Discurso durante a 71ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Questionamento do que deve ser feito para que o Brasil seja sustentavelmente desenvolvido fazendo menção às ideias de Thomas Piketty em seu livro O Capital no Século XXI.

Autor
Luiz Henrique (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Luiz Henrique da Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.:
  • Questionamento do que deve ser feito para que o Brasil seja sustentavelmente desenvolvido fazendo menção às ideias de Thomas Piketty em seu livro O Capital no Século XXI.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2014 - Página 27
Assunto
Outros > IMPRENSA, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.
Indexação
  • REGISTRO, MATERIA, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), MOTIVO, DEBATE, LIVRO, AUTORIA, ECONOMISTA, PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, OBJETIVO, PESQUISA, COMPORTAMENTO, ECONOMIA, MUNDO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, DISCUSSÃO, REFERENCIA, CONSTRUÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, BRASIL.

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco Maioria/PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador Paim, Srªs e Srs. Senadores, a revista Piauí, a revista mensal que propicia um dos mais densos debates sobre a realidade nacional e internacional, traz uma ampla matéria a respeito de um livro e de um autor.

            O livro chama-se O Capital no Século XXI, que tem edição francesa e inglesa e provavelmente logo terá edição na Língua Portuguesa. Esse livro demandou 20 anos de pesquisa, Sr. Presidente, e foi escrito com base no trabalho de mais de 20 pesquisadores, inclusive alguns prêmios Nobel em economia.

            Esse livro, editado nos Estados Unidos pela Editora da Universidade de Harvard, teve o maior volume de vendas de todas as publicações daquela Universidade durante 101 anos.

            O livro, segundo a revista The Economist, revoluciona o modo como as pessoas enxergam a história econômica dos últimos dois séculos. E é um livro muito importante para trazer a esta tribuna, porque inova em vários aspectos.

            Primeiro, ao invés de ser uma obra de um pesquisador solitário, é uma obra, como eu já falei, de uma grande equipe, e uma obra que tem uma ferramenta extraordinária, que é a internet, adentrando os laboratórios de pesquisa e as bibliotecas mais conceituadas do mundo.

            O segundo aspecto desse livro é que ele muda totalmente a lógica econômica vigente na atualidade. O mundo vem se movendo há muitos anos pela lógica matemática. Todas as teses econômicas se baseavam fundamentalmente em especulações matemáticas, em apreciações matemáticas.

            Esse livro, não. Esse livro é baseado em meticulosa, demorada pesquisa do comportamento da economia mundial durante os últimos cem anos e estabelece como grande advertência que a desigualdade na sociedade humana vem crescendo de 6% a 7% ao ano e que o grande desafio da humanidade é combater a desigualdade, o grande desafio dos governos é combater a desigualdade, o grande desafio dos Congressos é combater a desigualdade. Em recente pronunciamento, o Presidente Barack Obama disse que a desigualdade é o desafio extremo da nossa época. Vejamos o que ocorre nos Estados Unidos.

            Nos Estados Unidos, a pátria cantada em prosa e verso aqui no Brasil como a nação da sociedade com qualidade de vida, o welfare state, 1% das pessoas mais ricas controla 40% da riqueza do país. Em outro livro, que é indispensável nós lermos para que possamos projetar o futuro desta Pátria, o livro do ex-Vice-Presidente americano Al Gore, O Futuro, ele diz que 400 famílias norte-americanas açambarcam uma riqueza que corresponde a todo capital de 130 milhões de norte-americanos.

            Pois bem, Sr. Presidente. Havia uma tese que foi longamente exposta durante o regime autoritário que combatemos, a de que, primeiro, era preciso fazer crescer o bolo para depois distribuir. Essa teoria era baseada na célebre Curva de Kuznets, o Prêmio Nobel de Economia, que recebeu esse galardão com a tese de que o capitalismo gera dois setores produtivos, um tradicional e outro moderno.

            Enquanto a coexistência do tradicional e do moderno for mais ou menos equivalente, haverá uma redução da igualdade, haverá um aumento da desigualdade, mas que, a partir de um certo tempo, a indústria tradicional, migrando para a indústria mais avançada, gerará uma retomada da distribuição da riqueza. É a famosa curva de Kuznets, que corresponde a um “U” de cabeça para baixo.

            O economista Thomas Piketty, é um francês que é autor da nova tese que vem revolucionando o mundo, ao ponto de produtores de documentários de televisão estarem querendo comprar, em verdadeiro leilão, os direitos autorais para transformá-los em programas de televisão; ao ponto de um grande produtor cultural querer comprar direitos autorais do livro para transformá-lo numa ópera; e ao ponto de um Prêmio Nobel apresentá-lo como uma espécie de popstar mundial.

            O livro do francês Thomas Piketty inverte aquela curva de Kuznets: ao invés de “U” de cabeça para baixo, “U” de cabeça para cima, estabelecendo como base do desenvolvimento a retomada da igualdade.

            E o grande economista francês, o jovem economista francês, já aos 22 anos, publicava teses laureadas. A tese dele é uma fórmula matemática simples, como aquela célebre fórmula matemática com que Albert Einstein criou a Teoria da Relatividade. A fórmula do economista Kuznets é de que R tem que ser maior do que G, ou seja, a economia tem que crescer mais do que a acumulação da riqueza.

            Eu trago à tribuna essa matéria, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para que ela sirva de meditação. Na Comissão Senado do Futuro, o Senador Cristovam Buarque e eu estamos pesquisando algo que possamos fazer hoje para sermos produtivos nas próximas décadas e para que tenhamos uma sociedade mais justa, mais equilibrada, sem os cenários dramáticos e deprimentes de hoje, os cenários da corrupção, da criminalidade, da baixa eficiência dos serviços públicos, dos serviços de educação e saúde, e com o baixo crescimento dos investimentos em infraestrutura e em inovação.

            Nós estamos prospectando o que devemos fazer hoje para construir um Brasil sustentavelmente desenvolvido. E, por isso, é importante que reflitamos sobre esse livro, sobre essa nova lição que revoluciona a economia, que estabelece como principal preocupação no mundo a redução das desigualdades.

            O economista francês Thomas Piketty propõe um imposto mundial sobre as fortunas, sobre a riqueza. Evidentemente, isso é uma utopia, mas de utopia em utopia vai se atingindo uma nova realidade.

            Trago à tribuna essa reflexão para que possamos, efetivamente, tratar de debater aqui a profundidade da crise nacional, as razões da crise nacional, as razões da desigualdade, que foi reduzida, principalmente durante o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas que ainda é muito grande, que ainda é imensa: as razões que fazem um trabalhador ter que enfrentar três ou quatro horas do transporte público para chegar ao trabalho e para retornar a sua casa.

            É preciso que reflitamos sobre isso, e o fator principal, a causa principal dos problemas nacionais, dos problemas sociais, dos problemas econômicos, dos problemas vivenciais, dos problemas das cidades inchadas, das cidades superpovoadas, das cidades favelizadas, das cidades sub-habitadas, o problema fundamental é esse da acumulação da riqueza.

            Reflitamos, pois, sobre a tese do Prof. Piketty. Ele traz uma nova luz para políticas de governo a serem estabelecidas prioritariamente para tributar a riqueza, tributar as fortunas e estabelecer progressivamente uma sociedade mais igual.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte, Senador Luiz Henrique?

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco Maioria/PMDB - SC) - Com muito prazer, nobre Senador Eduardo Suplicy. Esse aparte vem da sua Renda Mínima para a sua competência máxima.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Prezado Senador Luiz Henrique, V. Exª traz aqui uma reflexão muito significativa sobre o autor Thomas Piketty, que, nesses últimos meses, a partir do lançamento de seu livro sobre o capital, passou a ter uma enorme influência no pensamento econômico mundial. V. Exª menciona a reportagem da revista Piauí, justamente também há hoje, uma entrevista com Thomas Piketty na Folha de S.Paulo, para a Eleonora de Lucena, no caderno Mercado, com o título “Desigualdade é ameaça verdadeira à democracia”. É interessante que, ao mesmo tempo em que Thomas Piketty, no seu livro, analisa as crescentes desigualdades no mundo, muito especialmente nos países desenvolvidos, como os Estados Unidos e diversos países da União Europeia, por outro lado, ele até menciona, nas suas palavras, que:

Não tivemos condições de apurar dados precisos sobre o Brasil. Tentamos muitas vezes, mas não conseguimos dados apropriados para a nossa pesquisa. O problema é a falta de transparência em dados referentes a Imposto de Renda, por exemplo.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Ou seja, ele não chegou a analisar no seu livro, em profundidade, como estamos no Brasil. Mas é fato que, diferentemente de muitos outros países, desde 1996, quando estávamos com o Coeficiente de Gini, de desigualdade, da ordem de 0,61, que nos colocava entre os três países mais desiguais do mundo, de 2001 e 2002, quando estávamos com 0,59, viemos diminuindo progressivamente. O último dado sobre o Coeficiente de Gini, de desigualdade, é de 2012, ainda não foi divulgado o de 2013, mas com algo em torno de 0,51 a 0,52. Portanto, com as diversas políticas econômicas e sociais implementadas pelos governos, já antes pelo governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que iniciou alguns programas sociais, mas que foram mais bem desenvolvidos a partir de 2003, houve, progressiva e gradualmente, uma diminuição da desigualdade, felizmente, no País, que é acompanhada da evolução do nosso processo democrático. E Thomas Piketty coloca, se me permite ler um trecho aqui:

Folha: O senhor escreve que a desigualdade é uma ameaça à democracia. (...)

Thomas Piketty: É uma ameaça verdadeira. O capitalismo do século 21 traz extrema desigualdade. A certo ponto, isso pode trazer riscos para as instituições democráticas. Outra ameaça é a resposta nacionalista: quando não conseguimos resolver os problemas sociais é tentador achar culpados: trabalhadores estrangeiros, outros países, Alemanha, China. É preciso discutir uma taxação adequada para assegurar benefícios gerais, senão correremos sérios riscos. A batalha política é muito complicada. As pessoas precisam entender as opções e é importante discuti-las.

            V. Exª chama atenção de como a democracia é tão importante para que o nosso sistema econômico, com participação do Estado, de forma muito significativa, como poderemos compatibilizar o sistema de mercado, a forma de propriedade privada, o capitalismo, com instituições que, sobretudo através da democracia, venham a fazer...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) -... de nossa Nação uma sociedade civilizada, caracterizada por justiça. Daí a relevância de bem pensarmos em qual sistema tributário adequado, inclusive de como prover a cada com o suficiente para assegurar sua sobrevivência. Eis por que será importante logo chegarmos às formas de financiamento de uma renda básica incondicional para todo e qualquer brasileiro e até para os estrangeiros aqui residentes há cinco anos ou mais. Quero cumprimentá-lo por trazer aqui essa reflexão importante sobre a contribuição deste economista Thomas Piketty. Parabéns.

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco Maioria/PMDB - SC) - Agradeço o aparte de V. Exª. Queria destacar alguns aspectos do livro do Professor Thomas Piketty, O Capital no Século 21. O primeiro aspecto é que, assim como há concentração de renda dentro dos países, há uma concentração de renda nos países mais avançados, esvaindo as economias dos países periféricos através de ganhos de capital, de transferência de juros, de lucros etc.

            O segundo aspecto que gostaria de estabelecer no aparte de V. Exª é que Thomas Piketty diz claramente que é uma ilusão pretender que o mercado resolva os problemas da desigualdade.

(Soa a campainha.)

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco Maioria/PMDB - SC) - Os problemas da desigualdade têm que ser resolvidos pela intervenção governamental, pela regulação governamental, pela ação dos congressos, como o nosso, dentro até da teoria da Encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, de que, nas relações entre o cidadão e o mercado, se se estabelecia o peso maior do mercado em uma balança, era preciso colocar o peso do governo na outra para estabelecer o equilíbrio social.

            E a terceira questão que ele menciona aqui: só há uma fórmula para reduzir a desigualdade; só há uma fórmula para produzir o acesso das categorias menos assalariadas em direção...

(Soa a campainha.)

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco Maioria/PMDB - SC) - ... a uma qualidade de vida melhor: é através do tributo progressivo, e, nesse ponto, ele elogia - V. Exª pode ver que, no livro dele, ele elogia - o Imposto de Renda brasileiro, que é progressivo, embora ele entenda que a taxa maior do nosso imposto é muito mais baixa do que a praticada nos Estados Unidos, que chegava a 90% e foi reduzida para 40% nos últimos anos.

            Então, é efetivamente uma obra revolucionária, como foi a de Adam Smith, como foi a de Malthus, como foi a David Ricardo, no passado, a obra de Thomas Piketty é realmente uma obra revolucionária sobre a qual devemos nos debruçar.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2014 - Página 27