Discurso durante a 16ª Sessão Especial, no Senado Federal

Destinada a comemorar os 30 anos da realização do comício inaugural da Campanha pelas Eleições Diretas para Presidente da República.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES, ESTADO DEMOCRATICO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Destinada a comemorar os 30 anos da realização do comício inaugural da Campanha pelas Eleições Diretas para Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 25/02/2014 - Página 10
Assunto
Outros > ELEIÇÕES, ESTADO DEMOCRATICO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, REALIZAÇÃO, COMICIO, REFERENCIA, MOVIMENTAÇÃO, DEFESA, ELEIÇÃO DIRETA, PAIS, PERIODO, REGIME MILITAR.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente desta sessão e também autor do requerimento para hoje comemorarmos os 30 anos da realização do comício inaugural da campanha nacional pelas eleições diretas, Senador Alvaro Dias, sua veemência, embora os cabelos tenham ficado mais curtos e as rugas tenham aparecido, não perdeu o viço de 30 anos atrás, quando, empunhando o microfone, com a vibração de um jovem, o que continua ainda hoje, fazia a defesa da tese da legítima cidadania, pela implantação em nosso País de eleições diretas para escolher os Governadores e o Presidente da República. As Diretas Já marcaram a história do nosso País. Então, eu queria, em primeiro lugar, cumprimentá-lo pela iniciativa, porque a memória precisamos avivá-la com muita frequência, para que não nos percamos nos escaninhos da história.

            Cumprimento o caro Senador Cyro Miranda, meu colega na Comissão de Educação, a qual compartilhamos, V. Exª como Presidente e eu como Vice-Presidente; o caro Deputado Luiz Pitiman, do Distrito Federal, representando a Câmara; a Vice-Presidente Nacional do Secretariado do PSDB Mulher e viúva de Dante de Oliveira, autor da proposta de emenda para a eleição direta do Presidente da República, Telma de Oliveira; o Diretor Técnico e Comercial da Companhia de Ethernet de Goiás Telecomunicações Ltda. (Celg Telecom), Paulo Silva de Jesus, representando aqui o Governador Marconi Perillo.

            Cumprimento ainda o secretário particular e assessor direto e político do Dr. Ulysses Guimarães, o Senhor Diretas, o Senhor Constituição Cidadã, o Sr. Oswaldo Dante Manicardi. Muitas vezes, nós nos encontramos, porque, à época, eu era também repórter e cobria o episódio. Eu já estava em Brasília; aqui cheguei em 1979. Portanto, naqueles momentos, muitas foram as entrevistas que fizemos, que eu fiz com o Dr. Ulysses Guimarães. Lembro a memória desse homem tão especial, que deixou marcas indeléveis na história brasileira, não só pela sua biografia, mas pela sua forma de ser.

            Certa vez, com um grupo de jornalistas - à época, eu liderava uma equipe no jornal Zero Hora -, fomos fazer uma entrevista com o Dr. Ulysses Guimarães. Nós o entrevistamos com toda a reverência e com todo o respeito, em nenhum momento deixando de chamá-lo de Presidente ou de Sr. Deputado. Ao final da entrevista de uma hora e meia, junto com Aldo Fagundes, que era Deputado do PMDB do Rio Grande do Sul, do MDB à época, uma figura também expressiva no comando partidário, ao término da entrevista, aquelas jovens repórteres ouviram do Dr. Ulysses uma declaração surpreendente. De pé, ele coçou as costas na entrada da porta e disse: “Vocês todas têm cara de mulheres muito bem amadas.” Foi uma declaração que parecia ser de pouco significado, mas que dizia muito, porque dizia do comportamento das jornalistas que ali entrevistavam aquele homem tão importante para a história brasileira.

            Com essas palavras, eu queria dizer que, com muita honra, em nome do Partido Progressista e, especialmente, do nosso Líder Francisco Dornelles, venho aqui. O pronunciamento do Senador Alvaro Dias, nesta sessão especial, já exaltou todos os méritos, todo o senso de oportunidade, toda a validade, toda a relevância do que significou há 30 anos aquela mobilização, que levou milhões de brasileiros às ruas em 1984, transformando-se em um marco histórico da nossa democracia. Ganhou força também especialmente com a relevante - e foi destacada pelo Senador Alvaro - atuação da imprensa, no começo um pouco tímida, mas, quando o engajamento foi absolutamente de comprometimento, abriram-se as porteiras e as comportas, e a avalanche começou. Destaco não só a atuação dos meios de comunicação, de que tive a honra de participar naquela época, mas também de outras instituições extremamente relevantes que, hoje, continuam tendo um papel decisivo sobre o aperfeiçoamento do processo democrático brasileiro. Eu citaria a OAB, a CNBB, a própria ABI e outras entidades.

            O engajamento durante quatro meses, ainda que inicialmente discreto, reconheça-se, foi preterido por alguns veículos, mas teve força e foi fundamental para difundir as ideias democráticas de modo inquestionável. À época, não tínhamos o Twitter, não tínhamos o Facebook, não tínhamos o YouTube. Nós fazíamos aquilo quase de boca a boca ou pela televisão e pelo rádio que, à época, tinham a força maior.

            Em vez de manifesto violento, marcado por atos de vandalismo, como hoje tem sido frequente nas nossas regiões metropolitanas no Brasil e em outros países, como Argentina e Venezuela, esse movimento histórico das Diretas, genuinamente brasileiro, além de politizado e objetivo, foi acima de tudo pacífico, uma festa legítima da democracia e do pluralismo.

            A rebeldia e o desejo de eleger pelo voto direto, visto e vivido nas ruas naquela época, contagiaram de modo muito positivo todas as classes sociais de nosso País, e o resultado não poderia ter sido melhor: a transformação da realidade e a conscientização sobre o empoderamento do povo ou da cidadania de todos aqueles que foram às ruas pedir para votar, para ter o direito de escolha. Naquele momento, a democracia venceu o medo e a repressão, dando lugar à liberdade e à autonomia, valores fundamentais em nossa sociedade.

            Esse fantástico movimento de massas jamais foi imaginado pelo Deputado Federal Dante de Oliveira, autor da proposta de emenda à Constituição de 2 de março de 1983 que estabelecia no papel o que as pessoas pediam nas ruas: as eleições diretas para Presidente.

            Vejam o quão importante é uma proposta legislativa! E ainda dizem que o Congresso custa caro, meu caro Senador Alvaro Dias. E ainda dizem que o Congresso custa caro! Que preço tem essa PEC Dante de Oliveira? Isso é incalculável, porque é um ganho para a sociedade. Então, não podemos quantificar o quanto se gasta pelo valor e pela relevância de uma decisão como essa e como muitas outras que esta Casa tomou. Naquele caso, foi sugestão suficiente para se transformar no estopim de um grandioso movimento. Foi, sem dúvida, forte estímulo para legitimar, cinco anos mais tarde, em 1989, a primeira e definitiva eleição direta para Presidente de nosso País.

            A fome e a sede dos brasileiros por autonomia política estavam, portanto, sendo saciadas. Os brasileiros, naquele momento, realizavam o sonho do empoderamento, característica democrática tão relevante e ainda necessária nos dias de hoje.

            Além das clássicas e inesquecíveis participações no comício na famosa Praça da Sé, em São Paulo - é claro, reconheço, o Senador Alvaro puxou a brasa para o Paraná, para Curitiba, onde aconteceu a primeira manifestação, e tem S. Exª toda a razão e todo o direito de fazê-lo; o Rio Grande do Sul não foi o primeiro, mas também realizou uma manifestação extremamente importante -, onde estavam presentes o ex-Presidente da República e então Líder do PSDB Fernando Henrique Cardoso; Ulysses Guimarães; Franco Montoro; Luiz Inácio Lula da Silva; Mário Covas; Leonel Brizola, grande gaúcho; Miguel Arraes; Roberto Freire e muitos outros, o movimento Diretas Já, há 30 anos, incluiu também outras instituições importantes, como falei: a OAB, a CNBB, os estudantes universitários, o movimento operário do ABC paulista e o partido do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), à época. Todos, juntos, estavam focados em um objetivo claro e muito definido: o direito de votar e de escolher o Presidente da República.

            Passados 30 anos, a vontade por mudanças, por transformações, continua muito viva ainda hoje, quando já elegemos e reelegemos dois Presidentes. Agora, novamente, estamos em outra campanha eleitoral, com a Presidente disputando uma reeleição.

            Queremos liberdade de expressão, sem acabar com o direito à privacidade. Defendemos a liberdade de manifestação desde que não acabemos com o direito de ir e vir das pessoas. As cobranças por melhor infraestrutura, por mais saúde, por mais educação, por transporte público de qualidade são também cada vez mais latentes e urgentes e demandam essas aspirações e reivindicações da nossa população.

            O Brasil mudou, e as demandas sociais também mudaram. O que não pode mudar, jamais, é a transformação pela via pacífica, suprapartidariamente, sem rupturas profundas. A transformação precisa ser conciliatória, sem traumas e sem violência. Esse deve ser o espírito sempre presente na nossa democracia, com movimentos políticos que assegurem as liberdades básicas, o respeito às normas e à alternância do poder. Isso é democracia. Esse deve ser o legado desse importante movimento ocorrido há 30 anos, há três décadas.

            Por isso, encerro este pronunciamento, lembrando um episódio envolvendo a cantora e ativista política Fafá de Belém, um dos maiores símbolos femininos das Diretas Já. É claro que, agora, eu, como mulher e Senadora, puxo a brasa para o nosso assado, não é, minha querida Thelma?

            Vale lembrar que, na véspera da campanha nacional pelo voto direto, a cantora participou de 30 comícios em todas as regiões do País. E foi no encontro na Praça da Sé, há 30 anos, que essa exuberante cantora paraense soltou, pela primeira vez, a pomba da liberdade, simbolizando que ali estava chegando a eleição direta e, portanto, consolidando a nossa democracia. Esse ritual foi repetido em todas as demais manifestações, em São Paulo, no Mato Grosso, nos dias de muito frio ou de muito calor.

            Em recente entrevista ao jornal Correio Braziliense, Fafá de Belém declarou:

Qualquer ditadura é ruim, qualquer regime totalitário, que cerceia a liberdade das pessoas, é ruim. A democracia é um exercício diário de opiniões divergentes, de busca de consenso. Somos crianças ainda, tempos apenas 30 anos. Mas só o fato de podermos falar abertamente e discutir abertamente qualquer tema é ponto muito positivo [palmas para Fafá de Belém!].

A imprensa tem o papel fabuloso de denunciar, de mostrar o que está errado. Isso não existia antes. Temos, então, de viver esse exercício diariamente [para praticarmos sempre e profundamente a democracia]. Isso é democracia!

            Agora, nosso voto é aberto no Senado. Esse também é um processo que foi estimulado pelo Senador Alvaro Dias e por outros Parlamentares, como o Senador Paulo Paim e os demais Senadores, e que nós apoiamos.

            Nesse tempo, elegemos, como eu disse, três Presidentes pelo voto direto: Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma. Todos eles foram beneficiados pelo dispositivo constitucional que permite a reeleição, dando o direito ao eleitor de, se estiver gostando, deixá-los permanecer no cargo.

            Não questiono. Não questiono o mérito de dar ao eleitor este poder e este direito de dizer: quero repetir o meu voto. Não questiono. Não questiono. O que estou querendo, para tornar mais democrática e, sobretudo, mais justa essa disputa, o que pretendemos é que os candidatos à reeleição, os pretendentes à reeleição deixem os cargos para que a disputa não se torne injusta com os concorrentes de outros partidos.

            Sou a autora da PEC nº 48, que tem essa natureza, e, com muita sabedoria, o Senador Relator da minha emenda constitucional, o Senador Luiz Henrique da Silveira, ex-Governador de Santa Catarina, brilhante Senador pelo seu Estado, aperfeiçoou a Emenda nº 48, definindo a data da oficialização da candidatura à reeleição como prazo limite para que o postulante a reeleger-se se desincompatibilize, deixe o cargo.

            Penso que, desta forma, estaremos contribuindo, sim, para que a democracia se consolide e para que não haja disparidade e injustiça em uma disputa eleitoral, no caso de mantermos a reeleição.

            Muito obrigada e, novamente, parabéns, Senador Alvaro Dias, por essa iniciativa!

            Viva a democracia! Viva as Diretas! Viva o nosso País!

            Obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/02/2014 - Página 10