Discurso durante a 185ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apreensão com o aumento da violência contra a juventude negra brasileira.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Apreensão com o aumento da violência contra a juventude negra brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/2013 - Página 75312
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • RELATORIO, MAPA, VIOLENCIA, AUMENTO, NUMERO, HOMICIDIO, ADOLESCENTE, POPULAÇÃO, NEGRO, BRASIL.

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores que nos acompanham pelos veículos de comunicação desta Casa, as crescentes cenas de violência nas cada vez mais frequentes manifestações populares em todo o País estão a merecer uma reflexão mais profunda de nossa parte. A sociedade brasileira parece sobressaltada com o aparente paradoxo de uma força policial extremamente violenta contra manifestantes pacíficos e inerte contra grupos minoritários agressivos e igualmente violentos.

            As cenas de depredação e violência a que assistimos nas ruas de todo o País, principalmente no Rio em São Paulo, parecem ter uma raiz mais profunda do que uma explosão irracional ou uma onda criminal, como querem fazer parecer alguns.

            Gostaria de propor uma reflexão a esta Casa sobre um tema que deveria merecer uma atenção crescente e constante de todos nós: refiro-me à violência urbana, que contamina o aparato de segurança pública e se abate sobre a vida cotidiana de grande parte da população mais vulnerável socioeconomicamente e, em particular, à violência contra o jovem negro brasileiro.

            Não é mais possível alimentar a imagem de uma Nação indulgente, construída ainda no Império, a autopiedosa visão construída pelas nossas elites de uma sociedade pacífica e cordial. É preciso concluir: somos um País violento.

            Recente pesquisa feita pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos e pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, denominada "Mapa da Violência 2013: Mortes Matadas por Armas de Fogo", demonstra que vivemos uma epidemia de violência em todo o Brasil, e ela atinge mais jovens negros e, geralmente, de baixa renda. O estudo coordenado pelo sociólogo Júlio Jacobo destacou entre as causas da morte por arma de fogo entre os jovens o abandono da escola e a baixa inserção no mercado de trabalho. Segundo o sociólogo, hoje temos 9 milhões de jovens, Senador Paim, que não estudam, não trabalham e que estão vulneráveis à situação de violência.

            Segundo as recentes estimativas populacionais para o ano de 2011, o País conta com um contingente de 34,5 milhões de jovens na faixa dos 15 aos 24 anos de idade. Esse quantitativo representa 18% do total dos 192,3 milhões de habitantes que o IBGE projetava para o País nesse ano de 2011.

            Diante, portanto, dessa realidade, da realidade a que assistimos no dia a dia, da pesquisa, até das notícias de jornais, do crescente número de mortos por homicídio e por acidentes de trânsito, esse estado de violência e tensão é a realidade das grandes cidades brasileiras.

            Aliás, na semana passada, a cidade de Salvador se viu constrangida diante de um fato que demonstra essa realidade, com a morte de dois jovens que estavam numa moto após uma briga de trânsito com uma senhora no seu carro, o que resultou na morte desses dois jovens, consternando a cidade inteira. Mas precisamos nos voltar para uma situação de violência mais grave ainda, que acontece em todas as cidades e em todos os Estados brasileiros. Portanto, é preciso sair da reflexão, aprofundá-la, sob o ponto de vista de reflexão e de debate, mas contribuir mais ainda para que possamos ter algumas ações concretas que nos ajudem a modificar essa realidade.

            Por isso iniciei, com o apoio de V. Exª, Senador Paim, e de outros Senadores, hoje, durante a reunião da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, a coleta de assinaturas para a criação de uma CPI destinada a investigar o assassinato de jovens negros no Brasil.

            Havia anunciado a intenção,...

(Soa a campainha.)

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - ... rapidamente, de promover a CPI após audiência que fizemos, no dia 10, sobre violência contra a juventude brasileira e como resultado de uma solicitação do Conjuve aos Senadores e Deputados.

            Após uma articulação e uma aprovação de V. Exª e da Senadora Ana Rita, Presidente daquela Comissão, iniciamos a busca por assinaturas, que já tem grande apoiamento, demonstrando a sensibilidade deste Senado para com o tema.

            Eu gostaria, no entanto, de deixar registrado aqui, rapidamente, alguns dados sobre essa situação de violência.

            Pesquisa divulgada pelo Ipea, na semana passada, constata que de cada três homicídios praticados no País dois são contra negros. De acordo com o estudo, tomando-se a população residente nos 226 Municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes, a chance de um adolescente negro ser vítima de homicídio é 3,7 vezes maior em comparação com os brancos. A possibilidade de um negro ser assassinado é 8% maior, mesmo quando a comparação envolve indivíduos da mesma escolaridade e de nível socioeconômico semelhante.

            Outro conceituado estudo, o Mapa da Violência, mostra que, entre 2002 e 2010, a partir dos registros do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, morreram assassinados no Brasil 272.422 cidadãos negros, média de 30.269 assassinatos por ano. Só em 2010, foram 34.983 mortos.

            Ainda segundo o Mapa da Violência, quando se analisa o conjunto da população, constata-se que também, entre 2002 e 2010, as taxas de homicídios brancos caíram de 20,6 para 15,5 homicídios (queda de 24,8%), enquanto a de negros cresceu de 34,1 para 36, um aumento de 5,6%. Assim, se em 2002 morriam assassinados, proporcionalmente, 65,4% mais negros do que brancos, no ano de 2010 esse índice saltou para 132,3%. As taxas juvenis duplicaram, ou mais, as da população total...

(Soa a campainha.)

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - ... em 2010, enquanto as taxas de homicídio da população negra total eram de 36 pontos, a dos jovens negros foi de 72 pontos.

            Assim, Sr. Presidente, não é mais possível ignorarmos a realidade de violência contra a população de jovens negros neste País. O estudo confirma aquilo que muitos movimentos negros e organizações de direitos humanos já denunciavam: a alta taxa de homicídios advindo do confronto com a polícia ou da ação policial militar neste País, o que impõe, sem dúvida alguma, a discussão, no Congresso Nacional, sobre a desmilitarização da polícia em nosso País.

            Os confrontos recentes, o desaparecimento de Amarildo, todos esses...

(Interrupção do som.)

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Apoio Governo/PSB - BA) - ... são dados comprobatórios do índice de violência (Fora do microfone.) crescente que vivem as grandes cidades brasileiras. E a nossa juventude, vulnerável, fica, portanto, em situação de risco.

            É necessário discutir, vinculando a isso a violência policial marcadamente praticada contra a população vulnerável nos grandes centros urbanos do nosso Brasil.

            Muito obrigada, Sr. Presidente, pela tolerância com o tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/2013 - Página 75312