Pronunciamento de Blairo Maggi em 14/11/2013
Discurso durante a 203ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Ponderações sobre as diferentes abordagens das questões sociais após a Proclamação da República e a Constituição de 1988.
- Autor
- Blairo Maggi (PR - Partido Liberal/MT)
- Nome completo: Blairo Borges Maggi
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PODERES CONSTITUCIONAIS.:
- Ponderações sobre as diferentes abordagens das questões sociais após a Proclamação da República e a Constituição de 1988.
- Publicação
- Publicação no DSF de 15/11/2013 - Página 82573
- Assunto
- Outros > CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PODERES CONSTITUCIONAIS.
- Indexação
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- COMENTARIO, PROCESSO, HISTORIA, BRASIL, PROCLAMAÇÃO, REPUBLICA, ELOGIO, PROMULGAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, MOTIVO, CONQUISTA (MG), DIREITOS HUMANOS, CIDADANIA.
O SR. BLAIRO MAGGI (Bloco União e Força/PR - MT. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, quando a República foi proclamada, correntes de otimismo alastraram-se pelo País.
No espaço de apenas 2 anos, havíamos eliminado a escravidão e instituído a forma republicana de governo, corrigindo assim a distância que nos separava das outras nações latino-americanas.
Abria-se um novo tempo da história nacional.
A forma como a República se instituiu era interpretada pelos contemporâneos como prenuncio do futuro promissor que se anunciava.
Rui Barbosa, um dos mais destacados próceres republicanos, homenageava o evento, em discurso proferido nesta Casa, em 1893.
Ardoroso defensor do novo regime dos momentos iniciais, afinado com a idéia da Federação, a ponto de defender a sua inscrição no dístico da República, considerava:
"Claridades de alvorada aureolaram esse natalício. As nações não conheciam algo semelhante: uma revolução que não tocou nem na consciência, nem na família, nem na propriedade, nem na vida, que não orfanou uma criança, nem levou à viuvez uma mulher, que abriu a todos os cultos o sacrário do respeito legal, que apelou para todas as opiniões, e utilizou todas as formas de patriotismo, que se sentiu menos na administração do que as alternações ordinárias dos partidos no poder, que fomentou energicamente o trabalho, a indústria, a atividade comercial, e que, a um sopro, converteu as províncias opressas de um Império centralizado nos Estados autônomos de uma democracia".
As expectativas positivas iniciais, algumas até mesmo eufóricas, a exemplo desta, que citamos, não permaneceram.
O encanto inicial esfumou-se na realização histórica da República, pois deixou de consagrar a cidadania.
Muito pelo contrário, ela sancionou a exclusão como princípio de organização do corpo social e político.
O sistema político republicano, cristalizado na Política dos Governadores, resultou na expropriação da participação popular.
A política degradou-se em sistema eleitoral corrompido e excludente, com a interdição do voto do analfabeto e das mulheres.
A fraude eleitoral campeava solta. A influência das oligarquias predominava, da política local ao Legislativo federal, nas eleições dos currais eleitorais e na Comissão de Verificação de Poderes que operava no Legislativo Federal.
O balanço das realizações republicanas, passadas algumas décadas da Proclamação, era deprimente. Seguimos o parecer do patrono do Senado Federal, Rui Barbosa.
Continuamos na companhia dele, excelente guia para se compreender os grandes dilemas daquela experiência histórica.
O que Rui Barbosa cobrava, no contexto histórico da República Velha, veio a ter a sua oportunidade de realização com a Constituição de 1988.
Nesta quadra comemorativa, que compreende as homenagens prestadas aos natalícios de 1889 e de 1988, a sopa de números que poderia ser aleatoriamente combinada sugere correspondências objetivas entre a fundação da República, 1889 - inspirada nos exemplos históricos da Revolução Francesa, mas, sobretudo, na elaboração norte-americana -, e a definição do quadro normativo do Brasil moderno, 1988.
O que distingue a Carta de 1988, em comparação com nossas experiências constitucionais anteriores, é precisamente a ênfase depositada nos direitos humanos e nos direitos fundamentais, enfeixados na noção de cidadania.
Nas constituições precedentes, a cidadania era sempre marginalizada. Tema desprezado, aparecia sempre em último lugar, não raro submerso em dispositivos que o limitavam, até mesmo eclipsando-o por meio de omissões intencionais.
Como bem reparou o nosso Rui, a República Velha não desperdiçava tempo com assuntos sociais.
As prioridades eram outras e tinham por conseqüência lançar a questão social na lata de lixo da história.
A nossa primeira vivência republicana anunciou, porém, naquilo que ela deixou de realizar, os rumos do futuro da Nação.
Parafraseando Rui Barbosa, "claridades de alvorada aureolaram" a Constituição de 1988. O seu brilho revelou-se, porém, com a intensidade do sol do meio dia.
A Constituição cidadã resultou da forte demanda histórica para se saldar a enorme dívida social acumulada por séculos, sem solução alguma.
As frustrações do intento maior da experiência republicana, a consagração da cidadania, nortearam a Constituinte de 1987/1988.
A República não poderia faltar novamente ao encontro, Senhoras e Senhores Senadores. Não poderia faltar ao encontro com a cidadania.
A partir de 1988, passamos a deixar de ser o País, na descrição de Rui Barbosa, "onde não entra o sol, não entra a saúde, onde não entra a luz, não entra o asseio, onde não entra a claridade, não entra a ordem, a pureza, o contentamento".
Deixamos de ser a Nação que poderia ter sido e não foi, o lugar das expectativas desiludidas, o eldorado do ouro de tolo dos bandeirantes que singraram os interiores deste País, por dois séculos, em expedições de lucros imaginários a busca das terras do Sabarabuçu, descritas nos roteiros de Fernão Dias Paes.
Assim, o recado de 1889 se fez ouvir em 1988, por propiciar, no novo enquadramento jurídico estabelecido, a moldura adequada na qual se desenvolve o modelo de desenvolvimento brasileiro, o modelo do desenvolvimento com inclusão social.
Os governantes do nosso País compreenderam como a cidadania pode ser forte indutora de desenvolvimento econômico.
Não podemos pensar o sucesso do Brasil, no mundo de hoje, sem a integração das camadas dos historicamente excluídos como agentes econômicos ativos.
Reconhecendo que temos muito a caminhar, temos o direito, devemos mesmo proclamar, cotidianamente, a refundação da nossa República.
Era o que tinha a dizer.
Muito obrigado.