Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da participação de S.Exª em audiência pública destinada à discussão da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Autor
Cícero Lucena (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
Nome completo: Cícero de Lucena Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR, POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Registro da participação de S.Exª em audiência pública destinada à discussão da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Publicação
Publicação no DSF de 26/03/2014 - Página 186
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR, POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, AUDIENCIA PUBLICA, OBJETIVO, DEBATE, PROJETO, ACONDICIONAMENTO, LIXO, RECICLAGEM.

            O SR. CÍCERO LUCENA (Bloco Minoria/PSDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na quarta-feira da semana passada, no dia 19 de março mais precisamente, realizamos uma audiência pública da maior importância no âmbito da Subcomissão Temporária de Resíduos Sólidos. Estiveram presentes à reunião o Sr. Albino Rodrigues Alvarez, técnico de Pesquisa e Planejamento do IPEA; o Sr. Diógenes Del Bel, Presidente da Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos (Abetre); o Sr. Carlos Roberto Vieira da Silva, Diretor Executivo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe); o Sr. Ney Maranhão, Secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente; e o Sr. Wanderley Coelho Baptista, analista de Políticas e Indústria da Confederação Nacional da Indústria.

            Durante essa audiência, pudemos ter uma visão panorâmica desses três anos de existência da Política Nacional de Resíduos Sólidos: o que tem sido feito, o que falta fazer, os pontos fortes e os pontos fracos.

            Nosso objetivo, ao realizar essas audiências, é não apenas chamar a atenção da sociedade brasileira e dos gestores públicos de modo geral para a importância da implantação dessa política; nosso objetivo também é fortalecer a prática de acompanhamento das políticas públicas pelo Congresso Nacional, porque não basta apenas fazer leis e formular políticas, é preciso saber se elas estão sendo implantadas e dando resultado. Então, essas audiências são o início de todo um processo de discussão do qual vamos extrair conhecimentos e propostas que possam ser adotadas para a implantação definitiva da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

            Por isso, Sr. Presidente, resolvi subir hoje à tribuna para fazer um apanhado geral do que foi discutido nessa audiência pública, para que todas as Srªs e os Srs. Senadores tenham a oportunidade de também estar a par desses debates.

            De tudo o que foi dito naquela audiência, a principal conclusão é a de que a Lei nº 12.305/2010 foi bastante ambiciosa ao fixar suas metas, mas, em virtude da complexidade da matéria, o avanço para cumprir a lei ocorreu em ritmo bem pequeno. A questão ganhou muita visibilidade e discussão em todo o País. Houve um expressivo aumento das iniciativas de coletas seletivas e as cooperativas de catadores se multiplicaram em todo o território nacional. Contudo, foram identificados diversos problemas que impediram o avanço mais acelerado da aplicação da lei.

            O primeiro desses problemas é a falta de cooperação entre os atores envolvidos: Governo, em suas várias esferas; empresas e demais segmentos da sociedade civil. E isso é fundamental, porque sabemos da fragilidade da nossa Federação no que diz respeito à distribuição de recursos. Sabemos que a grande maioria dos recursos fica na mão da União, em detrimento dos Municípios. Além disso, estamos tratando de uma questão que mexe com o hábito cultural do brasileiro, que é o de jogar lixo na rua. Então, é preciso haver um grande envolvimento de todos os atores desse processo.

            O segundo problema identificado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi a falta de respeito às diversidades locais e regionais. Implantar aterros sanitários não é uma tarefa simples, requer muitos estudos técnicos de viabilidade, e esses estudos precisam estar adequados às realidades regionais. Por isso, a gestão da Política Nacional de Resíduos Sólidos precisa sair de Brasília de modo efetivo. Precisamos tratar os desiguais como desiguais, e não tentar passar uma régua e considerá-los todos como absolutamente iguais.

            O Município tem um papel protagonista.

            Hoje, produzimos cerca de 180 mil toneladas de resíduos sólidos por dia, sendo que 58% desse total têm uma disposição adequada em aterros sanitários. Contudo, 25% dos Municípios brasileiros geram 80% de todo o resíduo sólido do nosso País. Por sua vez, temos 2.906 lixões em 2.810 Municípios. Para transformar esses lixões em aterros sanitários, será preciso pessoal especializado, porque não basta simplesmente construir o aterro, é preciso gerenciá-lo constantemente, para não perder todo o investimento realizado. É importante destacar que apenas 5% dos custos de um aterro sanitário se referem à implantação; 85% dos recursos são consumidos na manutenção e na vida útil do aterro. E esse é um grande problema, pois a falta de recursos dos Municípios brasileiros pequenos é bastante conhecida por esta Casa e por todos.

            Outro problema que foi detectado pelos expositores na audiência pública é a falta de incentivos fiscais, financeiros e creditícios para a implantação da logística reversa. Precisamos desonerar a cadeia produtiva, porque, hoje, em muitos casos, o material reciclado paga mais impostos do que o material virgem. Então, não é possível sustentar um sistema de reciclagem com essa esdrúxula forma econômica e de tributação.

            Há também o problema dos conflitos de legislação, porque existe uma competência concorrente na área do meio ambiente. Esse é um ponto em que nós, aqui no Congresso Nacional, podemos e devemos atuar muito fortemente, para impedir casos como o de um Município do Estado do Espírito Santo, por exemplo, que estabeleceu uma lei municipal para logística reversa de eletroeletrônicos e deu um prazo de apenas 30 dias para sua implementação. Isso não pode acontecer! Não é possível a indústria se adaptar e atender a legislações múltiplas que hoje são propostas e muitas delas aprovadas no nosso País.  

            Durante a audiência, ainda foi levantada a omissão da Lei nº 12.305, de 2010, quanto à exportação de resíduos. A lei só falou da importação, proibindo a entrada no País de produtos perigosos e de rejeitos, e condicionou as demais a características que não causem risco à população. Mas é importante que haja uma definição legal quanto à exportação de resíduos sólidos, porque precisamos saber se vamos exportar resíduo bruto ou beneficiado e em que condições.

            Também foi levantada, durante o encontro, a importância de desenvolvermos tecnologias próprias, pois o Brasil é um país sui generis, muito diferente da Europa, por exemplo. Não podemos simplesmente tropicalizar as soluções que foram adotadas lá, porque não dariam certo aqui. Somos um país heterogêneo, de múltiplos contrastes e, por isso, existe uma enorme dificuldade de se pensar uma solução que sirva para todo o Brasil e que, ao mesmo tempo, respeite as peculiaridades regionais.

            Então, Srªs e Srs. Senadores, esses foram alguns limitadores da lei que define a Política Nacional de Resíduos Sólidos apontados durante a audiência pública. Contudo, é importante registrar também os avanços e as conquistas desses últimos três anos.

            O primeiro desses avanços diz respeito à capacitação de pessoal técnico. Por meio do ensino a distância, o Ministério do Meio Ambiente já treinou mais de mil técnicos municipais para a elaboração de planos simplificados de gestão integrada de resíduos sólidos. Isso é fundamental porque, como já foi dito, um dos principais problemas para implantar a lei é a falta de pessoal capacitado. Hoje temos aproximadamente 19% dos Municípios com planos de gestão de resíduos já concluídos ou em elaboração, e o Ministério empenhou R$56 milhões, nos anos de 2011 e 2012, para financiar planos de gestão integrada de resíduos sólidos, embora não haja previsão de nenhum valor para o ano que exatamente era para encerrar ou fechar os lixões, o ano de 2014.

            Outro avanço importante se deu nas conversações para o estabelecimento da cadeia de logística reversa para os setores de embalagens em geral e também eletroeletrônico e lâmpadas. Quero lembrar que algumas cadeias produtivas já tinham política de logística reversa estabelecida antes mesmo da entrada em vigor da lei de resíduos sólidos, como é o caso dos setores de pilhas, baterias, pneus e embalagens de agrotóxicos. A esse respeito, quero destacar que o Brasil é o líder mundial na reciclagem de embalagens de agrotóxicos. Reciclamos algo em torno de 95% de nossas embalagens. Nenhum país faz isso. O mesmo acontece com as latas de alumínio, que atingimos 97,5%.

            Mas talvez o principal avanço ocorrido a partir da vigência de Política Nacional de Resíduos Sólidos tenha sido o aumento do debate a respeito do assunto pela sociedade. A partir do momento em que começamos a fortalecer o papel desempenhado pelas comunidades de catadores, a partir do momento em que os governos municipais começam a implantar a coleta seletiva, percebemos um gradual aumento da consciência da população quanto à necessidade de reduzir a emissão de resíduos sólidos, de reciclar e de reutilizar esses materiais. Acho que essa foi a principal conquista da lei nesses três anos de existência, porque estamos mexendo com algo que é cultura do brasileiro e levará tempo para ser implantado em sua totalidade.

(Soa a campainha.)

            O SR. CÍCERO LUCENA (Bloco Minoria/PSDB - PB) - Já estou concluindo, Sr. Presidente.

            Concluo meu pronunciamento, Sr. Presidente, ressaltando os inegáveis benefícios da logística reversa não apenas para o meio ambiente, mas também para a saúde e o sistema produtivo. Certamente, muitas internações hospitalares poderiam ser evitadas se os lixões já tivessem sido extintos e se já houvesse, em nosso País, um tratamento adequado dos resíduos sólidos.

            Também o sistema produtivo se beneficiará enormemente dessa política, porque existe a iminência do esgotamento de diversas matérias-primas - como o zinco e o cobre - nas próximas décadas, o que fará a chamada “mineração urbana” absolutamente necessária.

            Então, a preocupação com os resíduos sólidos é pertinente e fundamental. Se não tivesse sido feita essa lei, a tendência seria haver um crescimento desses resíduo,s porque, nos últimos dez anos, o que observamos foi um aumento na geração de resíduos sólidos, no Brasil, da ordem de 21%. No mesmo período, o crescimento populacional foi de apenas 9,65%, ou seja, a geração de resíduos no Brasil cresceu mais do que o dobro do aumento da população. Por outro lado, no mesmo período, a variação do PIB per capita foi de 20,8%, o que indica uma associação muito forte entre o aumento da geração de resíduos sólidos e o aumento do poder aquisitivo da população.

            Implantar a Política Nacional de Resíduos Sólidos deve constituir uma prioridade do Estado brasileiro, por todas as implicações que possui. Seu orçamento não pode ser contingenciado pelo Palácio do Planalto. Ao contrário, precisamos constituir fontes de financiamento perenes que viabilizem a plena implantação dessa política. Custa muito, é verdade, cerca de R$ 6,7 bilhões, para universalizar a coleta de resíduos sólidos urbanos no Brasil e dar a destinação adequada desses resíduos em aterros sanitários. Mas, com certeza, custa bem menos do que o impacto negativo da não realização dessas medidas e bem menos ainda do que o que vem sendo gasto para realizar a Copa do Mundo.

            Portanto, Sr. Presidente, concluo meu pronunciamento esperando que esta Casa possa, de fato, cumprir o papel que lhe cabe e fiscalizar a execução das políticas públicas e preencher as lacunas legislativas que ainda persistem a respeito do tratamento de resíduos sólidos em nosso País.

            Muito obrigado. Que Deus proteja todos.

            Agradeço ao Presidente a paciência de me conceder prorrogação de tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/03/2014 - Página 186