Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 12/02/2014
Discurso durante a 8ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Apelo ao poder público para que adote medidas a fim de solucionar crise no setor citrícola.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA AGRICOLA.:
- Apelo ao poder público para que adote medidas a fim de solucionar crise no setor citrícola.
- Publicação
- Publicação no DSF de 13/02/2014 - Página 247
- Assunto
- Outros > POLITICA AGRICOLA.
- Indexação
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- REGISTRO, CRISE, SETOR, PRODUÇÃO, FRUTA CITRICA, LOCAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), MOTIVO, EXCESSO, CALOR, FALTA, CHUVA, COMENTARIO, IMPORTANCIA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, PRODUTOR, REFERENCIA, DEBITOS, PEDIDO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, RESOLUÇÃO, PROBLEMA, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, CARTA, MANIFESTO, OFICIO, ENTREVISTA, RADIO, ASSUNTO.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, recebi do Presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Ibitinga, com o apoio da Comissão de Citricultura da Faesp e da Associtrus, um documento de alerta sobre o que está acontecendo hoje com os citricultores.
Esse documento eu estou encaminhando ao Ministro Guido Mantega, da Fazenda, ao Ministro Antônio, da Agricultura, e à Ministra Miriam Belchior, do Planejamento.
É de amplo conhecimento a grave crise por que passa o setor citrícola há diversos anos. Apesar dos esforços de pessoas e autoridades - gostaríamos de destacar a atuação dos Deputados Mendes Thame e Edinho Araújo, deste Senador que vos fala e das entidades Associtrus e Faesp -, infelizmente as consequências no campo são alarmantes e precisamos agir com maior rapidez.
A concentração e a verticalização do setor causaram tamanha distorção no mercado que, sem a atuação forte das autoridades governamentais, essa situação pode piorar ainda mais.
A concentração e a verticalização causaram tamanha distorção que, no ano de 2012, mesmo com recordes históricos de preços de venda do suco, as indústrias deixaram de comprar em torno de 40 a 50 milhões de caixas de laranja e o restante compraram a um preço que não cobria sequer a metade dos custos. Algo de errado tem nesse mercado.
Como o setor, que tem aumento do faturamento declarado nos últimos 12 anos (Secex) de 180% de valor nominal e 62% em valor real apenas com o suco, exportando o mesmo volume de suco, nesse mesmo período, passa por grave crise de preços pagos aos produtores?
Se consideramos apenas os dados da Coordenadoria de Defesa Agropecuária do Estado de São Paulo (CDA), de 2010 a 2013, saíram da atividade 5.156 propriedades, o que corresponde a mais de 4 mil produtores e 63 milhões de plantas a menos no Estado. É uma situação absurda que vem sendo denunciada e alertada pela Associtrus e Faesp há muito tempo.
Infelizmente, ações efetivas não foram tomadas, e a consequência dessa situação é uma absurda transferência de renda do setor produtivo independente para o setor industrial que, hoje, tem mais de 50% de produção própria. Com essa situação, milhares de produtores estão com muita dificuldade de honrar seus compromissos com as entidades bancárias, financiamentos de custeio e investimento.
Buscando ajudar nesse sentido, desde o início de 2013, alertas foram feitos a diversas autoridades ministeriais, assim como Deputados e Senadores, sobre a incapacidade de pagamento, necessidade de um plano de renegociação e alongamento das dívidas por longo prazo, como de 20 anos, e taxas de juros compatíveis e inferiores a 3%, assim como bônus de adimplência para os pagamentos de parcelas em dia.
Esse pedido foi formalizado e apresentado em conjunto pela Associtrus, Faesp, Câmara de Citricultura, no documento Manifesto da Citricultura, entregue, em agosto passado, a diversas autoridades e em destaque o Ministro da Agricultura Antônio Andrade. Informações preliminares indicam que o endividamento do setor nas áreas de custeio e investimento passou, em cinco anos, de em torno de R$600 milhões para quase R$1 bilhão, endividamento que ocorre justamente no período onde a área com a cultura reduziu em 150 mil hectares. Milhares de produtores permanecem com a dívida e não têm mais a atividade, pois precisaram arrendar a área para empresas que cultivam e processam cana-de-açúcar, arrendamento que busca tentar levantar recurso, antecipação de valores para não perder o patrimônio para saldar dívidas que, na sua quase totalidade, vem de gerações.
Reforçamos que o endividamento é muito grave e vem sendo alertado há mais de um ano e, formalmente, no documento Manifesto da Citricultura, apoiado por todas as entidades que defendem o produtor.
Contamos com o seu apoio no sentido de buscar explicações junto aos Ministérios da Agricultura, Planejamento e Fazenda sobre esse assunto que necessita de solução urgente e passa pelo alongamento das dívidas.
Em função disso, Sr. Presidente, estou encaminhando aos Srs. Ministros Guido Mantega, Antônio Andrade e Miriam Belchior, da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura, o seguinte ofício:
Brasília, 12 de fevereiro de 2014
Srs. Ministros,
Desde o ano passado, encaminhei a V. Exªs correspondência da Associtrus - Associação Brasileira de Citricultores -, da Faesp - Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo - e do Sindicato Rural de Ibitinga, nas quais foi relatada a V. Exªs a grave crise de endividamento vivida pelos pequenos e médios citricultores do Estado.
Apesar de o faturamento do setor, nos últimos 12 anos, ter crescido mais de 62% em valores reais, o preço pago aos produtores não cobria nem a metade dos custos de produção. Essa situação fez com que mais de 60 milhões de plantas fossem erradicadas dos pomares paulistas e que mais de 5.156 propriedades, correspondendo a aproximadamente 4.000l produtores, fossem obrigados a arrendar suas terras para pagar as dívidas com os bancos. O endividamento do setor, nos 5 cinco anos, passou de 600 milhões para aproximadamente 1 bilhão de reais. Essa situação é alarmante! Urge que medidas sejam tomadas para a solução do problema, que passa pelo alongamento dessas dívidas.
Em anexo, encaminho a correspondência assinada, em conjunto, pela Comissão de Agricultura da Faesp, Associtrus e pelo Sindicato Rural de Ibitinga.
Certo da compreensão e dos bons ofícios de V. Exªs, despeço-me.
Cordialmente,
Senador Eduardo Matarazzo Suplicy.
Assim, Sr. Presidente, quero ainda assinalar que, agravando essa situação, temos esse período de calor intenso que está caracterizando todo o Estado de São Paulo, bem como praticamente todo o território brasileiro.
Ainda na terça-feira última, dia 4 de fevereiro de 2014, em entrevista à CBN, o Sr. Flávio Viegas disse o seguinte, quando perguntado por Mílton Jung:
- Já é possível se identificar algum prejuízo que possa ser causado na produtividade?
- Ah, não tenha dúvida, Milton. Vai haver prejuízo na produtividade, principalmente devido ao menor crescimento dos frutos, e também está havendo uma certa queima dos frutos pelo excesso de insolação. Queima não só dos frutos como também das folhas das árvores. Então, esse efeito deve causar algum prejuízo ainda na próxima safra.
Então, pergunta Mílton Jung:
- A maior produção está em São Paulo?
- A maior produção está em São Paulo, cerca de 80% da citricultura está em São Paulo, que concentra a produção de suco de laranja que, vamos dizer, é exportada para o mundo. O Brasil abastece cerca de 80% do mercado mundial de suco de laranja.
- Que é exatamente um dos estados que vem sofrendo mais com essa falta de chuva e com excesso de calor. [Pondera Milton Young].
- Exatamente. O nível de chuva em São Paulo está 40% abaixo do esperado.
- Agora, Sr. Flávio Viegas, nós já podemos pensar um pouco sobre o que isso pode significar ou impactar em termo de preço?
Responde Viegas:
- Então, é muito difícil fazer essa projeção, mas os números indicam que deveria haver um reflexo importante de preço. Para você ter uma ideia, o Brasil precisa de cerca de 350 mil toneladas de estoque de passagem. Essa safra, que vai finalizar em final de junho, estima-se que o estoque de passagem seria de 205 mil toneladas e o Brasil precisaria de 350 mi toneladas. E na projeção do STA para a próxima safra, em que ele havia projetado um crescimento da produção de suco em 18%, que não vai ocorrer, o estoque de passagem seria de 93 mil toneladas, devido à quebra de safra dos Estados Unidos e maior importação pelos norte-americanos, um pequeno crescimento da Europa. Então, para você ter uma ideia, o Brasil não teria, praticamente, estoque de passagem se a quebra de safra atingisse cerca de 6 a 10%, que é o que está sendo esperado nesse momento. Então, isso deveria ter um impacto importante, inclusive para ajustar a demanda à oferta. - Então nos ajude aqui, nós leigos não entendemos o que é o estoque de passagem. Por que a importância desse dado? [Diz Milton Jung.]
Responde Viegas:
- Estoque de passagem é o estoque final da safra para cobrir o início da próxima safra, porque, geralmente, no início da próxima safra, você tem fruta de menor qualidade, mais ácida; então, a indústria precisa ter um estoque da safra anterior, de suco de melhor qualidade para misturar com esse suco mais ácido da safra seguinte, para manter o fluxo de exportação. O Brasil exporta cerca de 1,2 milhão por ano, e isso é feito por meio de navios especializados. Então você tem que manter o fluxo de 100 mil toneladas por mês, em média, para que todo sistema funcione e o mercado fique abastecido. Você, não tendo esse estoque de passagem, vai ter uma interrupção
Você... não tendo esse estoque de passagem, vai ter uma interrupção nas exportações, o que provoca um colapso no sistema operacional do mundo inteiro.”
Milton Jung então pergunta: “Nós estamos falando aqui de uma safra que vai de maio a junho e de dezembro a janeiro. E nesse período entre as safras é que se torna importante esse estoque?” Responde Flávio Viegas, concluindo: “O processamento é de maio a janeiro. Mas a safra, você tem 12 meses no ano, então você tem que, na safra, produzir uma quantidade correspondente ao consumo anual. Além disso, você tem uma flutuação de qualidade entre uma safra e outra. Então, é isso que exige o estoque de passagem.”
Ora, Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, gostaria de assinalar que desde agosto do ano passado, no Manifesto Público em Salvação da Citricultura, essas entidades estão solicitando as medidas de organização e direcionamento das políticas públicas.
Considerando que os órgãos públicos atuam de maneira isolada, cada qual dentro de suas respectivas competências, verifica-se que as medidas são adotadas de forma independente entre Mapa, Conab, Cade, Senado Federal, Câmara dos Deputados, Secretarias da Agricultura e outros entes.
Não obstante a existência das câmaras setoriais perante o Ministério da Agricultura, verifica-se que a rapidez com que a citricultura é exterminada do cenário agrícola exige a adoção de providências mais específicas, com a criação de organismo dentro da estrutura dos Governos Federal e Estadual, para tratar especificamente dos problemas enfrentados pelo setor.
Caso mantenha-se adotar medidas isoladas entre as diversas camadas do Poder Público, apesar da disponibilidade dos interlocutores, as iniciativas fragmentadas não atingirão os objetivos com a celeridade necessária. Postula-se, assim, a criação, com urgência, de uma agência reguladora da citricultura ou a criação de órgão específico dentro da estrutura governamental, com competência e atribuições próprias, específicas, para enfrentar os problemas do segmento.
Faz-se necessária a adoção de medidas aptas a frear a verticalização, a assimetria de informações e o exercício do poder de compra da indústria.
É incontroverso que entre as causas do posicionamento do preço da caixa de laranja muito aquém dos custos está a verticalização da produção da indústria, que utiliza plantios próprios para não depender de os produtores independentes asfixiá-los com a proposta de compra por preços vis.
Embora o Cade tenha adotado medida para tentar reduzir esse movimento no ato de concentração que autorizou a fusão Citrovita-Citrosuco, precaução ainda insuficiente, não há iniciativa por parte dos poderes públicos tendente a evitar a galopante aquisição de terras para plantio e aumento dos pomares próprios, medidas essas que incluem a nomeação de especialistas no Mapa para a realização de estudo específico tendente a apontar o número exato de plantio próprio em propriedades das indústrias ou através de contratos agrários de parceria e arrendamento; provocação do Cade para que, cautelarmente, imponha para todas as indústrias medidas semelhantes às fixadas no ato de concentração que regulou a fusão Citrovita-Citrosuco, limitando para todas as indústrias o percentual de áreas cultiváveis próprias em patamares que consigam eliminar o poder de compra; separação contábil e societária entre a atividade industrial e a atividade relacionada no cultivo de pomares próprios ou de terceiros; imposição de restrições estruturais tendentes a impedir que sociedades coligadas às indústrias sejam utilizadas para aumento da verticalização, limitando a produção em áreas próprias de arrendamentos pertencentes a familiares em linha reta ou colateral até o terceiro grau de administradores, cotistas ou acionistas, assim como de parceiros agrícolas, adotando-se para tanto parâmetros fixados no Estatuto da Lavoura Canavieira, que restringiu e reduziu as áreas de cana-de-açúcar das usinas ao limite de produção própria.
Quanto à assimetria de informações, é imperativo que o Mapa, através de seu poder regulamentar, e o Cade imponham para todas as indústrias a obrigatoriedade quanto à divulgação de informações trimestrais que contenham volume total estocado no Brasil e no exterior de suco de laranja produzido no Brasil; volumes mensais de exportação de suco de laranja concentrado INFC; preços médios mensais de suco de laranja concentrado INFC no mercado externo em dólares norte-americanos (base Free Carrier - Europa); preços médios mensais de exportação; custo médio mensal de transferência em dólares norte-americanos por tonelada métrica de suco de laranja da porta da fábrica aos terminais no exterior; rendimento médio da produção de suco de laranja baseado em caixa de laranja por tonelada, separando as variedades precoces das tardias; estimativa da quantidade de laranja precoce e tardia produzida em cada safra; preços mensais pagos pelos consumidores nos três principais mercados fora dos Estados Unidos.
A redução do poder de mercado da indústria passa pela urgente e necessária atuação dos Poderes Públicos, entre as quais se destaca a criação de normas regulamentadoras para a manutenção, aprimoramento de política de garantia de preços mínimos para a laranja, com o cuidado de apenas empresas comprometidas com os objetivos a leilões sejam admitidas a participar, incluindo requisitos para excluir empresas que tenham por objetivo cometer atos fraudulentos, instituição de normas e políticas públicas que implantem mecanismos de precificação mínima até a efetiva implantação e funcionamento do Consecitrus e implantação de organismo governamental que analise e regulamente medidas tendentes à desverticalização e regulação mais rígida das atividades nas indústrias.
Assim, Sr. Presidente, quero requerer seja transcrito, na íntegra, esse documento, que ainda contém os itens sobre o incentivo para a implantação definitiva da Consecitrus e, paralelamente aos tópicos estruturais citados linhas atrás, ações de curto, médio e longo prazo que permitam aos citricultores independentes manterem-se competitivos em curto prazo e recuperarem-se da crise de rentabilidade das últimas temporadas.
São importantes medidas de médio prazo para melhorar o ambiente de negócios, a competitividade do produtor independente e medidas de longo prazo, como o fortalecimento da defesa fitossanitária e a demanda doméstica pelo suco de laranja.
Daí a importância da renegociação de todas as dívidas dos citricultores e ex-citricultores nos últimos cinco anos pela securitização e recolocar a laranja na política de preço mínimo, com leiloes da Pepro, publicando edital completo que iniba ações de não citricultores, com a exigência de relatório do greening dos últimos três anos, apoiar o aumento percentual do suco de laranja para os néctares no País, reduzir os tributos incidentes sobre o suco de laranja comercializado, retomar a discussão de inserção do suco de laranja na merenda escolar no Estado de São Paulo, Viva Suco e Leve Suco, e nas sextas básicas da Conab e melhorar o ambiente de negócios, sobretudo com o fortalecimento do Consecitrus, assim também com ações de longo prazo para melhorar a defesa e o consumo doméstico do suco de laranja.
Peço, Sr. Presidente, que, na íntegra, seja registrado este documento que eu li em boa parte.
Muito obrigado, Senador Paulo Paim, pela tolerância para que eu aqui pudesse expor os problemas da citricultura em nosso País, em especial no Estado de São Paulo.
Muito obrigado.
DOCUMENTOS ENCAMINHADOS PELO SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)
Matérias referidas:
- Carta do Presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Ibitinga, com o apoio da Comissão de Citricultura da Faesp e da Associtrus;
- “Manifesto Público em Salvação da Citricultura”.
- Ofício encaminhado aos Ministros Guido Mantega, Antônio Andrade e Miriam Belchior, da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura;
- “Entrevista de Flávio Viegas a Milton Jung na CBN, no dia 04/02/2014;