Discurso durante a 227ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas às brigas de torcidas nos estádios brasileiros e às ações tomadas pelas autoridades.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE.:
  • Críticas às brigas de torcidas nos estádios brasileiros e às ações tomadas pelas autoridades.
Publicação
Publicação no DSF de 13/12/2013 - Página 94059
Assunto
Outros > ESPORTE.
Indexação
  • CRITICA, CONFLITO, ESTADIO, FUTEBOL, TORCEDOR, LEGISLAÇÃO, AUSENCIA, PUNIÇÃO, SEGURANÇA, POLICIA MILITAR.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, hoje não falarei mal da Presidente, Senador Requião.

            Trago a esta tribuna um assunto que devíamos ter debatido já na segunda-feira, mas ainda de forma oportuna, porque, há pouco, dois Ministros se reuniram para adotar providências em relação à violência nos estádios de futebol do Brasil.

            Por mais providências que adotem, e todas elas serão sempre bem acolhidas, é preciso dizer que já temos os antídotos necessários para o combate à violência nos estádios. Só falta usá-los. Temos legislação competente para punir os vândalos que promovem a selvageria nas arquibancadas dos estádios brasileiros.

            Essa movimentação do Governo se dá em razão do último episódio, dramático e lamentável episódio, ocorrido na cidade de Joinville quando do jogo entre Atlético Paranaense e Vasco da Gama.

            A legislação competente a que me refiro surgiu com a CPI do Futebol. A exemplo dessa CPI agora proposta pelo Senador Requião, lá por volta de 2001, propusemos a CPI do Futebol, que indiciou 17 cartolas brasileiros por falcatruas, por irregularidades, por corrupção na administração do futebol do País, e essa CPI legou também, no plano propositivo, duas obras de legislação: o Estatuto do Torcedor, a que me referirei a seguir, e a Lei de Responsabilidade do Desporto Nacional.

            São propostas de legislação que mudaram o conceito de administração do futebol, do desporto no nosso País, mas o fato recente que, lamentavelmente, produziu uma repercussão internacional negativa, com imagens de selvageria expostas na imprensa internacional, nos leva a ocupar a tribuna para dizer que as autoridades responsáveis, pelo que se verificou após o evento de Joinville, não leram o Estatuto do Torcedor.

            O responsável pela Polícia Militar de Santa Catarina não leu o Estatuto do Torcedor. O promotor público que deu entrevistas à imprensa nacional não leu o Estatuto do Torcedor. Vi também uma entrevista do Presidente do STJD que deixou a impressão não ter ele também lido o Estatuto do Torcedor.

            Comentários de colunistas esportivos também deixaram a impressão de falta de leitura do Estatuto do Torcedor, porque depois daquele evento buscou-se apontar responsáveis. E apontaram como responsável o Clube Atlético Paranaense, esquecendo-se de que a segurança nos estádios é responsabilidade do Estado - está no Estatuto do Torcedor.

            Eu leio. Aliás, o Estatuto do Torcedor no art. 13 diz: “O torcedor tem direito à segurança nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das partidas.”

            E o que diz o Estatuto do Torcedor com relação à responsabilidade pela segurança?

A responsabilidade pela segurança do torcedor em eventos esportivos é da entidade de prática desportiva detentora do mando do jogo e de seus dirigentes, que deverão [isto é o que importa] solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos de seguranças, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dos torcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de realização de eventos desportivos.

            Eu ouvi declaração do promotor público de que a responsabilidade da Polícia Militar pela segurança seria fora dos estádios. A legislação é clara, o Estatuto do Torcedor é claro. É responsável pela segurança dos torcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de realização de eventos esportivos.

            Portanto, ao clube patrocinador cabe informar. Não é da competência do clube realizar a segurança. Ele informa à Secretaria de Segurança do Estado onde será realizado o evento esportivo.

            Está aqui:

Informar imediatamente após a decisão acerca da realização da partida, dentre outros, aos órgãos públicos de segurança, transporte e higiene, os dados necessários à segurança da partida, especialmente:

a) o local;

b) o horário de abertura do estádio;

c) a capacidade de público do estádio; e

d) a expectativa de público.

            Portanto, ao Clube Atlético Paranaense, naquele evento, cabia informar à Secretaria de Segurança Pública do Estado de Santa Catarina. E à Secretaria de Segurança Pública cabia oferecer a segurança necessária aos torcedores fora e dentro do estádio em Joinville, a cidade do nosso colega Senador Luiz Henrique.

            Portanto, não há dificuldade de interpretação da legislação vigente. Ela é autoexplicativa. Por isso, nós nos surpreendemos. O mundo se surpreendeu com o espetáculo de violência em Joinville, como antes se surpreendera com outros espetáculos de violência, um deles aqui em Brasília mesmo, no Estádio Mané Garrincha, durante o jogo Corinthians e Vasco da Gama. Agora, nós nos surpreendemos com a falta de leitura das nossas autoridades, que não leram a legislação vigente.

            O que se verifica é a adoção de medidas punitivas que alcançam a instituição, o clube. Por exemplo, partidas com os estádios fechados, sem a presença da torcida. Os vândalos são punidos com isso? Evidentemente, não são punidos. Punidos com esta medida são aqueles torcedores da paz, aqueles que comparecem aos estádios e sustentam, portanto, com os ingressos que pagam, parte das despesas do clube para o qual torcem. Esses são punidos. Os estádios estão fechados durante a realização de alguns jogos, eles não podem comparecer, e é evidente que a beleza lúdica do espetáculo futebolístico se dá exatamente com a presença dos torcedores. Não há a mesma emoção, não é o mesmo espetáculo quando os torcedores estão ausentes.

            Então, a indagação: quem é punido com esta medida? O espetáculo é punido. É evidente: perdem todos aqueles que se envolvem no mundo do futebol, com a promoção do espetáculo, com a transmissão dos eventos.

            Todos perdem. E eles não são responsáveis pela violência que alguns vândalos praticam nos estádios de futebol.

            Os torcedores, de modo geral, a maioria esmagadora, torcedores que comparecem aos estádios na paz, na alegria, na vibração proporcionada pela competição, pelo esporte - no caso, pelo futebol -, esses é que são punidos com medida dessa natureza. 

            Não é uma medida inteligente, não atinge o alvo.

            A outra medida: obrigam os clubes a jogar longe de casa.

            Nesse caso de Joinville, o Atlético estava sendo punido, porque jogaram uma garrafa de água no estádio, em Curitiba. Ele foi punido e obrigado a jogar a 100 quilômetros da capital paranaense.

            Ora, é obrigado a jogar, a 100 quilômetros, um jogo importante, decisivo. A torcida tem de se locomover sem segurança, vai para um estádio sem segurança alguma, e é evidente que se oferece oportunidade ao vandalismo, à selvageria, que tem de ser condenada por todos nós, independentemente do clube.

            Portanto, não é a providência adequada.

            O Governo, agora, anuncia a criação de delegacias, etc., mas o importante mesmo é cumprir a legislação. O Estatuto do Torcedor permite a prisão dos que se envolvem. A nossa legislação é competente para tal.

            Esta é a punição adequada: a prisão em flagrante dos que se envolvem em violência nos estádios de futebol e, a critério do juiz, a substituição da pena de prisão pelo afastamento dos jogos durante três anos, com a necessidade de apresentação à autoridade duas horas antes da realização dos jogos, sendo liberados apenas duas horas após a realização dos jogos.

            Na Inglaterra, essa é também a legislação que resultou em pacificar os estádios britânicos. Os chamados hooligans, que promoviam baderna, selvageria, atos de violência reiteradamente, esses desapareceram de cena, porque foram presos e porque foram afastados dos jogos de futebol por dez anos. Depois dos dez anos, se houvesse reincidência, seriam definitivamente afastados - para sempre, portanto - dos estádios de futebol. Aí, sim, há rigor. Aí, sim, há providência legal, responsável, capaz de organizar os eventos esportivos na paz.

            Vejam que o que nos espantou foi ver que, nos veículos de comunicação, havia até cronistas esportivos defendendo que era um evento privado e que, como tal, a segurança teria de ser privada.

            Nós pagamos impostos para que a segurança pública só proteja eventos oficiais do Estado? Um evento privado não merece ter a proteção da segurança pública? Para que pagamos impostos? Mas a legislação diz diferente. Felizmente, a legislação não comete esse absurdo. A legislação define claramente que a responsabilidade pela segurança nos estádios de futebol é do Estado brasileiro.

            É por isso, Senador, que todos nós que gostamos de futebol e que acompanhamos os espetáculos esportivos através da televisão estamos cansados de ver a Polícia Militar ou alguns policiais perfilados de costas para o campo do jogo e de frente para a torcida. Portanto, é visível que a Polícia Militar está presente nos estádios de futebol, porque compete ao Estado oferecer segurança também dentro dos estádios de futebol, independentemente do fato de ser o espetáculo esportivo um evento privado.

            A FIFA é uma entidade privada, uma instituição privada poderosíssima, que, aliás, faturará, no Brasil, com a Copa do Mundo, mais de US$5 bilhões, enquanto, certamente, deixará para o País, segundo cálculos, um prejuízo de mais de US10 bilhões. Pois bem, a FIFA é uma instituição privada. O Governo brasileiro, o Estado brasileiro, não oferecerá segurança aos torcedores que estarão nos estádios assistindo aos jogos da Copa do Mundo? É evidente que estará presente.

            Portanto, não podemos concordar com essa fuga à responsabilidade, com justificativas que se buscam para isentar de responsabilidade governantes, autoridades públicas e transferir a responsabilidade inteiramente para agentes privados, que oferecem uma participação efetiva na promoção do espetáculo futebolístico no País, que é uma paixão do povo brasileiro.

            É evidente que o clube tem responsabilidade e deve assumir a sua parte de responsabilidade neste caso. O clube também tem de ser punido, é evidente, mas vamos distinguir qual é a responsabilidade do clube e qual é a responsabilidade do Poder Público.

            É agora a indagação.

            O clube é punido. Eventualmente, os que se envolveram serão punidos. As imagens são claras, facilmente se identificará aqueles que participaram do ato de vandalismo lá na Arena Joinvile. Mas e a autoridade pública, ela paga? A autoridade pública responsável, sim, pela ocorrência será punida? Não será punida. Aliás, é defendida até indevidamente com interpretações que não correspondem à verdade da legislação vigente no País.

            Por essa razão, nós louvamos a iniciativa do Ministro Aldo Rebelo e do Ministro José Eduardo Cardozo, que se reuniram para tentar apresentar medidas que possam evitar a repetição de atos de violência nos estádios brasileiros. Mas sem cumprir a legislação, nós não evitaremos; sem cumprir a legislação, nós estaremos estabelecendo um cenário de impunidade que estimula a prática da violência nos estádios de futebol no Brasil.

            O que é importante é cumprir a legislação. O Congresso Nacional legislou; o Congresso Nacional ofereceu um instrumento para que se responsabilize civil e penalmente os envolvidos nessa baderna, nessa guerra de torcidas, nessa selvageria a que assistimos nos espetáculos de futebol no Brasil e que o mundo assiste, consubstanciando a nossa incompetência, a incompetência do Brasil de promover espetáculos em paz e civilizadamente.

            Fica, portanto, a nossa advertência como cidadão que gosta de esporte.

            É preciso responsabilizar corretamente, distinguir a responsabilidade de cada um.

            Em resumo, ao final, de nada adiantará punir clubes de futebol, fechando os estádios para que não arrecadem; de nada adiantará mandar clubes de futebol jogar longe de casa, aumentando despesas e provocando transtornos que alimentam a violência. Não se reduz a violência com medidas pouco inteligentes como essas. Para a redução da violência, há lei. Para a redução da violência, há penalização devida, há prisão para aqueles que praticam vandalismo nos estádios de futebol.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/12/2013 - Página 94059