Discurso durante a 211ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Congratulações à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura pelos cinquenta anos de existência a serem completados em 22 de dezembro próximo; e outros assuntos.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM, POLITICA AGRICOLA. AGRICULTURA. HOMENAGEM. DIREITOS HUMANOS, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Congratulações à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura pelos cinquenta anos de existência a serem completados em 22 de dezembro próximo; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2013 - Página 84349
Assunto
Outros > HOMENAGEM, POLITICA AGRICOLA. AGRICULTURA. HOMENAGEM. DIREITOS HUMANOS, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, CONFEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA (CONTAG), RESPONSAVEL, LUTA, DIREITOS, TRABALHADOR RURAL.
  • COMENTARIO, EVENTO, EXPOSIÇÃO, VENDA, MATERIAL, AREA, AGRICULTURA, MUNICIPIO, PORTO ALEGRE (RS), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, AGRICULTURA FAMILIAR, DECLARAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), REFERENCIA, TRABALHADOR RURAL, IMPORTANCIA, COMBATE, FOME, POBREZA, DESENVOLVIMENTO, ECONOMIA, LOCAL.
  • REGISTRO, REFERENCIA, CONTRIBUIÇÃO, ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL, COTA, SERVIÇO PUBLICO, AUMENTO, POLITICAS PUBLICAS, PARTICIPAÇÃO, NEGRO, SOCIEDADE, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, SAUDE, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Mozarildo Cavalcanti, eu aproveito esta manhã de sexta-feira para fazer aqui alguns registros, a pedido de entidades, a pedido de movimentos sociais, sobre temas de que eu tenho tratado ao longo da minha caminhada, que são o combate a todo tipo de preconceito e a defesa permanente dos interesses dos trabalhadores do campo e da cidade, e naturalmente dos aposentados e pensionistas.

            Sr. Presidente, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) completa 50 anos agora em 22 de dezembro, exatamente daqui a 30 dias. A solenidade da festa aconteceu ontem, 21 de novembro.

            A Contag é uma entidade histórica, pois foi lá que nós nos reunimos diversas vezes durante a Assembleia Nacional Constituinte, para elaborar toda a parte da ordem social, que vai do art. 6º ao 12 da nossa Constituição. Lá foi o grande QG dos Constituintes, liderados também naturalmente pelo Diap, pelo Dieese, pelas confederações e centrais sindicais, e aqui o destaque para a Contag.

            A Contag possui 27 federações e mais de 4 mil sindicatos no País - 4 mil sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras rurais, filiados. Ela luta pelos direitos de milhões de homens e mulheres do campo e da floresta, que são agricultores familiares, acampados, assentados. Luta pela reforma agrária, pelos assalariados rurais, meeiros, comodatários, extrativistas, quilombolas, pescadores artesanais e ribeirinhos.

            A Contag integrou a vanguarda da luta contra a ditadura militar. Foi fundamental para a volta da democracia no Brasil, reivindicando uma ampla e irrestrita anistia política, eleições diretas e, como eu disse antes, foi fundamental até mesmo na convocação da Assembleia Nacional Constituinte.

            Durante a Constituição de 1988 - e eu estava lá, fui constituinte, V. Exª também, Senador Mozarildo -, a Contag participou de discussões que envolviam os direitos de toda a nossa gente, do campo e da cidade. Uma das vitórias foi a inclusão dos trabalhadores e trabalhadoras rurais na Previdência Social, garantindo, inclusive, aquele direito de um salário mínimo.

            Portanto, Sr. Presidente, senhoras e senhores, meus cumprimentos, meus parabéns, em nome do Senado Federal, em nome dos trabalhadores do campo e da cidade, a essa entidade, a Contag, pelos seus 50 anos de luta, 50 anos de vida nessa caminhada em defesa da nossa gente. Vida longa à Contag, vida longa aos trabalhadores do campo, que ela tão bem representa!

            Sr. Presidente, na mesma linha, quero também fazer um pronunciamento sobre a garantia dos direitos previdenciários na agricultura familiar. No mês de agosto deste ano, em Esteio, na região metropolitana de Porto Alegre, capital do meu Estado, o Rio Grande do Sul, tivemos mais uma edição importantíssima, a 34ª, da Expointer.

            A abertura desse importante e tradicional evento agrário coube à Presidenta Dilma Rousseff, que destacou, em seu pronunciamento, a importância da exposição e seus números expressivos. As vendas ultrapassaram R$850 milhões, e o público alcançou cerca de 560 mil pessoas.

            Evidentemente, os resultados positivos alcançados se devem a vários atores: ao governo estadual, aos produtores rurais - tanto os grandes, quanto os pequenos -, à agricultura familiar e à participação, eu diria, do povo gaúcho, num evento que já é internacional.

            Com efeito, a Presidenta destacou a capacidade rural do Rio Grande do Sul, sublinhando - abro aspas às palavras da Presidenta: “A cadeia de sucesso a que nós chegamos é fruto de trabalho, esforço e garra. Chegamos aqui graças também às políticas do Governo Federal, que se tornaram cada vez mais consistentes e fortalecidas.” Palavras da Presidenta.

            E quero ilustrar com uma dessas políticas.

            Ainda na Expointer 2013, recebemos uma importante informação provinda do Ministério da Previdência Social e do Ministro do Desenvolvimento Agrário.

            Em informe específico, o Ministro Pepe Vargas falou sobre a garantia dos direitos previdenciários para a agricultura familiar, destacando que, além de se tratar de fator de justiça social, esses direitos também são importantes para fortalecer a economia das regiões onde residem e trabalham os segurados.

            A opinião do Ministro é a seguinte:

Se juntarmos os recursos que a Previdência repassa com os recursos do crédito para a agricultura familiar, nós vamos ver o quanto isso movimenta a economia local e o quanto isso tem, em potencial, de geração de emprego e renda no comércio, na indústria e no setor de serviços.

            As palavras do Ministro Pepe Vargas encontram amparo na literatura acadêmica especializada sob diversos ângulos, que ora destacam os impactos econômicos, ora as melhorias de ordem social, convergindo sempre para destacar os efeitos benéficos do pagamento de benefícios rurais a esses trabalhadores tão importantes para o nosso País.

            No Rio Grande, são mais de 600 mil trabalhadores rurais amparados. No Brasil, o número ultrapassa a casa de 7 milhões, alavancados a partir do governo Lula e do Governo Dilma.

            Todo esse imenso universo aguardava, com ansiedade, boas notícias por parte do Governo brasileiro, e, mais uma vez, elas vieram.

            O Presidente do Instituto Nacional do Seguro Social, Dr. Mauro, afirmou, na mesma Expointer, que o trabalhador rural terá os direitos previdenciários reconhecidos automaticamente, da mesma maneira que hoje se faz com os trabalhadores urbanos, dispensando-os, assim, da penosa tarefa de apresentar vários e vários documentos ao INSS na hora de requerem o seu benefício. Para tanto, as informações laborais necessárias à concessão do benefício estarão registradas em um Cadastro Nacional de Informações Sociais de recorte rural.

            Trata-se de uma grande conquista, uma medida de caráter isonômico, capaz de igualar os trabalhadores do campo e da cidade, como manda a própria Constituição.

            Estamos todos de parabéns. A conquista e o aperfeiçoamento dos direitos previdenciários é uma velha bandeira que empunhamos há anos e anos, aqui nesta Casa, com muito orgulho, e que vemos agora se tornar realidade. Semeamos, e estamos hoje colhendo os frutos.

            Meus cumprimentos, especialmente ao Ministro Garibaldi, nosso colega aqui do Senado há tantos anos, que tem demonstrado muito carinho pelas causas das famílias rurais brasileiras.

            Cumprimento também o Ministro Pepe Vargas, ele, gaúcho lá da minha cidade, Caxias do Sul, que conhece bem a realidade do homem e da mulher do campo.

            Finalizo, Sr. Presidente, com as palavras de Elton Weber, Presidente da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Rio Grande do Sul. Após destacar que a garantia dos direitos previdenciários é uma das políticas que contribuem para manter os homens e mulheres trabalhando no campo, ele afirma, com propriedade: "Sem essas políticas públicas, nós teríamos muito mais problemas na questão da sucessão rural. A previdência social rural é uma forma de cidadania".

            Sr. Presidente, na mesma linha, ainda falando sobre agricultura familiar, quero discorrer agora sobre o Ano Internacional da Agricultura Familiar. Já que o assunto é agricultura familiar, quero lembrar que a ONU (Organização das Nações Unidas) declarou 2014 o Ano Internacional da Agricultura Familiar.

            O Ano Internacional da Agricultura Familiar visa destacar o perfil da agricultura familiar e dos pequenos agricultores, focalizando a atenção mundial em seu importante papel no alívio da fome e pobreza, provisão de segurança alimentar e nutrição, melhora dos meios de subsistência, gestão dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e obtenção do desenvolvimento sustentável, particularmente nas áreas rurais.

            O objetivo é reposicionar a agricultura familiar no centro das políticas agrícolas, ambientais e sociais nas agendas nacionais, identificando lacunas e oportunidades para promover uma mudança rumo a um desenvolvimento mais equitativo e equilibrado.

            Em 2014, haverá uma ampla discussão e cooperação no âmbito nacional, regional e global para aumentar a conscientização e o entendimento dos desafios que os pequenos agricultores enfrentam e ajudar a identificar maneiras eficientes de apoiar os agricultores familiares.

            A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura foi convidada a facilitar sua implementação, em colaboração com governos, instituições internacionais de desenvolvimento, organizações de agricultores e outras organizações relevantes do sistema das Nações Unidas, bem como organizações não governamentais relevantes.

            Mas, afinal, por que se fala tanto em agricultura familiar? Conforme a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) - aliás, seu Presidente é o brasileiro José Graziano da Silva, meu companheiro histórico -, a agricultura familiar inclui, Sr. Presidente, todas as atividades agrícolas de base familiar e está ligada a diversas áreas do desenvolvimento rural.

            A agricultura familiar consiste em um meio de organização das produções agrícola, florestal, pesqueira, pastoril e aquícola que são gerenciadas e operadas por uma família e é predominantemente dependente de mão de obra familiar, tanto de mulheres quanto de homens.

            Tanto em países desenvolvidos quanto em países em desenvolvimento, a agricultura familiar é a forma predominante de agricultura no setor de produção de alimentos. Em nível nacional, existe uma série de fatores que são fundamentais para o bom desenvolvimento da nossa querida agricultura familiar, tais como: condições agroecológicas e características territoriais; ambiente político; acesso aos mercados; acesso à terra e aos recursos naturais; acesso à tecnologia e serviço de extensão; acesso ao financiamento; condições demográficas, econômicas e socioculturais; disponibilidade de educação especializada, entre outros.

            A agricultura familiar tem um importante papel socioeconômico, ambiental e cultural, com certeza absoluta.

            Mas, afinal, a agricultura familiar tem um viés com os pequenos agricultores que estão diretamente vinculados à segurança alimentar mundial.

            A agricultura familiar preserva os alimentos tradicionais, além de contribuir para uma alimentação balanceada e salvaguardar a agrobiodiversidade e o uso sustentável dos recursos naturais.

            A agricultura familiar representa uma nova oportunidade para impulsionar as economias locais, especialmente quando combinada com políticas específicas destinadas a promover a proteção social e o bem-estar das comunidades.

            Sr. Presidente, há quatro objetivos-chave no ano internacional da agricultura familiar:

            - apoiar a formulação de políticas agrícolas, ambientais e sociais que promovam a agricultura familiar sustentável;

            - aumentar o conhecimento, a comunicação e a conscientização pública;

            - obter um melhor entendimento das necessidades, potencial e restrições da agricultura familiar e assegurar apoio técnico;

            - criar sinergias para sua sustentabilidade.

            Sr. Presidente, o ano internacional da agricultura familiar vai se concentrar em três linhas globais, Senador Mozarildo, de atuação, que serão implementadas no contexto dos processos e acordos nacionais em colaboração com os principais parceiros:

            - promoção do diálogo sobre processos de tomada de decisão em políticas públicas;

            - identificação, documentação e compartilhamento de lições aprendidas e de experiências bem-sucedidas de políticas pró-agricultura familiar existentes no âmbito nacional e global, para assim capitalizar conhecimentos relevantes sobre esse tema tão importante a que aqui eu destinei grande parte do meu pronunciamento, a agricultura familiar;

            - comunicação, promoção e divulgação.

            Sr. Presidente, pela importância desse tema, creio que esta Casa, o Senado Federal, poderia realizar, em 2014 - e entrei já com esse requerimento -, uma sessão especial sobre 2014, Ano Internacional da Agricultura Familiar. Faremos essa sessão em parceria com o Governo Federal e inclusive com entidades de nível internacional.

            Por fim, Sr. Presidente, quando falo em agricultura familiar, estou me referindo a todos os segmentos que defendo com muito amor e carinho desta tribuna: brancos, negros, índios, pequenos agricultores - não importa a origem, se quilombolas, se afrodescendentes, italianos, alemães, portugueses, japoneses, polacos. Não importa, aqui esse é o caminho.

            Nesse sentido, Sr. Presidente, aproveitando o tempo de que ainda disponho, eu gostaria de compartilhar, neste momento, com este Plenário e com o sistema de comunicação do Senado, algumas perguntas que recebi sobre a Semana da Consciência Negra.

            Depois de responder, elas foram publicadas nos órgãos que divulgam o trabalho daqueles que têm compromisso com a política de igualdade, eu resolvi, Sr. Presidente, para algumas questões ficarem mais claras, compartilhá-las da tribuna.

            Foi perguntado, Sr. Presidente, qual será a grande contribuição que o Estatuto da Igualdade Racial dará à comunidade a curto prazo. Eu respondi que o Estatuto da Igualdade Racial foi debatido por mais de 15 anos no Congresso Nacional. É uma proposta oriunda de homens e mulheres, negros e brancos, que queriam um instrumento jurídico que reunisse as principais demandas na construção de uma sociedade igualitária para todos.

            O desafio foi imenso, houve muita controvérsia e várias propostas que sonhamos não foram aprovadas num primeiro momento, mas o foram num segundo momento.

            Sabemos que um projeto original nem sempre é aceito em sua integralidade e eu sempre afirmo que projeto bom não é aquele que eu achei ótimo ou com que eu sonhei, mas aquele que conseguimos aprovar apesar das dificuldades.

            Por isso, o Estatuto da Igualdade Racial é um grande marco jurídico que deu legitimidade para formulação e implementação de inúmeras políticas públicas nesses três primeiros anos após sua aprovação.

            Apresentei o Estatuto há mais de 20 anos. Foi no debate da Assembleia Nacional Constituinte que começamos a sua elaboração e hoje ele é um marco na política brasileira.

            Nesse sentido, podemos citar a legitimidade, dada pelo Estatuto, à constitucionalidade das cotas no Supremo Tribunal Federal.

            O Estatuto ajudou e deu legitimidade para as cotas nas universidades, aprovadas, quase que por unanimidade, aqui, no Congresso Nacional. Aqui, no Senado, só houve um voto contrário.

            O Estatuto tem ajudado a construir cotas no serviço público em vários Municípios do País, inclusive em Estados como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

            O Estatuto colaborou e teve o reconhecimento da Presidenta Dilma neste sentido quando do envio do projeto de cotas para negros no serviço público, que passa a tramitar no Congresso Nacional.

            O Estatuto também ajudou dando legitimidade para o recente Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias do Nascimento - grande Abdias! -, que tem por objetivo propiciar a formação e capacitação de estudantes autodeclarados pretos, pardos, indígenas e pobres e também estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades, com elevada qualificação em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica e centros de pesquisa no Brasil e no exterior.

            Esses jovens terão a oportunidade de viver novas experiências educacionais e profissionais voltadas à educação, à competitividade e à inovação em áreas prioritárias para a promoção da igualdade racial, do combate a todo tipo de preconceito, do estudo e valorização das especificidades socioculturais e linguísticas dos povos indígenas, da acessibilidade e inclusão no Brasil e da difusão do conhecimento da história e cultura afro-brasileira e indígena.

            O Estatuto prevê um Sistema Nacional, chamado de Sinapir, Sistema Nacional de Política de Igualdade Racial, com forte função mobilizadora, que será implantado pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.

            O Estatuto também prevê que o Orçamento-Geral da União leve em consideração as demandas de promoção de políticas por igualdade, de negros, brancos, pobres e índios.

            A sociedade precisa empoderar-se desse documento, desse forte instrumento, e entendê-lo para formular cada vez mais políticas públicas.

            Quem não leu o Estatuto, que o leia!

            Sr. Presidente, em relação às comunidades quilombolas, perguntaram-me se a política de reconhecimento de posse é o bastante para garantir a preservação dessas comunidades. Eu respondi que a política de reconhecimento das terras quilombolas é uma grande fonte de luta das comunidades, mas ainda não é o bastante.

            Apresentei, no Congresso, um projeto chamado "Quilombos do Amanhã”, o Projeto de Lei nº 113, de 2008, com a finalidade de levar aos nossos quilombos saúde, educação, esporte, lazer e formas alternativas de trabalho.

            Não basta ter a terra. É preciso estruturar, aperfeiçoar, valorizar as tradições. Isso tudo, aliado às políticas de terra, dará um grande valor para nossas comunidades.

            Sr. Presidente, as manifestações de junho levaram várias pautas da sociedade às ruas. Então, perguntaram-me como eu teria visto o combate aos preconceitos.

            Eu respondi que achei bom a vinda das manifestações de junho, pois trouxeram pautas variadas: melhoria da prestação do serviço público, transporte, saúde, educação, combate à corrupção, entre outras.

            Defendemos, sim, todas essas propostas. Defendemos as políticas afirmativas, mas é muito importante que tenhamos um olhar sobre a política universal que atinge a grande maioria da população brasileira, principalmente os pobres. E lá estão os negros.

            Quanto à questão das passagens, por exemplo, sabemos que quem utiliza o transporte coletivo urbano são brancos e negros pobres. As manifestações são boas, são bem-vindas, são legítimas: transporte de qualidade e preço acessível.

            Outro exemplo, Sr. Presidente, de política universal é o Programa Bolsa Família, que não possui o corte racial, mas alcança mais de 70% da população negra.

            Trata-se da transferência de renda a brancos e negros pobres e abarca diretamente essa parcela da população. Como já dissemos, eles estão na base da chamada pirâmide social.

            Quando olhamos o avanço da classe média, percebemos o avanço da comunidade negra, pois, dos 25 milhões de pessoas que passaram a integrar a classe média, 75% são negras. Na saúde e na educação não é diferente, assim como no combate à corrupção, porque os desvios de recursos atingem diretamente os mais pobres, que são, naturalmente, negros e brancos nessa faixa.

            Quando aprovamos aqui que parte dos royalties vai para a educação, esse investimento maciço vai para onde? Principalmente para as escolas públicas, nas quais está a maioria da população pobre do nosso País. Eu diria até que lá está 100% da população pobre do nosso País, sendo que 70% dela é negra.

            Quando o Governo investe no Programa Mais Médicos, atendemos as periferias e os rincões do Brasil, as terras indígenas, os quilombolas, a agricultura familiar. É lá, de fato, que o nosso povo está.

            Como se pode ver, nas vilas, nos bairros, as pautas centradas nas políticas universais, naquele momento, não destacavam as questões pontuais do negro ou do branco, mas, fazendo uma leitura, podemos perceber que grande parte da comunidade negra está contemplada, porque está entre os mais pobres.

            Enfim, perguntam também quais são os cuidados que a comunidade brasileira precisa ter para tornar o Estatuto uma ferramenta efetiva de promoção da igualdade.

            Eu respondi que a principal estratégia a ser utilizada para que o Estatuto seja uma ferramenta efetiva é empoderar-se do Estatuto, fazer uma leitura, uma releitura e mais outra do seu texto e então perceber como ele é importante e como pode ser eficaz na construção de políticas públicas de combate a todo tipo de preconceito, buscando uma sociedade de iguais.

            Para aqueles que não têm condição de ler todos os 65 artigos, sugiro a leitura do art. 4o, que já é capaz de promover uma verdadeira revolução, pois permite a construção das ações afirmativas no Município, no Estado e na União. Então, repito: é preciso empoderar-se do Estatuto.

            Sr. Presidente, já enfrentamos, nas dependências do Congresso, no Supremo, em audiências públicas, nas ruas, nas praças, nas universidades, nas assembleias legislativas, debates incansáveis sobre políticas de igualdades, políticas afirmativas, políticas de cotas, e as respostas estão sendo dadas na sala de aula, com os jovens cotistas negros, pobres, brancos, indígenas, com deficiência, ocupando seus espaços com um grande sucesso. Sei que ainda existem dificuldades com a permanência dessas pessoas nas universidades em virtude de seus poucos recursos financeiros até para a alimentação e para o transporte, mas esse é um processo que nós haveremos de atravessar.

            Apresentei o projeto de Bolsa Permanência, Sr. Presidente, o PLS no 214, de 2010, e tenho procurado dialogar cada vez mais com o Governo Dilma para ampliar recursos da permanência. Esse é um desafio constante. Neste momento, as pautas latentes são as cotas no serviço público e o projeto da Bolsa Permanência, que vai assegurar que negros e brancos pobres tenham uma bolsa para poderem, efetivamente, estar nos bancos das universidades.

            Sr. Presidente, a imagem do negro na mídia, na TV, é de extrema importância. Defendo, sim, cada vez mais, uma política de inclusão. Temos visto algumas iniciativas pontuais e, certamente, tímidas, mas muito boas. A questão central são as ações afirmativas dentro da televisão brasileira, que já começou a adentrar, que é um espaço de reprodução, um espaço no qual avaliamos a nossa igualdade, um espaço de consumo e um espaço que cria referências.

            Com o avanço da classe média negra, vimos uma pequena modificação no olhar dos produtores sobre as atrizes e os atores negros. Mas só isto não basta. Queremos, claro, a participação efetiva de todos nas passarelas, nas propagandas e em todos os espaços. Afinal, todos, brancos, negros, pobres, índios, são consumidores.

            Como eu disse anteriormente, as cotas ampliam esse debate, devem ser vistas. Como disse aquele poeta espanhol que gosto de mencionar, o caminho a gente faz caminhando, caminhando juntos, brancos, negros e índios de mãos dadas.

            Sr. Presidente, estou indo para o final.

            O jovem brasileiro é alvo de um violento processo de extermínio em algumas das principais capitais do País. Isto está na mídia todos os dias. Acredito que a principal forma de resistência é manter a esperança na mudança de mentalidade.

            Existe uma crítica muito forte à polícia em relação ao seu papel repressivo contra os jovens negros, mas é importante que cada um, como Congresso Nacional, como Estado, como sociedade, reflita sobre seu papel nesse contexto, sobre sua contribuição no sentido de dar formas e instrumentos para que esses jovens tenham um lugar ao sol.

            Aqui, destaco, Sr. Presidente, que há cerca de 15 dias, juntamente com a Senadora Lídice da Mata, entregamos aqui a proposta de uma CPI para o enfrentamento à violência contra os jovens negros, porque, de cada dez jovens assassinados, oito são negros. O Presidente Renan Calheiros me indicou para Presidente e a Senadora Lídice da Mata para Relatora.

            Aqui, no Congresso Nacional, trabalhamos fortemente e fui Relator do Estatuto da Juventude. Estamos levando aos jovens o sonho de estudar numa universidade em que ninguém seja excluído pela cor da pele, como acontecia até o período em que não tínhamos o Estatuto e as cotas. Abordamos essa questão no Estatuto da Igualdade Racial, no capítulo “Da Juventude”, pois acreditamos que devem existir diversas políticas conjuntas para este tema. E lá mesmo, no Estatuto da Juventude, colocamos também um artigo para combater a discriminação de alguém pela sua orientação sexual - e já é lei.

            Também estamos apoiando o Programa Juventude Viva. Esse programa nasceu de uma intensa articulação interministerial para enfrentar a violência contra a juventude brasileira, especialmente aqueles que estão sendo agredidos e assassinados, na sua ampla maioria, negros, mas também brancos. Ele reúne ações de prevenção a partir da criação de oportunidades de inclusão social e autonomia; da oferta de equipamentos, serviços públicos e espaços de convivência em territórios que concentram altos índices de homicídio. Assim buscamos também o aprimoramento da atuação do Estado por meio do enfrentamento ao racismo institucional e da sensibilização de agentes públicos para essa questão.

            Não é uma tarefa fácil. Não é uma tarefa fácil vencer o violento processo de extermínio da juventude. Precisamos reunir uma verdadeira força tarefa para acabar com isso e precisamos lembrar sempre que, matando esses jovens, mata-se o futuro do nosso País.

            Sr. Presidente, quando um jovem da periferia, negro ou branco, é morto, estamos matando a vida, a alegria, estamos matando o Brasil, estamos permitindo que matem nossos filhos, nossos netos, nossos bisnetos.

            Precisamos acabar com os autos de resistência nas ocorrências policiais, uma vez que é um dos fortes fatores das mortes desses jovens em nosso País. Isso é violação dos direitos humanos.

            Para terminar, Sr. Presidente, agradecendo muito a V. Exª, apenas digo essa frase final: para combater todo tipo de preconceito, todo tipo de violência, seja física, seja pontual, seja pela cor da pela, seja pela orientação sexual, só tem um caminho - e sei que V. Exª vai concordar -, o de investir na educação, na educação, na educação, na saúde, no lazer e na cultura. Assim, estaremos dando aos jovens formas de conhecimento para que possam ascender socialmente e viver e envelhecer com dignidade.

            Por isso, insistimos tanto, tanto, tanto, que a palavra número um foi: educação, educação, educação e educação.

            Obrigado, Presidente. Agradeço muito a V. Exª por ter permitido que eu completasse o meu pronunciamento nesta manhã de sexta-feira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2013 - Página 84349