Discurso durante a 161ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com os conflitos envolvendo indígenas no Estado do Mato Grosso do Sul; e outro assunto.

Autor
Delcídio do Amaral (PT - Partido dos Trabalhadores/MS)
Nome completo: Delcídio do Amaral Gomez
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Preocupação com os conflitos envolvendo indígenas no Estado do Mato Grosso do Sul; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2013 - Página 65020
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, REFERENCIA, REGULAMENTAÇÃO, ATIVIDADE, REMUNERAÇÃO, PERMISSIONARIA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, LOTERIA FEDERAL.
  • APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CONFLITO, GRUPO INDIGENA, PRODUTOR RURAL, MOTIVO, POSSE, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, LOCAL, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CRIAÇÃO, POLITICA FUNDIARIA, POLITICAS PUBLICAS, MELHORAMENTO, SAUDE, SEGURANÇA, COMUNIDADE INDIGENA, OBJETIVO, SOLUÇÃO, PROBLEMA.

            O SR. DELCÍDIO DO AMARAL (Bloco Apoio Governo/PT - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, falo já no adiantado da hora, pois são 19h38. O Plenário trabalhou durante todo o dia. Recebemos, hoje, o nosso querido Ministro Padilha, tratando de um tema que toda a população brasileira tem acompanhado muito de perto, que é a saúde, falando do presente, falando do futuro.

            Eu também não poderia deixar de destacar -- não pude estar presente na aprovação do PLC dos lotéricos -- que recebi especialmente os lotéricos do meu Mato Grosso do Sul seguidas vezes. Trabalhei intensamente para que a Senadora Vanessa Grazziotin fosse a Relatora desse projeto nas comissões do Senado por onde tramitou esse PLC.

            Então, quero saudá-los pela grande vitória de hoje, uma vitória importante para todos os lotéricos do meu Estado do Mato Grosso do Sul e para todos os lotéricos do País!

            Eu não pude estar presente e, aqui, justifico, meu caro Presidente Senador Paulo Paim, o porquê da minha ausência: eu estava no Ministério da Justiça, conversando com o Ministro José Eduardo Cardozo. V. Exª é um militante das causas sociais dos direitos humanos, e fui tratar especificamente desse assunto.

            Hoje, lamentavelmente, mais um indígena foi baleado no meu Estado, Mato Grosso do Sul. Nós perdemos um indígena há alguns meses, e, hoje, foi baleado um indígena. O motivo está concentrado naquilo em que trabalhamos durante alguns anos: a criação de uma secretaria que trate especificamente da saúde indígena. Antes, a questão da saúde indígena era tratada pela Funasa. Eu mesmo, que sempre fui muito atento, conhecendo os problemas das etnias indígenas do meu Estado -- andei pelo Brasil inteiro também, estudando isso, por meio de uma comissão do próprio Senado, que foi criada há muitos anos, ainda no governo do Presidente Lula --, empenhei-me para que essa secretaria fosse criada. E, hoje, o conflito surgiu pela absoluta falta de funcionamento de uma secretaria que tem de cuidar da saúde indígena.

            Mas a situação, meu caro Presidente Paim, Senadores e Senadoras, não é só essa. A situação é muito mais complicada. Alguns meses atrás, junto com o Ministro José Eduardo Cardozo, com o Ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, e com o Ministro Luís Adams, buscamos uma solução para a Fazenda Buriti, que foi invadida. Houve um conflito, perderam-se vidas, e o Brasil inteiro acompanhou esse assunto, que já se arrasta há muito tempo, que não é de agora. Esse assunto já vem se estendendo, com todas as consequências de uma não decisão por parte dos órgãos competentes, o que tem trazido insegurança para as famílias, para as etnias, para as famílias dos produtores, para os investidores no Estado de Mato Grosso do Sul, para a nossa economia e para a população como um todo.

            O meu Estado é feito de pessoas trabalhadoras, de pessoas que acreditam no nosso Estado e no Brasil, de pessoas solidárias, de pessoas generosas. Meu Mato Grosso do Sul é um Estado de cidadãos e cidadãs que honram seus Municípios, seu Estado e seu País, e a nós envergonha-nos muito essa realidade que ainda vivemos.

            Hoje, fui conversar como Ministro José Eduardo Cardozo para manifestar minha preocupação, porque os acordos que fizemos, há alguns meses, com a presença de lideranças políticas, do governador e de várias instituições do Governo Federal, pouco caminharam, pouco caminharam.

            A decisão que tomamos era a de que nós indenizaríamos, primeiro, a Fazenda Buriti. Através de uma chicana jurídica, respeitando o art. 231 da nossa Constituição, uma grande conquista das etnias indígenas, respeitando o art. 231, repito, indenizaríamos a terra nua, até porque essas terras são tituladas. No Mato Grosso do Sul, não existem terras devolutas, as terras são todas tituladas. Portanto, isso nasceu lá atrás, quando houve a conquista do oeste brasileiro, no sentido de preservar as nossas fronteiras com as políticas agrárias desenvolvidas pelo Presidente Getúlio Vargas.

            Portanto, encaminhamos uma solução, inclusive parecida, meu caro Presidente Paim, com que o Rio Grande do Sul adotou: a criação do fundo. Foi o que adotamos na Assembleia também. Essa foi, inclusive, uma iniciativa de um Deputado do PT, o Deputado Laerte Tetila, que V. Exª conhece muito bem e que foi Prefeito de Dourados, a segunda cidade de Mato Grosso do Sul.

            Sr. Presidente, entramos agora num labirinto jurídico, porque o Estado titulou as terras, o Estado assentou. A primeira alternativa era a utilização de TDAs, admitindo-se que o Estado de Mato Grosso do Sul teria terras suficientes para negociar, para assentar as várias etnias, as várias famílias indígenas, e para negociar também com as famílias dos produtores. Mas, para a nossa surpresa, o Estado não detinha terras suficientes para promover toda uma agenda que já havíamos combinado nessa última reunião, para mostrar às etnias e aos produtores que nós íamos seguir um cronograma para resolver definitivamente a questão dos indígenas em Mato Grosso do Sul.

            Frustramo-nos! Depois, corremos atrás de terras da União, da Rede Ferroviária Federal, o que não deu certo, por uma série de dificuldades também ao longo do caminho. Agora, basicamente, restou-nos, Sr. Presidente, primeiro, a alternativa de utilizar as terras que pertenciam ao crime organizado.

            Agora, basicamente, nos restou, Sr. Presidente, primeiro, a alternativa de utilizar as terras que pertenciam ao crime organizado. V. Exª sabe que Mato Grosso do Sul é uma vítima do crime organizado, principalmente em função das nossas fronteiras com o Paraguai e com a Bolívia. E, hoje, a SPU tem terras em Mato Grosso do Sul que pertenciam ao crime organizado. Então, essa seria uma saída, uma solução, para que, efetivamente, a União cedesse para o Estado, o Estado leiloasse, e o dinheiro do leilão seria aplicado na compra de terra nua, na aquisição de terra nua, preservando-se o art. 231, que é quase uma cláusula pétrea das etnias indígenas na Constituição de 1988. Então, temos essa alternativa.

            A outra alternativa, Sr. Presidente, é tentar buscar, junto ao STJ, um acordo na Justiça, porque a Justiça julgou que a fazenda Buriti não era terra indígena. Então, se juridicamente nós conseguirmos fazer um acordo para que, efetivamente, a União pudesse indenizar essas terras, essa seria outra alternativa, que, inclusive, nós discutimos, hoje, com o Ministro Adams. Eu estava com o Ministro José Eduardo Cardozo quando ele ligou para o Ministro Adams, consultando e procurando atualizar essas ações todas que estavam sob responsabilidade da Advocacia-Geral da União.

            Sr. Presidente, Senador Paim, amanhã haverá uma reunião no Ministério da Justiça para se fazer uma avaliação de todo esse quadro e para que os representantes do Governo Federal levem essa solução, levem essas propostas na segunda-feira.

            Estive, agora, com o Ministro José Eduardo Cardoso, que entrou em contato com o Governador de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli, agendando essa reunião para segunda-feira, que dá continuidade às tratativas anteriores. Mas agora, em função desses tristes acontecimentos de hoje, ela vai acontecer num momento extremamente importante. E nós esperamos que já se leve uma solução jurídica para que pelo menos possamos resolver o problema da fazenda Buriti e comecemos a dar os encaminhamentos necessários para outras áreas que passam por esses conflitos que lamentavelmente prejudicam nossas etnias, cuja história se mistura com a história do nosso Estado, do nosso País. E que ao mesmo tempo leve tranquilidade ao campo, porque não podemos conviver mais com essa sensação de insegurança, com esse clima de conflito que não constrói absolutamente nada.

            Resumindo, Sr. Presidente Senador Paim, eu venho aqui a esta tribuna pedir ao Governo Federal, encarecidamente, que busque uma saída no menor espaço de tempo possível. As coisas não estão bem no Mato Grosso do Sul não só com relação às etnias, mas também não estão bem com relação aos produtores rurais.

            E o pior, meu caro Presidente Senador Paim, é que todos nós, que sempre conversamos com as duas partes envolvidas, assim como com o Governo do Estado e com o Governo Federal, estamos perdendo a voz. Como nós não resolvemos, não solucionamos essa questão, nós estamos perdendo credibilidade. Portanto, nós estamos entrando numa zona de alto risco, e isso não vai ser bom para o Mato Grosso do Sul, não vai ser bom para o Brasil, não vai ser bom para o Governo do Estado, não vai ser bom para o Governo Federal, para o Governo da Presidenta Dilma, que sempre se preocupou com os mais desfavorecidos, com aquelas pessoas que precisam da mão generosa do Estado para que tenham direito à cidadania.

            Portanto, meu caro Presidente Paim, eu espero que, na reunião de amanhã, as coisas evoluam -- essa reunião vai acontecer aqui em Brasília -- e, na segunda-feira, no meu Mato Grosso do Sul, realmente, o Governo Federal aponte saídas.

            Hoje, em função das dificuldades de caráter jurídico, ou vamos para cima daquelas terras que foram tiradas do crime organizado, ou então temos que fazer um acordo para começar pela fazenda Buriti, no Judiciário, para que, criando as condições necessárias para zerar uma negociação no Judiciário, tenhamos condição de indenizar terra nua. Nesse caso, com recursos mesmo, uma vez que a solução de TDA não deu certo, não surtiu o efeito desejado.

            Nós precisamos resolver isso de vez. Todos nós, meu caro Presidente Senador Paim, estamos cansados. Essa é uma novela a que ninguém aguenta mais assistir, e quem perde com isso é a população de Mato Grosso do Sul, quem perde com isso é o Brasil.

            Portanto, eu não poderia deixar de vir à tribuna hoje -- acabei de sair do Ministério da Justiça -- para, mais uma vez, registrar a minha preocupação e a necessidade de uma decisão urgente. Espero que não tenhamos, mais à frente, que lamentar novas perdas, pessoas machucadas, vidas que se vão, porque esse assunto se arrasta há anos, e, aparentemente, as pessoas que deveriam decidir sobre isso não perceberam a profundidade do problema e o que isso representa.

            Meu caro Senador Paim, queria deixar registrada esta minha preocupação.

            Quando morreu o primeiro indígena, eu já vinha avisando isso há muito tempo. E as soluções estão aí. O próprio Presidente Lula encontrou uma solução lá para o Tocantins, através de uma medida provisória, e resolveu a questão das etnias que viviam ali.

            Será possível que nós não conseguimos achar uma saída para o Mato Grosso do Sul, para a Região Centro-Oeste, uma região que cresce, uma região que produz, uma região que merece ter paz, cujas etnias merecem ter paz, que os seus produtores rurais merecem também? O que está acontecendo no Mato Grosso do Sul nos envergonha!

            E eu não poderia deixar de fazer este registro e alertar mais uma vez para o risco que vem por aí. Não foi por falta de avisar ou não é por falta de avisar. Ou o Governo Federal age rapidamente, ou vamos, nas próximas semanas, ter problemas sérios novamente. E incontroláveis. A classe política que conseguia, mal ou bem, com as nossas qualidades, com os nossos defeitos, mediar esses conflitos, está perdendo autoridade e credibilidade. E quando qualquer processo foge do controle, o resultado sabemos qual é.

            Muito obrigado, meu caro Presidente, Senador Paim.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2013 - Página 65020