Discurso durante a 188ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da política como o único meio para a superação de problemas que afligem a população e reflexões acerca do atual contexto de crise de representatividade.

Autor
Ruben Figueiró (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Ruben Figueiró de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA NACIONAL, ATIVIDADE POLITICA, POLITICA PARTIDARIA.:
  • Defesa da política como o único meio para a superação de problemas que afligem a população e reflexões acerca do atual contexto de crise de representatividade.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 26/10/2013 - Página 76160
Assunto
Outros > POLITICA NACIONAL, ATIVIDADE POLITICA, POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • DEFESA, EXCLUSIVIDADE, POLITICA, DEMOCRACIA, FORMA, ALCANCE, BEM ESTAR SOCIAL, COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, POPULAÇÃO, BRASIL, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, REGISTRO, PRESENÇA, ORADOR, ENCONTRO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), DIRETORIA DE ENGENHARIA DA MARINHA (DEM), PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS), MUNICIPIO, AQUIDAUANA (MS), MINISTERIO DA SAUDE (MS).

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu tenho o prazer de estar nesta Casa há mais ou menos dez meses e honro-me muito com a convivência que tenho mantido com V. Exªs.

            Sou de uma época em que o exercício da política era considerado um múnus público. Comecei a militância há muitíssimos anos, talvez há mais de 60 anos. Percorri um longo caminho como militante, defendendo as ideias que conservo até hoje. Nessa trajetória toda, eu sempre discuti como seria feita uma boa política.

            Na convivência que tenho hoje com V. Exªs, observando o quadro político do nosso País, com todas as turbulências que temos presenciado, e também, sinceramente, após a Constituição de 1988, da qual nós, Senador Paulo Paim e Senador Mozarildo Cavalcanti, tivemos o privilégio de participar, contribuindo com o nosso idealismo, tenho a convicção de que, realmente, estamos baseados no Estado democrático de direito, apesar de termos o desprazer de verificar algo que não representa, realmente, o conceito da boa política.

            Foi em razão disso, Senador Paim, que resolvi, nesta manhã de sexta-feira, quando é possível tratar de assuntos com maior profundidade, trazer a V. Exªs, Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti, algumas ideias que sempre, repito, motivaram a minha atuação nas lides públicas. Permitam-me V. Exªs que discorra aqui este meu pensamento.

            Voltando à antiga Grécia, lembro de Aristóteles, que definiu a política como "a arte de interpretação da realidade". Seus ensinamentos balizaram conceitos e ideias que são válidas até os dias de hoje.

            Na medida em que a realidade torna-se mais complexa, a análise política deve ser dotada de instrumentos teóricos adequados para melhor compreender o que se passa em nosso tempo.

            A leitura crítica dos acontecimentos e do movimento da história nos coloca frente a frente com aqueles elementos que transformam a sociedade. Através das ações concretas dos homens e por meio das leis que constituem e consolidam as instituições é que construímos os pilares de uma sociedade próspera e justa .

            A democracia tem sido o canal pelo qual flui a evolução progressiva das principais civilizações. Podemos cada vez mais nos expressar livremente, sem temer as retaliações tirânicas. Podemos debater amplamente os caminhos e descaminhos dos governos, sem que isso possa ser considerado um gesto de subversão.

            A liberdade de expressão e pensamento é um direito universal consagrado. Por isso, acredito que a política é o único caminho que pode levar à superação de problemas que afligem a população. Sem a prática política, não há como resolver as questões de desigualdade, da violência, das carências da educação e da saúde.

            Ou seja, o processo político deve ser essencialmente democrático, para que o exercício da cidadania encontre o estuário das soluções de seus problemas e estabeleça as bases de uma sociedade desenvolvida, lastreada nos direitos humanos e no bem-estar geral.

            Os novos tempos são confusos. E creio que V. Exªs, Senador Paulo Paim e Senador Mozarildo Cavalcanti, também pensam da mesma forma. Cada vez mais, os cidadãos brasileiros questionam a política em sua essência, duvidando que esse seja o instrumento que possa ser utilizado para que possamos superar as adversidades que nos atingem. A política tem se transformado em sinônimo de escândalo, infelizmente digo.

            O homem comum das ruas tem, cada vez mais, rejeitado as instituições democráticas, pois não enxerga nelas força para resolver seus dramas e anseios.

            Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são vistos como castelos inacessíveis. Os partidos políticos enfrentam uma séria crise de representatividade. Há um crescente de críticas ao comportamento do Parlamento. Estamos sendo observados nos mínimos detalhes. Há cobranças contundentes sobre o modelo de funcionamento das instituições.

            Com isso, os Poderes dão a impressão de que suas finalidades estão voltadas para si mesmas. Daí nasce a chamada crise de representatividade e de governabilidade. Os partidos se transformam apenas em siglas partidárias, sem substância programática, sem definição ideológica, não havendo mais quem diferencie atos e palavras, gestos e intenções, vontades e fazeres.

            Assim, Srs. Senadores, a política transforma-se numa massa homogênea, estigmatizada por uma sociedade extremamente carente de agenda e liderança, querendo que tudo se solucione como num passe de mágica, flertando muitas vezes com regimes fortes ou com o populismo autoritário.

            Neste sentido, devemos refletir sobre o significado da boa política, aquela feita com desprendimento de espírito, defendendo as grandes causas, sem oportunismo, com os olhos mais voltados para os verdadeiros valores do espírito público e menos para os ganhos eleitorais.

            Aquela política, Srs. Senadores, feita sem personalismo, mais coletiva e menos individual, mais aberta e menos exclusivista, na qual o desejo da maioria predomine sobre a vontade de uns poucos. Precisamos nos reaproximar desse modus operandi político, revalorizando a política que se preocupa com as grandes causas e menos com os temas paroquiais.

            Neste fim de semana, Sr. Senador Paulo Paim, lia nas páginas amarelas da revista Veja uma entrevista com o cientista político Francis Fukuyama em que ele alerta para as fragilidades da democracia brasileira, ao mesmo tempo em que o ex-Presidente Lula observa o abandono da militância do PT, Partido de V. Exª, Senador Paulo Paim, pelas formas de luta espontânea que caracterizou o Partido antes da chegada ao poder.

            São duas observações feitas por pessoas de campos de pensamento diferentes que olham o fenômeno pelo mesmo prisma. Creio que, neste sentido, muitos de nós aqui nesta Casa enxergamos esses fatos da mesma forma, talvez apenas divergindo nos detalhes.

            Temos observado uma diluição do interesse pela política como elemento necessário para o fortalecimento dos valores da cidadania. O que vemos nas ruas é uma gradual substituição de manifestações democráticas e ordeiras para uma violência de moldes fascistas, em que o desejo de destruir é sempre maior do que o de construir.

            O quadro é extremamente preocupante, Srs. Senadores. A crítica democrática, aberta, marcada pela tolerância de ouvir o outro, está sendo substituída pelo insulto, pelo vandalismo, pela força destruidora de poucos, que afastam a maioria e estigmatizam a política como espaço de degradação das relações humanas. Política não é vale-tudo. Política é convergência, entendimento, busca incessante do bem comum.

            Os equívocos se propagam nas redes sociais e formam um caldo de cultura que indica que há um mal-estar geral tomando conta da sociedade. Algo precisa ser feito para mudar essa desorientação.

           Quero destacar aqui, Excelências, neste Plenário, que podemos fazer um grande esforço de convergência rumo à divulgação das vantagens do exercício da boa política, aquela feita sob os pressupostos da transparência, da ética, do republicanismo, afastando o ranço e a crítica fácil de que todos são farinha do mesmo saco.

           Neste fim de semana, por exemplo, em Mato Grosso do Sul, participei de um encontro pluripartidário promovido pelo PSDB, meu Partido, no Município de Aquidauana, em que pude presenciar um exemplo da boa política colocada em prática.

           Na ocasião, pudemos ver Lideranças do PSDB, do PT, do PDT, do DEM, do PPS e do PROS discutirem com forças vivas da sociedade caminhos que possam fazer com que as pessoas possam ser protagonistas do próprio destino.

           Nesse encontro, que se intitulou “Pensando em Mato Grosso do Sul”, debatemos as prioridades regionais e elaboramos um documento que represente os anseios sociais, criando uma maneira alternativa de elaborar propostas de desenvolvimento do nosso Estado.

           Acredito que, com isso, estamos procurando encontrar novos caminhos. Nosso esforço consiste em fortalecer o processo democrático, ouvindo as pessoas, fugindo do esquematismo com que comumente se elaboram planos de governo, de cima para baixo, sem considerar as reais necessidades das comunidades.

           Espero, Srs. Senadores, que as grandes manifestações populares do mês de junho não sejam esquecidas. Tudo indica que elas voltarão com mais força no próximo ano. A sociedade está atenta aos acontecimentos do dia a dia, esperando que a classe política dê respostas adequadas aos anseios ali consagrados.

           Concedo, com muito prazer, um aparte ao eminente Senador Paulo Paim.

           O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador Ruben Figueiró, eu quero, primeiro, cumprimentar V. Exª pela reflexão que faz sobre o quadro político nacional, sobre a visão que a sociedade tem do Parlamento e dos partidos políticos. Ao mesmo tempo, V. Exª aponta caminhos. O caminho é defender causas e não coisas. E que o homem público se dedique àquilo para o que foi eleito e com o que se comprometeu, nos palanques, pedindo votos. Eu acho que, se o princípio básico do homem público for defender causas, ideias, e não coisas; se ele for fiel a tudo aquilo que ele defendeu nos palanques ao longo da sua vida política e aos compromissos dos grandes temas que ele pregou que aqui iria defender - aqui é o Parlamento, quer seja na Câmara de Vereadores ou na Assembleia Legislativa... Também concordo com V. Exa em relação à grande mobilização dos meses de junho e de julho. Começou em junho, em um único dia, com mais de 2 milhões de pessoas nas ruas. Na sequência, tivemos o movimento sindical. V. Exa, Senador Ruben Figueiró foi Constituinte e tem uma história bonita que orgulha a cada um de nós. Aqui a questão não é partidária, é apontar caminhos, e eu sempre gosto de repetir aquele poema de um poeta espanhol, que diz: “O caminho se faz caminhando”. Mas voltando às manifestações: nesta caminhada, nós todos defendemos a mobilização, a pressão, o questionamento, a rebeldia da juventude, ou mesmo dos homens e mulheres de cabelos brancos. Mas criticamos a quebradeira, o vandalismo, essa forma desordenada e inútil, no meu entendimento, que traz prejuízos a outros, o quebra-quebra. Isso não! Mas é bom ver essa moçada na rua, pressionando esta Casa, pressionando o Executivo, e até mesmo o Judiciário. O Judiciário tem que saber também qual é a voz das ruas. Eu sempre digo que o princípio da Justiça é a justiça na sua forma mais ampla. Eu não sou advogado, mas V. Exa é, Senador Ruben Figueiró. V. Exa tem essa visão do aspecto legal, baseado, naturalmente, naquilo que manda a nossa Constituição, mas eu às vezes digo que a letra fria da lei não pode também contribuir para cometer injustiças. A justiça, para mim, está em primeiro lugar, e a lei deve se enquadrar no princípio maior, que é fazer a plena justiça. Por isso, eu quero cumprimentar V. Exa. Senador Ruben Figueiró, V. Exa, como eu, na próxima terça-feira, será homenageado aqui pela Casa. E não só nós, mas também o Senador Mozarildo Cavalcanti. Na verdade, somos 13 Senadores, que nos encontramos, lá naquele processo histórico, em 1987, 1988, quando da elaboração da Constituição. Naquele período já, eu via V. Exª falar com a coerência com que está falando agora. E, naquele período, nós tínhamos nas ruas milhões de pessoas pressionando o Parlamento, que contribuiu para a Constituição cidadã, tão falada pelo inesquecível Ulysses Guimarães. Este é outro grande momento. Para mim, a população tem que voltar mesmo às ruas, como está voltando, e continuar pressionando. Aí, entraremos, com certeza, nesse processo tão falado por V. Exª, de que o homem público se volte para políticas humanitárias, que tenha uma visão, como sempre digo, de fazer o bem não interessando a quem. E, nessa visão, estaremos contribuindo para todo o povo brasileiro, acima, inclusive, das siglas partidárias que defendemos. Mas a justiça, para mim, está sempre, sempre em primeiro lugar. A coerência do homem público, para mim, é fundamental. Termino dizendo que recebo muita correspondência por e-mail, enfim, pelas redes sociais, e fico muito feliz quando as pessoas dizem: “você não mudou o discurso”. O mesmo discurso que eu tinha, como V. Exª e o Senador Mozarildo, lá na Constituinte, lá quando eu era sindicalista ainda, há 30 anos, eu mantenho. Mantenho o discurso das causas, mas avançando, como o mundo avançou, com uma visão cada vez mais moderna, mas nunca esquecendo as políticas humanitárias, que vão na linha de defender o Planeta e, naturalmente, a vida no Planeta. Parabéns a V. Exª!

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS) - Senador Paulo Paim, eu sinceramente me envaideço neste instante em que ouço V. Exª, porque é a voz da experiência, que pisou uma trilha que vem lá do Rio Grande do Sul com a mesma coerência de ideias. Eu o conheci, ou nós nos conhecemos, como ao Senador Mozarildo Cavalcanti, lá nos anos de 1987, 1988, na luta pela Constituição cidadã, tão proclamada pelo nosso saudoso Ulysses Guimarães.

            V. Exª citou um pensamento de um intelectual espanhol. Eu quero retribuir a V. Exª com outro de La Barca, também espanhol, que dizia que “sonhos, sonhos são”. Nós ainda sonhamos, mas sonhamos de uma forma diferente, pisando na realidade. Temos condições, pela nossa tradição política - permita-me a imodéstia -, dizer aos nossos concidadãos, aos nossos colegas desta Casa, que não mudamos a nossa posição, que somos coerentes com o nosso passado e queremos que aquela boa política que nos trouxe aqui permaneça como bronze, seja permanente, porque esse é o caminho que a Nação deseja de todos nós.

            Quero agradecer a V. Exª a sua manifestação, que é calcada na sua sabedoria, na sua experiência e numa vida pública que enaltece o Parlamento brasileiro.

            Muito obrigado a V. Exª.

            Mas continuo, Sr. Presidente.

            A sociedade é sábia em momentos cruciais. Devemos insistir na tese do retorno às boas práticas políticas, sem cair na ingenuidade de que isso se dará apenas pela boa vontade e voluntarismo de alguns. A sociedade tem que ser veemente nas cobranças, defendendo o exercício da política como algo substantivo e não acessório.

            Repito aqui La Barca: nossos sonhos, sonhos são. E nosso sonho, com a elaboração da Carta Constitucional de 1988, que depositou todas as suas fichas na construção de uma sociedade aberta, regida pelo Estado democrático de direito, deverá permanecer como força viva a reger nossas mentes e nossos corações.

            Sr. Presidente, era o que tinha a dizer nesta manhã esplendorosa do mês de outubro, sobretudo com a honrosa presença de V. Exªs.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/10/2013 - Página 76160