Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre a trajetória política de S. Exª e explicações sobre gastos com plano de saúde.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXPLICAÇÃO PESSOAL.:
  • Reflexões sobre a trajetória política de S. Exª e explicações sobre gastos com plano de saúde.
Aparteantes
Rodrigo Rollemberg.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2014 - Página 313
Assunto
Outros > EXPLICAÇÃO PESSOAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA, ORADOR, EXPLICAÇÃO PESSOAL, UTILIZAÇÃO, PLANO DE SAUDE, RECURSOS, SENADO, DIREITOS, SENADOR.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS. Sem revisão do orador.) - Prezado Sr. Presidente, Senador Mozarildo, Srªs e Srs. Senadores, eu guardo, em minha mente, uma entrevista do poeta gaúcho Mário Quintana.

            Quando lhe perguntaram em qual outra profissão poderia se imaginar, Quintana respondeu: “Eu queria ser um pajem medieval. Mas isso não é nada, pois hoje eu queria ser uma coisa mais louca, eu queria ser eu mesmo.” Bem que meu pai queria que eu fosse médico, mas, nos passos do poeta, mais do que gostar eu preferi ser eu mesmo. O poeta foi provocado com uma nova pergunta: “[Quintana], mas quem é o senhor?” Ele concluiu: “Eu não sou eu, sou o momento, [eu] passo.”

            Fosse médico, talvez eu pudesse contribuir na curetagem das feridas do mundo, mas eu também não queria ser eu. É que eu percebi desde muito cedo que, para ser eu mesmo, eu teria que abraçar a vida pública e saber que eu sou o momento e que eu também passo.

            Se não quiserem que eu seja eu mesmo, cortem-me a palavra. Sem ela, mais do que não ser eu mesmo, eu serei ninguém.

            Não me mantiveram calado quando o tempo era de degola e o vento tinha o cheiro de chumbo.

            Quando os atos institucionais eram uma espécie de guilhotina com seu corte afiado nas cordas vocais a calar vozes e a calar fundo no peito de centenas de brasileiros, eu fiz coro com brasileiros como Ulysses e Teotônio Vilela nos portões das prisões políticas. O nosso grito e o de tantos outros contribuiu para que outras vozes não fossem caladas para sempre pelas masmorras espalhadas pelo Brasil inteiro.

            Não me calei quando o Sargento Manoel Raimundo Soares apareceu boiando nas águas do Jacuí, em Porto Alegre, com as mãos amarradas nas costas, depois de uma sessão de torturas no DOPS da capital gaúcha.

            Com meus companheiros do velho MDB, numa das primeiras, se não na primeira contestação aberta ao regime da ditadura de 1964 - hoje estamos às vésperas dos seus 50 anos -, enfrentamos a censura, enfrentamos a tortura, o cala-boca dos calabouços, a violência do arbítrio.

            Eu não teria sido eu mesmo se não lutasse pela anistia ampla, geral e irrestrita. Se não gritasse por eleições diretas para a Presidência da República.

            Eu não seria eu mesmo se não combatesse a corrupção e a impunidade, sementes de joio nas plantações do trigo da saúde, da educação, da segurança pública e da cidadania de todos os brasileiros.

            Eu não seria eu mesmo se não viesse hoje a essa tribuna.

            Fui Governador do Rio Grande, fui Ministro. Antes, Vereador em minha terra, Caxias do Sul, e Deputado. Tenho direito por lei a uma aposentadoria. Hoje, sou Senador. Não tenho outra atividade remunerada, como muitos. Exerço o meu mandato em tempo integral. Desde o início dos meus mandatos como representante do povo gaúcho, lá na Assembleia Legislativa e aqui nesta Casa, abri mão das verbas de representação a que teria direito. Exerço o mandato de Senador, recebo salário como Senador. Nada mais. De tudo mais abri mão enquanto aqui eu estiver.

            Como Senador, teria direito a uma chamada verba indenizatória no valor de R$15 mil mensais. Com esse mesmo valor poderia contratar atividades típicas de mandato, como aluguel de escritório para atividades políticas locais, pagamento de despesas de viagem pelo interior do meu Estado.

            Também, desde o início, eu abri mão desse valor. Não recebo.

            O Senado Federal já propicia, por meio do seu quadro institucional, condições para que eu possa alcançar os meus objetivos como Senador da República.

            Por muito tempo, os valores das passagens não utilizadas para viagens aos respectivos Estados eram acumulados anualmente. Vou ao meu Estado inúmeras vezes, tantas quantas necessárias. Ainda assim, somando o montante das chamadas requisições de passagens aéreas, acumulei um crédito superior a R$1,4 milhão, que devolvi à Tesouraria do Senado Federal, integralmente, devolvi ao Senado Federal.

            Em todos esses anos, eu sempre tive um agradecimento mais que especial a fazer a Deus. Ele me propiciou a saúde necessária para exercer o meu mandato, nenhum grande tropeço na minha saúde me tirou da tribuna nem me fez utilizar os recursos do Senado oferecidos para todos os Senadores e familiares a título de pagamento em razão das doenças.

            É evidente que os anos vividos contribuem na fadiga do organismo humano. É bem verdade que a moléstia não escolhe a idade. Muitos dos nossos companheiros, ainda novos, sofreram de males do corpo e da alma, sem contar aqueles que partiram no exercício do mandato, ainda em uma tenra idade e com um futuro brilhante pela frente.

            Repito: em todos esses casos, o Senado Federal propicia um plano de assistência à saúde, para pagamento das despesas médicas e hospitalares.

            Nos últimos dois anos, como ser humano sujeito às vicissitudes da vida, tive que recorrer à ciência médica. Acho que as minhas orações já não têm sido suficientes para alcançar Deus. Ou Ele me encaminhou para a mesma ciência que soprou nas consciências das equipes médicas que me atenderam, os mesmos profissionais que me devolveram a saúde que tenho hoje - também, repito, graças a Deus -, para bem exercer o meu mandato e continuar na luta como representante do Estado do Rio Grande do Sul no Senado Federal.

            Recorri, em todos os casos, a avaliações médicas e a pareceres dos segmentos administrativos e financeiros da Casa para saber da necessidade das intervenções, da legalidade dos gastos respectivos, por meio do Plano de Assistência à Saúde, oferecido a todos os Senadores no exato momento da posse nesta Casa.

            Sempre que possível, a não ser em atendimentos de emergência, recorri a opiniões médicas alternativas. Tudo o que fiz, portanto, foi por necessidade prescrita pela ciência e submetida à vontade de Deus. Tudo o que fiz teve o aval dos segmentos desta Casa, depois de rigorosa avaliação de legalidade.

            Os Anais do Senado são o testemunho mais que natural da minha luta pela moralidade nos gastos públicos, em particular nos gastos públicos desta Casa, o nosso Senado. Um dos meus trabalhos foi objeto de publicação, sob o título O Senado nos Trilhos da História, em que conto a vida desta Casa, equívocos, erros que houve no passado, ou até no presente, e alternativas e propostas de mudança para melhor.

            Não podemos negar, porém, que esse mesmo corte - reconheço que a atual administração está envidando esforços no sentido da diminuição dos gastos de custeio - que a atual administração está fazendo, diminuindo os gastos de custeio, não tem recaído sobre os benefícios históricos oferecidos aos Senadores.

            A questão da saúde é um caso típico. Não discuto, aqui, a necessidade de um serviço médico no tamanho e nos moldes anteriores à sua quase extinção, como foi feito recentemente. Mas o fato é que a extinção do serviço médico só recaiu sobre os funcionários da Casa.

            Atendimentos chamados contínuos, aqueles que temem soluções de continuidade foram ceifados da noite para o dia. O Plano de Assistência à Saúde dos Srs. Senadores e familiares, entretanto, permaneceu são e salvo dos cortes de recursos.

            E foi a esse mesmo plano de saúde, não tangenciado nos cortes de despesas, que recorri quando das cirurgias a que me submeti, todas elas recomendadas como de urgência. Na cirurgia dentária, por exemplo, ouvi antes a opinião de diferentes profissionais - optei, municiado por critérios técnicos. Submeti uma papelada aos departamentos competentes do Senado Federal.

            De repente, vi meu nome estampado nos jornais - bem verdade -, juntamente com outros nomes de Senadores, Deputados Federais, de todas as idades, e cada um deles com o seu mal a ser tratado, como também propicia o nosso plano de saúde, Parlamentares e respectivos familiares.

             No meio dessa discussão, no noticiário e nos editoriais, um nome: o meu. Charge do tipo: “Até tu Simon?” Um jornal conhecido de Porto Alegre. Pois é, até eu, que nunca gastei as tais verbas indenizatórias; até eu, que devolvi os recursos de passagens não utilizados; até eu, que ocupo essa mesma tribuna para denunciar os desvios de recursos que tanto faltam nas escolas, nas estradas, nas cidades e também, principalmente, nas filas dos hospitais.

            Nada disso foi manchete ou editorial. Isso é obrigação minha, como homem que escolheu a vida pública; eu, que sempre quis ser eu mesmo. Fosse eu médico, como sonhava meu pai, talvez pudesse eu mesmo me diagnosticar e teria, quem sabe, um plano de saúde para as intervenções as quais também eu mesmo não poderia me submeter.

            Assim tem que ser também aqui no Senado Federal e, por extensão, em todos os cargos de mandatos públicos. Um plano de saúde arcado por cada um de nós. Não cometi nenhuma ilegalidade, nenhuma imoralidade, como atestam os documentos que acompanham todos os processos de recomendação médica e da consulta sobre a legalidade do repasse do recurso por meio do plano de saúde.

            O noticiário dos últimos dias, o mesmo que estampa "até tu", traz à tona, entretanto, a necessidade de uma reflexão sobre a moralidade de nós, Parlamentares, termos privilégios tão distantes, em valores e consequente qualidade no atendimento, da grande maioria do povo brasileiro. Se assim o quisermos, tenhamos todos os nossos próprios planos de saúde.

            Recebi sugestões no sentido de que não viesse a esta tribuna para tratar desse assunto. Dizem muitos que a publicação é parte de um processo eleitoral que já se avizinha e objetiva a minha pessoa.

            Se estou aqui é porque atendi, unicamente, à imposição, mais que sugestão, da minha consciência. Se eu não viesse aqui expor a minha angústia com as últimas publicações que envolvem o meu nome, apesar de tudo ter sido feito nos estritos moldes da legalidade e da moralidade, "eu não seria eu", como diria, novamente, o poeta Quintana. Se eu não viesse aqui, seria a minha imagem no espelho da minha consciência.

            Tenho - repito - plena consciência de que não cometi nenhuma ilegalidade, nenhuma imoralidade, ao recorrer aos préstimos do Plano de Assistência à Saúde do Senado Federal para ressarcir tais gastos, com intervenções médicas e odontológicas, minhas e da minha família.

            O Sr. Rodrigo Rollemberg (Bloco Apoio Governo/PSB - DF. Fora do microfone.) - Senador Pedro Simon.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Pois não.

            O Sr. Rodrigo Rollemberg (Bloco Apoio Governo/PSB - DF) - Eu quero dizer a V. Exª, Senador Pedro Simon, que, de fato, V. Exª nem precisaria ocupar a tribuna do Senado para dar esse tipo de explicação; V. Exª só a está ocupando porque V. Exª sempre atua com excesso de zelo. Todos aqui conhecem a trajetória de V. Exª, que é um exemplo, não apenas um exemplo para nós, Senadores, um exemplo para os jovens brasileiros, para todos aqueles que querem um País sério, um País em que o recurso público seja utilizado de forma adequada, com honestidade, com legalidade, com transparência. Se V. Exª utilizou recursos ressarcidos pelo Senado para atendimento médico é porque efetivamente havia uma necessidade de saúde, uma necessidade de saúde importante para V. Exª. Portanto, V. Exª não se preocupe. Todos sabem que V. Exª não cometeu nenhuma ilegalidade e nenhuma imoralidade. V. Exª foi, V. Exª é e V. Exª será sempre para todos nós um exemplo de conduta de homem público.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco Maioria/PMDB - RS) - Agradeço muito a V. Exª, querido Líder, a gentileza de seu aparte. V. Exª, aqui em Brasília, também luta com importante responsabilidade no sentido de representar a nossa Capital, que tem seus problemas, suas dificuldades, e V. Exª tem seus problemas e suas dificuldades para vencer esses problemas e essas dificuldades.

            Muito obrigado! Do fundo do coração, eu agradeço a V. Exª.

            Sr. Presidente, tudo foi feito conforme os dispositivos do regimento desse mesmo plano. Estou certo, entretanto, que devemos rever esses mesmos dispositivos não pela legalidade que lhes é embutida, mas por critérios de moralidade, uma vez que nos atribui benefícios que estão distantes daqueles que dispõe a grande maioria da população, ou que estão ao alcance dela.

            Recomendei à minha assessoria uma avaliação sobre esse tema. Trata-se de um assunto que deve envolver muitos Senadores - melhor ainda, todos os Senadores. Ou, quem sabe, uma decisão imediata da direção desta Casa, nos moldes das últimas decisões que resultaram em cortes de gastos, que, também repito, no caso da saúde, atingiram mais diretamente os funcionários da Casa.

            A continuar como está, "até eu"; como possibilidade, todos. A doença, na maioria das vezes, não bate à porta. E, quando ela vem, a tendência é, aí sim, batermos à porta daquilo que entendemos como "direito", ou legal, o que nem sempre é moral. Moralidade e legalidade são muito mais que rimas, quando o assunto é dinheiro público.

            Hoje, passados os fatos, não posso dizer que não cairei mais doente. Afinal, não sou Deus, apenas um temente a Deus. Tomara que as minhas orações sejam ouvidas sempre, para mim e para todos, inclusive para os jornalistas. O que me move é a moralidade, mais que a legalidade. Espero também que a legalidade se aproxime da moralidade, com as mudanças necessárias e urgentes nos privilégios que deram ensejo ao noticiário dos últimos dias, envolvendo Parlamentares de diferentes Estados.

            “Eu sou o momento, e passo”, ainda repetindo o poeta, mas quero continuar a construir a minha história, como exemplo para os meus filhos e os meus companheiros de viagem terrena, nos trilhos estritos da legalidade e principalmente da moralidade.

            Era o que eu tinha a dizer, agradecendo a gentileza e compreensão de V. Exª.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2014 - Página 313