Pela Liderança durante a 200ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da apresentação de projeto que torna nula a declaração de vacância do cargo da Presidência da República feita em 1º de abril de 1964.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Registro da apresentação de projeto que torna nula a declaração de vacância do cargo da Presidência da República feita em 1º de abril de 1964.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/2013 - Página 80743
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • ANUNCIO, SOLENIDADE, RETORNO, RESTOS MORTAIS, JOÃO GOULART, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE RESOLUÇÃO, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, ANULAÇÃO, DECLARAÇÃO, VACANCIA, CARGO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, GOLPE DE ESTADO, DITADURA, REGIME MILITAR.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - Todas as homenagens a V. Exª, Presidente.

            Sr. Presidente, todos que nos assistem pela TV Senado, todos que nos ouvem pela Rádio Senado, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, esta semana será brindada por um acontecimento de enorme justiça histórica.

            Nessa quinta-feira está previsto, após 50 anos, o retorno a Brasília do Presidente João Goulart, o retorno dos restos mortais do Presidente João Goulart. E, desta feita, o retorno dos restos mortais do Presidente João Goulart será finalmente recebido na Base Aérea de Brasília com as honras devidas de Chefe de Estado e de Governo, honras essas que não teve, lamentavelmente, quando faleceu em 1976, devido à funesta ditadura civil militar pela qual padecia o País naquele momento.

            Cinquenta anos após, o Presidente João Goulart volta a Brasília que ele governou, a Brasília que ele viu ser fundada, que ele viu nasceu e que ele fundou quando era Vice-Presidente de Juscelino Kubitscheck, ou seja, a mesma Brasília que ele fundou junto com Juscelino Kubitscheck, em 1960, a Brasília que ele fundou, a Brasília que ele governou como Presidente da República e na qual ele tomou posse, em 1961, como Presidente constitucional, a Brasília em que ele foi deposto em 1964, em um golpe civil e militar.

            Ele volta 50 anos depois, no que considero, Sr. Presidente, o mais importante ato a ser realizado por parte de reconstrução. É o mais importante ato, Senador Cristovam.

            Quer a História, Senador Cristovam, que V. Exª esteja neste Plenário, porque V. Exª é personagem dos personagens de que vou falar agora, porque V. Exª é legatário duas vezes: é legatário de Darcy Ribeiro, um dos personagens de que aqui vou falar. V. Exª é o mais leal legatário de Darcy Ribeiro. Talvez poucas pessoas quanto V. Exª levam a ferro a bandeira de Darcy Ribeiro. E Darcy Ribeiro é um dos personagens de que vou falar agora. E V. Exª é do Partido Democrático Trabalhista, que é o fiel legatário das bandeiras de João Goulart.

            João Goulart volta essa semana a Brasília, 50 anos após ter sido deposto do Governo da República. E volta em um ato que eu considero o mais importante ato de recuperação da memória histórica e o mais importante ato de recuperação da justiça.

            Portanto é importante resgatarmos os acontecimentos daquele 1º de abril de 1964, quando João Goulart foi deposto do Governo da República para, ao final, Sr. Presidente, apresentar aqui o projeto de resolução do Congresso Nacional para o qual estou iniciando a coleta de assinaturas no dia de hoje e protocolizando junto com o Senador Pedro Simon no dia de hoje; para apresentar o projeto de resolução do Congresso Nacional que reconhece que, no dia 1º de abril de 1964, o Senhor Presidente da República João Belchior Marques Goulart estava em território nacional.

            Para isso é necessário primeiro reconhecer alguns acontecimentos e antes disso só relatar ao Brasil esse projeto de resolução para o qual iniciei a coleta de assinaturas no dia de hoje.

            Reitero, tendo conhecimento de que, nesta quarta-feira, em São Boja, seria iniciado o processo de exumação do corpo do Presidente João Goulart para dissipar a dúvida sobre as causas que levaram a sua morte e tendo conhecimento a decisão da Presidenta da República de que na quinta-feira próxima o Presidente João Goulart voltará a sua Brasília, 50 anos depois, e agora será recebido como chefe de Estado, eu tomei a decisão, sexta-feira, de apresentar o projeto de resolução, o PRN, declarando nula a declaração de vacância da Presidência da República exarada no dia 1º de abril de 1964 pelo Sr. Senador Auro de Moura Andrade, então Presidente do Senado Federal e Presidente do Congresso Nacional, na 2ª Sessão Conjunta da 5ª Legislatura do Congresso Nacional, realizada no 2 de abril de 1964, quando declarou vaga a Presidência da República.

            A declaração de que é nula aquela declaração passa a ser resolução do Congresso Nacional, e essa resolução entra em vigor na data de sua publicação.

            Ao propor essa resolução, resolvi, de imediato, convidar o Senador Pedro Simon para assiná-la comigo. Assim o fiz, Senador Alvaro Dias e Senador Cristovam, porque o Senador Pedro Simon, entre nós, companheiro, amigo de João Goulart, viveu aqueles acontecimentos, foi testemunha daqueles acontecimentos e sabe quão grande e vil foi aquela injustiça perpetrada no histórico 1º de abril de 1964.

            Tive a honra de contar com as assinaturas agora, ato contínuo, do Senador Cristovam Buarque, do Senador Alvaro Dias, do Senador Acir Gurgacz e de outros Senadores. Essa proposição ainda precisa da assinatura de 20 Srs. Senadores e Srªs Senadoras e de 80 Srªs Deputadas e Srs. Deputados. Tenho certeza de que amanhã conseguiremos essas assinaturas para declarar nula a declaração de vacância do Presidente da República no dia 1º de abril de 1964.

            E por que declarar nulo esse ato do Congresso Nacional, esse ato infame do Congresso Nacional no dia 1º de abril de 1964?

            Digo já por que esse ano tem de ser declarado nulo.

            Ocorria a manhã de 1º de abril de 1964. O Senhor Presidente da República João Belchior Marques Goulart se encontrava no Rio de Janeiro, no Palácio das Laranjeiras. Os rumores do golpe de Estado já eram de conhecimento de S. Exª.

            S. Exª se encontrava no Rio de Janeiro, no Palácio das Laranjeiras, para ser mais exato. As tropas do General Olympio Mourão Filho já desciam de Minas Gerais. Tão logo tinha conhecimento do levante das tropas vindas de Minas Gerais e tão logo tinha conhecimento de que estava em marcha um golpe militar, um levante de tropas contra o governo constitucional do Brasil naquele momento, o Presidente da República se desloca, de imediato, do Rio de Janeiro para a sede do governo da República, já em Brasília.

            De imediato, ao se deslocar para Brasília e ao chegar a Brasília, ele já sabia que, naquele momento, não existiam condições, que as condições de resistência militar ao golpe que estava em curso em Brasília eram pequenas. Eram pequenas porque, em primeiro lugar, Brasília era uma ilha, e existiam poucas condições militares ali de resistência. E as forças militares que se encontravam em Brasília já se encontravam rebeladas, inclusive a Base Aérea de Anápolis.

            De imediato, o Senhor Presidente da República resolveu se deslocar, ainda no dia 1º de abril, para a Base Aérea de Brasília. Organiza o seu deslocamento através de uma aeronave Coronado, da Varig. Essa aeronave não se desloca e, de imediato, é providenciado o deslocamento em uma outra aeronave, uma aeronave da Força Aérea Brasileira, de pequeno porte. Esta aeronave decola de Brasília às 23h55 e desloca-se, de Brasília para Porto Alegre, às 23h30 do dia 1º de abril.

            Naquele momento, os rumores no Congresso Nacional eram de que o Presidente da República tinha se evadido do território nacional. O Presidente da República tinha saído de Brasília para Porto Alegre, onde existiam melhores condições para organizar...

            (Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - ... a reação civil e militar ao golpe que estava em marcha contra o governo constitucional do Brasil.

            Assim, depois de 5 horas de voo, na madrugada de 2 de abril de 1964, a aeronave do Presidente da República aterrissa na capital gaúcha. João Goulart desembarca lá. E lá podia contar com a fidelidade do 3º Exército, com a fidelidade do General Ladário Pereira Telles e com a fidelidade do ex-Governador do Rio Grande do Sul, o então Deputado Federal Leonel Brizola.

            Ato contínuo a isso, na madrugada de 1º de abril, o Sr. Auro de Moura Andrade, então Presidente do Senado Federal e Presidente do Congresso Nacional, em uma convocação totalmente intempestiva, em uma convocação sem nenhum amparo regimental do Regimento Comum do Congresso Nacional, do Regimento do Senado e do Regimento da Câmara, convoca o Congresso Nacional. Estavam presentes, para essa convocação, 212 Srs. Congressistas, sendo 29 Senadores e 183 Deputados. Essa convocação ocorre na madrugada entre 1º e 2 de abril de 1964.

            A advertência da ausência de amparo regimental para essa convocação, da ausência de amparo constitucional para essa convocação é feita, naquele momento, pelo Sr. Deputado Sérgio Magalhães, do Partido Trabalhista Brasileiro. A questão de ordem feita pelo Deputado Sérgio Magalhães é bem clara. Diz o Deputado Sérgio Magalhães:

Sr. Presidente, apresento questão de ordem nos seguintes termos, de acordo com o art. 1º do Regimento Comum:

“A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, o Congresso Nacional, reunir-se-ão em sessão conjunta para;

- inaugurar a sessão legislativa;

- elaborar ou reformar o Regimento Comum;

- receber o compromisso do Presidente e do Vice-Presidente da República;

- deliberar sobre o veto aposto pelo Presidente da República, nos casos do §1º do art. 70 da Constituição;

- eleger o Presidente e o Vice-Presidente da República, nos casos do art. 79, §2º, da Constituição.”

            Conclui, então, naquele momento, o Deputado Sérgio Magalhães:

Nessas condições, Sr. Presidente, não vejo como enquadrar no Regimento Comum a convocação que V. Exª fez com o fim de que o Congresso ouvisse uma comunicação. Essa comunicação é, portanto, em consequência, antirregimental. Em consequência, o Congresso não pode ouvir essa simples convocação de V. Exª.

            Ora, Sr. Presidente, esse apelo do Deputado Sérgio Magalhães, feito naquela madrugada para o Sr. Auro de Moura Andrade, pouco foi ouvido. Ao contrário, a esse apelo, a essa questão de ordem feita pelo Deputado Sérgio Magalhães, o Senador Auro de Moura Andrade respondeu o seguinte: “Em 1961, V. Exª não entendeu dessa forma.”

            O Deputado Sérgio Magalhães insistiu em responder: “Sr. Presidente, pela ordem, para uma outra questão de ordem: de conformidade com todos os Regimentos, seja da Câmara, do Senado ou o Regimento Comum, V. Exª tem de responder a uma questão de ordem de maneira conclusiva.”

            Ou seja, mesmo a questão de ordem apresentada pelo Deputado Sérgio Magalhães, na madrugada daquela fatídica sessão, não foi respondida. Mesmo assim, mesmo com a questão de ordem feita pelo Deputado Sérgio Magalhães, apontando a antirregimentalidade, a anticonstitucionalidade, a antijuridicidade daquela convocação do Congresso Nacional, que não foi ouvida pelo Sr. Presidente de então, Auro de Moura Andrade, ele, o Sr. Auro de Moura Andrade, ainda convoca o 1º Secretário do Congresso Nacional para que fosse lida a carta do Sr. Darcy Ribeiro...

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) -...Chefe da Casa Civil do Presidente João Goulart.

            E, na carta do Sr. Darcy Ribeiro, Chefe da Casa Civil do Presidente João Goulart, é dito em alto e bom tom:

Sr. Presidente do Congresso Nacional, o Sr. Presidente da República incumbiu-me de comunicar a V. Exª que, em virtude dos acontecimentos nacionais das últimas horas, para preservar de esbulho criminoso o mandato que o povo lhe conferiu, investido na Chefia do Poder Executivo, decidiu viajar para o Rio Grande do Sul, onde se encontra à frente das tropas militares legalistas e no pleno exercício dos poderes constitucionais com o seu Ministério.

Atenciosamente, Darcy Ribeiro, Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República.

            Apesar de todos os apelos, Sr. Presidente; apesar, Senador Cristovam, da questão de ordem feita pelo Deputado Sérgio Magalhães; apesar de todos os protestos da Bancada do PTB; apesar da antijuridicidade, apesar da antirregimentalidade, apesar da anticonstitucionalidade da convocação do Congresso Nacional naquela madrugada, a efetivação do golpe se consubstanciou por parte do Sr. Auro de Moura Andrade.

            Ignorando todos os apelos e para dar um vaticínio à violência que já estava em curso nas ruas, mesmo com o Presidente da República em pleno Território nacional e mesmo com um comunicado do Sr. Darcy Ribeiro, Chefe da Casa Civil do Presidente da República, dando conta de que ele estava no Rio Grande do Sul à frente das tropas legais e no uso de suas atribuições constitucionais, mesmo com tudo isso, o Sr. Auro de Moura Andrade, dando ignorância a tudo, resolveu proceder à seguinte proclamação, declarando a Presidência da República vaga. Resolveu ignorar essa última comunicação por parte do Chefe da Casa Civil, declarou vaga a Presidência da República e, nos termos do art. 79 da Constituição da República, convocou, para assumir a Presidência da República, o Sr. Ranieri Mazzilli, dando um ar - abro aspas - “de legalidade” ao golpe civil militar de 1964.

            Senador Cristovam Buarque, tenho o prazer de ouvi-lo.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Randolfe, eu creio que esse seu discurso vai entrar na lista dos grandes discursos feitos nesta Casa, porque tem aquilo que faz com que um discurso seja grande: o seu conteúdo e a sua historicidade. Alguns são capazes de dizer que é irrelevante anular aquela sessão. Não! É altamente relevante do ponto de vista histórico, como foi relevante, Senador Acir, devolver o mandato de muitos parlamentares cassados. Eu creio que o senhor está fazendo um gesto extremamente positivo do ponto de vista da história do nosso País. Agora, está faltando uma só coisa: eu acho que a gente deveria abrir um processo pela cassação, por falta de decoro, de Auro de Moura Andrade. O que ele fez ali foi uma das mais vergonhosas faltas de decoro que um parlamentar pode fazer: servir a golpistas daquela maneira. E aí, se a gente fizer para ele e devolver o mandato dos cassados, eu creio que a gente deveria abrir um processo por falta de decoro para todos que votaram a favor de declarar vaga a Presidência da República naquele momento. É estranho até a coincidência de que seja um 1º de abril. Dá vontade de fazer um projeto de lei, dizendo: o 1º de abril foi apenas o 1º de abril. Mas, lamentavelmente, isso não é possível diante de tantos mortos, exilados, de tanto sofrimento, da censura durante um bom tempo dos 21 anos; não se permite tratar aquilo como 1º de abril. Aquela foi uma data trágica na história do Brasil, e creio que cada um deve pagar, historicamente que seja, pelos seus atos.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - O senhor está trazendo a ideia de redimirmos o João Goulart, que volta a ser Presidente da República, e não ex-Presidente, volta a ser Presidente, porque não abandonou o Brasil naquele momento, só quando já não tinha mais maneira, o golpe já tinha sido dado, as forças legalistas já estavam vencidas. Mas eu quero propor que trabalhemos a ideia de complementar com a declaração de falta de decoro de todos aqueles que votaram a favor, mentirosamente, de que a Presidência estava vaga, de todos aqueles que, imbuídos de mandato, foram golpistas naquela madrugada e que, por isso, deveriam ser cassados, sim, mesmo que simbolicamente, mesmo que historicamente, com a mesma força histórica e simbólica da devolução dos mandatos para aqueles que foram cassados.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Governo/PSOL - AP) - Senador Cristovam, reitero o que disse - V. Exª que tem profunda autoridade nesses gestos: a Política e a História são feitas de gestos. O importante dos gestos que aqui estamos fazendo é a reabilitação histórica de João Goulart, dizendo, concretamente, para os golpistas daquele dia, em especial para quem arquitetou aquela madrugada funesta da história nacional, que eles perderam, que a História venceu.

            Como diz um xará seu, um pouco xará e um pouco parente - aliás, V. Exª que me disse que é parente - o Chico Buarque, há um trecho de uma música em que ele diz: “A História é um trem alegre, que atropela indiferente todo aquele que a negue”. Os que assim o fizeram naquele 1º de abril atropelaram o trem, atropelaram o trem da História. Está sendo lembrado hoje, 50 anos depois - pode ter demorado -, que eles atropelaram o trem da História.

            Veja, Senador Cristovam, eu estava procurando - eu faço questão de frisar, de reiterar, pela violência - a declaração do Sr. Auro de Moura Andrade, contra todos os apelos, contra todos os apelos da Constituição, a declaração de violência na declaração de vacância que ele fez.

            Diz ele:

O Senhor Presidente da República deixou a sede do governo [tumulto no plenário], deixou a Nação acéfala [tumulto] numa hora gravíssima da vida brasileira em que é mister que o chefe de Estado permaneça à frente do seu governo. O Senhor Presidente da República abandonou o governo, e esta comunicação faço ao Congresso Nacional

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) -

Esta acefalia configura a necessidade de o Congresso Nacional, como poder civil, imediatamente tomar a atitude que lhe cabe nos termos da Constituição brasileira para o fim de restaurar, nesta Pátria conturbada, a autoridade do governo e a existência de governo. Não podemos permitir que o Brasil fique sem governo, abandonado [tumulto]. Recai sobre a Mesa a responsabilidade pela sorte da população do Brasil em peso.

Assim sendo, declaro vaga a Presidência da República!

E, nos termos do artigo 79 da Constituição Federal, invisto no cargo o Presidente da Câmara dos Deputados, Sr. Ranieri Mazzilli [tumulto]!

            Em seguida - conta-se na história -, mesmo havendo mobilizações e manifestações na rodoviária de Brasília, mesmo sob mobilizações contrárias aqui mesmo no Congresso Nacional, o Sr. Auro de Moura Andrade mandou desligar as luzes do Congresso, literalmente deixou o Congresso às escuras, fechou as portas do Congresso Nacional, impediu, durante 48 horas, que qualquer outro parlamentar entrasse no Congresso Nacional, foi até o Palácio do Planalto, subiu por um elevador - por outro, desceu Darcy Ribeiro e Waldir Pires - e deu, inconstitucionalmente, posse ao Sr. Ranieri Mazzilli, sem nenhum amparo regimental e constitucional.

            Era o gesto que precisava para o governo dos Estados Unidos da América reconhecer, de imediato, o golpe que estava em curso - e o governo dos Estados Unidos da América estava com a 4ª Frota Americana na costa brasileira.

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - Enquanto isso, o Presidente João Goulart estava em Porto Alegre nesses mesmos acontecimentos, numa madrugada em claro, reunido com o General Ladário Telles e com o Comando do 3º Exército, as tropas leais ao Presidente da República, e com o Governador Leonel Brizola. O Presidente João Goulart pergunta ao General Ladário Telles: “O que podemos fazer?”

            E é o General Ladário Telles que responde ao Presidente João Goulart: “Presidente, dê a ordem. Dê a ordem! Nós subiremos com as tropas leais. Teremos apoio popular e destituiremos o governo golpista em Brasília.” Essa decisão teria o custo do sangue de brasileiros. Haveria uma guerra de secessão, e o Presidente João Goulart tinha as informações de que os golpistas teriam, naquele momento, o apoio da quarta frota americana. Nós teríamos um longo período de guerra popular prolongada, a secessão do Brasil durante alguns anos de guerra civil. E, a contragosto de Leonel Brizola, foi a decisão do Presidente João Goulart, naquele momento, decisão para a história julgar: “Não irei sacrificar o sangue de soldados, nem do povo brasileiro. Vou para o exílio.” Recusou-se a levar o terceiro exército ao conflito. Recusou-se a levar as tropas legais, que estavam leais ao Presidente da República, leais à Constituição, ao conflito. Foi a decisão de João Goulart. Julgada ou não, qualquer que seja o julgamento que se faça da história, foi uma decisão que salvou também vidas de brasileiros.

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - É também por isso que, na próxima quinta-feira, João Goulart deve ser por nós e pela história homenageado. É também por isso que o Brasil, sem 20 anos de regime autoritário, poderia ter sido bem melhor. É também por isso, porque os 20 anos de autoritarismo ceifaram uma geração de políticos brasileiros e ceifaram que o Brasil pudesse ter avançado muito mais nesses anos. O País poderia ter sido muito melhor se não fosse esse período de arbítrio que nós vivemos. É por tudo isso, Sr. Presidente, e para que nunca mais aconteça, que apresentamos esse projeto de resolução.

            Por isso, Senador Cristovam - falo para concluir -, seria importante que amanhã... Conversei há pouco com o Senador Pedro Simon. O Senador Pedro Simon está em contato com a família do Presidente João Goulart.

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - Já convidei o Sr. Senador Cristovam. A nossa ideia é que amanhã nós consigamos já as assinaturas necessárias a esse projeto de resolução e levemos esse projeto de resolução a S. Exa o Presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, e a S. Exa o Presidente do Senado Federal, Presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros, e consigamos o compromisso de S. Exas de que, se possível - e acho que é possível -, antes de quinta-feira, o Congresso Nacional se reúna e coloque a votar essa resolução.

            E, quando o Presidente João Goulart pousar em Brasília, na quinta-feira, o Congresso Nacional brasileiro não tenha mais, nos seus Anais, essa triste mancha de o Congresso Nacional ter um dia dito que, enquanto um Presidente da República...

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - ... estava em território nacional, lamentavelmente, a Presidência da República foi considerada vaga.

            Eu espero que, quando João Goulart, na quinta-feira, voltar à sua Brasília, o Congresso Nacional já tenha votado que essa mancha está apagada de sua história.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/2013 - Página 80743