Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca de projeto de lei que trata da guarda compartilhada dos filhos de casais separados.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO CIVIL.:
  • Considerações acerca de projeto de lei que trata da guarda compartilhada dos filhos de casais separados.
Publicação
Publicação no DSF de 26/02/2014 - Página 18
Assunto
Outros > CODIGO CIVIL.
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), RELATOR, ORADOR, ASSUNTO, REFORMULAÇÃO, CODIGO CIVIL, RELAÇÃO, PARCERIA, PAES, SITUAÇÃO, DIVORCIO, GUARDA, FILHO.

            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT-RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, nosso querido Senador Paulo Paim, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, venho esta tarde para falar, com muita satisfação, do PLC nº 117, que trata da guarda compartilhada. Sou Relatora, nesta Casa, desse projeto que, inclusive, já foi aprovado na Câmara dos Deputados e tem, como autor, o Deputado que tem feito um trabalho muito semelhante ao que o Senador Paulo Paim faz aqui em defesa dos aposentados. Refiro-me ao Deputado Arnaldo Faria de Sá.

            Então, essa proposição, o PLC nº 117, reformula o dispositivo do Código Civil relativo à guarda compartilhada dos filhos nos casos de separação dos casais, conferindo novas dimensões a esse instituto de guardas compartilhadas.

            O Deputado autor, Arnaldo Faria de Sá, registra que mesmo já incorporada ao Direito brasileiro, a guarda compartilhada nem sempre se torna efetiva. Corrigir essa realidade é o objetivo maior dessa proposta.

            Poucas situações causam mais sofrimento do que as decorrentes da separação litigiosa de casais com filhos. Constituem, na sua quase totalidade, fontes de uma sequência de desencontros dolorosos, que representam tormento para os pais e pesadelo para os filhos.

            Tanto a legislação quanto a jurisprudência brasileira têm reagido com certa lentidão na busca de amenizar esse sofrimento. Admitimos que, por definição, constrangimentos serão sempre comuns, antes a regra do que a exceção, independentemente de leis. É possível, porém, contribuirmos ao menos para amenizar os confrontos. Em certa medida, isso tem ocorrido.

            Mas é preciso, efetivamente, haver preocupação do Estado em assegurar normas jurídicas e políticas públicas que evitem o afastamento entre os pais e seus filhos, permitindo construir estratégias adequadas às necessidades de cada momento histórico na vida dessa família. Tanto o Legislativo quanto o Judiciário têm caminhado nesse sentido, embora com certa lentidão.

            Contamos hoje, por exemplo, com normas que visam combater a alienação parental, problema doloroso, às vezes até compreensível, mas que precisa mesmo ser coibido, tornando-se objeto de atenção de nosso Direito.

            Como dizíamos, caminhamos na direção correta, mas com certo grau de lentidão. Esta pode até ser compreensível, dada a sensibilidade existente nessa área. Estamos falando da vida das pessoas. Estamos falando da vida das crianças. Estamos falando de gestos que podem marcá-las para sempre, por toda a sua existência futura.

            Justamente por essa razão é tão grande a responsabilidade que pesa sobre nós, legisladores, assim como sobre o Judiciário, mas nós temos que enfrentar essa situação.

            Foi apenas em 2008 que se alterou a redação dos arts. 1.583 e 1.584 do Código Civil para instituir e regulamentar a guarda compartilhada. Sim; a redação anterior do Código Civil Brasileiro - tão recente, de 2002 - não fazia referência a essa fórmula, que costuma contribuir para atenuar os conflitos e para diminuir as injustiças.

            Não obstante, até 2008, seu art. 1.584 tratava somente da guarda unilateral, observando o critério de melhores condições para exercê-la. O novo ordenamento acrescenta a guarda compartilhada como opção para pais e mães não conviventes cuidarem dos filhos.

            Essa mudança na legislação brasileira se deve a diversos fatores, entre eles as contundentes reivindicações daqueles que não detinham a guarda de suas crianças e as distintas investigações efetuadas a respeito dos desdobramentos do rompimento conjugal tanto para pais quanto para filhos, o que incluía o exame das disposições de guarda.

            Sr. Presidente, considero muito grande a responsabilidade pela relatoria do PLC 117, de 2013. Como diz o seu autor, o Deputado Arnaldo Faria de Sá, “muito embora não haja o que se negar sobre avanço jurídico representado pela promulgação da Lei n° 11.698, de 2008, que institui a guarda compartilhada no Brasil, muitas pessoas, inclusive magistrados, parecem não ter compreendido a real intenção do legislador, quando da elaboração de tal dispositivo”. A verdade é que a rotina da guarda compartilhada, embora possa demandar uma maior organização por parte dos pais, de suas famílias e da própria criança, é a que melhor atende aos interesses dos filhos, que devem constituir foco de nossa preocupação.

            Se não foi possível uma vida em comum entre os pais, o que é compreensível, a verdade é que, nem por isso, a criança pode ser privada do convívio de ambos. E, aos poucos, constatou-se que, efetivamente, a guarda compartilhada é a resposta mais eficaz à continuidade das relações da criança com seus pais na família dissociada. Essa observação não é minha, mas de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

            Sabemos que a guarda compartilhada não é perfeita. Dadas as circunstâncias em que ocorre a separação dos pais, talvez nenhuma fórmula jurídica possa ser capaz de eliminar arestas, de trazer felicidade. A guarda compartilhada vem representando, porém, uma medida facilitadora para o convívio familiar, assegurando vínculos mais estáveis da criança com ambos os pais, além de favorecer a igualdade de deveres e direitos dos genitores. Trata-se de uma nova âncora social para o exercício dos papéis parentais.

            Supera-se a ideia de um genitor principal, o guardião, e um secundário ou de final de semana. Compreende-se, portanto, que as dificuldades que possam surgir nos arranjos de guarda não devem ser interpretadas apenas como questões provenientes do âmbito doméstico. Não se trata, é evidente, de uma fórmula mágica, capaz de, por si só, superar todos os problemas decorrentes de uma separação.

            Ensina a Psicóloga Ruth Agulha, perita em Psicologia Forense, que cada família tem sua identidade e dinâmicas muito próprias. Por isso mesmo, dificilmente poderemos identificar um, e um só, regime de contatos entre pais e filhos que se ajuste às necessidades e idiossincrasias de todas as famílias. Esta definição precisa, necessariamente, levar em conta as características únicas de cada família, os seus valores, os seus mitos, os seus costumes, as suas regras, a sua cultura. À parte essa cautela, as famílias também mudam, crescem e evoluem, o que exige fórmulas flexíveis e ajustadas a este processo de desenvolvimento.

            Desde que fui designada Relatora do PLC nº 117, recebi um número muito grande de manifestações de pais e mães. Em quase todos os casos, são pais e mães agoniados, sofredores, machucados. Pedem não só a aprovação do projeto, mas pressa em sua votação.

            Considero que existem razões para isso. A atual redação do Código Civil - mostra o autor do projeto hoje em exame no Senado - recomenda a guarda compartilhada “sempre que possível”. Isso leva à interpretação, ocasionalmente até no Judiciário, de que ela deve ser recomendada “sempre que os pais se derem bem”. Caso assim fosse, diz o Deputado Arnaldo Faria de Sá, a lei seria desnecessária. A proposta em estudo, já aprovada pela Câmara dos Deputados, representará um grande passo no sentido de reduzir a aflição de pais e o sofrimento de seus filhos. Não será, repito, uma solução mágica, até por ser impossível chegar a ela.

            A manutenção do convívio de crianças com ambos os pais, no entanto, é ainda a principal forma de se enfrentar o problema - e é também a argumentação que deu suporte à grande maioria das decisões judiciais favoráveis à guarda compartilhada até o momento.

            Pesquisas mostram, porém, que essas decisões são, certamente, em número menor do que os julgados contrários. É esse quadro que se precisa reverter.

            Não se trata apenas de uma decisão teórica. Tratamos aqui da vida das pessoas, da vida das crianças, da vida de famílias.

            Esperamos que o PLC nº 117 contribua para amenizar tantos dramas familiares e colabore para se garantir, de forma saudável, a convivência familiar de crianças e de adolescentes com seus pais - com ambos os pais, quero deixar claro.

            Então, Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, é com muita satisfação e alegria que anunciamos aqui o nosso relatório do PLC nº 117, visando fazer a alteração no Código Civil para a instituição da guarda compartilhada.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/02/2014 - Página 18