Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas aos pronunciamentos de parlamentares petistas ao Plano Real.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA, POLITICA PARTIDARIA, PROGRAMA DE GOVERNO.:
  • Críticas aos pronunciamentos de parlamentares petistas ao Plano Real.
Publicação
Publicação no DSF de 27/02/2014 - Página 35
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA, POLITICA PARTIDARIA, PROGRAMA DE GOVERNO.
Indexação
  • CRITICA, PRONUNCIAMENTO, AUTORIA, CONGRESSISTA, FILIAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), REFERENCIA, IMPLANTAÇÃO, SISTEMA MONETARIO NACIONAL, REAL, SUBSTITUIÇÃO, CRUZEIRO REAL, MOTIVO, TENTATIVA, INCONSTITUCIONALIDADE, POSSIBILIDADE, AUMENTO, DIVIDA, REDUÇÃO, SALARIO, POPULAÇÃO.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, Srªs e Srs. Senadores, ontem, à tarde, depois da sessão solene comemorativa dos 20 anos do Plano Real, assistimos a um verdadeiro desfile promovido por Senadores e Senadoras do PT, desta tribuna, tentando reescrever a história do Plano Real sob a ótica das suas “verdades” - entre aspas - ou das suas mentiras, apostando na ausência de memória do povo brasileiro, subestimando a inteligência de todos nós.

            Fiquei impressionado ao perceber a tentativa de apropriação indébita do sucesso exponencial do Plano Real, que foi marco divisor de águas, muito mais que um plano econômico, a mudança do conceito da sociedade na administração das suas finanças e da Administração Pública, sobretudo ao assumir responsabilidade maior a partir da Lei de Responsabilidade Fiscal. Fiquei impressionado! Isso despertou minha curiosidade e fui à internet buscar vídeos que guardem pronunciamentos feitos à época por lideranças do Partido dos Trabalhadores, sobretudo por sua maior liderança, o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que afirmava, taxativamente, tratar-se o Plano Real de um estelionato eleitoral. Esqueceram-se de que o PT votou contra o Plano Real, que o PT votou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal e que o PT ingressou com ação direta de inconstitucionalidade tentando impedir que o País pudesse destruir o monstro da inflação a partir do Plano Real.

            Essa ação direta de inconstitucionalidade não foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal, mas imaginem os brasileiros o que teria ocorrido com o nosso País se ela tivesse sido julgada e acolhida.

            Vou pontuar algumas das aleivosias ouvidas ontem da tribuna do Senado Federal.

            A primeira inverdade é a de que, no grande festejo, pela manhã, o Presidente Itamar Franco não recebeu o devido reconhecimento. Não é verdade! Nunca nos esquecemos do Itamar Franco. O Fernando Henrique nunca se esqueceu do Itamar Franco. O Aécio Neves jamais se esqueceu de Itamar Franco, tanto que o apoiou para voltar ao Senado da República exercendo seu último mandato. Foi homenageado aqui, desta tribuna, por Aécio e por Fernando Henrique. É público e notório que o Presidente Itamar, apoiando e prestigiando seu Ministro da Fazenda, lançou, com grande coragem, a autêntica revolução econômica do Brasil, que seria implantada em 1º de julho de 1994. Era criado o padrão monetário que estabilizaria a economia brasileira, o Real, e o Senador Pedro Simon, há pouco, fez um retrospecto competente sobre os acontecimentos daquela época.

            A tergiversação produziu algumas pérolas na ofensiva orquestrada para desqualificar a equilibrada fala do ex-Presidente Fernando Henrique. Com referência ao gesto do Presidente Fernando Henrique de pedir apoio ao PT e ao próprio Lula para o Plano Real, afirmou-se que foi negado o benefício da dúvida à Oposição e que não cabia ao Governo solicitar apoio à Oposição para seus projetos, mesmo considerando que o País vivia dramática situação.

            Lembro-me bem - Pedro Simon era governador do Rio Grande do Sul e eu era governador do Paraná - de que nós estávamos sufocados pela inflação de mais de 80% ao mês, que impedia qualquer planejamento para a semana seguinte. Mesmo assim, o Presidente da República não tinha direito de pedir apoio à Oposição.

            A postura do PT foi votar contra o Plano e qualificar o Plano Real de estelionato eleitoral. O PT agiu sistematicamente contra o Plano Real e tentou torpedear políticas que complementaram o próprio Plano Real, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, recorrendo à Suprema Corte, como já disse, e atirando com grosso calibre no Proer, o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional, votando, sistematicamente, contra toda medida que garantisse as reformas e a estabilidade da economia.

            Em relação à Lei de Responsabilidade Fiscal eu posso falar por experiência própria, porque tive a primazia de ser o Relator da Lei de Responsabilidade Fiscal no Senado Federal e conhecer de perto a pressão, estimulada pelo Partido dos Trabalhadores, de inúmeros prefeitos que não desejavam a Lei de Responsabilidade Fiscal, pois ela coibia a irresponsabilidade administrativa e dificultava a ação das administrações municipais, sobretudo, que teriam que adotar um novo modelo de gestão para conter um processo de endividamento que era impulsionador da inflação no País.

            Todos sabem que o Proer foi crucial para o processo de estabilização da moeda. Impediu o colapso do sistema bancário. Foi ferozmente combatido pelo PT e por seus principais líderes.

            O Proer recebeu, na sequência, elogios do Presidente Lula e do Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, por ajudar a conter a crise mundial de 2008. Sem o Proer, a economia do Brasil teria naufragado naquele momento. E o Presidente Lula, à frente do governo do Brasil, divulgava, internacionalmente, ser o Proer uma solução também para o sistema financeiro norte-americano, em crise.

            O Plano Real, o Plano Real foi desdenhado pelo PT. O PT desdenhou do Plano Real e dos seus criadores, mas valeu-se dele para sobreviver no governo, conquistando altos índices de popularidade. Ao falar em inclusão social, não pode ignorar que o Plano Real foi e é o principal instrumento de inclusão social no País.

            É evidente que a Constituição de 88 garantiu instrumentos para a inclusão social, como, por exemplo, a universalização do sistema de previdência, incluindo os trabalhadores rurais, que passaram a ter aposentadoria com salário integral. Isso significa muito mais do que todo o Programa Bolsa Família ou os benefícios da prestação continuada. Tem origem na Constituinte de 88 e contribui extraordinariamente para a inclusão social de milhões de brasileiros. Mas, sem dúvida, o Plano Real é a mola mestra propulsora da inclusão social.

            O PT caminhou unido contra a implantação do Plano Real e de seus desdobramentos. Vamos recordar o que eles diziam. É preciso cultivar a memória para que, quando se desejar reescrever a história, ela seja reescrita com a verdade, sem omissões e tergiversações.

            Lula dizia:

Esse plano de estabilização não tem nenhuma novidade em relação aos anteriores. Suas medidas refletem as orientações do FMI. O fato é que os trabalhadores terão perdas salariais de, no mínimo, 30%. Ainda não há clima, hoje, para uma greve geral, mas, quando os trabalhadores perceberem que estão perdendo com o Plano, aí, sim, haverá condições. (O Estado de S. Paulo, 15.01.94).

O Plano Real tem cheiro de estelionato eleitoral. (O Estado de S. Paulo, 06.07.94) Guido Mantega.

Existem alternativas mais eficientes de combate à inflação (...) É fácil perceber por que essa estratégia neoliberal de controle da inflação, além de ser burra e ineficiente, é socialmente perversa. (Folha de S.Paulo, 16.08.94) Marco Aurélio Garcia.

O Plano Real é como um relógio Rolex, desses que se compram no Paraguai e tem corda para um dia só (...) a corda poderá durar até o dia 3 de outubro, data do primeiro turno das eleições, ou talvez, se houver segundo turno, até novembro. (O Estado de S. Paulo. 07.07.94) Gilberto Carvalho.

            E o PT usou e exibiu esse “Rolex” nos últimos anos para sobreviver com popularidade no governo.

            Mais uma grande falácia foi proferida desta tribuna: que o Presidente Henrique deixou de reconhecer que coube ao Presidente Lula e ao PT resgatar, praticamente salvar o Plano Real! Ouvimos ontem, desta tribuna, essa falácia!

            O Plano Real foi muito mais além do que o mais bem-sucedido plano de combate à inflação crônica: foi um divisor de águas.

            Representou uma mudança radical de atitude que permeou toda população brasileira; trouxe previsibilidade à economia; recuperou a fé da população no valor de sua moeda; restaurou a confiança internacional do Brasil; representou para todos nós o otimismo e a capacidade de planejar racionalmente.

            A tentativa de estabelecer comparações com a crise enfrentada pelo Brasil em 1994, quando o real era implantado, com o cenário que o Presidente Lula encontrou ao assumir em 2003 foi mais uma falácia disparada na tarde de ontem desta tribuna.

            Afirmar que “o patriarca do Plano Real entregou o País nas mesmas condições adversas enfrentadas antes da implantação do plano” é um deboche com a verdade.

            Vamos restabelecer a verdade: a desconfiança aumentou ao longo de 2002, no calor da campanha eleitoral. Em que pesem análises que procuravam fugir ao pessimismo, muitos observadores internacionais temiam a decretação de alguma forma de moratória em 2003, no contexto da adoção - que alguns julgavam certa - de políticas populistas por parte de um novo governo, encabeçado pelo PT.

            Em 2 de julho de 2000, a conselheira econômica de Lula, economista Maria da Conceição Tavares, em artigo na Folha de S.Paulo, defendia a ideia de que “está mais do que na hora de submeter à população um plebiscito nacional sobre a dívida externa que esclareça os prejuízos decorrentes de manter essa situação de submissão às regras do FMI”.

            O próprio Lula, em artigo no Valor Econômico, do dia 2 de abril de 2000, escrevia: “precisamos, em primeiro lugar, readquirir o controle sobre nossa política fiscal e monetária, hoje comandada pelo FMI, a serviço da geração de superávits primários para pagar credores”.

            É importante ressaltar que, mesmo pouco tempo antes das eleições, esse tom era mantido. O receio que havia - o risco PT - era uma realidade e provocou, entre outros, inflação ascendente, dólar pressionando e falta de confiança internacional.

            Esta é a verdade. Tanto é que o Presidente Fernando Henrique Cardoso convidou ao Palácio do Planalto os candidatos à Presidente da República, inclusive Lula, que assumiram o compromisso de manter, de assegurar o cumprimento das providências que seriam naquele momento adotadas pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, exatamente para debelar a crise que se avizinhava em razão…

(Soa a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR) - … do terror que se espraiava: medo de um novo governo populista comandado pelo Presidente Lula. Essa é a verdade.

            Em agosto de 2002 - Sr. Presidente, eu serei rápido aqui -, dois meses antes da disputa presidencial, Guido Mantega afirmava que o superávit primário de 3,75% do PIB definido para 2003 “era um obstáculo para o País aumentar o seus gastos sociais”. Portanto, deve ser considerada a seriedade da situação externa do País no final de 2002, indicando que, sem a recuperação do crédito externo e o acesso aos recursos do FMI, havia riscos de Lula ter de assumir em 2003 com uma situação gravíssima.

            O que fez Lula ao assumir? Elevou a taxa de juros básica, abandonando o que era tabu para o PT, definiu um aperto da meta do superávit primário, que passou de 3,75% para 4,25% do PIB em 2003, anunciou as metas de inflação, ordenou cortes dos gastos públicos, entre outras medidas.

            Não há patriarca do Plano Real. A despeito da “amnésia seletiva” que acometeu muitos oradores na tarde de ontem, foi graças ao empenho pessoal de Fernando Henrique Cardoso, eu diria que até visceral, somado à sua capacidade de gestão e de articulação, amparado por uma excelente equipe de auxiliares, que o Brasil se livrou da hiperinflação crônica que implodia a vida de milhões de famílias, levando-as ao desespero de não poder enxergar o futuro de filhos e netos.

            A louvação quanto aos feitos gloriosos da era petista...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR) - ... em detrimento dos avanços alcançados anteriormente é uma “fixação marqueteira”. A estabilidade trazida pelo Plano Real reduziu a proporção de pobres de 40% para cerca de 30% da população total. No período presidencial seguinte, nova redução para aproximadamente 20%.

            Ao decantar em prosa e verso a redução da dívida pública brasileira é mais um capítulo da contabilidade criativa. Entidades influentes e credenciadas do pensamento econômico global vocalizam o descrédito no indicador brasileiro que mostra a queda da dívida pública do País. A própria OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - já alertou em relatórios sobre o Brasil que “as autoridades deveriam direcionar seus esforços de redução do endividamento para a dívida bruta, em vez da dívida líquida”. A dívida bruta, nos últimos dois anos, aumentou de 61,8% para 64,2% do PIB.

            O que vem produzindo a discrepância entre os indicadores foi a adoção de sucessivas manobras contábeis para ampliar gastos públicos, sem reflexos nos resultados oficiais. E a dívida bruta brasileira, a dívida interna, ultrapassa dois trilhões de reais atualmente.

            A propósito, recomendo a leitura de recente estudo da competente Consultoria Legislativa aqui do Senado - que merece sempre ser reverenciada -, que explicita que a "dívida bruta em relação ao PIB deixou de cair desde o início de 2009". A partir de 2011, o indicador tem crescido rapidamente: 4,1 pontos percentuais do PIB entre dezembro de 2010 e agosto de 2013.

(Soa a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR) - A louvação petista fecha os olhos ao deplorável estado em que se encontra a infraestrutura em nosso País. É impossível se esperar crescimento onde não existem estradas, pontes, ferrovias, portos, aeroportos, silos, etc.

            Estou concluindo, Presidente.

            Onde está a transposição do Rio São Francisco? O trem-bala? As refinarias? As hidrelétricas? Até mesmo a Petrobras, empresa que sempre conseguiu ser eficiente à margem da ineficiência e crises durante vários governos, está sendo largada, ou tragada, para dentro da incompetência e equívocos da gestão petista.

            Ao contrário da retórica ufanista traçada pelo marqueteiro de plantão, o PT colheu os frutos do fortalecimento advindo da consolidação do Plano Real, sem falar de um momento excepcional vivido pela conjuntura internacional entre os anos de 2003 e 2008.

            O Brasil real do PT é o Brasil da contabilidade criativa, do maior déficit com o exterior de todos os tempos - mais de 10 bilhões de dólares só em janeiro -, do controle de preços públicos, da bolsa-empresário do BNDES, da pressão inflacionária que já compromete a renda dos mais pobres, da desmoralização da política econômica, da destruição das estatais, dos empréstimos secretos para ditaduras, da omissão quanto à violação dos direitos humanos em países da América Latina. Mas não é apenas isso! O Brasil real do PT é o Brasil dos 50 mil assassinatos por ano, da educação avaliada pelo Pisa como uma das piores do mundo,...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Minoria/PSDB - PR) - ... da estagnação do IDH, da corrupção como método de governo, das obras fictícias, etc.

            O Plano Real dotou-nos do grande vértice na moderna vida econômica: uma moeda que se estabilizou e que tem possibilitado melhorar a vida de milhões de brasileiros.

            Concluindo, Presidente, é importante não olvidar: que o governo de Fernando Henrique Cardoso deixou um "tripé" de políticas - metas de inflação, câmbio flutuante e austeridade fiscal - que, se mantido ao longo dos anos, poderia criar as condições para o desenvolvimento econômico futuro, com inflação baixa e equilíbrios externo e fiscal. Um elenco robusto de mudanças estruturais: Lei de Responsabilidade Fiscal, o ajuste fiscal nos Estados, reinserção do Brasil no mundo, através da obtenção de fluxos de investimentos diretos externos de, na média, quase 20 bilhões de dólares/ano nos oito anos. Enfim, o PT herdou uma herança bendita! Não pode desdenhar dela.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/02/2014 - Página 35