Discurso durante a 229ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às declarações do Ministro da Fazenda, Guido Mantega, e à decisão de adiar a implantação da lei que obriga a inclusão do freio ABS e do airbag nos automóveis fabricados no Brasil.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Críticas às declarações do Ministro da Fazenda, Guido Mantega, e à decisão de adiar a implantação da lei que obriga a inclusão do freio ABS e do airbag nos automóveis fabricados no Brasil.
Aparteantes
Alvaro Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 17/12/2013 - Página 95083
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, GUIDO MANTEGA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), RELAÇÃO, PROPOSTA, ADIAMENTO, IMPLANTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, ASSUNTO, OBRIGATORIEDADE, EQUIPAMENTOS, SEGURANÇA, AUTOMOVEL, CIRCULAÇÃO, BRASIL, COMENTARIO, POSSIBILIDADE, REDUÇÃO, MORTE, GASTOS PUBLICOS, ACIDENTE DE TRANSITO.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quero me associar ao pesar expressado pelo ilustre Líder Alvaro Dias e agradecer a V. Exª a gentileza da permuta.

            Sr. Presidente, o Ministro Guido Mantega deu, nos últimos dias, duas declarações absolutamente estarrecedoras e desastradas. A primeira delas é a respeito da economia. Disse S. Exª que a economia brasileira caminha sobre duas pernas mancas. Fazia referência à insuficiência de crédito, que em sua opinião aflige os consumidores brasileiros, contrariando todas as informações dispostas urbi et orbi, para conhecimento de todos. E, em segundo lugar, à crise externa, que vai, no entender de S. Exª, perdurando muito além daquela que atinge os Estados Unidos, a União Europeia, o Japão e atinge especificamente o Brasil.

            São desculpas esfarrapadas na verdade, para esconder o fato de que não são apenas as duas pernas da economia brasileira que andam tropeçando; são várias pernas.

            A economia brasileira é uma verdadeira centopeia, que vai se arrastando aos trancos e barrancos, num clima de esmorecimento, de falta de ânimo e de falta de confiança. É a inflação elevada; é a insuficiência dos investimentos; é a infraestrutura em pandarecos; é o controle de preços administrados pelo Governo, que levou à quebra da Petrobras - em todo caso, ao endividamento extraordinário dessa empresa-, e à sua incapacidade agora de enfrentar os desafios que tem pela frente; são os desequilíbrios das contas externas; a situação fiscal precária que as maquiagens e os malabarismos fiscais que não se conseguem entender. São várias as pernas ruins da economia brasileira. Mas, em todo caso, ficou registrada essa manifestação que, segundo consta na crônica política, recebeu a competente reprimenda da Presidente da República, porque, afinal de contas, não é coisa que o Ministro da Fazenda possa dizer; mas, infelizmente, é aquilo que o Governo faz ou deixa de fazer.

            A outra declaração desastrada foi em relação aos airbags. Isso já foi objeto de comentário da Senadora Ana Amélia, aqui no plenário. E quero insistir no assunto, uma vez que o Ministro disse, na semana passada, que nesta terça-feira - portanto, amanhã - proporia à Presidente da República algo que me parece completamente absurdo, sem pé nem cabeça: propõe S. Exª o adiamento da entrada em vigor do que consta na Lei nº 11.910, de 2009, da obrigatoriedade de os automóveis que saem das montadoras instaladas no Brasil trazerem dois equipamentos de segurança absolutamente indispensáveis para que o nossos carros, os nossos automóveis ostentem nível de segurança comparável àqueles que nós importamos e deixem de ser carros da morte, como são hoje 70% dos veículos que trafegam no Brasil, que não têm nem airbag e nem freios ABS, duas exigências dessa lei. Todos sabem que, nos termos da lei - aliás, proposta que surgiu de uma iniciativa do então Senador Eduardo Azeredo -, todos os automóveis fabricados no Brasil, a partir de 1º de janeiro do ano que vem, 2014, deveriam sair das fábricas equipados com airbag e com freios ABS.

            As montadoras brasileiras tiveram prazo de cinco anos para se adaptar a essa exigência. Durante esse período, várias empresas foram criadas no Brasil exatamente para aumentar a disponibilidade desses dois equipamentos essenciais para a segurança dos passageiros: airbags e freios ABS. As fábricas estão prontas para entrar em produção, esperando que, a partir de 1º de janeiro, essa exigência possa efetivamente sair do papel e se transformar numa realidade. O Ministro propõe o adiamento por um ano ou dois. E qual é a razão? A razão é segurar o preço dos automóveis. Segundo o Ministro, se essa lei fosse plenamente implantada e essa exigência atendida, o preço dos automóveis poderia ser acrescido de uma importância variável entre R$1 mil e R$1,5 mil. É o preço da economia, da economia em vidas, que são salvas com a utilização desses dois equipamentos.

            Seria o caso, diante dessas duas reiteradas declarações fora de propósito, de se perguntar ao Ministro o que perguntou o Rei Juan Carlos ao falecido Hugo Chávez: “Por qué não te callas?” Para de falar, Ministro; é melhor! É melhor!

            Veja, o Ministro expõe um dilema que não deveria existir na cabeça de um governante responsável, no momento da tomada de decisão. Ele coloca nos dois pratos de uma balança dois valores: de um lado, a vida, a segurança das pessoas; de outro lado, o preço dos automóveis, o acréscimo de R$1 mil a R$1,5 mil no preço dos automóveis. Estão colocados na mesma balança do Ministro; e ele dá um peso maior ao preço dos automóveis. Uma forma de controlar a inflação a partir do represamento dos preços, mediante a exigência de instalação de equipamentos dessa importância.

            Não tem cabimento uma coisa dessas. Em primeiro lugar, porque são conhecidos os efeitos benéficos da utilização desses equipamentos nos automóveis. Existem estudos que mostram isso; refiro-me a um, por exemplo, do Centro de Experimentação e Segurança Viária , que diz o seguinte:

“Se todos os veículos brasileiros possuíssem airbag, seriam evitadas, por ano, cerca de 500 mortes e 10.100 ferimentos”.

            Não é pouca coisa, Ministro, evitar 500 mortes e 10.100 ferimentos, alguns que deixam sequelas, que deixam pessoas tetraplégicas, que deixam pessoas com traumatismo craniano. Vidas infelicitadas ou vidas ceifadas de um lado e, de outro, R$1.000 ou R$1.500 a mais no preço do automóvel, ainda mais sabendo, Sr. Presidente, que os automóveis mais baratos são exatamente aqueles que são adquiridos pelas pessoas de menor poder aquisitivo e que têm acesso a eles justamente em função do crédito farto. Então, os carros importados, os carros mais caros, para as pessoas mais ricas, estes, sim, podem andar com ABS. Os carros da classe média e da classe média baixa podem andar sem ABS e sem airbag, ficando com a cota majoritária das mortes e dos acidentes.

            Ouço o aparte do Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (Bloco Minoria/PSDB - PR) - Senador Aloysio, V. Exª aborda exatamente essa postura do Governo, especialmente via Ministro da Fazenda, que tem por objetivo e foco prioritário o projeto de poder. É hora de dourar a pílula para evitar desgaste eleitoral, porque há eleição no ano que vem. Daí essa política de dourar a pílula. Não se pode atender essa exigência da sociedade porque haverá um aumento de preço do veículo e isso tem impacto negativo para o Governo. Além de prever sempre muito mal, exageradamente otimista, tentando, com a mistificação, iludir a população do País, o Ministro é desmentido pelo próprio Banco Central, segundo o qual a perspectiva de crescimento da economia anda para trás, há redução da previsão de crescimento da economia de um boletim para o outro. A perspectiva para o PIB de 2013 é de expansão de 2,30%, abaixo dos 2,35% registrados na semana passada. Ou seja, de uma semana para outra há uma redução da expectativa. E a estimativa de crescimento do Produto Interno Bruto para 2014 é de 2,01%, número menor do que os 2,10% do último boletim Focus. Ainda segundo o boletim, pelo Banco Central, haverá perspectiva de crescimento das taxas de juros, o Banco Central manterá essa política de aumento das taxas de juros e a taxa básica Selic fechará o ano a 10,5% contra os 10% previstos. E, sobre a inflação, o mercado avalia que haverá um cenário de preços mais altos no ano que vem, com o IPCA fechando em 5,95%. Para este ano, a perspectiva ficou inalterada em 5,70%. Portanto, por mais que queira o Ministro Mantega dourar a pílula para passar uma ideia de organização da economia do País, ele acaba sendo desmentido pelos seus parceiros de política econômica, neste caso o Banco Central. E V. Exª faz muito bem em trazer essa questão nesta segunda-feira de plenário vazio para que o povo brasileiro possa acompanhar de perto as agruras que nos aguardam para o próximo ano, especialmente.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Minoria/PSDB - SP) - Muito obrigado pelo seu aparte, meu caro Líder Alvaro Dias.

            Realmente, são perspectivas sombrias, mas creio que mais sombrias ainda seriam ou serão as perspectivas do Brasil se a Presidente Dilma Rousseff concordar com esta proposta sem pé nem cabeça do Ministro da Fazenda, porque, se for adiar em mais dois anos, a entrada em vigor da Lei do Airbag, serão mais mil mortos e vinte mil feridos graves.

            Espero, Sr. Presidente, embora tenhamos, hoje, um plenário vazio, que a Presidente Dilma Rousseff não cometa essa insensatez. Espero que tenha sensibilidade para evitar que esse gesto irresponsável seja cometido pelo seu governo e, afinal de contas, por ela, porque, em se tratando de uma lei, ela somente poderá ser modificada mediante outra lei, de iniciativa da Presidente, ou uma medida provisória, também, como reza a Constituição, de iniciativa exclusiva da Presidente da República.

            Agora, Sr. Presidente, eu não quero ficar apenas com este lado, expondo esse lado da história, que é, realmente, o lado mais dramático, das vidas, dos ferimentos graves, das lesões permanentes das pessoas vítimas de acidentes automobilísticos.

            Vamos olhar também pelo lado mesquinhamente econômico e financeiro, que é o único lado que o Ministro da Fazenda enxerga nessa questão quando se propõe a adiar a entrada em vigor da Lei do Airbag, para, com isso obter uma economia de R$1.000,00 a R$1.500,00 por automóvel vendido no Brasil.

            S. Exª poderia se indagar sobre quanto montarão as despesas adicionais que são arcadas pelo Sistema Único de Saúde para o atendimento hospitalar das vítimas desses acidentes, vítimas que poderiam ser poupadas. Quanto custa para o Sistema Único de Saúde, além do atendimento no momento do acidente, os custos da reabilitação dos pacientes vítimas de sequelas graves, que costumam ocorrer em acidentes automobilísticos? Quanto isso pesaria, em termos de despesa, para o Sistema Único de Saúde no Brasil?

            Pelo visto, o Ministro da Fazenda não se preocupa com isso. Ele se preocupa em segurar o preço dos automóveis e, com isso, facilitar um pouco mais a vida dessa queridinha do Governo do PT que é a indústria automobilística. O PT tem verdadeira obsessão pela indústria automobilística, não apenas porque, nas suas origens, ele vai entroncar com o sindicalismo dos metalúrgicos do ABC, como porque, sendo um governo dito dos trabalhadores, é um governo que corteja, com absoluta solicitude, chegando mesmo à subserviência, os interesses do grande capital.

            A indústria automobilística brasileira tem sido beneficiada, de 2008 até esta data, com a concessão de subsídios fiscais, com o abatimento nos impostos que deveriam pagar, pelas leis vigentes no País, ano após ano. A soma desses subsídios hoje já ultrapassa os R$35 bilhões. Mas a indústria é insaciável. Ela pede cada vez mais, e é atendida, porque o Governo atual, o Governo do PT, tem esta forma de gerir a economia, de buscar o deslanchar do nosso desenvolvimento: o atendimento tópico a demandas de setores da economia brasileira, por favores fiscais, por favores creditícios. Ele os atende na medida em que haja proximidade entre esses setores, os dirigentes desses setores, as empresas que os compõem, e o Governo brasileiro, aqueles que hoje ocupam o poder. É o caso da indústria automobilística. São R$35 bilhões, por baixo, nesses últimos cinco anos.

            E agora a indústria quer um pouco mais: quer adiar a obrigação, que não é uma obrigação que lhe foi imposta de uma hora para a outra, mas da qual ela estava ciente desde 2009, de instalar airbags e freios ABS em todos os veículos por ela fabricados. E o Governo, mais uma vez, dobra a espinha, abaixa a cabeça e se dispõe a atender aos interesses das multinacionais do automóvel.

            Este é o panorama, Sr. Presidente, Srs. Senadores, desalentador que nós vivemos hoje no nosso País.

            Venho à tribuna - insisto, Sr. Presidente - na esperança de que a Presidente Dilma tenha a sensatez e a sensibilidade de repelir essa proposta, que é, para usar a linguagem popular, claramente, incontestavelmente, uma ideia de jerico.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/12/2013 - Página 95083