Discurso durante a 17ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre as razões que motivaram S. Exª a impetrar mandado de segurança contra a Presidente Dilma Rousseff por empréstimos concedidos pelo Brasil a Cuba e a Angola.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA EXTERNA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.:
  • Comentários sobre as razões que motivaram S. Exª a impetrar mandado de segurança contra a Presidente Dilma Rousseff por empréstimos concedidos pelo Brasil a Cuba e a Angola.
Publicação
Publicação no DSF de 25/02/2014 - Página 50
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA EXTERNA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, MANDADO DE SEGURANÇA, OBJETIVO, PEDIDO, ESCLARECIMENTOS, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, CONCESSÃO, EMPRESTIMO, PAIS ESTRANGEIRO, ANGOLA, CUBA, COMENTARIO, OPOSIÇÃO, ATUAÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ainda há pouco, às 15h30, entreguei, em mão, ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Joaquim Barbosa, este mandado de segurança que interponho contra a Presidente da República, Dilma Rousseff; o Ministro Mauro Borges Lemos, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; e o Presidente do BNDES, Luciano Galvão Coutinho.

            O objetivo, Sr. Presidente, é obter as informações sobre os inusitados empréstimos secretos conferidos pelo Brasil à Cuba e à Angola, especialmente. Esse assunto tem sido recorrente. A oposição adotou várias providências, os discursos foram reiterados, os protestos na mesma ordem, mas nós temos de adotar providências judiciais efetivas para oferecer resposta às reivindicações da sociedade brasileira no que se refere a esse tema. Há uma indignação que certamente os governistas reconhecem. Especialmente por meio das redes sociais, somos convocados constantemente a agir contrariamente a empréstimos concedidos a outros países, notadamente aqueles que trazem a tarja de sigilosos.

            Encaminhei, recentemente, requerimento com base na Lei de Acesso à Informação, e o Governo negou informar, argumentando tratar-se de sigilo na legislação dos países parceiros. Aliás, recentemente também, há alguns meses, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos, indaguei ao Presidente do BNDES, Luciano Coutinho, qual a razão desses empréstimos secretos. Ele responde, informando que naqueles países a legislação exige o sigilo. Disse a ele: “O Governo brasileiro prefere respeitar a legislação de outros países e rasgar a nossa própria Constituição a respeitar esses pressupostos básicos constitucionais que dizem respeito à transparência e à publicidade dos atos da administração pública?” O Presidente ficou sem resposta. Exatamente respaldados na negativa do Governo é que estamos impetrando esse mandado de segurança.

            Nós estamos apresentando, anexo ao mandado de segurança, os documentos necessários que consubstanciam nosso pleito.

A Lei Maior, ao adotar a publicidade como princípio regente da administração pública, reverbera-o tal como ideologia sedimentada ao longo de todo seu texto - princípio que é. Nesse sentido, aliás, o hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal, Prof. Luís Roberto Barroso, ensina:

“Os princípios constitucionais são, precisamente, a síntese dos valores mais relevantes da ordem jurídica, consubstanciando premissas básicas de uma dada ordem jurídica, irradiando-se por todo o sistema (...). Indicam o ponto de partida e os caminhos a serem percorridos.”

            Aduzimos também, mais um arrazoado jurídico da lavra de Celso Antônio Bandeira de Mello.

            Celso Antônio Bandeira de Mello afirma:

“Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico (...). Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais (...)”

Ora, é direito líquido e certo de qualquer Parlamentar provocar atos de fiscalização, com base em prerrogativa constitucional da Casa a que pertença. Lamentavelmente, nada parece obrigar o Poder Executivo a expor suas negociações internacionais nem mesmo ao poder que lhe é controlador por excelência.

Na medida em que os [governistas] negam ao [Congresso] - Parlamentar que é - o direito à fiscalização dos atos do Poder Executivo federal, resta violada a sua prerrogativa constitucional e republicana. (...)

Ademais, há que se sustentar a possível inconstitucionalidade desses acordos financeiros internacionais. Ora, a Constituição Federal é clara quando estabelece, como mais uma demonstração do mecanismo representado no Direito nacional pela atribuição exclusiva do Congresso Nacional prevista no art. 49 da Lei Maior:

“Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;”

Também não se tem notícia da chancela congressista com relação a tais acordos internacionais “secretos”. [O Congresso não autorizou o Governo da União a celebrar contratos secretos com outros países.]

Está clara a obscuridade que o Poder Executivo, representado na figura de sua Presidente, lança sobre os princípios constitucionais da Administração Pública.

            Recentemente, uma professora da USP, em entrevista à Record News, defendeu tratar-se de atos inconstitucionais aqueles praticados pelo Governo brasileiro ao conceder empréstimos a outros países sem autorização do Congresso Nacional.

            Não desconhecemos que o Governo dribla a legislação em várias oportunidades, concedendo empréstimos, inclusive, através de empresas empreiteiras que realizam obras ou supostamente realizam obras no exterior. É uma forma de driblar o preceito constitucional.

            Nós estamos solicitando, com esse mandado de segurança, o seguinte, Sr. Presidente:

Dos pedidos principais:

(...) Requer-se dos demandados [ou seja, a Presidente, o Ministro e o Presidente do BNDES] a concessão de pleno acesso ao impetrante dos documentos e informações pleiteados no requerimento que anexamos a esse mandado de segurança, formulado com base na Lei de Acesso à Informação [já há alguns meses]; caso o pedido anterior não seja deferido, requer-se a concessão de ordem para que os impetrados forneçam as informações requeridas, com base no direito avençado, ainda que sob a proteção do sigilo legal.

Dos pedidos complementares, porém, indispensáveis:

Notificação das autoridades coatoras, para que, no prazo legal, apresentem as informações.

            Nós estamos resumindo, Sr. Presidente, encaminhando esse mandado de segurança, em razão da prerrogativa de foro dos réus - Presidente da República, Ministro Mauro Borges e o Presidente do BNDES -, ao Supremo Tribunal Federal.

            Muitas sugestões vieram no sentido de ajuizarmos uma ação direta de inconstitucionalidade, mas esta ação não se presta, nesse momento, já que esta ação não se presta a declarar a inconstitucionalidade de atos concretos do Poder Executivo, somente aos que o Judiciário chama de atos abstratos e genéricos, ou seja, leis e normas jurídicas.

            O nosso objetivo é requerer ao Supremo acesso aos contratos, documentos e informações, envolvendo os empréstimos internacionais, neste caso, com os governos de Cuba e Angola. Quais são os fundamentos? Violação do direito líquido e certo do Parlamentar em exercer a sua prerrogativa constitucional de fiscalização dos atos do Poder Executivo federal; violação ao princípio constitucional da publicidade dos atos administrativos; violação da moralidade administrativa mediante a deturpação do uso da Lei de Acesso à Informação - uma importante conquista do cidadão, que está sendo sabotada pelo alto escalão do Governo Federal.

            Essa Lei significou, sim, um avanço na direção da transparência que exige a Constituição do País. No entanto, ela está sendo sabotada pelo Governo da União. As indagações que formulamos nesse caso e em outros casos não foram respondidas com base na Lei de Acesso à Informação.

            A inconstitucionalidade dos empréstimos internacionais sem a chancela do Congresso Nacional é uma discussão que, certamente, ganharia contornos polêmicos, já que, como disse anteriormente, o Governo da União vale-se de subterfúgios para fugir à legislação vigente, que exige o pronunciamento do Congresso Nacional para a concessão de empréstimos externos.

            Essa é uma primeira medida. Nós não podemos admitir que o Governo faça empréstimos vultosos sem que aqueles que pagam impostos neste País saibam o valor dos empréstimos, o prazo de carência para o seu resgate, taxas de juros. Sabemos que as taxas são privilegiadas, mas não conhecemos os percentuais estabelecidos nesses empréstimos sigilosos.

            Não vejo outro assunto, neste momento, que revolte tanto o povo brasileiro, ao verificar que o nosso Governo empresta para a construção de porto em Cuba; empresta para o metrô de Caracas, na Venezuela; para a construção de hidrelétrica na Venezuela; para a aquisição de máquinas agrícolas e outros equipamentos na Venezuela; que empresta para a aquisição de aviões da Embraer pelo governo da Venezuela; que estuda empréstimos de mais de US$4 bilhões para que a Venezuela possa enfrentar este momento de desabastecimento alimentar.

            Aliás, é bom frisar que a eclosão dessa mobilização popular nas ruas daquele país se dá como consequência do acúmulo de incompetência, prepotência, censura à imprensa, subtração de garantias individuais dos cidadãos, violência contra órgãos de imprensa e perseguição a jornalistas. Enfim, um festival de atos arbitrários, que desmentem a existência de um regime democrático naquele país.

            A paixão do Governo brasileiro por ditaduras mundo afora, como a de Cuba, especialmente, que se prolongam no tempo e na história, é inusitada. Nós não devemos contestar essa paixão. Confesso que, na juventude, também me apaixonei pelos atos dos revolucionários, aqueles que resistiam ao autoritarismo e que procuravam reagir para libertar os seus povos.

            Confesso que admirei a figura de Fidel Castro, de Che Guevara, mas essa admiração da época de juventude transformou-se em enorme frustração. Não era por isso que vemos, hoje, que os admirávamos. Mas os admirávamos porque entendíamos serem ícones das mudanças para a democracia.

            O que desejávamos era o voto, o que desejávamos era a competição democrática, um cenário de liberdade de expressão, de liberdade de imprensa, de direitos humanos respeitados. E, ao final, a frustração veio na esteira de ditaduras perversas, de ditaduras implacáveis que esmagam os seus povos; ditaduras declaradas ou não declaradas. A de Cuba, a de prisioneiros políticos, é uma ditadura declarada. Venezuela é uma falsa democracia, porque tem governo prepotente, desumano e perverso, que leva o país para um abismo social sem precedentes, onde falta de alimentos a papel higiênico e onde a bala é utilizada para cercear a liberdade de manifestação nas ruas do país, com a configuração da violência que martiriza...

            (Soa a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR) - ...todo um povo desejoso de restabelecer o processo democrático num país que já foi livre e próspero, num país que já ostentou o melhor poder aquisitivo da América Latina e que hoje é submetido, pela incompetência e pela prepotência, a dias amargos de dor, de fome e de miséria.

            Sr. Presidente, aqui está, para registro nos Anais, esse mandado de segurança que estamos interpondo junto ao Supremo Tribunal Federal. O Brasil precisa saber. O Brasil tem o direito de saber. O Governo tem o direito de informar para onde esses recursos públicos estão sendo enviados. Para alimentar ditaduras ou falsas democracias, fazendo com que líderes boquirrotos sobrevivam ao longo do tempo e da história, esmagando as suas gentes?

            Esses empréstimos precisam ser do conhecimento não apenas do Congresso Nacional, que tem de ser o intermediário para fazer chegar ao povo brasileiro. Essas informações não podem ser negadas.

            Se não conseguimos em respeito à Lei de Acesso à Informação, temos esperança de conseguir por determinação do Supremo Tribunal Federal.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/02/2014 - Página 50