Pela Liderança durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso dos 256 anos de criação da cidade de Macapá.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Registro do transcurso dos 256 anos de criação da cidade de Macapá.
Publicação
Publicação no DSF de 05/02/2014 - Página 226
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, MUNICIPIO, MACAPA (AP), ESTADO DO AMAPA (AP), COMENTARIO, HISTORIA, PERIODO, CONSTRUÇÃO, CIDADE.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, (Fora do microfone.) o dia de hoje, 4 de fevereiro, na capital do meu Estado, na antiga Estância das Bacabas, na Vila de São José de Macapá, a cidade de Macapá, é feriado. Hoje, a cidade de Macapá completa 256 anos de fundação. Nós voltamos, hoje, fazemos referência… E eu quero aqui fazer um encontro com a história da fundação da cidade de Macapá há 256 anos.

            Macapá foi resultado de um momento histórico, de um momento do projeto português de ocupação da Amazônia. É de um período em que o Estado português resolve expandir os seus domínios; é de um período em que a colonização sobre as terras portuguesas no além-mar toma nova configuração. É o período em que Portugal resolve, em definitivo, transformar-se em enorme império colonial. É o auge do chamado Período Pombalino.

            Não à toa está presente, nos primórdios, nos momentos que antecedem a fundação da Vila da Macapá, uma figura histórica diretamente vinculada à fundação da Vila de Macapá, a figura do Marquês de Pombal; e não à toa é designado, dentro do projeto pombalino de ocupação da Amazônia, nada menos do que o seu irmão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, para governador do Grão-Pará e do Maranhão. E não é à toa, ainda, a expressão e o destaque da recomendação do Marquês de Pombal para a fundação da Vila de Macapá; e não só para a fundação da Vila de Macapá, mas para a ocupação do que era a região do Cabo Norte. Escrevia e designava o Marquês de Pombal, já no século XVIII, quando determina a ocupação do que anteriormente era conhecido como Capitania do Cabo Norte.

            Dizia o Marquês de Pombal:

Recomendo-vos e particularmente vos encarrego de povoardes o Cabo Norte, onde cuidarei em estabelecer não só povoações, mas também logo alguma defesa para fazer barreira desse Estado por essa parte, evitando, por esta forma, as desordens e conquistas que por esta parte podem fazer os franceses.

            Essa determinação do chamado Período Pombalino, no século XVIII, é marca da ocupação portuguesa. Não é à toa que essa região, a região onde hoje está localizado o Estado do Amapá, foi anteriormente conhecida como Tucujulândia e, anteriormente, também conhecida, nos primórdios da ocupação portuguesa, como Capitania do Cabo Norte.

            Nos seus primórdios, esquecida pela colonização, é a partir do século XVIII - e, repito, a partir do Período Pombalino -, que é dada a esta área a importância que lhe é devida. É Marques de Pombal que compreende a necessidade que há de essa região ser ocupada, e essa ocupação é decisiva para guarnecer a fronteira amazônica e para consolidar a ocupação portuguesa na Amazônia. Por isso, Macapá não é uma povoação apenas; Macapá não é uma vila apenas; Macapá é uma das primeiras povoações a serem constituídas dentro da estratégia de ocupação militar portuguesa na Amazônia.

            Depois de Belém, já constituída no século XVII, nos primórdios, só existiam na Amazônia três Vilas: Vigia, Cametá e Gurupá. Macapá, então, é a quarta vila, a quarta povoação a ser constituída pelo império colonial português em toda a Amazônia.

            Têm um diagnóstico de conteúdo estratégico as datas de 1752 e, especificamente, 4 de fevereiro de 1756, haja vista não se tratar de uma atitude impensada, mas de uma atitude meticulosamente planejada e organizada pelo império colonial português. Não é à toa que, em 1752, pensa-se na constituição da povoação, lá estabelecendo uma igreja - ainda hoje em pé, a Igreja de São José - para, quatro anos depois, elevar a povoação à condição de vila. Não é algo impensado, como não é impensada a ideia de transferir do Arquipélago de Açores 432 famílias, transladá-las pelo Atlântico, levando-as para o coração da Amazônia. Isso fazia parte do projeto português, como fazia parte também do projeto português a construção do forte que se ergueu em Macapá.

            Ali, na Vila de São José de Macapá, a fortaleza que foi construída, a Fortaleza de São José, não era uma também uma fortaleza qualquer. É, ainda hoje, a maior fortificação de todo o império colonial português no mundo, uma vez que tinha um objetivo estratégico, militar: uma povoação e um forte para guarnecer a entrada do grande rio e para assegurar a defesa do império colonial em toda a Amazônia.

            De fato, os portugueses, obviamente, não eram bobos. Planejava-se meticulosamente a construção de um enorme império; planejava-se expandir a dimensão do império por toda a Amazônia. Pensava-se, logo ali, que as drogas e especiarias da Amazônia não poderiam ser de posse da coroa espanhola, não poderiam ser de posse da coroa francesa, não poderiam ser de posse de nenhum dos outros Estados nacionais europeus concorrentes dos portugueses. Essas drogas e especiarias deveriam, pois, ser de posse portuguesa.

            A ideia da expansão da fronteira do império colonial português foi um projeto pensado e, dentro dessa estratégia, está a construção, a elevação da Vila de Macapá.

            É o próprio Francisco Xavier de Mendonça Furtado, irmão do Marquês de Pombal, que, no dia 4 de fevereiro de 1756, vai até a Vila; dá posse aos primeiros vereadores da Vila; eleva o povoado à condição de Vila, à condição de cidade. Em seguida a isso, traz também as primeiras famílias açorianas e anuncia, claramente, quais eram as condições que existiam ali: terra boa para plantar e para colher, ar puro e água abundante - aliás, água abundante demais -, às margens do maior rio do Planeta. O próprio Mendonça Furtado, nos escritos da época, destaca todas as vantagens que ali havia.

            É também, daí, o projeto original português do traçado da cidade de Macapá: avenidas vindas dos rios; ruas cortando as avenidas. Esse traçado original, presente até hoje, foi pensado pelo próprio arquiteto, pelo próprio engenheiro da Fortaleza de São José de Macapá, que também é engenheiro e arquiteto da Vila de Macapá: um italiano da época, Enrico Galluzzi. E não se tratava de um italiano qualquer do século XVIII, mas o maior arquiteto, o maior engenheiro do século XVIII, um cidadão das luzes, do Iluminismo que surgia naquele período.

            Esse conjunto de homens, lideranças políticas reconhecidas, como Francisco Xavier de Mendonça Furtado e o Marquês de Pombal, principais lideranças políticas da coroa portuguesa, principais lideranças políticas europeias de então; homens das luzes, da arquitetura e da engenharia, como o italiano Enrico Galluzzi: são esses homens que vão para o interior da Amazônia erguer uma ideia de cidade, erguer um projeto de cidade, que, pelo projeto original português, era para ser um modelo de civilização branca portuguesa nos trópicos.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador Randolfe, apenas amplio o tempo da nossa sessão por mais duas horas, para que todos possam usar a palavra.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - Perfeitamente, Presidente.

            Pois bem; como ia dizendo, o projeto português de então, ao erguer a Vila de São José de Macapá, era pensado para estabelecer um - abro aspas - “modelo de civilização branca portuguesa no coração da floresta amazônica”. Nesse aspecto, ainda bem, Presidente, que o projeto português fracassou.

            Nos anos que se seguiram, para a construção do forte, iniciada em 1762 e só concluída em 1782, foi necessária a utilização da mão de obra indígena e foi necessária também a utilização da mão de obra negra. Os negros não aceitaram a escravidão e, nos arredores da Vila de São José de Macapá, constituíram e estabeleceram quilombos - quilombos e terras quilombolas presentes até hoje. Os indígenas também não aceitaram. A mistura das famílias açorianas originárias com os negros escravizados que para lá foram, bem assim com os povos indígenas antecessores, originários - tukujus, waiãpys, e tantos outros povos que lá existiram -, consolidaram uma miscigenação, entre as várias miscigenações que há neste Brasil, que constituiu o povo mais miscigenado, mais misturado, entre tantos povos misturados que temos no Brasil.

            A mistura se realizou por completo na minha, na nossa Macapá. O projeto português de um modelo de civilização branca, nesse sentido, ainda bem que fracassou. Macapá realizou uma mistura étnica formidável, fantástica, às margens do grande rio, o Amazonas. Na esquina do rio mais belo com a Linha do Equador, como nós dizemos, constituímos uma mistura étnica com um povo extremamente acolhedor.

            O projeto de vila foi acompanhado por outros projetos de ocupação na Amazônia Equatorial. Na mesma Capitania do Cabo Norte, houve dois projetos de vila que foram erguidos: a Vila de Marzagão, ao sul, também com famílias açorianas, e a Vila Viçosa de Madre de Deus, junto com a Vila de Santana. A Vila Viçosa de Madre de Deus foi devastada por uma epidemia de malária. Permaneceu a Vila de Marzagão, que depois mudou de lugar. E, dessas vilas, a que triunfou e nunca mudou de lugar foi a Vila de Macapá, embora tenha sido abandonada a partir do século XIX pelo Governo imperial e tenha tido um declínio no seu desenvolvimento no início, desde o século XIX até o começo do século XX.

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - Recuperou seu rumo e seu caminho de desenvolvimento - já concluo, Sr. Presidente - a partir da segunda metade do século XX, com a criação do Território Federal do Amapá.

            Este ano de 2014, Sr. Presidente, também é importante para a cidade de Macapá, porque, ao mesmo tempo em que a nossa cidade completa os seus 256 anos, fará 70 anos que o então Governador Janary Nunes, no ano de 1944, fez a transferência da capital da cidade de Amapá para a nossa cidade de Macapá.

(Soa a campainha.)

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Apoio Governo/PSOL - AP) - Essa transferência da capital no dia 31 de maio de 1944 foi fundamental para o novo ciclo de desenvolvimento da cidade. Houve a expansão urbana, o estabelecimento das estruturas de Estado na cidade de Macapá, a expansão e criação de avenidas, a construção de um moderno hospital na década de 1940, a construção de escolas, a construção de ruas e de avenidas modernas e a construção de prédios públicos modernos naquele período.

            A cidade viveu, nos últimos anos, Sr. Presidente, uma gravíssima crise urbana. A cidade, que tinha um modelo de planejamento pensado pelos portugueses no século XVIII, teve, nos anos 70, um planejamento que aproveitava o seu potencial hídrico. Macapá está situada às margens do Rio Amazonas e é cercada por um conjunto de ressacas naturais, por um conjunto de lagos naturais que rodeiam e presenteiam a cidade. Felizmente, até 1970, pensava-se o planejamento a partir dessas ressacas. Lamentavelmente, depois das décadas de 70 e de 80, pensou-se em um modelo de desenvolvimento e se esqueceu de um planejamento da cidade para preservar essas ressacas. A cidade cresceu desordenadamente. Em vez de conurbar e abraçar a sua vizinha Santana, ela avançou sobre suas áreas de ressaca, perdendo sua perspectiva de desenvolvimento, de crescimento, em especial junto à sua cidade irmã de Santana. Cresceu em direção aos seus ecossistemas naturais, depredando-os. A cidade viveu, em especial, um período triste na primeira década do século XXI.

            O atual Prefeito de Macapá, o companheiro Clécio, é do meu Partido. E tenho muito honra disso, porque Macapá é a única capital deste País governada pelo meu Partido, pelo PSOL. Ao mesmo tempo em que isso é motivo de muita honra e de orgulho para nós, isso também é motivo de enormes desafios. Nós governamos a nossa cidade diante do desafio de garantir cidadania, de melhorar a vida das pessoas e de reconstruir a nossa cidade depois da mais grave crise moral e política da sua história de 256 anos, desde que Francisco Xavier de Mendonça Furtado, no dia 4 de fevereiro de 1756, elevou o povoado à condição de vila.

            É com muita felicidade que vemos que esses desafios, apesar dos pesares, estão sendo superados graças não somente à determinação de uma jovem equipe que a governa, mas também graças, e muito, às parcerias e à compreensão de fazer as coisas em conjunto com o Governo estadual. Isso ocorre também graças, e muito, em especial, à compreensão do povo de Macapá no sentido de entender que só é possível Macapá dar a volta por cima se essa for uma obra não somente do seu Governo, mas, em especial, uma obra de mobilização do povo da cidade.

            Tenho a certeza, Sr. Presidente, de que Macapá e seu povo conseguirão recuperar o elo perdido na sua história. Depois de pelo menos duas décadas em que a cidade perdeu o seu caminho de desenvolvimento, depois de duas décadas em que a cidade teve um modelo de desenvolvimento predatório, depredando, inclusive, seus próprios ecossistemas, sem pensar, em especial, no seu próprio povo, tenho a certeza de que estes anos servirão para a cidade reencontrar o seu legado histórico, que esteve presente na disposição desse povo, que, na sua história, subverteu até a vontade portuguesa, que se baseava em um modelo de civilização branca. Subverteu a vontade portuguesa, porque constituiu um povo belíssimo, misturado e acolhedor às margens do mais belo rio do Planeta.

            Tenho muita fé e confiança no futuro de Macapá e, por isso, parabenizo a minha cidade pelos seus 256 anos.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/02/2014 - Página 226