Pronunciamento de João Capiberibe em 25/11/2013
Discurso durante a 212ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Necessidade de maior controle social dos gastos públicos e de maior celeridade do Poder Judiciário no exercício da jurisdição.
- Autor
- João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
- Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
REFORMA JUDICIARIA, JUDICIARIO, IMPRENSA.:
- Necessidade de maior controle social dos gastos públicos e de maior celeridade do Poder Judiciário no exercício da jurisdição.
- Aparteantes
- Mozarildo Cavalcanti.
- Publicação
- Publicação no DSF de 26/11/2013 - Página 85468
- Assunto
- Outros > REFORMA JUDICIARIA, JUDICIARIO, IMPRENSA.
- Indexação
-
- SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, INTERNET, PERIODICO, EPOCA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSUNTO, DEFESA, NECESSIDADE, AUMENTO, CONTROLE, GASTOS PUBLICOS, REFORMA JUDICIARIA, CRITICA, ATUAÇÃO, JUDICIARIO, RELAÇÃO, DEMORA, EXCESSO, CUSTO, QUANTIDADE, PROCESSO JUDICIAL, CARENCIA, MODERNIZAÇÃO.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srs. Senadores, Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, na verdade, hoje eu gostaria de fazer uma prestação de contas de nossa participação na COP-19, realizada em Varsóvia, sobre mudanças climáticas. No entanto, alguns fatos terminam se sobrepondo à agenda e eu gostaria aqui de abordar uma situação que ocorreu no meu Estado, sexta-feira passada.
A verdade é que nós exercemos uma das atividades que não admitem exceção. Quando um político comete um desvio de comportamento, aí são todos os políticos. No senso comum, a atividade política é a mais degradante que existe. Quando um médico comete um erro médico, é citado o nome desse médico, ou, quando um prédio cai, é um engenheiro fulano de tal que cometeu esse descuido, mas, na política, não. Na política, todos são iguais, todos vão para a vala comum da desonestidade e da corrupção. Isso cria um clima de descrédito, de desalento na sociedade.
No momento em que nós acompanhamos a prisão de políticos, empresários - empresários importantes, banqueiras -, envolvidos no mensalão, haveria de se pensar, de se imaginar que haveria uma redução, haveria, digamos, um receio de desviar recurso público, mas parece que não, parece que não há como paralisar essa sangria dos cofres públicos, mesmo que hoje tenhamos muito mais transparência no uso dos recursos públicos, tenhamos dado saltos importantes. Do meu ponto de vista, melhoramos a aplicação dos recursos, mas ainda há uma certa impunidade, essa é a palavra.
E as mazelas do Judiciário, um Poder que trabalha com leis anacrônicas, criadas para favorecer e proteger as elites deste País, terminam fazendo com que os processos não terminem nunca. Mas esse, do mensalão, foi um processo - digamos - ágil, porque existem alguns que estão lá há 20 anos, e a grande maioria termina não tendo resultado prático nenhum.
Em nosso País, como falei no começo, há uma enorme dificuldade de separar o joio do trigo, o político limpo do político sujo, e aí se estabelece e se generaliza que todos são iguais. Mas trago hoje, aqui, um exemplo de políticos sujos, que, infelizmente, mais uma vez, vem do meu Estado, vem do Amapá.
Eu peguei aqui uma matéria publicada, criteriosa, de um jornalista chamado Paulo Silva, matéria que saiu, no sábado, no Portal Brasil 247, que passo a ler. Abre aspas:
Após saquear o Executivo estadual do Amapá no período 2003/2010 - estima-se um rombo de mais de R$1,5 bilhão - o grupo da chamada "HARMONIA", que provocou sete operações da Polícia Federal dentro do governo do Estado [sete operações!], passou a atacar os cofres dos órgãos federais, com especial destaque para a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), alvo de duas operações da PF entre 2011/2013.
A Funasa no Amapá é indicação do PMDB - o PMDB, que tem, nesta Casa, como representante o ilustre Senador José Sarney e, também, no Amapá, o ex-Senador Gilvam Borges. O PMDB indica os gestores da Funasa desde os anos 1990.
[...] e todos os superintendentes nomeados se meteram em encrencas e foram condenados pelo Tribunal de Contas da União, entre eles o ex-deputado federal Gervásio Oliveira e o servidor Abelardo Oliveira (demitido do serviço público), além de funcionários de diversos setores da instituição.
A Operação Citrus, desencadeada nesta sexta-feira, 22, pela Polícia Federal, é resultado de cinco meses de investigação que apuraram desvio de mais de R$45 milhões em convênios assinados pela Funasa com as prefeituras do Oiapoque e Laranjal do Jari, no sul do Estado. O Superintendente da Funasa, José Roberto Galvão, a ex-Prefeita de Laranjal do Jari, Euricélia Cardoso, e Agnaldo Rocha, ex-Prefeito do Oiapoque, foram presos. Meses antes da operação, a Polícia Federal esteve por diversas vezes na sede da Funasa buscando documentos. Galvão, Euricélia e Agnaldo são ligados ao ex-Senador Gilvam Borges e ao Senador José Sarney.
Mas a primeira operação da Polícia Federal a atingir os esquemas de corrupção da Funasa no Amapá foi a [Operação] “Carniça”, deflagrada em 2011, quando a Polícia Federal descobriu que o dinheiro público destinado ao atendimento médico indígena foi desviado para a campanha da família de Gilvam Borges, então no mandato de Senador.
À época, um relatório de 389 páginas da Controladoria-Geral da União comprovou o que se suspeitava na Funasa do Amapá: fraudes em licitações, compras de remédios e outros produtos com preços acima dos praticados no mercado, além de pagamentos indevidos por serviços não prestados. A CGU calculou só o prejuízo financeiro em R$6,2 milhões. Entre 2005 e 2009, a Funasa gastou R$34 milhões com saúde indígena.
Os relatórios da CGU expuseram a influência do então Senador Gilvam nas atividades da Funasa no Amapá. O caso mais significativo envolveu um convênio firmado em 2006 entre a Funasa e uma Organização Não Governamental, a Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (Apitu). Em três anos, a Apitu recebeu R$6 milhões da Funasa. Segundo a CGU, o prejuízo para os cofres públicos nesse convênio chegou a R$2,8 milhões.
O assombro não estava na dimensão dos desvios, mas no destino final deles [para onde foi o dinheiro]. Depois de receber os recursos do Governo, a Apitu repassou R$667 mil à AFG Consultores Ltda. Os serviços, diz o relatório, nunca foram prestados. A Polícia Federal quebrou o sigilo bancário da AFG e mostrou o caminho percorrido pelo dinheiro. Das contas da AFG, os recursos saíram para as contas do comitê eleitoral do PMDB no Amapá, a fim de financiar as campanhas a prefeito de dois irmãos de Gilvam. Um deles, Geovani Borges, compartilhou mandato de Senador com o irmão: volta e meia um tirava licença para que o outro exercesse o mandato em Brasília. Em julho de 2008, Geovani exercia o mandato de Senador quando a AFG passou R$150 mil ao comitê de sua campanha à prefeitura de Santana, no Amapá. Esse dinheiro era quase um terço de tudo o que Geovani declarou à Justiça Eleitoral. Ele perdeu a eleição para prefeito.
De acordo com sua prestação de contas da campanha a prefeito de Mazagão, também no Amapá, Giodilson Borges, o outro irmão de Gilvam, informou que recebeu R$40 mil da AFG. Em entrevistas a revista Época, Gilvam e Geovani só reconheceram o financiamento depois de serem informados de que a doação está registrada na Justiça Eleitoral. Giodilson estava no centro das investigações. Foi ele quem aproximou o clã Borges de Henry Williams Rizzardi e Andréia Fernandes Gonçalves, donos da AFG. Andréia e Henry formam um casal que, segundo a Polícia Federal, aplicou golpes em Brasília e em dezenas de Municípios. Os dois foram presos na Bahia e mandados para o Amapá, onde passaram cinco dias na cadeia. Giodilson é o atual Prefeito de Mazagão, eleito em 2012.
O maior desfalque no convênio da Funasa com a ONG Apitu foi na contratação de empresas de táxi aéreo. Em depoimento à Polícia Federal, a servidora Maria do Socorro Tavares Miranda, então responsável pelos pregões eletrônicos da Funasa, contou que foi procurada pelo empresário Geodalton Pinheiro Borges, caçula dos 13 irmãos Borges. Segundo Maria Tavares, Geodalton pediu a ela que manipulasse o Pregão nº 15, de 2009, e contratasse a empresa Norte Táxi Aéreo para atender os índios do Amapá e do norte do Pará.
E a matéria segue. Eu não vou ler até o final, mas vou pedir que sejam inscritas nos Anais do Senado as duas matérias, tanto a da revista Época, como também a do jornalista Paulo Silva, que faz uma radiografia do comportamento político na condução da Funasa, no nosso Estado.
É verdade, Senadora Ana Amélia, que há uma enorme desconfiança entre a sociedade e aqueles que a sociedade escolhe para representá-la, seja no Parlamento, seja no Executivo. Essa desconfiança é gerada por esse tipo de comportamento.
Há, de fato, da minha parte, uma contribuição para que reduzamos essa desconfiança. Trata-se da Lei da Transparência, que tornou obrigatória a exposição, em tempo real, de todas as despesas públicas de forma detalhada na internet. No entanto, persiste um distanciamento da sociedade, uma falta de interesse. Inclusive, eu posso incluir aí os meios de comunicação, que, só muito recentemente, estão preparando seus jornalistas para a investigação e a utilização das informações dadas nos portais de transparência de alguns órgãos, porque há alguns órgãos públicos que resistem a expor as suas despesas com clareza para que todos possam seguir.
Efetivamente, nós carecemos de um controle social maior dos gastos públicos. As informações estão disponíveis. Aqui mesmo no Senado, as informações de todos os Senadores, detalhadas, estão na internet à disposição de todos. E é necessário que a sociedade se anime, que as organizações da sociedade trabalhem no sentido de controlar os gastos e até de preveni-los, porque, muitas das vezes, uma compra superfaturada pode ser paralisada antes de que seja consumada.
Infelizmente, no Amapá, nós tivemos, em oito anos, sete operações da Polícia Federal e, agora, são os órgãos do Governo Federal que estão sendo saqueados no Estado. Precisamos dar uma parada. Inclusive, é nosso interesse, interesse daqueles que exercem a atividade política, que exercem a representação política, que possamos fazer o controle e dar um basta a essa situação.
Senador Mozarildo, por favor.
O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco União e Força/PTB - RR) - Senador Capiberibe, fico feliz por V. Exª falar principalmente com relação à Funasa. Lá em Roraima, dois dirigentes da Funasa e funcionários já foram presos pela Polícia Federal em operações justamente baseadas em denúncias que eles constataram. Vou dar um exemplo. V. Exª falou sobre a questão de uma ONG indígena. Lá existem umas três que recebem também para cuidar dos atendimentos médicos nas comunidades. Não fazem nada e recebem o dinheiro. Pior ainda: a Funasa contrata aviões para irem às comunidades indígenas mais distantes. No fundo, no fundo, o voo é feito só de Boa Vista para uma fazendinha próxima, os pilotos esperam para passar o tempo necessário que fosse para ir à comunidade e voltar e cobra integralmente o voo não realizado. E esse dinheiro dividido, logicamente, com os dirigentes da Funasa e, talvez, outros políticos. Mas o importante é que, como disse V. Exª, como isso acontece e o povo não vê punição, então, realmente, a coisa fica, digamos assim, contaminando e fazendo aquilo que V. Exª disse, que todo político não presta. Alguns não prestam, contaminam genericamente todo mundo. Eu quero me somar ao protesto de V. Exª. Não é só na Funasa, que, aliás, no meio médico e também na população, já estão tratando a Funasa como funerária nacional da saúde, porque não presta os serviços que deveria prestar e, pior, é uma roubalheira atrás da outra. A CGU, no ano passado, fez um levantamento dos últimos quatro anos, e foram desviados da Funasa no Brasil todo, R$500 milhões, dinheiro que deveria estar no atendimento à saúde dos Municípios e, principalmente às comunidades indígenas. Obrigado.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - Obrigado, Senador Mozarildo. Só para complementar as informações de V. Exª, eu fui governador do Amapá, prefeito da minha cidade de Macapá, e sou aliado dos povos indígenas. Aliás, o meu mandato está a serviço aqui dos segmentos mais vulneráveis da sociedade: quilombolas, povos indígenas, ribeirinhos, mulheres. Eu acompanho o desempenho da Fundação Nacional de Saúde do meu Estado, e o volume de recursos gastos para colocar água nas comunidades indígenas desde a metade dos anos 90 desapareceu todo.
No norte do Amapá, na reserva indígena do Uaçá, onde vivem em torno de 6 mil indígenas em suas reservas, em suas áreas, trabalhando, mergulhados na sua cultura, só tem uma comunidade indígena com água tratada, quando eu coloquei na época em que eu era governador. Depois, o recurso era transferido para a Funasa e desviado. Em todas as comunidades indígenas você vai encontrar canos, vai encontrar uma caixa d’água, mas não realizaram o serviço. Isso é uma coisa vergonhosa.
E tem um dado: a Justiça não julga. Ora, justiça que tarda não é Justiça. Esse exemplo do mensalão, da Ação nº 470, que foi ágil, tem que se estender; daqui para frente, tem que servir de exemplo. Parar com essa lentidão insuportável nos julgamentos. Nos tribunais de justiça do meu Estado, são dezenas de operações da Polícia Federal e estão todos lá livres, leves e soltos. E isso termina gerando a impunidade, a repetição, e a gente vem à tribuna falar, repetir; de tempos em tempos, contar uma operação de desvio de bilhões. São R$45 bilhões. Agora, não é verdade que todos os políticos são iguais, Senador. Não é verdade.
Eu estou na vida pública há mais de 30 anos e nunca respondi a um inquérito administrativo, nunca fui nada. Sempre usaram as instituições do Judiciário de forma política contra mim: ações populares e tal, mas nunca fui objeto nem mesmo de investigação. Meu filho é Governador, nenhuma operação em três anos. Está lá. Dá trabalho fiscalizar? Dá. Dá trabalho porque você tem que afastar, você tem que se desgastar da política. O que não dá é para passar a mão na cabeça de ninguém que desvia dinheiro do contribuinte.
Muito obrigado.
DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR JOÃO CAPIBERIBE EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)
Matérias referidas:
- Anexos.