Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa das ações implementadas pelo Governo Federal para enfrentar os problemas apresentados pelo setor elétrico no País.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA.:
  • Defesa das ações implementadas pelo Governo Federal para enfrentar os problemas apresentados pelo setor elétrico no País.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2014 - Página 232
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, RISCOS, CRISE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ENERGIA ELETRICA, BRASIL, DEMONSTRAÇÃO, AUSENCIA, PERIGO, RACIONAMENTO, ENERGIA, APROVAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), POLITICA ENERGETICA.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, o tema que me traz à tribuna, hoje, é um tema complexo, um tema difícil de a gente entender, mas muito presente na vida de todos nós, na vida das pessoas. E eu gostaria, hoje, de falar para aqueles que estão me ouvindo pela Rádio Senado e me vendo pela TV Senado. É o tema da energia elétrica.

            Quando acendemos uma luz, ligamos um chuveiro, quando acessamos um rádio, um aparelho de som, de TV, nós estamos usando energia elétrica. E este tem sido um tema muito debatido e noticiado nos nossos meios de comunicação: a possibilidade de termos, novamente, como em 2001 e 2002, um racionamento de energia.

            Eu queria falar um pouco sobre isso e sobre as confusões que estão sendo feitas em relação a estresse hídrico, que nós estamos tendo neste momento, a despacho de energia térmica e também à MP 579, que antecipou a prorrogação de contratos de energia. Isso tudo tem sido misturado, e tem se dado ou se vendido ou se dito ao País que nós teremos uma crise de energia, que nós estamos prestes a ter um racionamento ou prestes a repetir o que nós tivemos em 2001 e 2002.

            Eu queria dizer que isso não é verdade. Nós não estamos prestes e nem perto do que aconteceu em 2001 e 2002. Nós não temos e não teremos um racionamento de energia. Por quê? Em 2001 e 2002, nós tínhamos duas situações que nos levaram, primeiro, ao apagão e, depois, ao racionamento.

            A primeira, um desequilíbrio estrutural do sistema, ou seja, nós não tínhamos energia sendo produzida neste País. Portanto, nós não tínhamos como distribuir energia. E nós também não tínhamos linhas de transmissão nem um sistema integrado. Então, nós não tínhamos energia, nós não tínhamos capacidade de transmissão, nós não tínhamos condições de despachar a geração que existia no Sul para outras regiões do País. Nós tínhamos uma restrição forte de despacho, sem geração. Por que isso? Porque nós não tínhamos investimentos, ou seja, a forma como o sistema era estruturado não dava garantias aos investidores de investir na geração de energia, porque investiam e não sabiam se haveria para quem vender, já que não era obrigada a contratação das distribuidoras.

            Quando nós refizemos o modelo - a então Ministra Dilma Rousseff, hoje nossa Presidenta, dirigia o Ministério de Minas e Energia - para que reformulássemos a estrutura ou tirássemos do desequilíbrio estrutural a situação de energia, tivemos muitos investimentos no Brasil, que nos levaram a ter, hoje, uma geração de energia que nos dá segurança de suprir a demanda.

            Para se ter uma idéia da redução dos recursos alocados no segmento elétrico: enquanto, na década de 80, a média anual de investimentos foi de US$12,6 bilhões, na década de 90, o montante caiu para apenas US$6,5 bilhões. Isso significa que, de uma década para a outra, o investimento médio anual foi reduzido à metade. Entre os anos de 1995 e 1998, ou seja, no primeiro governo de Fernando Henrique, foram acrescentados anualmente à capacidade de geração apenas 1.590 megawatts em média; no período de 1995 a 2000, que antecedeu o racionamento, 2.200 megawatts; nesses 11 anos de governo do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, acrescentamos, por média, por ano, 4.000 megawatts.

            Outra falha evidente detectada no modelo anterior foi a incapacidade de promover a construção de linhas de transmissão capazes de integrar os sistemas. A prova maior disso foi quando o País assistiu, em 2001, ao insólito espetáculo de usinas do norte e do sul vertendo água sem geração de energia, que deveriam ser transmitidas para o nordeste e para o sudeste.

            A expansão das linhas de transmissão média, por ano, no primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique, foi de apenas 600 quilômetros por ano; nos quatro anos seguintes, foi de 2.000 quilômetros; nos 11 anos de governo do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, expandimos, em média, quase 4.000 quilômetros de linhas de transmissão. Apenas no ano passado, fizemos 9.900 quilômetros em linhas de transmissão.

            As diferenças são muito evidentes, por isso nos permitimos afirmar com segurança que o nosso sistema é confiável, ou seja, o modelo foi refeito. Hoje, temos 126 mil megawatts de potência instalada contra os 80 mil que tínhamos em 2002; e temos 116 mil quilômetros de linha contra os 73 mil, em 2002. Portanto, suficientes para o escoamento da energia do País aos centros de consumo.

            Quero dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que é importante deixar isso claro, porque não há semelhança com o que aconteceu em 2001 e 2002. Nós não temos, hoje, um desequilíbrio estrutural. O que nós temos semelhante àquele período é uma situação conjuntural, ou seja, uma baixa fluência hídrica, e até mais severa do que a daquele período. Se nós não tivéssemos essa infraestrutura que eu relatei aqui, nós já estaríamos numa situação de racionamento.

            Mas, graças à retomada do planejamento, à realização dos leilões de energia, às determinações feitas pelo Governo do Presidente Lula, pelo Governo da Presidenta Dilma, hoje, mesmo tendo uma situação hídrica, um estresse hídrico, uma situação difícil, nós não corremos risco de racionamento.

             Onde entram as térmicas, com as quais se tem causado muita confusão? Tem sido misturado este tema com a edição da MP 579 e, depois, a sua conversão na Lei nº 12.783.

            O aproveitamento do potencial hidrelétrico confere uma importante vantagem competitiva ao Brasil, porque as usinas hidráulicas representam fonte limpa.

            É importante dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que 84% da nossa geração elétrica no Brasil é hídrica. Isso é limpo, geração de energia limpa. Apenas 14% é térmica, e outros 2% de energia alternativa - eólica, energia solar. Então, nós temos uma fonte limpa, temos tecnologia conhecida e dominada pela engenharia nacional, e isso apresenta custo reduzido de operação.

            Para se ter uma ideia, o megawatt médio, hoje, praticado no Brasil é de R$133,00. Mas esse é o médio. Nós vendemos energia muito mais barata. E, com a antecipação das concessões ou a prorrogação dos contratos que deveriam passar por uma nova concessão, nós estamos colocando no mercado energia a R$32,00 o megawatt. Só que, ao longo dos últimos anos, tem havido dificuldade para construção das usinas com reservatório. Os reservatórios regularizam, estão associados principalmente a despacho de energia com segurança. Só que, por questões ambientais e por questões fundiárias, nós temos restrição.

            Belo Monte, por exemplo, é uma usina com capacidade de mais de 11 mil megawatts de potência instalada. Nós vamos conseguir usar cerca de três mil megawatts, porque ela é uma usina a fio d'água; nós não podemos fazer alagamento, ou seja, nós não podemos ter reservatório como temos em Itaipu, como temos em outras usinas, o que ajudaria muito a segurança hídrica e a utilização de uma energia limpa.

            Como forma de mitigar essa exposição, ou seja, de nós não conseguirmos colocar no nosso planejamento mais futuro - porque presente nós temos o suficiente, mas mais futuro -, nós não conseguirmos expandir o nosso fornecimento por hidráulica, houve um incremento na expansão do parque gerador térmico, notadamente gás, carvão e combustíveis líquidos, que, por sua característica de geração, estão associados apenas à disponibilidade de combustível, e não de condições hidrológicas.

            Então, hoje, nós temos, no Brasil, o que a gente chama de uma matriz de geração hidrotérmica complementada por outras fontes renováveis, como a eólica e de biomassas, como eu disse aqui.

            Como, por que e quando as térmicas são despachadas?

            (Soa a campainha.)

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - A operação integrada das diversas fontes do Sistema Nacional tem por base a minimização do custo, ou seja, a modicidade tarifária, o custo total da operação, que é prevista num futuro de cinco anos. Então, toda vez em que a energia produzida por fonte hidráulica ficar mais cara por restrição - como é o momento que nós estamos vivendo hoje -, ou seja, o valor da água ser mais elevado pelo estresse hídrico, nós começamos a despachar as térmicas pelo seu valor mais baixo. Mas elas são necessárias, porque elas dão segurança ao sistema, que era uma coisa que nós não tínhamos em 2001 e 2002. Nós não tínhamos nem a geração hidráulica, porque nós não tínhamos investimento, nem a térmica para dar segurança ao sistema. Então, quando o valor da água projetado em cinco anos por escassez maior em reservatórios maior do que o valor da térmica, nós despachamos a térmica. É um valor efetivado por uma cadeia de modelos matemáticos. São dois mil cenários feitos pela Aneel, que, de forma integrada, definem o despacho.

            Então, quando nós observamos os armazenamentos elevados nos reservatórios de usinas hidrelétricas, quando temos essa condição, nós não usamos a térmica e a remuneramos apenas pelo valor do investimento, que é um valor baixo - que é diferente do investimento da hidráulica, cujo investimento é alto e a operacionalização mais baixa. Na térmica, é diferente.

            Então, quando nós não precisamos usar a térmica, nós remuneramos a térmica pelo investimento; e, quando precisamos, temos que remunerá-la pela operação. E é o que está acontecendo agora. Como nós estamos com um volume baixo, mas não estamos aquém da nossa capacidade física instalada - temos capacidade -, para equilibrar o sistema, estamos despachando energia térmica.

E isso equivale a muito pouco percentual na nossa matriz, 14%, como eu falei, e estamos utilizando 16 mil megawatts.

            Isso não tem nada a ver com a Medida Provisória nº 578, com a prorrogação dos contratos de energia. Isso tem a ver com a realidade do nosso sistema, como ele foi concebido e o que lhe dá segurança. Esse é o maior estresse hídrico dos últimos 40 anos, atingindo as bacias do Sul e do Sudeste, e nós não temos e nem teremos problema de racionamento.

            Esse custo das energias térmicas é um custo que impacta o sistema. Portanto, não é um custo pelo qual o Governo tem de responder; é um custo que já é absorvido pelo sistema.

            O que é a Medida Provisória nº 579, que, de acordo com o que eu ouço muito falar, é uma MP que desestruturou o sistema elétrico brasileiro e que trouxe problemas às nossas elétricas? Não é verdade, é mentira. Primeiro, porque a concessão de energia elétrica, ou seja, a utilização do potencial hídrico não é uma dação do Estado. Desde 1904, a concessão de energia é vista como reversível. Em 1964 o Código das Águas também deixou isso claro. Nós não damos um rio. O rio é patrimônio da União. Nós emprestamos, concedemos, deixamos utilizar por um determinado espaço de tempo. Pois bem, então todos os contratos de energia feitos neste País têm tempo, têm termo.

            Nós tivemos um período em que o Estado brasileiro era o maior operador, no regime militar e um pouco mais adiante, na década de 1980. Em 1990 começou a iniciativa privada. Então, como o Estado era o grande operador, ficava-se meio sem se preocupar com essa questão da licitação, porque eram as empresas estatais. Ao entrar a iniciativa privada, os contratos têm de ter termo.

(Soa a campainha.)

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Governo/PT - PR) - Nós temos de fazer novas concessões, porque nós não vamos dar um rio à iniciativa privada.

            Portanto, desde 1999 nós começamos a ter as licitações com termo: 35 anos para a energia nova e cerca de 15 anos para a energia que nós chamamos de velha ou que já está em operação.

            Como nós remuneramos uma usina hidrelétrica? Por dois custos: O&M, que é operação e manutenção, e por custos financeiros, de investimentos. Então, uma usina que se tem que construir é uma usina cuja energia obviamente custa mais do que a de uma usina construída, porque eu tenho que amortizar o meu custo.

            O que acontece com os contratos que a Presidenta está renovando por força da Medida Provisória nº 579, que virou lei? É energia proveniente de usinas que nós chamamos de amortizadas, ou seja, aquelas em que já foram feitos investimentos, que não precisam mais ser pagos e que, portanto, não precisam compor tarifa; eles têm de ser retirados da tarifa para haver modicidade tarifária.

            Então se propôs que essas usinas, se quisessem prorrogar os seus contratos, os que venciam até 2017, pudessem praticar um valor mais baixo, e foi dado o valor de R$32,00 por megawatt. A maioria das usinas aderiu.

            O que o Tesouro está pagando em relação a isso? Dois custos. Um custo que é o investimento não amortizado daquelas que aderiram e quiseram entrar no sistema regulado e também o custo dos encargos sociais, porque havia antes, no valor da tarifa, por exemplo, o Luz para Todos ou alguns outros encargos. É isso que o Tesouro está pagando.

            Ocorre que três empresas não entraram ou não aderiram à MP: a Cesp, a Cemig e a Copel. Ao não aderirem à MP, ficaram com seus contratos liberados e preferiram vender sua energia no chamado mercado spot ou mercado de curto prazo. Sabe qual é o valor dessa energia no mercado de curto prazo, Sr. Presidente? Oitocentos reais por megawatt.

            As distribuidoras são obrigadas a contratar 100% da energia que têm que distribuir, mas nós não podemos obrigar as distribuidoras a ir ao mercado spot comprar a R$800,00, já que essas geradoras não quiseram entregar às distribuidoras a energia compromissada. Por isso também o Tesouro está tendo que socorrer as distribuidoras, mas não é por conta de um desequilíbrio de cálculo da MP, é por conta da não adesão dessas três empresas. Só que o contrato dessas empresas vence agora, vence em 2015, 2014,...

(Soa a campainha.)

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - ... 2016 e 2017, e essas empresas vão ter que ser concedidas pelo valor de R$32,00 por megawatt/hora. Então o que nós estamos vendo é o empurrar da barriga com um valor que afeta o consumidor e a economia brasileira.

            Eu queria fazer esses esclarecimentos, Sr. Presidente, porque há muita especulação, há muita gente falando sobre o setor elétrico, plantando o caos, dizendo que há crise. E queria reafirmar aqui a seriedade com que o Governo brasileiro tem tratado essa questão. Mesmo estando no maior estresse hídrico dos últimos 40 anos, nós não passaremos pela situação que nós passamos em 2001, quando nós não tínhamos medidas estruturais para garantir energia ao povo brasileiro.

            Então, quero dizer aos Srs. Senadores, às Srªs Senadoras e à população que nos assiste pela TV Senado e nos ouve pela Rádio Senado que há muita especulação. Ano passado, os notícias diziam que nós teríamos também racionamento e teríamos problema na geração de energia. Não tivemos. Em 2008, a aposta era igual. Não tivemos.

            E não tivemos por quê? Porque nós temos um sistema equilibrado, nós temos um sistema que considera a diversidade da matriz, mas, principalmente, nós temos incentivos aos investimentos para geração, distribuição e transmissão de energia no Brasil.

            Obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2014 - Página 232