Discurso durante a 188ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da importância da sanção presidencial do Programa Mais Médicos; e outro assunto.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PROGRAMA DE GOVERNO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. SAUDE, IMPRENSA.:
  • Registro da importância da sanção presidencial do Programa Mais Médicos; e outro assunto.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 26/10/2013 - Página 76174
Assunto
Outros > PROGRAMA DE GOVERNO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. SAUDE, IMPRENSA.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, SANÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROJETO DE LEI, REFERENCIA, PROGRAMA DE GOVERNO, GOVERNO FEDERAL, CONTRATAÇÃO, MEDICO, PAIS ESTRANGEIRO, MELHORAMENTO, SAUDE PUBLICA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ASSUNTO, DESVIO, VERBA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), DEFESA, NECESSIDADE, CRIAÇÃO, CARREIRA, MEDICO, PAIS.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco União e Força/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Ruben Figueiró, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes da rádio Senado, há poucos dias, a Presidente da República sancionou o projeto de conversão oriundo de uma medida provisória que tramitou, eu diria, até em tempo recorde, entre Câmara e Senado. Aliás, tramitou na Comissão Mista, que analisou primeiramente e que fez o relatório, e, depois, na Câmara e no Senado.

            Tive a honra de ser o Relator Revisor dessa Comissão Mista, também no Senado, que deu parecer sobre essa medida provisória. Hoje, Lei dos Mais Médicos. É lógico que muitos médicos ainda têm resistência a essas alterações. Até certo ponto, com razão. Temem que a qualidade da Medicina no País caia com esse processo de importação e até modificação no currículo das faculdades de Medicina no Brasil.

            Mas o importante é que essa medida provisória aqui, no Senado, talvez tenha sido a medida provisória que não tinha nenhum anexo ou, como se diz, nenhum penduricalho para incluir outros temas na questão. E, em relação à medida provisória original, apresentei alguns pontos que realmente aprimoraram a medida, que foram mantidos na Câmara. Portanto, eu diria que representa, de fato, um marco.

            Nunca disse - e tenho dito, aliás, o contrário - que o Mais Médicos é a salvação da lavoura. Pelo contrário. Falando do ponto de vista médico, eu diria que é um tratamento de emergência, que se vai transformar, com as medidas que foram feitas, num programa permanente. Por quê? Porque nós incluímos, por exemplo, a redução dessa primeira leva de médicos, que vieram de outros países. Eles vão ficar três anos apenas trabalhando com o registro do Ministério da Saúde. Depois, se eles quiserem continuar no programa ou se quiserem ficar no País, em outra área, terão que fazer a revalidação do diploma.

            Também colocamos um item que não existia. O Governo Federal terá a obrigação, em cinco anos, de reformar, construir e equipar as unidades de saúde, principalmente as unidades de primeiros atendimentos, e incrementar também o Programa Saúde da Família. É verdade que os prontos-socorros, os hospitais estão assoberbados de pacientes que, se tivessem tido atendimento médico no momento, diríamos, inicial, talvez não chegassem ao pronto-socorro e muito menos a ter internação de emergência. É evidente que caso de emergência, casos de urgência têm que ser tratados como prioridade.

            Mas também tenho dito, Senador Paim, que se discute muito a questão do financiamento da saúde. E é necessário. É necessário definir realmente que o percentual que o Governo Federal arrecada nos Municípios e nos Estados seja estabelecido por lei, assim como é: para os Municípios, 15%; para os Estados, 12%; e para o Governo Federal que seja, pelo menos, 10%.

            Porém, eu diria que há um mal maior nessa questão da área de saúde - e tenho denunciado aqui vários casos, inclusive no meu Estado, no Estado de Roraima -, que é a corrupção, que envolve vários escalões, inclusive.

            O jornal Folha de S.Paulo do domingo passado publicou matéria de capa intitulada: “Em cinco anos SUS [ou Sistema Único de Saúde] sofre desvios de de 15 milhões”. E fala mais: “Irregularidades aparecem em prefeituras, Estados e instituições públicas e privadas”.

            Eis o início da matéria:

Prefeituras, governos e órgãos públicos e particulares aplicaram, irregularmente, R$502 milhões de recursos do SUS em cinco anos. Checagens de 2008 a 2012 do governo indicaram os desvios, equivalentes a 227 novas UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) [exatamente para onde deve ir a maioria dos médicos do Programa Mais Médicos].

O Ministério da Saúde diz que o valor pode ser maior, por causa de novos relatórios, e cobra o ressarcimento.

Há casos de equipamentos doados e desaparecidos, cobranças indevidas, problemas em licitação e prestação de contas, suspeitas de fraude e favorecimento.

            E diz mais:

No Piauí, um paciente [só um paciente] ‘foi atendido’ 201 vezes [201 vezes] em um único dia, e as consultas foram cobradas do SUS.

Prefeituras respondem por 73% do valor de desvios, e Estados, por 15%.

            Essa é a média. Realmente, é a média, porque há Estados, infelizmente, como o meu, em que essa média, com certeza, é bem superior ao que está dito aqui.

            “Os dados foram obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.”

            A matéria continua falando isso, que o SUS paga 201 consultas, no mesmo dia, para um só paciente.

            “Ministério cobra desvios identificados em auditorias; 113 casos têm ressarcimento de mais de R$1 milhão.”

            Sr. Presidente, segue a matéria abordando vários pontos. E diz:

Para burlar as contas do SUS, gestores falsificam registros hospitalares ou inserem em seus cadastros profissionais “invisíveis”.

Em Nossa Senhora dos Remédios, também no Piauí, de 20 profissionais cadastrados nas equipes do Programa Saúde da Família, 15 nunca haviam dado expediente.

Em Ibiaçá (RS), remédios do SUS foram cedidos a pacientes de planos de saúde.

As íntegras desses e de outras centenas de auditorias estão disponíveis no site do Denasus [que é o órgão encarregado de fiscalizar e controlar os recursos aplicados na área de saúde].

            Então, eu sempre disse que é um verdadeiro câncer que deteriora a saúde. Muito antes até de pensar em alocar e transferir mais recursos ou aplicar da própria receita dos Municípios e dos Estados, temos que fazer um verdadeiro mutirão, Senador Paim, em que exista não apenas o Denasus, que, com certeza, não tem condições de fazer uma fiscalização mais rigorosa e duradoura. E também envolver os Tribunais de Contas dos Estados, o Tribunal de Contas da União e os Ministérios Públicos, tanto estadual como federal. Um verdadeiro mutirão mesmo, porque se reduzirmos somente a corrupção que acontece no setor de saúde, teremos condições, de fato, de construir novas Unidades de Pronto Atendimento e até hospitais de média complexidade, de equipá-los e de dar ao médico a retaguarda necessária em muitos casos.

            Minha tristeza, Senador Paim, é que não fica só nisso. Por exemplo, a Funasa também... No ano retrasado, a Controladoria-Geral da União (CGU) apresentou um relato dizendo que, nos últimos cinco anos, haviam sido desviados R$5 milhões dos cofres públicos, porque há todo tipo de maracutaia com a Funasa. Ela é a responsável principalmente pela aplicação de recursos em saneamento básico e pela prestação de saúde às comunidades indígenas.

            Então, a corrupção vai da contratação de voos que não são feitos e são pagos até a passagem de recursos para os Municípios, que não são aplicados também. A corrupção em um órgão como a Fundação Nacional de Saúde é enorme. Recursos da saúde têm de ser tratados, eu diria, com mais cuidado até do que são tratados em outras áreas, embora eu entenda que a corrupção tenha de ser combatida em todos os setores. O Brasil, que tem avançado tanto em tantas áreas, tem de avançar nessa também.

            Principalmente depois da aprovação do Programa Mais Médicos, nós temos de ver tudo que envolve a questão da saúde e as condições de trabalho dos profissionais de saúde. Não é possível, por exemplo, que fiquemos sem uma carreira de Estado para o médico. Com uma carreira, o médico ficaria estimulado, faria concurso, uma prova de seleção, e começaria ganhando menos, como, aliás, é o caso dos magistrados estaduais, que, quando passam no concurso, são nomeados juizes substitutos e vão, geralmente, para comarcas do interior, não ficam na capital. Depois, são promovidos a juiz titular, passam a ganhar mais e, portanto, têm o estímulo de, sem reclamar, forçadamente, ir para uma comarca do interior. Entendo que a carreira de Estado dos médicos, bem como já aprovamos aqui o aproveitamento de uma mão de obra importante, que são os médicos militares, que vão para a reserva muito novos ainda, eu diria, que podem colaborar muito com o Programa Mais Médicos.

            A mesma coisa com os militares que estão nas fronteiras, como no meu Estado, que tem um pelotão em cinco, seis Municípios, estão em toda a fronteira norte, leste, oeste e, portanto, já prestam o que eles chamam de ação cívico-social e atendem aos necessitados, pessoas das áreas onde eles atuam. Vou citar o exemplo, inclusive, da área ianomâmi, de que todo mundo fala, como se fosse apenas uma reserva indígena. Lá existe um pelotão de fronteiras que atende aos índios e que atende também, é lógico, à corporação e seus familiares.

            Portanto, o médico, o bioquímico e o odontólogo não estão circunscritos a estarem ali para atender apenas aos militares. Eles fazem, repito, essas ações cívico-sociais que atendem, de maneira muito importante, às populações de onde estão localizados.

            Por isso, entendo que esses profissionais poderiam, também, acumular o serviço no SUS, recebendo, vamos dizer, um adicional para que atendam, cada vez mais, à população de onde estão localizados. Quer dizer, nós aproveitaríamos um profissional médico que já está nessas áreas, movido pela sua situação de carreira militar, porque o tempo na fronteira é contado em dobro, ele recebe um adicional, e poderia ser aproveitado também pelo Programa Mais Médicos.

            Entendo que, se fizermos uma reflexão... E eu, Senador Paim, estou comprometido, agora mais do que nunca, a olhar esses aspectos, que existem, repito, desde que me formei, há 44 anos. Na Comissão Mista, o relator foi um Deputado médico, o revisor fui eu, que sou médico, e havia muitos médicos, Deputados e Senadores.

            Portanto, nós acreditamos, firmemente, que fizemos um programa que deveria ter sido feito, no meu entender, há 40 anos pelo menos. Eu me formei no ano em que minha faculdade estava completando 50 anos de existência. Portanto, já havia formado 44 turmas. E o problema dessa questão de distribuição dos médicos já existia. Nós já debatíamos esse assunto. E, quatro décadas passadas, ou quatro décadas e meia, praticamente, não havia um programa para resolver isso. Fomos sempre empurrando com a barriga, fazendo de conta que isso não existia, em alguns momentos. O certo é que nós temos de levar...

            Eu sempre digo, já que o Senador Cristovam está pedindo um aparte, que saúde e educação são irmãs gêmeas. Se a pessoa não tiver educação, também não aprende a ter cuidados básicos para evitar doenças que são evitáveis apenas, às vezes, com condutas de higiene. Mas, também, se a pessoa estiver doente, não consegue estudar. Então, eu acho que essas duas áreas - saúde e educação - têm de, realmente, andar juntas. 

            Abordei aqui a corrupção na área da saúde, mas, infelizmente, também existe corrupção na área da educação, seja no transporte escolar, seja no sucateamento das escolas, seja no pagamento minúsculo aos profissionais da área, os professores. Realmente, é triste ver que alguns Estados até entraram no Supremo contra o piso mínimo da categoria. Então, eu fico, realmente, como disse, mais comprometido, sempre fui comprometido com a questão da saúde, mas agora fico mais ainda.

            Ao mesmo tempo em que ajudei a aprovar esse projeto, vou ajudar a fiscalizar e a reivindicar melhorias para o setor, principalmente para aqueles que vão para o interior, que muitos órgãos da imprensa nacional chamam de grotões. São Municípios na fronteira que não têm nenhum médico, e a prefeitura, quando contrata, tem que aceitar que ele trabalhe três, quatro dias por semana e vá trabalhar em outro lugar para complementar o seu salário.

            Eu concedo o aparte ao Senador Cristovam, com muito prazer.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Mozarildo, eu não lhe disse sobre uma dívida que tenho com o senhor em relação ao Mais Médicos. Desde o primeiro instante, eu fui um entusiasta desse projeto. O meu sentimento, a minha compaixão me levava a dizer que um bom projeto é não deixar uma cidade sem médico. E, já que não temos aqui, por que não buscar fora? Mas havia sempre certa dúvida em função da reação dos médicos. Quando eu aqui soube, conversando um dia, que o senhor era favorável ao projeto, confesso que senti um alívio de fazer a defesa da maneira mais enfática possível, pelo seu conhecimento técnico, pelo seu relacionamento com os colegas da Medicina. Além disso, cada vez que ouço o senhor falar, eu vejo que é um apoio, eu diria até um certo entusiasmo, mas com algumas contribuições de como melhorar. Em nenhum momento, o senhor disse aqui que esse programa é a salvação da Pátria. Ele é uma necessidade da Pátria, mas não a salvação. E o senhor sempre dá caminhos, como a própria carreira nacional do médico e de todos os trabalhadores da saúde, que o senhor sempre enfatiza, o equipamento nos lugares para onde vão esses médicos. E os médicos que não são do Mais Médicos também têm que ter esses equipamentos. Então, eu quero aqui manifestar, de público, a minha gratidão, a certeza que eu tive de que eu estava do lado certo, a partir do momento que vi suas análises, seu apoio e suas sugestões de como melhorar esse programa.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco União e Força/PTB - RR) - Senador Cristovam, fico muito orgulhoso com o seu aparte, que enriquece o meu pronunciamento.

             E, falando na área da educação médica, nós temos que ter um cuidado redobrado, tanto que também apresentei sugestão nessa área criando critérios básicos para a abertura e o funcionamento de cursos de Medicina. Do contrário, correremos o risco da proliferação indiscriminada de cursos médicos, como já ocorre em outras áreas, de má qualidade. Por isso, também colocamos os pontos cardeais da questão da abertura e de funcionamento dos serviços médicos.

            Essa lei, quem realmente a lê com atenção vai ver que não é simplesmente aquela história de abrir a porteira para trazer mais médicos do exterior. Vamos lutar agora para formar mais médicos.

            Esse, na verdade, é um programa que foi elaborado e conduzido em parceira com o Ministro da Saúde e o Ministro da Educação. Portanto, envolve dois ministérios vitais. O Ministério da Educação já tomou a providência de aumentar o número de vagas nos cursos de Medicina das escolas federais.

            Agora, nós também vamos acompanhar, Senador Paim, porque se apenas aumentar o número de vagas e não aumentar o número de professores e os laboratórios, daqui a pouco, haverá, nas universidades federais, a deterioração da formação dos nossos médicos.

            Mas, no conjunto da obra, eu diria, foi dado um passo importante. Embora seja um caso de emergência, é uma emergência que está sendo tratada tardiamente. Repito: há pelo menos quatro décadas, esse problema era do conhecimento de todos. Não só da classe médica, de todos. Então, nem governo, nem entidades médicas, nem mesmo o Parlamento fizeram, digamos, um trabalho mais profundo para resolver essa causa.

            Eu quero encerrar, Senador Paulo Paim, pedindo a V. Exª que autorize a transcrição desta matéria publicada na Folha de S.Paulo, que, para mim, realmente, é um grande alerta, um alerta público, portanto, de que temos que combater com eficiência a corrupção na área de saúde. Se não, será igual a um recipiente furado em que se coloca água, mas existe um buraco que drena tudo, e nunca há a quantidade necessária de recursos para aplicar.

            Se não estou enganado, aprovamos aqui uma lei que torna crime hediondo a corrupção na área de saúde e outras.

            Então, acho que é fundamental mesmo, porque quem rouba na educação, quem rouba na saúde, no meu entender, não está simplesmente roubando, está tirando direitos: por exemplo, o de haver mais estudantes nas escolas públicas e o de as escolas públicas serem de boa qualidade. Quem rouba na saúde está tirando não só a saúde do paciente que precisa, mas, às vezes, até a vida.

            É muito importante que o Governo realmente intensifique esse trabalho, repito, talvez em mutirão, porque só o Denasus não vai ser capaz de coibir, de maneira global, essa questão da corrupção na saúde.

            Reitero o pedido de transcrição.

            Muito obrigado a V. Exª.

 

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

Matéria referida:

- “Em 5 anos, SUS sofre desvios de R$500 milhões” (Folha de S. Paulo.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/10/2013 - Página 76174