Discurso durante a 185ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à cobrança de taxas em terrenos de marinha.

Autor
Paulo Bauer (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Paulo Roberto Bauer
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA.:
  • Críticas à cobrança de taxas em terrenos de marinha.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/2013 - Página 75372
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • CRITICA, COBRANÇA, UNIÃO FEDERAL, TAXAS, TERRENO, MARINHA, DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ELIMINAÇÃO, TRIBUTOS, TRANSFERENCIA, PROPRIEDADE, IMOVEL, OCUPANTE.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Ocupo hoje esta tribuna para retomar a discussão de um tema fundamental para nosso País: a questão dos imóveis situados em terrenos de marinha e a cobrança abusiva de taxas pelo Governo Federal.

            Ontem mesmo, o tema esteve presente neste plenário, em comunicação inadiável feita pelo Senador Ricardo Ferraço, dando conta de decisão preliminar do Superior Tribunal Federal favorecendo a ilha de Vitória na questão dos terrenos de marinha, decisão que, se confirmada, deverá repercutir favoravelmente para outras capitais com sede em ilha oceânica: São Luís e Florianópolis.

            No entanto, a questão dos terrenos de marinha afeta não apenas as ilhas oceânicas, mas todas as cidades litorâneas brasileiras. Ela afeta até mesmo algumas cidades que não têm praia, como a minha querida Joinville, em Santa Catarina. Como a cidade foi construída no entorno de uma malha de rios e córregos que sofrem influência das marés, dezenas de milhares de famílias joinvilenses são obrigadas a pagar taxas de marinha ao Governo Federal.

            É um problema nacional. A cobrança mais perversa é a taxa de ocupação, que é de 2% para os terrenos ocupados antes da Constituição de 1988 e de 5% para os terrenos ocupados desde então. Há, ainda, a cobrança, pelo Governo Federal, da taxa de laudêmio de 5%, sempre que um imóvel em terreno de marinha passa por uma operação de compra e venda.

            O Brasil é o único país do mundo que ainda mantém esse tipo de cobrança, Senadora Ana Amélia. Trata-se de um entulho legislativo, que vem desde o período imperial. Um decreto imperial de 1868 criou o conceito, determinando que todas as áreas numa linha de 15 braças craveiras, contadas a partir do preamar médio de 1831, seriam consideradas terrenos de marinha.

            A justificativa para sua implementação foi a defesa do território, o que era aceito à época, mas é absolutamente injustificável para os dias de hoje. Para termos ideia de como esse conceito é anacrônico, essa distância de 15 braças, que equivale a 33 metros, foi definida - vejam V. Exªs - pelo alcance de um tiro de canhão. Um canhão da época, é claro!

            Um decreto-lei de 1946, logo após o fim do Estado Novo e depois da Segunda Guerra Mundial, atualizou o texto, mantendo a distância de 33 metros. Como os canhões da época já atingiam bem mais que 33 metros, estava claro que o argumento da defesa nacional não mais se sustentava. Os terrenos de marinha subsistiam apenas para financiar o Estado, por meio de cobrança de foro, taxa de ocupação e laudêmio dos proprietários de imóveis situados nestas áreas.

            A verdade é que nosso País foi empurrando esse problema para frente por muito tempo. A Constituição de 1988, Sr. Presidente Sérgio Souza, recepcionou o conceito de terreno de marinha, incluindo-o entre os bens da União, juntamente com os acrescidos, ou seja, os aterros posteriores.

            Durante muito tempo, nós brasileiros encaramos tais cobranças como fatos da vida, lamentavelmente. A cobrança sobre os terrenos de marinha se sustentava no frágil argumento de que a União precisava ser ressarcida pela ocupação de terrenos que teriam sido de sua propriedade.

            Façamos um exercício, Senador Inácio Arruda: no caso de um terreno ocupado há 60 anos que paga 2% de seu valor anualmente a título de taxa de ocupação, o proprietário já pagou à União 120% de seu valor. Nos primeiros 50 anos, ele pagou 100% do valor, ressarcindo integralmente a União pelo valor da área. Nos últimos 10 anos, sofreu cobrança abusiva, portanto, e, se nada mudar, continuará sofrendo nos anos vindouros.

            Façamos outro exercício, tendo como base um terreno ocupado há 25 anos, a idade da nossa atual Constituição: sobre os terrenos ocupados a partir de 1988 incide, como já mencionei, uma taxa de marinha de 5% sobre o seu valor. Assim, o proprietário deste terreno pagou 100% do valor nos primeiros 20 anos e mais 25% do valor nos últimos cinco anos. Dentro de 15 anos, se nada mudar, ele terá pagado à União duas vezes o valor do terreno que ocupa.

            Como eu disse, o problema vem sendo empurrado para frente. No entanto, a situação se agravou muito nos últimos anos, dado o apetite por arrecadação do atual Governo Federal e de seu antecessor. A Secretaria do Patrimônio da União, órgão responsável pelas taxas, tem feito estudos de validade duvidosa, revendo os limites da faixa de marinha e incluindo novos terrenos na cobrança. Subitamente, proprietários que nunca pagaram taxa de marinha passam a receber a cobrança da Secretaria do Patrimônio da União. Recentemente, tivemos casos bastante considerados na imprensa catarinense, que enfocava exatamente esse assunto.

            Além disso, a SPU passou a interpretar que a cobrança de laudêmio, a taxa sobre compra e venda do imóvel, incide não apenas sobre o terreno, mas também sobre as benfeitorias ou sobre a ocupação. Ou seja, a SPU acha que tem direito não apenas sobre o terreno, mas também sobre o imóvel que o proprietário construiu nele. Um completo absurdo, Senador Aécio Neves!

            Para reverter essa situação, está tramitando, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desta Casa, o substitutivo do Relator, o nobre Senador Ricardo Ferraço, à Proposta de Emenda à Constituição n° 53, de 2007, que passa aos ocupantes de terrenos em área de marinha o domínio pleno sobre suas propriedades, extinguindo a cobrança de quaisquer taxas.

            O substitutivo do Senador Ferraço foi apresentado no início do mês passado, Senador Casildo Maldaner, e é resultado de um amplo debate nacional, inclusive com audiências públicas realizadas.

            A matéria está pronta para ser votada, aguardando apenas sua inclusão na pauta da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal.

            No entanto, desde o momento em que o Senador Ferraço assumiu a relatoria, o Governo Federal detectou o risco da perda de arrecadação. E como o Governo, este Governo, o Governo da Presidente Dilma, não admite perder nenhum recurso de arrecadação, seja a cobrança justa ou não - e é bom relembrar a questão do Fundo de Garantia e dos 10%, para inserir no contexto da cobrança, se justa ou não -, enviou apressadamente um projeto de lei à Câmara visando eternizar a cobrança da taxa de marinha.

            Foi uma situação semelhante ao recente caso da multa adicional de 10% sobre o FGTS, quando o Governo Federal enterrou um projeto de lei já em tramitação - na hora da votação, pelo Congresso, dos vetos, fez valer a sua força política - e manteve a cobrança por medida provisória.

            Voltando à questão dos terrenos de marinha, o Executivo apresentou à Câmara o Projeto de Lei nº 5.627, de 2013, dando nova regulamentação à cobrança do foro, do laudêmio e da taxa de ocupação. E anunciou isso como se estivesse fazendo um favor aos proprietários!

            Basicamente, o projeto determina o fim da diferença da taxa para as ocupações anteriores e posteriores a 1988: todos pagarão 2% do valor do terreno, mas pagarão 2% para sempre! O projeto deixa também claro que a cobrança de laudêmio deve incidir apenas sobre o valor do terreno e não também sobre as benfeitorias. Ou seja, aborda um problema criado pelo próprio Governo, pela interpretação abusiva do SPU.

            O Governo sentiu a pressão e quer morder menos, como observou o Deputado catarinense e ex-Prefeito de Florianópolis Esperidião Amin. Acontece que essa mordida, além de injusta, ainda dói demais. Reparem que nada muda para quem é proprietário de um terreno ocupado antes de 1988 e não pretende vendê-lo. Esse cidadão vai continuar recebendo a mesma mordida, a mesma cobrança anual de 2% sobre o valor de seu terreno. Fora isso, a SPU vai poder continuar usando os mesmos critérios duvidosos às faixas de marinha, incluindo cada vez mais moradores na cobrança de taxas. Isso está acontecendo em Santa Catarina e em todos os Estados litorâneos do Brasil.

            O remédio definitivo, sem dúvida, é a aprovação do substitutivo à PEC no 53, de 2007. Por isso, faço meu apelo público ao Senador Vital do Rêgo, Presidente da CCJ, para que coloque o quanto antes a matéria em votação naquela Comissão. Assim, sua tramitação ganhará impulso, a emenda constitucional poderá ser promulgada, e milhares e milhares de brasileiros terão o domínio pleno de seus bens e não mais estarão sujeitos a essas perniciosas cobranças das taxas de marinha.

            Assim, estaremos sepultando, definitivamente, uma taxa criada com a ajuda daquela velha arma imperial, o canhão, que de nada mais nos serve, exceto para a decoração de museus.

            Ouço, com muito prazer, o aparte do Senador Casildo Maldaner.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco Maioria/PMDB - SC) - Eu confesso, Senador Paulo Bauer, que aprendi um pouco da história com V. Exa, em vosso pronunciamento. Essa das braças - eu até anotei aqui: 15 braças correspondem a 33 metros. À época do Império, dos canhões, era a distância que atingiam mais ou menos. Era para montar a defesa da área ocupada, a defesa do Estado, a defesa do País. Era a distância que tinha essa força, mais ou menos. E dali foram transformando, transformando, e chega ao que existe hoje. Como catarinense, o que eu tenho recebido de reclamações... E, olha, às vezes, se alteram, a bel-prazer, os preços de terreninhos. “Olha, Maldaner, estão me cobrando agora. Eu tenho um pedacinho, uma ocupação. Estão me cobrando R$7 mil, R$8mil, R$10 mil por cada ano. Eram R$500,00, R$200,00. Agora, são R$2 mil”. Alguns vêm me falar em R$10 mil, em R$12 mil. Tem que pagar, senão não sei o quê. É a bel-prazer que a SPU (Secretaria do Patrimônio da União) estipula. Vem daqui, vem de lá. V. Exa levanta um tema, com muito estudo, com uma análise profunda, detalhando os acontecimentos da época do Império, quando começou, dando os caminhos todos e o que vem sendo tramitado e o que se debate hoje na CCJ, e o que podemos buscar para se evitar essa coisa abusiva. V. Exª está falando com conhecimento para o Brasil. Quero cumprimentá-lo. Sem dúvida alguma, isso nos clareou e ajuda a entender melhor essa mecânica, esse avanço que é um mecanismo do qual, se nós não agirmos, a Secretaria de Patrimônio da União não vai abrir mão nunca. Se deixarmos assim, deve ter uma arrecadação - pelo que me falam - muito extraordinária. Quero cumprimentá-lo pelo pronunciamento.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Agradeço a V. Exª. Obviamente, a arrecadação é muito grande. O Brasil, com oito mil quilômetros de costa, com todas as áreas que estão situadas às margens de rios que sofrem influência das marés, todas as áreas de mangue, enfim, todas essas propriedades pagam a taxa de marinha para que o SPU possa, obviamente, ter uma receita tal qual a própria União.

            Mas é nosso entendimento que, mesmo com a decisão do Supremo Tribunal Federal quanto às ilhas oceânicas, ainda não se vai eliminar a questão da taxa de marinha. Em todos meus pronunciamentos nesta Casa - e V. Exªs são testemunhas disso -, eu sempre, repetidas vezes, faço menção a uma coisa que considero necessária: é preciso reduzir a carga tributária deste País.

            Quando a gente fala em carga tributária, a primeira coisa que vem à cabeça é Imposto de Renda, é ICMS, é IPI, é PIS, é Cofins; mas, na verdade, há muitas outras coisas que fazem o custo Brasil aumentar. Obviamente, uma família que paga, todo ano, 2% do valor do imóvel onde vive para a União, para poder continuar usando esse imóvel, obviamente que está recolhendo um dinheiro que ela precisa conquistar e angariar com trabalho e esforço, e tudo isso vira custo, custo de vida, custo para o próprio País. Quando o Povo de um país tem de pagar muito imposto, ele, obviamente, está sofrendo para conseguir os recursos destinados a esse pagamento.

            Então, ora se paga muito imposto no remédio, ora se paga muito imposto no combustível, também se paga muito imposto na energia elétrica, paga-se muito imposto em todas as atividades e em todos os negócios.

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Hoje mesmo, pasmem V. Exªs, eu soube que no Brasil nós pagamos, Senador Inácio Arruda, em torno de 43% de carga tributária no uso de telefone celular, no uso da linha telefônica. É um absurdo!

            É uma carga tributária muito elevada, que o Brasil precisa reduzir, porque, se há menos imposto, há mais dinheiro no bolso das pessoas. Se há mais dinheiro no bolso das pessoas, elas compram mais. Se compram mais, há mais geração de produção nas empresas. Se há mais geração de produção nas empresas, há mais emprego. Se há mais emprego, há mais consumidor. A roda gira, e gira sempre positivamente, a favor do crescimento econômico.

            Por isso, cada vez que eu encontrar no Brasil uma ação que pudesse significar justiça social, pudesse significar redução de carga tributária, pudesse significar adequação do País aos novos tempos, é claro, voltarei à tribuna para sugerir providências, para pedir atenção. E esta aqui, com toda certeza, merecia, Senador Osvaldo, um tiro de canhão, para ser enterrada de vez.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/2013 - Página 75372