Discurso durante a 20ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da crise na Venezuela.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Considerações acerca da crise na Venezuela.
Publicação
Publicação no DSF de 28/02/2014 - Página 280
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, CRISE, POLITICA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, CONFLITO, GOVERNO, OPOSIÇÃO.

            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Srªs e Srs. Senadores, nas últimas semanas, a mídia brasileira e internacional vem sendo inundada por notícias preocupantes advindas da Venezuela, mergulhada em conflito entre governo e oposição. Para nossa preocupação, esse conflito não é só político, como seria esperado em um regime democrático, mas uma verdadeira tentativa de desestabilização do regime venezuelano.

            Para entender a crise por que passa a nossa irmã Venezuela é preciso retroceder no tempo. Assim como no Brasil e nos demais países latino-americanos, a desigualdade social venezuelana remonta à colonização.

            Portugueses e espanhóis fizeram da América Latina a principal fonte de sua própria opulência. Exauridas as nossas riquezas, restaram sociedades extremamente desiguais, com barreiras intransponíveis separando pobres e ricos.

            Tal situação perdurou e se aprofundou durante as ditaduras militares que assolaram a região, cujo maior objetivo era o de oprimir as legítimas aspirações dos mais pobres por sociedades mais justas e igualitárias.

            Apoiados pelos setores mais conservadores e mais abastados do tecido social do continente, e contando com o decisivo suporte dos Estados Unidos, os militares sul-americanos mantiveram o povo sob pesada opressão e ditaduras.

            Após a redemocratização, a esmagadora maioria dos países latino-americanos ainda foi governada por políticos conservadores, descomprometidos com os legítimos anseios populares e voltados à defesa da manutenção dos privilégios das elites.

            No Brasil, a situação mudou de verdade com a eleição do ex-presidente Lula, em 2002, cujo legado se mantém vivo com a Presidenta Dilma Rousseff e que vem marcando na história de nosso país, uma transformação sem precedentes, com redução das desigualdades sociais e econômicas.

            Na Venezuela, a eleição de Hugo Chávez, ocorrida em 1999, foi o divisor de águas no cenário regional. Já são 15 anos de chavismo na Venezuela, regime hoje capitaneado pelo Presidente Nicolás Maduro, eleito democraticamente pela maioria dos venezuelanos,

            Neste tempo, 5 milhões de pessoas saíram da pobreza, o analfabetismo foi erradicado e a mortalidade infantil caiu drasticamente. O chavismo teve a coragem e a ousadia de investir nada menos do que 42% do orçamento do Estado na área social, grande parte em educação.

            Foram criadas 11 universidades e o número de professores na escola pública saltou de 65 mil para 350 mil. Os investimentos da Venezuela em educação são um exemplo para nós, brasileiros, que hoje discutimos, aqui no Senado, alternativas para o financiamento da educação, em Comissão Especial, que tenho a honra de presidir e que conta com o apoio do colega Cristovam Buarque (PDT/DF) como seu relator.

            Mas o que explica a crise política venezuelana? Justamente o descontentamento das elites com o progresso social que o chavismo implementou na Venezuela, país que repousa sobre imensas jazidas de petróleo, cuja riqueza deixou de beneficiar uns poucos para beneficiar a grande maioria!

            Descontentes com quatro derrotas eleitorais sucessivas, integrantes da oposição venezuelana parecem ter desistido da via democrática e apostado na tentativa de desestabilizar o governo democraticamente eleito pela maioria do povo venezuelano.

            É uma estratégia que não podemos aceitar e que precisa ser repudiada pelo povo irmão da Venezuela e pela comunidade internacional, especialmente, os países sul-americanos.

            Felizmente, tal repúdio já foi demonstrado pela União dos Países da América do Sul, a Unasul, ao rejeitar "a tentativa de desestabilizar a ordem democrática constituída legitimamente pelo voto popular".

            O mesmo fez o Mercosul e seu Parlamento, ao repudiar todo o tipo de violência e intolerância contra a democracia e as instituições venezuelanas.

            Aqui no Senado, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional aprovou voto de solidariedade ao Mercosul, ao Parlasul e à Unasul por seus recentes pronunciamentos em defesa da ordem democrática na nossa irmã Venezuela, ao qual gostaria de associar-me.

            Reitero, também, a nota divulgada pelo meu partido, o PT, no dia 19 de fevereiro, em que condena os fatos e ações com vistas a desestabilizar a ordem democrática na Venezuela, além de rechaçar as ações criminosas de grupos violentos como instrumento de luta política, bem como as ações midiáticas que ameaçam a democracia, suas instituições e a vontade popular expressa por meio do voto.

            Na semana passada, recebi em meu gabinete o Embaixador da Venezuela no Brasil, Senhor Diego Molero, que demonstrou toda sua preocupação com os acontecimentos protagonizados pela oposição em seu país e reiterou o compromisso democrático do governo de Nicolás Maduro.

            Como bem escreveu o eminente professor Emir Sader, em artigo publicado em dezembro de 2013, a direita latino-americana vive uma "situação de profunda debilidade política e social".

            De fato, os governos progressistas democraticamente eleitos provaram que é possível crescer com justiça social, que é possível dividir com toda a população os frutos da prosperidade econômica.

            É ancorada nesse novo jeito de governar, nessa nova e criativa maneira de distribuir renda, que os segmentos políticos de esquerda vêm sendo eleitos e reeleitos em nosso continente, para o desespero daqueles que pensavam que a prosperidade era benefício de poucos, e privilégio da elite.

            É desse descontentamento que nasce a instabilidade política na Venezuela. Ao constatar-se incapaz de vencer nas urnas, a direita tenta desestabilizar o governo popular aprovado pela maioria. Tarefa certamente inglória, pois o povo venezuelano não abrirá mão de sua prosperidade.

            Tal enfrentamento, no entanto, deve ser absolutamente pacífico. Como disse a Presidente Dilma, a menor solução para a Venezuela nascerá do diálogo entre governo e oposição, de modo a construir alternativas viáveis - e democráticas - para a crise política que assola nosso país irmão.

            Confio que o Presidente Nicolás Maduro, com apoio do povo e das instituições multilaterais sul-americanas, saberá restabelecer a paz e o convívio democrático na Venezuela.

            Para tanto, é preciso apostar no diálogo e no entendimento, as melhores ferramentas de uma democracia.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/02/2014 - Página 280