Discurso durante a 160ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Debate sobre o financiamento da saúde pública.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Debate sobre o financiamento da saúde pública.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2013 - Página 64934
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, SISTEMA, SAUDE PUBLICA, PAIS, IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, FONTE, RECURSOS, FINANCIAMENTO, SETOR, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, MELHORAMENTO, GESTÃO, IMPLANTAÇÃO, CRITERIOS, AVALIAÇÃO, QUALIDADE, OFERTA, SERVIÇO PUBLICO.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente do Senado, Senador Renan Calheiros, Ministro de Estado da Saúde, Alexandre Padilha, Ministra de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, Miriam Belchior, Senador Vital do Rêgo aqui esteve, mas precisou se ausentar, Presidente do Conselho Nacional de Saúde, Maria do Socorro de Souza, Secretário Executivo do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Jurandi Frutuoso, e Coordenador do Movimento Saúde +10, Ronald Ferreira dos Santos. E eu queria aqui também fazer uma saudação muito especial ao Senador Waldemir Moka, que tem, nesse processo, nos ajudado e buscado, juntamente conosco, um entendimento para que possamos ter um avanço nesse debate, nessa discussão. Eu quero me desculpar com cada um e cada uma que aqui está, porque vou falar e daqui a pouco vou precisar ir, porque eu supunha que nós teríamos tempo suficiente para fazer toda a discussão, mas enfim...

            Eu começo dizendo bem rapidamente - não quero ser repetitivo, até porque o Ministro Padilha falou várias coisas - que nós temos um sistema no Brasil cuja Constituição garante que esse sistema de saúde, ele é universal, ele é gratuito, ele é equânime. E quando se criou o Sistema Único de Saúde, lá em 1988, houve uma previsão da definição de recursos para a sua constituição, o seu exercício. Já àquela época, aquilo que foi definido não era suficiente para fazer com que esse sistema crescesse. E, ao longo do tempo, ele só tem crescido mais e mais.

            Ao longo desse período, tem sido muito grande a luta também para viabilizar os recursos para que esse crescimento se dê. Não vou falar aqui de todos os movimentos que aconteceram, como a criação da IPMF e, depois, da CPMF, o debate sobre a Emenda nº 29...

            Eu diria hoje, sem medo de errar, que o que o Sistema Único de Saúde faz com o recurso que ele tem é um verdadeiro milagre. Digo isso porque em qualquer comparativo que fizermos com outros países nós vamos ver que o Brasil gasta pouco. É verdade que tivemos um crescimento importante ao longo desses últimos dez, quase onze anos.

            Tive oportunidade de ser Ministro da Saúde no primeiro governo do Presidente Lula, quando, pela primeira vez, a Emenda Constitucional nº 29 foi cumprida e, de lá para cá, esse cumprimento tem acontecido. O que hoje se coloca é que essa regra já não é suficiente para viabilizar os recursos que são necessários para o processo de consolidação e avanço do Sistema Único de Saúde.

            Acompanhamos também a posição do Governo quando, em 2012, deu apoio ao processo de regulamentação da Emenda nº 29 por intermédio da Lei Complementar nº 141, da qual eu tive oportunidade de ser relator. Naquele momento, nós conseguimos promover um incremento de recursos para a saúde por outra via, garantindo a definição clara do que seriam serviços e ações de saúde e, com isso, reduzindo sensivelmente a possibilidade de maquiagem orçamentária que outros entes da Federação anteriormente faziam para atingir aqueles mínimos constitucionais.

            Naquela época também, é bom lembrar que na Câmara foi proposta a criação de uma contribuição, que foi rejeitada lá. E, quando essa proposta chegou ao Senado, o papel do Senado como iniciador daquela proposição e como revisor final era uma proposição de garantir 10% da receita corrente bruta para a área da saúde. Aqui, todos sabem que nós seguramos essa proposta, como se diz vulgarmente, pelos chifres, porque havia uma tendência de se votar isso, que era a proposta originalmente votada aqui. Fizemos isso com o compromisso, que foi honrado pelo Presidente do Senado, de criarmos uma comissão especial para debater esse tema. E essa comissão foi criada.

            Eu vou, rapidamente, falar de algumas constatações a que ela nos levou. Primeiro, que há um crescimento real do orçamento da saúde. Porém, se nós acompanharmos o crescimento relativo no que diz respeito a outras áreas sociais, pagamos um preço que... Como o orçamento da saúde é grande, olha-se muito mais o valor absoluto do que efetivamente as necessidades relativas de crescimento.

            Aí, por exemplo, na saúde, se nós fizermos uma avaliação grosseira dos números, houve uma duplicação do valor de orçamento entre 2003 e 2012. Nesse mesmo período, a educação multiplicou o seu por quatro, a assistência social multiplicou o seu por oito, a área do trabalho multiplicou o seu por três. Felizmente, entre aspas, daqui a pouco o orçamento da educação vai ultrapassar o orçamento da saúde e aí talvez se olhe de uma forma diferente para a questão da política de saúde. Isso estabelece uma prioridade. É lógico que saúde foi prioridade, mas outras áreas foram mais do que a área da saúde.

            Para complementar, o Congresso Nacional eliminou a CPMF no ano de 2008, o que foi um grande desastre, eu diria, para o País, especialmente para a área da saúde. E aí, mais uma vez é forçoso reconhecer o esforço do Governo, que substituiu aquela fonte continuando a cumprir a Emenda Constitucional nº 29. Porém, hoje nós temos carências concretas.

            E eu disse: se nós compararmos o gasto do Brasil em saúde, seja pelo sistema de gasto de saúde per capita, seja o gasto de saúde na proporção do PIB, o gasto público e o gasto privado, que percentual cada um desse tem? E se analisarmos relativamente o gasto federal, o gasto estadual e o gasto municipal, nós temos uma carência que precisa ser suprida. O Governo reconhece isso, a Presidenta Dilma reconhece isso. E acho que reconhecer é importante, mas precisamos de mais, até porque sempre será pouco o orçamento da saúde.

            Veja, qual é a clientela da educação no País? É sensivelmente menor do que a clientela da área da saúde. O Bolsa Família beneficia 60 milhões de brasileiros. É muita gente, mas o SUS é para os 200. É óbvio que, por essa razão, ele tem um custo diferenciado. E aí nós precisamos discutir mais recursos, até porque existem outros problemas. Na área da educação, teremos a clientela nos próximos anos se reduzindo; no caso da saúde, estará aumentando. As pessoas com mais de 60 anos vão formar um pico de uma pirâmide invertida crescente a cada ano, enquanto as taxas de crescimento populacional no Brasil vêm diminuindo. Então é óbvio que vamos ter que lidar com essa questão do envelhecimento, as necessidades.

            O Presidente Lula diz muito bem: quem comia sanduíche de mortadela agora quer comer, eu não diria nem caviar, mas um prato feito bom. É lógico que quem teve algumas necessidades básicas atendidas na área da saúde quer mais, e isso custa dinheiro. A nossa área, infelizmente, é aquela em que a incorporação tecnológica não produz um não uso da tecnologia anterior. A abreugrafia, que foi criada lá no século passado, continua sendo utilizada num sistema que já tem a ressonância magnética, que já tem tantas outras. Quer dizer, vai-se acumulando, não se supera aquela tecnologia. E essas tecnologias novas são mais caras.

            A Comissão de Financiamento chegou a algumas conclusões: primeiro, que temos, de fato, que ter mais recursos, que estes recursos, dentro do que está proposto pelo Movimento Saúde+10, seriam mais adequados para essa nossa quadra no processo de implantação do Sistema Único de Saúde: os 10% da receita corrente bruta ou o seu equivalente em receita corrente líquida. E é importante dizer que sabemos que não é possível atender a isso de uma vez, mas, se fosse atendido de uma vez, sabe quanto isso ia representar em termos de gastos de saúde em relação ao PIB? Um por cento. Nós íamos sair de 4% do gasto público com saúde em relação ao PIB para 5% do gasto público com relação ao PIB. São dados, são números reais. Nós não podemos...

            Então, a nossa Comissão entendeu que a necessidade é essa hoje. E o nosso entendimento é de que isso deveria ser feito, seja qual for a proposta, em relação à receita corrente líquida, pelas razões que a Ministra Miriam colocou, mas por outras. A receita corrente líquida permite uma segurança, porque até o conceito de receita corrente bruta é impreciso.

            Temos opiniões dentro do Tribunal de Contas da União definindo que não se pode fazer essa vinculação, porque estaria vinculando receitas que não pertencem à União, ao Governo Federal. São recursos de transferência, por exemplo.

            Por outro lado, outras despesas estão vinculadas à receita corrente líquida, o percentual da folha de pagamento em relação à receita corrente liquida, o gasto da educação era receita do ano. A questão dos precatórios usa a receita corrente líquida. Portanto, é uma vinculação é uma vinculação que já está estabelecida. E aí nós fizemos essa... Nós entendemos que essa seria a melhor proposição. Óbvio que nós sabemos que precisamos de fontes. Neste momento, nem o Governo e nem o Parlamento vai discutir nem apresentar uma proposta de fonte nova, nem o Movimento quer. Portanto, nós vamos ter que trabalhar do ponto de vista da priorização.

            Temos hoje algumas fontes, os royalties... As informações que eu tenho - me perdoe a Ministra Miriam - são de que, do ponto de vista dos recursos, os royalties, a partir de 2017, seriam um pouco maiores daquilo que foi ali colocado. Temos o orçamento impositivo, nós vamos brigar aqui para que 50% dessas emendas possam ir para a saúde. Nós sabemos que vamos precisar discutir uma fonte sim, vamos precisar. Eu tenho uma preocupação importante, que é a preocupação de nós... O que vier agora - eu espero que seja algo substantivo, substancial - precisa ser bem gasto. Precisa ser bem gasto para que nós tenhamos a legitimidade diante da sociedade de apresentar uma proposição de ampliação da participação da sociedade no financiamento da saúde. (Palmas.) O Ministério da Saúde, as secretarias estaduais, o Movimento, o Parlamento têm uma responsabilidade enorme. Se forem seis, sete, dez, vinte, trinta, quarenta e cinco bilhões a mais, que isso tenha um impacto efetivo na condição de saúde da população, sob pena de nós chegarmos em 2015 e não termos autoridade política para cobrar nem do governo e nem da sociedade o incremento desses recursos. (Palmas.)

            Isso implica melhorar a gestão, utilizar critérios de qualidade para fazer o monitoramento da condição de saúde da população, implica nós aprovarmos a Lei de Responsabilidade Sanitária para definir claramente qual a responsabilidade dos entes e dos seus gestores e o que acontece quando essa responsabilidade não é cumprida.

            Portanto, nós estamos nessa discussão, nessa batalha. O Governo e o Movimento sabem claramente que o que nós estamos tentando fazer aqui - o Senado, o Congresso - é encontrar uma solução, que certamente não será exatamente igual à que o movimento quer agora, mas também não pode ser uma proposição que o Governo apresente e que esteja tão longe daquilo que nós temos como carência hoje. Estamos lutando para isso. Eu espero que até a próxima semana nós possamos ter um entendimento. Eu sei que a luta vai ter que continuar. Essa bandeira dos 10% da receita corrente bruta é justa, e eu entendo que, ainda que não consigamos isso agora, ela vai continuar. Mas é importante que, neste momento, nós tenhamos ganhos concretos. Eu tenho certeza de que o Governo terá sensibilidade política suficiente e clareza de onde buscar esse recurso para que nós possamos, de fato, atender ao clamor da população brasileira.

            Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2013 - Página 64934