Discurso durante a 15ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apresentação de alternativa de solução para o impasse que envolve matéria legislativa que regula a criação de novos municípios.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Apresentação de alternativa de solução para o impasse que envolve matéria legislativa que regula a criação de novos municípios.
Publicação
Publicação no DSF de 22/02/2014 - Página 88
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, OBJETIVO, REGULAMENTAÇÃO, CRIAÇÃO, MUNICIPIOS, MOTIVO, VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROJETO, AUTORIA, ORADOR.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco União e Força/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Senador Ruben Figueiró, aqui preside esta sessão, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, Sr. Presidente, houve o veto ao meu projeto, que circulou durante 12 anos, entre Senado, onde foi aprovado primeiro, Câmara, onde houve um longo debate e um acordo, inclusive, com a anuência do Governo Federal. E veio para cá, onde acatamos o substitutivo da Câmara e, ainda, colocamos umas exigências a mais, também a pedido do Executivo. Infelizmente, a Presidente o vetou.

            E não estou, aqui, criticando a Presidente, mas estou dizendo que, assim como ela teve, constitucionalmente, o direito de vetar a lei, teríamos o direito de derrubar o veto. Infelizmente, na sessão que foi destinada à derrubada do veto, houve, realmente, uma clara manobra e uma apresentação, ou uma feitura, naquele dia, de outro projeto muito semelhante ao meu, para dizer que, então, o Governo estava construindo um consenso. Quer dizer, em 12 anos, não deu para construir um consenso e, agora, após isso, quer-se fazer um consenso.

            Eu não sou pessoa que não goste de consenso; pelo contrário, até por formação médica, quando temos dúvida sobre um caso, fazemos uma junta médica, para chegar a um consenso sobre que doença, realmente, o paciente tem. Mas, na verdade, esse veto decepcionou muita gente deste Brasil afora. Inclusive, muitos prefeitos que recebi, naquele dia em que eles próprios, prefeitos, queriam o desmembramento ou a fusão de distritos ao Município, a incorporação de áreas

            E o meu Estado só perde, eu diria, para o Pará e para o Amazonas em Municípios enormes, gigantescos. E nenhum prefeito, mesmo com dois mandatos, consegue atender as coisas básicas de que aquelas pessoas precisam.

            Por exemplo, justamente prevendo a aprovação desse projeto, eu apresentei uma lei que incorporava, criava o Porto de Santa Maria do Boiaçu, que é lá no sul do Estado, já quase na fronteira com o Amazonas, com uma realidade diferente. Também aprovei a transformação de uma rodovia estadual precária, por sinal, há muito tempo, para que essa rodovia fosse federalizada - e foi. Então, ontem, eu reclamei, inclusive, da demora da aprovação desses projetos na Câmara. Pois bem, a estrada já foi aprovada - é a BR-421. Agora, o porto ainda não foi aprovado, e nós precisamos, de fato, criar as condições.

            Este País não pode continuar mais ou menos como o sistema colonial ou o sistema da época do Império neste País, em que o Brasil era só o litoral. Nós precisamos avançar para o oeste, para o seu Centro-Oeste, na verdade, para o seu Estado, para todos os Estados ali que são grandes, tanto Mato Grosso, quanto Mato Grosso do Sul e o Amazonas.

            Então, como eu estava dizendo, o meu Estado só perde para o Pará e o Amazonas em tamanho de Município. E nenhum Município no meu Estado tem menos de 5 mil habitantes. No entanto, em São Paulo, há um Município com menos de mil habitantes, como em Minas também há. São os dois Estados maiores, mais subdivididos do País e têm Municípios com essa proporção. Municípios com até mil habitantes, dois mil habitantes, três mil habitantes há milhares. Então, a criação de Municípios não tem ainda regra nenhuma. Obedece-se a critérios políticos e a alguma observação técnica que obedece a esses interesses políticos.

            O nosso projeto, ao contrário, cria normas rígidas para a criação de Municípios, começando pelo número mínimo de habitantes, passando pelo estudo de viabilidade econômica e, depois, pelo plebiscito em toda a área do Município a ser desmembrado e do Município que ficará desmembrado.

            Então, é um projeto realmente rígido, democrático, que, inclusive, exige um estudo de viabilidade econômica, não só da parte que se desmembra para criar um novo Município, mas da parte que remanesce de onde foi tirado o novo Município. Então, não se pode criar um Município em prejuízo de um já existente e que fique inviabilizado economicamente.

            Muito bem. Tudo isso feito, a sessão da derrubada do veto foi obstruída, porque os Deputados entenderam claramente que os Senadores não compareceram. Nós tínhamos 57 Senadores presentes na sessão do Senado e, logo em seguida, na sessão do Congresso, nós não tínhamos nem 20.

            Isso realmente é lamentável, porque apequena o Poder Legislativo, torna-o um apêndice do Executivo. Eu acho que o Executivo e o Legislativo têm de ser independentes e harmônicos, como manda a Constituição. Então, não pode haver esse monopólio da legislação vindo do Executivo. Já não bastassem as medidas provisórias que a toda hora trancam as pautas, a iniciativa parlamentar de legislar praticamente não existe mais. Raríssimos projetos são aprovados por iniciativa de Parlamentar. E saibam que eu considero a mais nobre missão do Parlamentar justamente legislar sobre todos os assuntos de interesse do País e de sua região.

            Eu recebi várias comunicações, por exemplo, como a de Santa Maria do Boiaçu, que eu já citei aqui. Fica dois dias distante da sede - só se vai lá por barco. Como é que um prefeito vai administrar um Município que é tão grande quanto vários Estados do Nordeste, por exemplo, e até mesmo do Sul e do Sudeste? Como ele vai administrar esse Município adequadamente?

            Aí, se argumentou que criaríamos despesas. Ora, o que se propõe, está proposto lá, é a divisão do Fundo de Participação dos Municípios. O que quer dizer? Um Município com área X recebe X recursos do Fundo de Participação do Município, o que é constitucional, não é nenhuma benesse do Governo. Mas, ao mesmo tempo, esse FPM, criado um novo Município, vai ser dividido entre os dois. Por quê? Porque um Município que perde a área diminui o FPM, mas não diminui a responsabilidade de gastar no novo Município.

            Os Estados Unidos, tirando o Alasca, são mais ou menos a mesma área do Brasil e têm 56 mil Municípios. Será que somos mais inteligentes do que os americanos? Será que temos realmente a visão de desenvolvimento que tiveram os Estados Unidos, inclusive em sua criação, em que os Estados foram traçados a régua, sem que se importassem com rios, montanhas ou quaisquer acidentes geográficos?

            Eu quero hoje dizer o seguinte, até dando uma satisfação à população que estava esperançosa em meu Estado.

Por exemplo, a de Santa Maria do Boiaçu, que fica no sul do Estado, ligado ao Município Caracaraí, que fica no centro do Estado, mais para o norte, até, como os habitantes de Rorainópolis, que é um Município que também vai até o sul do Estado, fazendo fronteira com o Amazonas, o Município de Cantá, que é grande e poderia, perfeitamente, ser dois Municípios, até para que a população desse Município tivesse, de fato, a presença do poder público para dar assistência médica, assistência à educação, ao transporte, enfim, levar ao cidadão os direitos e deveres que tem o Executivo a respeito do desenvolvimento regional. Aliás, é um imperativo constitucional o Governo eliminar as desigualdades regionais.

            Entendo que o Governo tem feito muito na questão de eliminar as desigualdades sociais, mas isso não resolve a questão do desenvolvimento regional. Quer dizer, então, há um desequilíbrio e o pior é que termina acontecendo o que, Senador Figueiró? Pessoas que até fazem uma faculdade lá em Roraima, lá no Acre ou lá no Amazonas terminam indo para São Paulo, Rio, Minas, por quê? Porque vão morar num grande centro, têm mais oportunidade de aperfeiçoamento e de trabalhar em hospitais mais equipados. Eu estou falando de médicos, que, portanto, têm curso superior, mas nós temos, também, a mão de obra, digamos assim, não especializada que está nesses Estados mais pobres, que não tem oportunidade de emprego lá e vai, principalmente, para São Paulo, Rio e Minas, agravando os problemas sociais que lá existem.

            Então, eu queria, aqui, fazer um apelo à Presidente da República e aos seus líderes no Senado.

            O Jornal Nacional disse que se está buscando um consenso. Interessante, porque, comigo, que sou autor, nem conversaram ainda! Então, que consenso é esse? É unilateral? Eu sou da base aliada da Presidente Dilma, mas eu repito o que já disse, aqui, várias vezes: o bom amigo, o bom aliado não é aquele que só aplaude, que sempre concorda, mas é aquele que, realmente, procura ajudar, fazendo análises críticas construtivas e, também, que defende a sua região com clareza.

            Então, eu quero dizer que o melhor acordo que se poderia fazer seria derrubar o veto e apresentar esse novo projeto. Quando o projeto que está aí, chegado há poucos dias aqui, fosse aprovado, ele revogaria os dispositivos da lei anterior.

            Então, não consigo entender por que não existe, portanto, essa harmonia, esse entendimento entre Executivo e Legislativo. Não quero nem falar do Judiciário, que é outra seara. Eu entendo que, se nós somos, aqui no Senado, a Casa da Federação, em que Estados pequenos como o meu têm o mesmo número de Senadores que tem São Paulo, nós não podemos aceitar esses desequilíbrios regionais de maneira pacífica, sem que tomemos uma providência adequada.

            Portanto, eu quero repisar essa questão, principalmente porque se noticia já, inclusive no Jornal do Senado, que o Governo está buscando um consenso para substituir um projeto que tramitou 12 anos no Senado e na Câmara.

            Não chego a ficar frustrado, como disse Rui Barbosa, ao ver essas coisas, mas realmente lamento porque um País que tem um Parlamento com maioria governista - não há problema; nos Estados Unidos, há Câmara e Senado -, num, o governo tem maioria; no outro, ele não tem maioria; e, às vezes, há presidente que tem maioria nas duas casas, mas sempre o debate é feito, em todas as matérias de interesse do País.

            Agora, aqui, o que adianta, por exemplo, em discurso que já se fez e nós tivemos, é bom frisar, 312 Deputados que votaram a favor - a maioria esmagadora da Câmara, porque são 513 -, 312 votaram a favor, aqui no Senado, no dia da sessão, havia 62 Senadores presentes, só 5 votaram contra.

            Então, por que não levar em consideração essa questão? Eu compreendo que não poderemos fazer um País realmente democrático mantendo o Congresso submisso. Para isso, há o diálogo. Por que as lideranças dos diversos partidos aliados, a Liderança do Governo aqui, no Senado e no Congresso, não dialogam mais com os Parlamentares? Mesmo os mais ferrenhos opositores aqui poderão ter ideias que sejam válidas. Não é essa história só de uma divisão, como estar de mal, só vale o que eu penso e o outro, eu nem falo com ele.

            Portanto, quero encerrar aqui de uma maneira serena, pedindo que realmente seja analisada essa questão das desigualdades regionais, provocadas principalmente pelas enormes regiões em Estados mais pobres e pequenos Municípios em Estados ricos, como é o caso de Borá, em São Paulo, que não tem nem mil habitantes.

            Penso que é um dever meu, como roraimense, como amazônida, como homem, que, inclusive, se formou lá, não conheço a Amazônia só por ouvir falar, penso que é importantíssimo que o Governo repense, realmente, e chegue a um acordo. E, vou repetir, faço uma proposta: derrubemos o veto, a lei fica valendo, não há prazo estabelecido para se criar Município, e esse outro projeto é aprovado; quando aprovado, transformado em lei, vai revogar os itens que o Governo achar inconvenientes nesse projeto.

            Ninguém está aqui radicalizando, mas também não há como aceitar, de maneira passiva, uma questão dessas, que interessa a milhões de brasileiros pelo País afora. Citei aqui a Amazônia, que é o caso pior, o Norte, mas o Nordeste também não é muito diferente, e o Centro-Oeste também não. Então, precisamos, eu diria, estabelecer um órgão que, de fato, cuide da integração do País. Lamento dizer que, infelizmente, o Ministério da Integração não tem feito esse papel, não tem promovido, de fato, a integração regional do País.

            Portanto, quero agradecer a V. Exª pelo tempo concedido e fazer este apelo ao Poder Executivo e aos seus aliados aqui, entre os quais me incluo, para que possamos, realmente, não desmoralizar uma atitude feita pelo Congresso em consonância com o Executivo. Está aí a fórmula: derrubemos o veto, coerentemente com a votação feita aqui no Senado, que teve 53 Senadores a favor; em seguida, aprova-se esse outro projeto, que será encabeçado pela Senadora Gleisi; e, no que houver divergência, essa lei posterior revogará os dispositivos da lei anterior. É uma proposta que faço de acordo.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/02/2014 - Página 88