Discurso durante a 228ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com as constantes intervenções do STF no Poder Legislativo; e outros assuntos.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODERES CONSTITUCIONAIS, JUDICIARIO, LEGISLATIVO. POLITICA PARTIDARIA, ATIVIDADE POLITICA. HOMENAGEM. DIREITOS HUMANOS.:
  • Preocupação com as constantes intervenções do STF no Poder Legislativo; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 14/12/2013 - Página 94456
Assunto
Outros > PODERES CONSTITUCIONAIS, JUDICIARIO, LEGISLATIVO. POLITICA PARTIDARIA, ATIVIDADE POLITICA. HOMENAGEM. DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • COMENTARIO, REFERENCIA, INTERVENÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, COMPETENCIA, LEGISLATIVO, RESULTADO, AUSENCIA, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, DISCUSSÃO, REALIZAÇÃO, PROPOSIÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MOTIVO, EXIGENCIA, RETIRADA, ASSINATURA, CONGRESSISTA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), TRANSPORTE.
  • HOMENAGEM POSTUMA, NELSON MANDELA, EX PRESIDENTE, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA DO SUL.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, COMISSÃO, VERDADE, PAIS, APRESENTAÇÃO, CONFIANÇA, ORADOR, JUVENTUDE.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS. Sem revisão do orador.) - Prezado companheiro Presidente, geralmente eu o encontro na Presidência, porque V. Exª está sempre nesta Casa, de segunda a sexta-feira, das 2 horas; e, quando eu saio - pode ser às 7 horas, às 8 horas, às 9 horas -, V. Exª ainda está aqui.

            Eu peço desculpa, mas foi um ano, foi um mês, foi uma semana muito corrida e não posso deixar de fazer alguns pronunciamentos que eu considero importantes e que transcorreram nesses dias. Amigos meus têm me cobrado pelo meu silêncio, porque não compareci aqui.

            Vou falar sobre a decisão de ontem do Supremo.

            Olha, Sr. Presidente, nós, a rigor, podíamos dormir sem essa. O Supremo vem dando umas ganhadas em nós duras. Não é confronto. Eu discordo daqueles que acham que há uma diferenciação, uma corrida para quem é melhor ou para quem decide, entre Supremo e Congresso Nacional. A Constituição é muito clara: os Poderes são iguais, independentes e harmoniosamente entre si, mas o que tem acontecido a gente já imaginava, eu já falei várias vezes nesta Casa.

            Morreu o Dr. Tancredo e o Presidente Sarney assumiu a Presidência da República. O Presidente Sarney - e faço justiça a ele, posso discordar disso ou daquilo -, naqueles princípios da aliança democrática que consolidara aquele momento histórico e ímpar na História do Brasil, cumpriu os seus compromissos e convocou a Assembleia Nacional Constituinte. Mas é verdade que o Presidente Sarney não tinha a autoridade que teria o Presidente Tancredo, se estivesse vivo. Tancredo foi o eleito, ele era o vice. Então, criou-se um embaraço difícil de conduzir a Constituinte.

            Dr. Ulysses, Presidente da Constituinte, com muita autoridade e com muita força, Presidente de um partido, e o MDB, sozinho, tinha maioria na Constituinte, Sr. Presidente, na Câmara e no Senado. Todos os governadores eram do MDB, à exceção do governador de Sergipe.

            No debate, surgiram grandes discórdias. No início, acertou-se, mas, no fim, um grupo competente - eu diria até dos maiores líderes, dos que eram mais capazes, eram mais progressistas - fez um lance de muita inteligência: criou uma comissão de sistematização que, aprovando o texto modelo da Constituinte, para mudá-lo depois, precisaria, para cada texto, o quórum qualificado.

            Só que aí nasceu o tal do centrão. Porque se as lideranças mais progressistas na Comissão de Sistematização tinham ampla maioria, no plenário não tinha. Eu me lembro do saudoso Deputado Robertão que, inclusive foi ministro do Dr. Sarney e coordenou esse centrão. E esse centrão inverteu, derrotou o texto da Comissão de Sistematização, entrando outro texto, o deles. E aí era o inverso. As lideranças maiores, mas que não eram majoritárias, tinham que votar e botar a maioria em cada texto.

            Mudou tudo. E esse é um fato da maior gravidade. E só a competência do Dr. Ulysses Guimarães e, de certa forma o respeito do Presidente Sarney ao Congresso Nacional, conseguiu que se chegasse ao final. Mas se chegou ao final, entre vírgulas. Ainda hoje, se nós pegarmos a Constituição, nós vamos encontrar uma série de dispositivos em que, na hora de votar, não havia acordo. Ou então, cá entre nós, e se fosse para votação, o Covas, Líder do Governo, mas na verdade minoritário, perderia em plenário.

            Então até hoje está na Constituição: O Brasil fará a reforma agrária. Mas como? Quer dizer, a Constituição diz que nós precisamos fazer a Reforma Agrária. Mas como? Em termos de lei complementar. Lá se vão 25 anos e até agora não tem coisa nenhuma de lei complementar.

            Será feita a reforma tributária. Como? Em termos de lei complementar. Até agora não tem nada.

            A fidelidade partidária existe. Quem trocar de partido perde o mandato. Como? Em termos de lei complementar. E precisou o Supremo, na ausência, no vazio nosso, precisou dizer: Parlamentar que muda de partido perde o mandato. E nós temos que calar a boca, nós perdemos a autoridade. Se nós estamos há 25 anos não fizemos nada, eles fizeram. E é o que tem acontecido.

            Nós não podemos dizer uma palavra ao Supremo, não podemos dizer que ele está invocando, está entrando no nosso terreno. Não é verdade. Nós não fazemos nada. É nosso, é verdade. Mas há 25 anos não fazemos nada, ele ocupa o terreno. E é o que está acontecendo agora. E é o que está acontecendo agora.

            A Constituição fala em financiamento público, mas, até agora, nada! E o que é mais grave: essa minirreforma, era melhor que não se fizesse nada e que a gente - eu defendi essa tese - convocasse uma sessão extraordinária do Congresso para 30 dias em janeiro, só para discutir essa reforma da Constituição. Então, janeiro e fevereiro só para a reforma da Constituição naquelas questões essenciais que precisam ser discutidas. Mas, fazer como nós fizemos...

            O Presidente, na melhor das intenções, designa uma Comissão até juristas etc e tal, e aí vem ao plenário para votar e deu no que deu. A maioria votou que as empresas podem doar dinheiro para a campanha política, mesmo aquelas que tenham negócios com o Governo.

            Se nós formos olhar o que isso significa, vamos verificar que a grande e triste verdade é que as empresas que doam aos partidos políticos são exatamente as empresas que têm grandes interesses com os partidos políticos. São as grandes empresas que fazem as negociações.

            As construtoras são fontes de 55% de doações aos partidos, em 2012; construtora, incorporadora, engenharia e empreendimento doaram R$416 milhões (55% do total); agropecuária, agroindústria e fertilizante doaram R$61 milhões (8%); banco, consórcio e seguro, R$51 milhões (6%); depois vêm indústria de tecnologia, solo, saneamento e meio ambiente; alimentos e bebidas; energia, petróleo e gás; comércio.

            Quem está dando dinheiro para a campanha política é aquela empresa que negocia com o Governo. Das grandes construtoras, as grandes empreiteiras, que fazem fortunas em negociação com o Governo, a que deu mais deu 45 milhões. Uma empresa só, 45 milhões!

            Já se disse muitas vezes: em política não há almoço de graça. Não há almoço de graça em política. Nem carona de avião de graça a gente consegue na política. E o nosso Congresso, o nosso Senado vota favorável a que as empreiteiras continuem a atuar na campanha. No Supremo, até ontem, quatro a zero contra esse tipo de doação. Não podem dar dinheiro.

            E também as pessoas físicas: 10% do patrimônio, do rendimento bruto. Só o nosso amigo José Dirceu vai ganhar 20 mil; 10% do rendimento bruto (240 mil). Então, pode doar 24 mil para a campanha.

            Eu estranhei - perdoem-me a sinceridade, mas eu estranhei - o brilhante e ilustre Ministro, que foi o último Ministro indicado para o Supremo, o 11º, ter pedido vista, porque o Supremo deseja votar essa matéria até o fim do ano, para valer ainda para a eleição do ano que vem.

            Essa é uma matéria tão interessante que praticamente todos os Ministros já deram o voto. Todos os Ministros, abertamente, já votaram. Afora os quatro que votaram oficialmente, os outros já disseram como vão votar. Mas ele disse que vai ter que estudar.

            Eu faço um apelo a S. Exª para que devolva até quarta-feira, senão S. Exª ficará como responsável por essa matéria não entrar em julgamento agora. Se essa matéria não valer para a eleição do ano que vem, terá no ilustre Ministro o último dos indicados como responsável de um pedido de vista que ele tem direito - que é legítimo, não estou nem discutindo isso -, mas que ele podia tranquilamente... porque, cá entre nós, Sr. Presidente, ter dúvida sobre essa matéria, S. Exª estivesse onde estivesse, antes de estar lá, é algo completamente incompreensível. Eu faço esse apelo.

            E, infelizmente, volto a dizer aqui: é difícil esperar as coisas do Congresso Nacional. Ou os jovens vão às ruas e tomam posição e se manifestem, ou então as coisas continuarão como estão.

            Sr. Presidente, se não me engano, com a primeira assinatura do Senador Requião, está correndo uma CPI sobre a questão do transporte. É uma questão muito delicada, é uma questão da maior importância. Quando me pediram que eu assinasse, eu estava do lado do Senador Paim, eu e ele assinamos com a maior naturalidade, e o número de assinaturas foi bem superior.

            Saudação ao companheiro que vem...

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Após o senhor. Inclusive, vim agora de uma solenidade, como o senhor sabe, de um belíssimo encontro que tive. E, tomo a liberdade, vou tentar falar desse mesmo assunto, porque apresentei um projeto de lei - estava ouvindo no rádio- proibindo a doação de pessoa jurídica. O Senador Suplicy me ajudou, mas o projeto é de minha autoria. Eu gostaria que as eleições ficassem mais iguais. Vamos para a pessoa física, mas, com empresas doando, vamos ficar aqui, em muitos casos, despachantes de luxo, o que é péssimo para o Senado e para a política. Desculpe interrompê-lo, Senador. Vou falar também do encontro que tive, e dei o recado de que um grande político do Brasil, devoto, vai procurá-lo para entregar o livro pessoalmente.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Eu digo, sinceramente, com a mesma simpatia, que me parece que V. Exª está mais iluminado nessa sua volta de Roma.

            Nessa CPI, serena e tranquila - ontem, parece-me que terminou, à meia-noite, o prazo... Entrou-se com a CPI, e, meu querido Senador, foi impressionante a corrida para a retirada de assinatura.

            Essa CPI me lembra aquela que originou o mensalão. Primeiro, eu fui ao Palácio e insisti para que o Presidente - insisti não, porque eu tinha certeza de que não tinha problema... Apareceu a figura, na televisão, do cidadão recebendo o dinheiro, os dólares, e discutindo o percentual. O Lula deveria tê-lo demitido ali. Naquele momento, ele deveria ter sido demitido. E eu disse, desta tribuna, que - naquele início de governo do Lula, eu estava meio comprometido com ele, inclusive de ajudá-lo, de colaborar com ele até aqui dentro do Senado - eu iria ao Lula, e o Lula o demitiria. Não demitiu. Aí criamos a Comissão, e aconteceu, naquela oportunidade, o que está acontecendo agora.

            Primeiro, lutou-se para evitar que as assinaturas saíssem; mas saíram as assinaturas. E os Líderes não indicaram os nomes. Tivemos que entrar no Supremo, que mandou criar um ano depois. Aí não era mais a figurazinha, aí já era o mensalão.

            Pois, ontem, aconteceu isso. Os Líderes à procura dos Parlamentares. Uma ilustre Parlamentar chorando e dizendo: “Eu tenho que retirar”. E dando a entender que ela era forçada, pela sua posição, a retirar. Alguns não aceitaram e mantiveram a assinatura; mas outros retiraram.

            Ó, meu velho e querido PT! Claro que V. Exª está no Governo, mas fazer o trabalho, forçar, exigir que pessoas, por essa ou por aquela razão, retirassem as assinaturas já feitas na CPI! Impedir pessoas que queriam assinar ontem! Elas foram impedidas!

            Sobre a última história da CPI, eu estive nesta tribuna para dizer: a CPI do Cachoeira foi um escândalo. Foi criada, foi composta, mas fizeram um acordo de Lideranças. Foi o caso mais imoral, mais indecente que eu conheço em trabalhos de averiguação ou de tentativas de averiguação, aqui, neste Congresso.

            Eu ainda não sei o resultado, se é que terminou à meia-noite. Queira Deus que tenham sobrado as assinaturas necessárias. Se isso não acontecer, vai ser uma pena.

            O PT, com 11 anos de Governo, realiza um grande Congresso Nacional. São 11 anos de Governo. É o terceiro Presidente: Lula; mais Lula, quatro anos; e a Presidenta, entrando no seu quarto ano. Grandes debates, grandes discussões internas, grandes manifestações. Eu respeito.

            Que o PT e seus líderes prestem solidariedade aos que foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal, eu respeito. Que queiram transformar essas pessoas que foram condenadas em mártires, em heróis da democracia, eu fico com o líder Olívio Dutra, ex-Governador do Rio Grande do Sul, quando ele se refere a um dos condenados: “Ele tem um passado, um passado de glória, um passado de respeito, mas não é esse passado que foi julgado. O que foi julgado é o ato praticado, que ele praticou, e cometeu o crime. E o Supremo Tribunal Federal condenou, e nós temos que respeitar a decisão do Supremo Tribunal Federal”. Coragem, a decisão de Olívio Dutra, que é meu adversário no Rio Grande do Sul, mas sempre o reconheci, sua seriedade e credibilidade.

            Não é bom fazer um confronto entre PT e Supremo Tribunal, até porque eu acho que uma das bandeiras que o Lula e a Srª Presidenta poderiam dizer é a seguinte: este Supremo que decidiu tem oito ou nove Ministros indicados pelo Lula ou pela Srª Dilma. Então, mostra que, ao indicarem os Ministros, nem Lula - que indicou primeiro, quando não existia o mensalão -, nem a Srª Dilma - que indicou depois, quando o mensalão estava em pleno andamento - teve preocupações na escolha dos nomes e interrogação com respeito aos seus votos; escolheram quem achavam que deviam escolher. E alguns desses Ministros absolveram, e outros desses Ministros condenaram, a maioria condenou.

            Então, o Governo do PT não pode receber nenhuma crítica no sentido de que tentou, no Supremo, qualquer coisa para que ele não votasse como quisesse, de acordo com sua consciência. Por isso, o PT se saiu bem lá na hora, acatando e aceitando a decisão. O Governo saiu bem.

            Que o PT preste suas homenagens aos seus líderes, é um respeito. Que faça o que quiser com relação aos líderes que foram condenados, é uma decisão própria. Mas fazer o confronto do PT com o Supremo não fica bem.

            Eu respeito a decisão do Supremo. Tem razão o PT, quando pergunta: E o mensalão de Minas Gerais? Tem razão o PT: E os metrôs lá de São Paulo? Tem razão o PT, quando faz essas perguntas, que são da maior importância e do maior significado e merecem resposta.

            E até, de certa forma, vai ser favorável ao PT esse levantamento de debate. E vai ser no ano eleitoral, nesse ano, exatamente nesse ano em que haverá essa votação. Por isso, que o PT vá devagar, que não queira criar um confronto com o Supremo. Porque a grande verdade - entendo o PT e entendo todos os partidos -é que essa decisão do Supremo eu diria que teve quase a unanimidade da sociedade brasileira. Eu diria que essa decisão do Supremo foi o início de uma redenção do Supremo, em que, pela primeira vez, a gente pode dizer: “Eu tenho orgulho do Supremo”.

            Eu encerro, Sr. Presidente, trazendo - não tive outra chance, mas o faço agora - o meu abraço e a minha mágoa pela morte do querido Mandela. Acho que o grande líder da África do Sul realmente foi uma das figuras mais extraordinárias ao longo de toda a história. Um grande líder, um grande líder! Lutou pela liberdade, lutou pela liberdade! Lutou contra os mais dolorosos regimes de intolerância que o mundo já viu, em 27 anos de cadeia!

            Ora, Sr. Presidente, eu era Deputado Estadual de primeiro mandato, quando eu estive nos Estados Unidos. Eu estive lá no sul, onde andei e vi ônibus de branco e ônibus de negro; colégio de branco e colégio de negro; escola de branco e escola de negro. Lá nos Estados Unidos, essas coisas aconteciam. Eu fiquei boquiaberto, porque não me passava pela cabeça, embora eu soubesse que essas coisas existiam, vendo ali no local, vendo ali: naquela rua, branco; e, naquela rua, negro. Estados Unidos - entre aspas - “campeão mundial da democracia”.

            Eu também vi, lá na África, aquelas coisas. Realmente, era bem mais cruel, porque ali era uma ditadura, era a Inglaterra, o que tinha sobrado do seu império, que praticamente tinha a metade do mundo, estava ali, na África. Uma minoria de menos de 10% esmagando uma maioria de 90%. E Mandela foi o grande líder, foi o grande nome. E é impressionante que, preso, inclusive em solitária, pelo prazo de 27 anos, foi ele que, na África do Sul e pelo mundo afora, conduziu a grande luta que fez a grande transformação naquele país.

            Mas a importância de Mandela, Prêmio Nobel da Paz, não foi a sua vitória, não foi a África se livrar da escravidão da Grã-Bretanha. A grande vitória de Mandela, o que o torna fantástico, foi ele em liberdade, foi ele vitorioso, foi ele, endeusado no mundo, assumir a Presidência, foi ele conduzir o processo.

            Grã-Bretanha fora, nós no poder, fim da desigualdade racial, como vamos agir? De que forma se conduziria o processo? O que se faria com aqueles que, ao longo do tempo, prenderam e escravizaram, mantiveram afastados da cidade os guetos de negros? O que fazer daqueles que tinham casos de assassinatos de mortes, de violência, de tortura e tudo o mais? Como conduzir o processo, anos e anos e anos e geração em que isso tinha acontecido? 

            E o povo na expectativa, o povo querendo a resposta, o povo querendo buscar uma fórmula através da qual viesse essa resposta. E aí é que surge o Mandela, aí é que surge o Mandela. Quando se esperava a nomeação de comissões de julgamento para julgar, analisar, decidir e matar, prender, declaração de pena de morte ou de perpétua punição, o que o Mandela faz? Vamos apurar tudo. Vamos apurar tudo. Vamos verificar de cada uma das pessoas qual é a responsabilidade e o que fez. E apuraram. Fizeram um dossiê de cada um dos criminosos, de cada um. E agora, o que fazer? Esse merece a morte, esse merece a prisão perpétua, esse merece... Não. Aí foi a boquiaberta.

            O cidadão era investigado, era condenado, reconhecia, assinava que ele reconhecia aqueles delitos que ele tinha cometido, pedia perdão e ficava em liberdade. As pessoas, as entidades discutiam com Mandela: mas o que é isso? Isso não existe! Mas que forma de fazer é esta? E Mandela respondeu: nós temos dois caminhos, o primeiro caminho, que é seguido por todos, que é o racional à primeira vista, que é justo e que é normal. Nós vencemos democraticamente, um país que vivia sob domínio, agora é nosso. Dezenas de anos de escravidão, de violência. Temos casos que estão aí, à prova. O problema é que nem Cuba fez, comissão de fuzilamento, prisão que nem a dele, vinte e tantos anos. Mas, se nós fizermos isso, eles vão pagar, mas nós, também. Não dá para dizer que nós vamos fazer isso na imparcialidade. Vamos fazer e vamos cometer nossos equívocos, vamos matar vamos fazer o que eles fizeram. Aí nós vamos ter uma luta numa guerra civil por quanto tempo? Quanto tempo durará isso? Por quanto tempo ficaremos matando, chorando, derramando sangue, e a África do Sul, cada vez pior?

            Organizou ele... Nos jogos de futebol americano em que a Grã-Bretanha jogava, nos jogos dela não entrava negro, e nos jogos em que jogavam os africanos, lá nos arrabaldes, não entrava branco. E ele fez a participação no torneio. E fez o máximo: o estádio lotado, metade de brancos, metade de pretos, juntos, de mãos dadas. E a África conseguiu, inclusive, ganhar uma partida espetacular a África do sul.

            E aquele gesto de o branco assassino pedir desculpas, baixar a cabeça... É claro que ele ficou numa posição olhada com desdém, porque não estava na cadeia, não foi preso, não foi torturado. Ocasionou o desenvolvimento e o progresso da África do Sul. Isso fez de Mandela um líder mundial.

            São duas pessoas que eu respeito, para quem tiro o chapéu e por quem tenho paixão: é ele e Mahatma Ghandi, na Índia. Índia dominada pelos ingleses. Massacraram, a mesma coisa que na África do Sul, com os seus preconceitos. Na Índia foi pior, porque a Grã-Bretanha a rachou ao meio: um país, Índia; o outro país, Paquistão.

            O povo queria guerra contra a Grã-Bretanha, e a política de Gandhi era a política da paz. Não aceitava armamento, não aceitava guerra. A única questão era o direito de não fazer, de não ir; de cruzar os braços e não fazer. E essa política da não violência cresceu, cresceu, cresceu, cresceu, cresceu... A Grã-Bretanha perdeu completamente o controle, e Gandhi conseguiu, também sem derramar um tiro.

             Por isso, Sr. Presidente, atrasado porque não tive condições antes, eu não podia deixar de vir a esta tribuna e trazer o meu abraço afetivo a Nelson Mandela. Vivemos uma das páginas mais bonitas da história desta humanidade. Ele, realmente, mostrou que a gente pode, que a gente tem condição. Que o exemplo de Mandela seja um pouco de exemplo para a nossa Comissão da Verdade. Ainda tem gente, ainda tem general ocupando cargo importante no atual Governo que pensa que a ditadura não acabou. E vamos fazer justiça: a Comissão da Verdade está agindo com muita tranquilidade, quer investigar, quer o direito de procurar os ossos do filho para que a mãe possa enterrar.

            Tanto a Presidente Dilma quanto a Ministra Maria do Rosário, Ministra das questões sociais por quem tenho muito respeito, estão conduzindo bem o processo. Conduziram bem a questão do Presidente João Goulart, investigando. Acho muito difícil, 50 anos depois, descobrir se houve ou não assassinato, mas investigou, aprovou o projeto do ilustre e querido Senador do Amapá e meu, decretando nula a sessão do Congresso Nacional do dia 1º de abril de 1964 até a madrugada do dia 2. Aquela sessão está anulada. Ela não existiu. Em consequência, não houve a cassação de João Goulart. O que houve foi o golpe dos militares, que se reuniram, decretaram o AI-1, transformaram o Congresso em colégio eleitoral e elegeram Castelo Branco.

            Na quarta-feira, votaremos... Aliás, perdão, promulgaremos a sessão.

            Acho um momento importante este. Acho que alguns poucos que ainda não encontraram razão para ver que eles estão cumprindo, estão governando, estão dirigindo cargos da maior importância e consequentemente têm de estar de acordo com o pensamento nacional.

            Que a Comissão da Verdade continue, que a Ministra Maria do Rosário seja firme. E meus cumprimentos à Presidente da República, que, desde o início, agiu com a maior dignidade. E meus cumprimentos ao Presidente do Senado, Senador Renan, que foi firme na convocação da reunião, firme no debate, firme em não aceitar algumas tentativas de impedir. Firme e com alegria.

            Dizem que a unanimidade é burra. Não foi por unanimidade por só um voto. Mas o voto que votou contra nós é de um Deputado militar do Rio de Janeiro que, se tivesse votado conosco, teria que se explicar. Fez bem em ficar com a consciência dele, que é bem diferente da nossa.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Aquele rapazinho ali é meu filho. Entrou na faculdade de Direito e está com a namorada, que também é estudante de Direito. Eu vejo com muita alegria, meu filho, essa coincidência de você e a Luiza chegarem aqui, no momento em que estou falando essas coisas de muito significado.

            Você está estudando Direito, ela, também. E com que emoção a gente vê essa geração que vem aí. Ele, quando estudou a história, e ela, quando estudou a história, estudaram que, no dia 1º de abril, o João Goulart fugiu, estava no exterior, em lugar incerto e não sabido, e por isso foi cassado. O filho de vocês vai ver a verdadeira história. Não houve o 1º de abril. Na verdade, o que houve foi o golpe que os militares deram com o colégio eleitoral.

            Eu vejo essa geração com muita emoção e com muito respeito. Eu vejo tanto o meu filho como a Luiza tendo as ligações nas redes sociais e vejo como é impressionante como elas andam, como elas voam. E tenho a impressão, meu querido amigo, de que elas vão crescer.

            Eu tenho a impressão de que, lá nos Estados Unidos, o Obama só se elegeu por causa da mocidade e dessas coisas. O Obama recusou. Os nossos amigos aqui, os nossos Líderes de Bancada que querem dinheiro das empreiteiras... O Obama recusou. Lá se pode receber dinheiro público ou não. O Obama recusou qualquer verba para a sua campanha, a não ser a das redes sociais, cujo máximo, se não me engano, era de US$10, não sei quanto. Ele pegou uma montanha de dinheiro.

            Eu vejo, meu amigo Pedrinho, meu filho, que foi por vocês. Quando vieram aqui na frente é que conseguimos aprovar a Lei da Ficha Limpa. No dia anterior ao que vocês estiveram aqui, neste Senado falaram umas 15 pessoas, todas contra a Ficha Limpa. Mas, no dia seguinte, quando vocês estavam aqui na frente, eu fui um dos que vieram a esta tribuna e disse: “Olha, eu falo para ti, fulano, como meu amigo. Eu te quero muito bem, mas hoje o teu nome vai ficar marcado para o resto da vida.” Outro vai ser marcado como quem votou: “Quem é vigarista caia fora! Ou tu votaste do lado deles.”

            Pedro, no dia anterior, 20 votaram contra, e, no dia seguinte, depois da manifestação dos jovens, a unanimidade votou a favor, a unanimidade votou a favor. É por isso que eu falo que não acredito no Congresso, acredito menos ainda no Executivo e no Supremo. Eu acredito na mocidade, acredito no povo na rua.

            Estou aqui, com muita emoção, falando à nova geração. Eu estou indo, mas, para aqueles que não gostam muito de mim, estou deixando gente no meu lugar.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/12/2013 - Página 94456