Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pelos atos de racismo praticados por torcedores peruanos contra o jogador Tinga; e outros assuntos.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL. MANIFESTAÇÃO COLETIVA, POLITICA HABITACIONAL.:
  • Lamento pelos atos de racismo praticados por torcedores peruanos contra o jogador Tinga; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 14/02/2014 - Página 22
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL. MANIFESTAÇÃO COLETIVA, POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • CRITICA, MANIFESTAÇÃO, TORCEDOR, TIME, PAIS ESTRANGEIRO, PERU, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, ATLETA PROFISSIONAL, BRASILEIRO NATO, DEFESA, NECESSIDADE, PUNIÇÃO.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, EVENTO, MOVIMENTAÇÃO, SEM-TERRA, ELABORAÇÃO, CARTA, CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, REGULARIZAÇÃO, ASSENTAMENTO RURAL, APREENSÃO, CONFLITO, TRABALHADOR, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Cumprimento o prezado Presidente, Senador Ruben Figueiró, e os queridos Senadores Paulo Paim, Pedro Simon, Roberto Requião.

            Senador Paim, V. Exª falou algo que eu estava aqui pronto para falar. Eu vou dizer o mesmo que V. Exª disse, ainda que as coisas possam, de alguma forma, ser repetitivas. É tão importante que nos solidarizemos com o Tinga, que acredito que não há qualquer problema em repetir algumas de suas palavras, pois eu, aqui, estava preparado para isso.

            Nesta quarta-feira, o Cruzeiro estreou na Taça Libertadores, jogando contra o time peruano Real Garcilaso. A partida foi em Huancayo, cidade situada a 3,2 mil metros acima do nível do mar. Apesar de o Cruzeiro ter feito o primeiro gol, vencido pela altitude, o time mineiro permitiu que o Real Garcilaso marcasse dois gols e virasse o jogo. Perder ou vencer são coisas do futebol. O problema foi o que aconteceu fora do campo. Alguns torcedores peruanos foram protagonistas de lamentáveis cenas de racismo. Sempre que o volante Paulo César Fonseca, conhecido como Tinga, gaúcho, tocava na bola, a torcida fazia gestos e sons imitando macaco.

            É inadmissível que, em pleno século XXI, cenas de racismo aconteçam no futebol! O árbitro venezuelano José Argote não tomou qualquer providência para coibir essas deploráveis manifestações.

            Tinga se referiu ao ocorrido: “Fico muito chateado. Joguei quatro anos na Alemanha e nunca passei por isso. Agora acontece num país parecido com o nosso, cheio de mistura. Trocaria um título pela igualdade entre raças e classes e respeito.”

            Demonstrações dessa natureza empobrecem o espetáculo esportivo, a paixão de multidões, o futebol. E é de fundamental importância que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) exija que a Conmebol - Confederação Sul-Americana de Futebol - tome urgentes providências, aliás já mencionadas pelo Senador Paulo Paim, para punir o time do Real Garcilaso e sua torcida e também adote ações efetivas para coibir que atos dessa natureza venham a manchar o espetáculo proporcionado pelo futebol.

            Racismo é crime em qualquer lugar do mundo e deve ser repudiado com veemência. Vamos acompanhar as providências que serão tomadas pela Confederação Brasileira de Futebol e pela Conmebol para coibir atos dessa natureza.

            Não podemos permitir que demonstrações de preconceito façam parte de jogos em que equipes brasileiras participem. É importante que a sociedade brasileira, os órgãos governamentais e as entidades esportivas tirem ensinamentos desse episódio de racismo, pois estamos às portas de uma Copa do Mundo em nosso País e não podemos passar qualquer exemplo, mesmo que seja realizado por uma minoria, que se afaste de nossa conduta de respeito com todas as pessoas.

            Bem fez a Presidenta Dilma Rousseff ao classificar, nesta quinta-feira, em mensagens publicadas em seu perfil no microblog Twitter, de “lamentável” o fato de torcedores do Real Garcilaso, do Peru, terem reproduzido sons de macacos no momento em que o jogador brasileiro Tinga, do Cruzeiro, tocava na bola, durante partida entre as duas equipes pela Taça Libertadores da América. Campeão da última edição do Campeonato Brasileiro, o Cruzeiro, time de Minas Gerais, estreou, nessa quarta-feira, na competição continental na cidade peruana de Huancayo.

            “Foi lamentável o episódio de racismo contra o jogador Tinga, do Cruzeiro, no jogo de ontem, no Peru”, disse a Presidente. “Ao sair do jogo, Tinga disse que trocaria seus títulos por um mundo com igualdade entre as raças”, bem fez a Presidenta Dilma de assim publicar na rede social.

            Ela ainda acrescentou que o Brasil, atualmente, está fechado com o jogador do Cruzeiro. “Acertei com a ONU e com a FIFA que a nossa Copa das Copas também será a Copa contra o racismo”, publicou Dilma. E disse que jamais o esporte deve ser palco para o preconceito.

            Eu gostaria também, como fizeram a Senadora Vanessa Grazziotin e o Senador Inácio Arruda, de aqui saudar o VI Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, com 15 mil militantes do Movimento provenientes de 24 Estados brasileiros, que se encontram hoje em Brasília. Eles estão aqui desde segunda-feira e, ontem, realizaram uma manifestação diante do Supremo Tribunal Federal e do Palácio do Planalto. Hoje, pela manhã, cerca de 30 dirigentes do MST foram recebidos pela Presidenta Dilma Rousseff.

            Ontem, de manhã, estive no ginásio em que estão os trabalhadores rurais sem terra e assisti à palestra que ali fez um dos dirigentes, Gilmar Mauro. Hoje, de manhã, a convite de Gilmar Mauro e de outros companheiros do MST, pude ali fazer uma saudação de aproximadamente cinco minutos, para transmitir a eles o quão importante é que eles possam reivindicar a realização mais rápida da reforma agrária, dos assentamentos, com a devida assistência técnica creditícia, e oportunidades de educação para todos aqueles que lutam para que, efetivamente, com dignidade, os trabalhadores rurais possam trabalhar a terra.

            Na carta à Presidenta, já mencionada pelo Senador Inácio Arruda, eles colocam que estão discutindo os problemas sociais do campo, a realidade agrária, a necessidade urgente de fazer mudanças nas políticas agrárias do Governo da Presidenta Dilma.

            Diante da grave situação que atinge milhares de camponeses sem terra em todo o País, resolveram eles escrever para a Presidenta Dilma e dizer que, primeiro, há em todo o Brasil mais de 100 mil famílias acampadas debaixo de lona preta, organizadas por vários movimentos populares e sindicatos. Muitas famílias estão acampadas há mais de oito anos. O Governo foi incapaz de resolver esse grave problema social e político. A média de famílias assentadas por desapropriações foi de apenas 13 mil por ano, a menor média após os governos da ditadura militar. É necessário assentar, imediatamente, todas as famílias acampadas.

            Esclareço que, no documento encaminhado pelo Ministro Pepe Vargas, do Desenvolvimento Agrário, os números são um pouco diferentes. Eles observam que o Ministro, em comunicação, do Incra informa que:

Os programas conduzidos pelo Incra para tornar a reforma agrária mais eficiente se converteram em resultados expressivos no ano de 2013, indicando mais vigor para essa política, com 132 novos assentamentos, 30.239 famílias assentadas - ante uma meta de 30 mil -, cem decretos desapropriatórios, além da edição da Medida Provisória nº 636 e de outros dois decretos que possibilitam uma reabilitação financeira de famílias assentadas. O ano 2014 começa sob nova perspectiva: a de elevar a condição do beneficiário da reforma agrária a partir das políticas de governo combinadas com as ações específicas da autarquia.

‘O balanço de 2013 das ações do Incra tem um diferencial em relação aos anos anteriores, pois estamos indo além do cumprimento de metas, abrindo perspectivas inovadoras para a reforma agrária no Brasil, o que ocorre em um momento importante, já que estamos no Ano Internacional da Agricultura Familiar’, afirma o Presidente do Incra, Carlos Guedes de Guedes.

            Mas, aqui e agora, continuam com os pontos ressaltados pelo MST.

2 - O Governo havia se comprometido de priorizar o assentamento de famílias sem terra nos projetos de irrigação do Nordeste brasileiro.

Sabemos que, além dos vários projetos que estão sendo implantados, há mais de 80 mil lotes vagos, com água e infraestrutura necessária para assentamentos. Basta cumprir a promessa feita e ter agilidade administrativa para assentar milhares de famílias e camponeses nesses lotes, mas, até agora, nada foi feito.

3 - O Governo, na medida provisória que encaminhou o problema das dívidas de créditos passados, incluiu a privatização dos lotes de Reforma Agrária. Essa decisão [segundo o MST] irá permitir incentivar a venda de lotes nos assentamentos. É tudo o que os inimigos da Reforma Agrária querem para desmoralizá-la, através da compra e venda de lotes dos assentamentos. Defendemos o que está na Constituição: a terra distribuída através da Reforma Agrária não pode ser vendida! E os assentados devem receber um título individual de Concessão Real de Uso, com direito a herança. Sugerimos que o Governo e os Parlamentares alterem a Medida Provisória.

4 - O Governo implementou, nos últimos anos, dois programas importantes para ajudar e incentivar agricultura familiar e camponesa, o PAA - Programa Aquisição de Alimentos, e o Penae - Programa Nacional de Alimentação Escolar. Porém, esses programas só atingiram [segundo o MST] 5% das famílias camponesas. É necessário que o Governo aumente os recursos para esses programas, desburocratize e amplie para o maior número possível de Municípios do Brasil.

5 - Existe a necessidade de construir, aproximadamente, mais de 120 mil casas nos assentamentos da Reforma Agrária. As famílias conquistaram a terra, mas não têm moradias dignas. Reivindicamos [diz o MST] que a Caixa Econômica Federal amplie os recursos, desburocratize os processos para que todas as famílias assentadas tenham acesso ao programa Minha Casa, Minha Vida, sob controle das famílias e suas associações.

6 - No Brasil, persistem diferentes formas de trabalho escravo em todo o território nacional. A Polícia Federal libertou mais de 50 mil pessoas em 566 fazendas nos últimos anos. Exigimos que o Governo puna essa prática criminosa e aplique o que determina a Constituição Federal: a expropriação dessas fazendas para fins de Reforma Agrária.

7- Apoiamos e exigimos a legalização imediata de todas as terras indígenas e as áreas de quilombolas [menciona o MST].

8 - Queremos denunciar que o atual coordenador da CTNbio, que julga a liberação de sementes transgênicas, até ontem fazia consultoria para empresas transnacionais que obtêm vultosos lucros com as vendas dessas sementes. Isso é, no mínimo, falta de ética. Exigimos que essa pessoa seja substituída. E solicitamos que os movimentos populares do campo e as universidades também tenham o direito de indicar cientistas para compor a comissão de análise das sementes transgênicas. Exigimos que o governo use sua base parlamentar para impedir o avanço dos projetos de lei que querem legalizar o uso da tecnologia que esteriliza as sementes. Nenhum país do mundo aprovou a ‘tecnologia terminator’. O Brasil não pode ser essa exceção.

9 - Há tempos [dizem os membros do MST na sua carta à Presidenta] apresentamos ao seu Governo algumas propostas que são muito importantes para resolver os problemas da população camponesa, como políticas estruturantes:

a) propomos um grande programa de reflorestamento nas áreas dos pequenos agricultores e assentados. O Governo deveria incentivar e ajudar cada família a reflorestar 2 hectares de terra com árvores nativas e frutíferas.

b) Há ainda 14 milhões de trabalhadores analfabetos. Isso é inaceitável.

            (Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) -

c) Precisamos garantir escolas de ensino fundamental e médio em todo interior do País. Não podemos aceitar que continuem fechando escolas no campo, como aconteceu com mais de 20 mil escolas nos últimos anos. Forçar as crianças e jovens a estudarem nas cidades é um incentivo para promover o êxodo rural.

d) Reivindicamos que se ampliem os recursos do Pronera, para multiplicar as possibilidades de acesso dos jovens do campo às universidades. Todos os anos faltam recursos orçamentários, impedindo a realização de muitos cursos.

9 - O Governo avançou quando aprovou um plano nacional de agroecologia, discutido com as entidades e movimentos populares. Porém, esse plano continua na gaveta, sem recursos e sem programas efetivos. O Ministério da Agricultura afronta a Anvisa, ao liberar o uso de venenos agrícolas ainda mais perigosos para o meio ambiente e, sobretudo, para a saúde das pessoas.

            (Interrupção do som.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Quero requerer, Sr. Presidente, seja registrado na íntegra o documento que estava para concluir, assim como documento divulgado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, pelo Sr. Rafael Ferreira Simões Pires, Assessor do Ministro Pepe Vargas, em que procuram fazer um balanço de toda a atuação do Incra e do Ministério do Desenvolvimento Agrário nos itens de acesso à terra, regularização quilombola, assistência técnica, novo crédito e remissão das dívidas, infraestrutura, Pronera, governança fundiária.

            Tenho a certeza de que, tendo a Presidenta Dilma Rousseff recebido a Direção, a Coordenação do MST, certamente houve e haverá um avanço na forma como o Governo da Presidenta Dilma irá corresponder às reivindicações que aqui estão colocadas.

            Gostaria, apenas, Sr. Presidente, de mencionar que eu tive o depoimento, hoje de manhã, de Gilmar Mauro, que estava ali, diante do Supremo Tribunal Federal, quando ocorreu aquele conflito entre trabalhadores. Informou que os membros do MST estavam se propondo a fazer uma homenagem de lembrança aos 1.800 trabalhadores rurais mortos nas lutas pela terra, pela reforma agrária, nos últimos anos, desde que se iniciou, nesses 30 anos, o MST. Haviam avisado e, inclusive, obtido autorização do Comandante da Polícia Militar daqui, do Distrito Federal, para colocar as cruzes diante do Supremo Tribunal Federal, uma cruz para cada um dos 1.800 mortos. Estavam ali um ônibus, junto às cruzes, e os trabalhadores, para pegarem as cruzes no chão e levarem ao local adequado, planejado, mas eis que o major que estava ali, responsável pela segurança, simplesmente disse que não admitiria que eles colocassem as cruzes nos lugares. O ônibus, então, avançou um pouco, e os trabalhadores vieram pegar as cruzes. Foi exatamente por essa razão que se iniciou o conflito que levou ao ferimento de 20 PMs, ou de até um pouco mais, e de 3 trabalhadores rurais sem-terra. Felizmente, esses, depois de terem ficado hospitalizados até o final da tarde, tiveram alta. Um advogado do MST, que havia sido preso, foi liberado. Entretanto, infelizmente, ocorreu isso.

            O próprio Gilmar Mauro e todos os coordenadores do MST muito lamentaram o episódio, porque a intenção deles era realizar uma manifestação pacífica, como, por exemplo, aquela que aconteceu há alguns anos, quando rememoram o incidente de Eldorado de Carajás e os trabalhadores que ali haviam sido mortos. Eu, inclusive, participei daquela caminhada tão bela que aconteceu, com pessoas vindas de todas as regiões do País. Eu me lembro de ter vindo saudar os membros do MST, com as famílias, às vezes, com a neta, a mãe e a avó. Todos saudaram, porque avaliavam como positivo. Eu, inclusive, transmiti aos membros do MST o quão importante é que eles caracterizem as suas ações seguindo sempre as recomendações de Mahatma Gandhi e de Martin Luther King Jr. de sempre procurarem evitar confrontar a força física com a força da alma, sempre fazendo com que, pela justiça de suas reivindicações, eles possam efetivamente se manifestar, indo às ruas, realizando passeatas como as de ontem, mas de maneira pacífica, porque assim irão conseguir o respeito e o apoio da grande maioria da população brasileira.

            Muito obrigado, Senador Roberto Requião, pela tolerância.

            Informo ainda que, na madrugada próxima, às cinco da manhã, estarei seguindo, em missão parlamentar, juntamente com o Senador Cícero Lucena, o Senador Valdir Raupp e mais dois Deputados Federais, Ivan Valente e outro Deputado do Rio de Janeiro, ao Irã, verificar toda a interação de progresso tecnológico entre o Brasil e aquele país e também dialogar sobre os programas sociais e de melhoria da distribuição de renda. Levarei informações sobre os programas brasileiros e as nossas metas. Também procurarei saber de programas, já que lá parece estar havendo uma experiência pioneira da distribuição de uma renda da ordem de US$40 para todos os habitantes do Irã. E, na semana que vem, reportarei o que lá tiver conhecido.

            Muito obrigado, Sr. Presidente, Senador Roberto Requião.

 

DOCUMENTOS ENCAMINHADOS PELO SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

Matérias referidas:

- Carta de reivindicações do MST à Presidenta Dilma Rousseff, de 12 de fevereiro de 2014;

- “Dilma classifica de “lamentável” racismo contra Tinga na Libertadores”. Matéria de Filipe Matoso e Juliana Braga, do G1, em Brasília;

- Jogo do Cruzeiro no Peru: cenas de racismo;

- “Incra cumpre metas e inicia 2014 com nova perspectiva de atuação”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/02/2014 - Página 22