrado, de nossa biodiversidade, de nossos recursos naturais, fauna, flora, solos, água, entre outros. Temos que criar um novo modelo de povoamento e ocupação das nossas fronteiras agrícolas diferentes do que ocorreu até hoje. Há que considerar que o que está em curso é uma crise econômica somada a uma crise ecológica. Sim, somos uma potência agrícola, mas também devemos ser uma potência ecológica. Uma agricultura ecológica intensificada é possível. Esse é o desafio para esse século. O primeiro relatório do IPCC, Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, publicado na sexta-feira última, nos indica esse caminho.

            No entanto, a escalada contra dos direitos dos povos indígenas no Legislativo pode ser avaliada através de inúmeros projetos de lei, como por exemplo:

            - o Projeto de Lei 1610/1996 que abre as terras indígenas para a mineração por não índios;

            - o Projeto de Lei Complementar 227/2012 que igualmente abre as terras indígenas para quaisquer atividades econômicas por não índios por interesse da União;

            - a PEC 237/2013 que legaliza o arrendamento das terras da União ocupadas pelos índios para o agronegócio

            - a PEC 215/2000 que transfere para o Congresso Nacional a competência para a homologação e demarcação de Terras Indígenas, apesar de inconstitucional, como foi amplamente demonstrado pelo eminente jurista, Professor Dalmo Dallari.

            E como mais um exemplo dessa ofensiva, no mês passado a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP) foi destituída da relatoria do projeto que cria o Conselho Nacional de Política Indigenista, pelo Presidente da Comissão da Amazônia, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS). Diante dessa atitude a deputada renunciou a sua vaga neste colegiado.

            O deputado Jerônimo Goergen lamentou a decisão de Janete Capiberibe em abandonar a Comissão da Amazônia afirmando: "o que há na comissão é uma maioria que entende ser necessária uma reavaliação da política indigenista, que já há terra demais para esses povos. Agora, interpretamos também que as ONGs e a FUNAI também defendem interesses econômicos e internacionais".

            Ao proferir essas palavras, o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) se revelou um portador das teses anti-indígenas propaladas pelos ruralistas. Essas teses equivocadas e preconceituosas foram muito bem expostas por Cleber Buzatto, Secretário Executivo do Cimi, em excelente artigo publicado no Portal Ecodebate, intitulado "Desvelando falácias em teses anti-indígenas do latifúndio no Brasil. Vejamos algumas dessas teses.

            A primeira tese afirma que as internacionais. Com esta tese, os ruralistas desqualificam a luta dos povos indígenas pelos seus territórios. Ao mesmo tempo encobrem o fato visível de que é o próprio agronegócio que serve aos interesses internacionais. Ora, tanto a produção de sementes, máquinas agrícolas, adubos químicos e agrotóxicos, quanto a industrialização, a comercialização e exportação são controladas por empresas multinacionais, que enviam os altos lucros fora do Brasil, como por exemplo: Monsanto, Archer, Cargil, New Hoiland, Bunge, Bayer, Basf, Syngenta, Louis Dreyfus, Shell, Fiat, etc.

            A outra tese afirma que indígenas são manipulados por ONGs, Cimi e CPT. Com isso, visam não apenas deslegitimar a luta e o direito dos povos, como criminalizar organizações e pessoas que lhes apoiam.

            Uma terceira tese anti-indígena afirma que a demarcação de terras deve ser aprovada pelo Congresso Nacional por este representar o povo brasileiro No entanto, a representação ruralista é a mais desequilibrada, pois representa menos de 0,3% da população brasileira, mas é representada por cerca de 40% dos deputados federais.

            A quarta tese sustenta que muita terra para pouco índio no Brasil. Ora, desconsideram o fato de que 98,47% da extensão de todas as terras indígenas demarcadas estão localizados na Amazônia brasileira e apenas 1,53% localizam-se nas regiões Nordeste, Sudeste, Sul e estado do Mato Grosso do Sul.

            Como amazônida, eu concluo que o objetivo dos ruralistas é atacar o bioma amazônico, arrasar a maior floresta do planeta, em nome do lucro. Além do mais, volto a afirmar que quando dizem que "há muita terra para poucos índios" - um contingente de quase 900 mil índios no país -, escondem o fato de que, na realidade, há muita terra para poucos latifundiários. Basta verificar no IBGE que 50 mil estabelecimentos agrícolas do país possuem mais da metade da superfície agrícola do país. Um único proprietário pode ter vários estabelecimentos. Ou seja, um número vinte vezes inferior ao número de indígenas.

            Índios do Brasil, de muitas etnias, irmãos: vocês são bem vindos a essa Casa. Seguiremos juntos na luta contra os projetos anti indígenas tramitam no Congresso nacional, que fragilizam seus territórios e os deixam à mercê dos ruralistas. No que depender de mim e do meu mandato, ruralistas e coronéis: não passarão!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2013 - Página 68721