Discurso durante a 77ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca do tratamento do câncer no Brasil.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Considerações acerca do tratamento do câncer no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 23/05/2014 - Página 163
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI, RELATOR, ORADOR, OBJETIVO, MELHORIA, EFICIENCIA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), RELAÇÃO, TRATAMENTO MEDICO, DOENÇA, CANCER, DEFESA, IMPORTANCIA, AJUSTE, MARCO REGULATORIO, PROJETO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente desta sessão, Senador Ruben Figueiró, agradeço imensamente sua generosa referência, mas atribuo isso à sua relação com um amigo comum, o Pompílio, lá do Mato Grosso do Sul.

            Então, como o senhor diz ser um “matucho”, que é aquele do Mato Grosso do Sul com ascendência gaúcha, então essa referência eu atribuo a essa relação muito afetiva entre gaúchos e mato-grossenses-do-sul.

            O SR. PRESIDENTE (Ruben Figueiró. Bloco Minoria/PSDB - MS) - Senadora Ana Amélia, tenha V. Exª a certeza de que o mesmo respeito que Pompílio e os mato-grossenses-do-sul têm por V. Exª a Nação também o tem.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Muito obrigada, meu caro Senador. Isso é estimulante esta hora da tarde, após termos passado a manhã, na Comissão de Agricultura, juntamente com o senhor, às 8 horas, discutindo temas de interesse nacional e, depois, na sequência, na Comissão de Relações Exteriores, discutindo questão de política externa.

            Finalmente, venho a esta tribuna para tratar de uma questão crucial, que é o da saúde pública. Para mim, em especial, ele é um tema muito caro, porque fui Relatora, nesta Casa, da famosa Lei dos 60 Dias. Sessenta dias é o prazo para que o SUS inicie o tratamento para o câncer dos pacientes portadores dessa doença de todos os tipos.

            E V. Exª também tem na família uma das maiores autoridades na área do câncer, um oncologista, o Dr. Paulo Hoff, que tive a honra de conhecer pessoalmente em várias das audiências públicas.

            Então, mais uma admiração aumenta o conhecimento e a relação pessoal que temos, caro Senador Ruben Figueiró.

            Fabrícia Magalhães é uma professora do Ensino Fundamental de São Paulo que descobriu um nódulo na mama aos 37 anos. Essa jovem é a personagem real da série de reportagens do Dr. Dráuzio Varella sobre o câncer de mama, iniciada, há menos de um mês, pelo programa Fantástico, exibido aos domingos, na TV Globo.

            O drama da Professora Fabrícia, que tem sido acompanhado por muitos brasileiros pela televisão e na internet, é o mesmo sentido por muitas mulheres brasileiras: correr contra o tempo e enfrentar as dificuldades impostas pela doença para alcançar a esperada cura do câncer de mama, um dos mais curáveis, se identificado precocemente e se o tratamento, igualmente, for iniciado no tempo certo, porém um dos cânceres que mais matam quando o tratamento é feito com atraso ou fora do tempo adequado.

            E falo disso com conhecimento de causa. Perdi uma irmã, aos 44 anos, vítima de um câncer de mama violento, mas tenho uma que é uma vitoriosa, porque, há 12 anos ou mais do que isso, sobreviveu ao câncer e ajuda pessoas portadoras de câncer a enfrentar essa doença.

            É para pessoas como a Fabrícia e a minha irmã que sobreviveu, para todas as vitoriosas que sofreram o câncer de mama ou que passam ou irão passar por essa difícil situação de luta contra o câncer que a Comissão de Assuntos Sociais do Senado fez, hoje, 22 de maio, uma ampla e necessária audiência pública, requerida por mim, com autoridades, para examinar os problemas na aplicação da Lei nº 12. 732, de 2012, da qual fui Relatora.

            Esse recente marco legal, que foi sancionado sem vetos pela Presidente Dilma Rousseff, completa exatamente hoje o seu primeiro ano de implementação, estabelecendo o prazo de até 60 dias para que o Sistema Único de Saúde inicie, obrigatoriamente, qualquer tratamento contra o câncer, independentemente da localidade, seja no nosso Rio grande do Sul, Senador Paulo Paim, seja em qualquer outro Estado brasileiro.

            Hoje, a Lei não está sendo aplicada na sua integralidade, como admitiram todos os expositores convidados, entre os quais os Subprocuradores-Gerais da República Eitel Santiago de Brito Pereira e Francisco Rodrigues dos Santos Sobrinho e o Procurador Regional da República Waldir Alves.

            O Secretário de Controle Externo da Saúde do Tribunal de Contas da União, Marcelo André Barbosa da Rocha Chaves, e o oncologista e representante da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, Bruno Carvalho de Oliveira, também participaram do debate. Outros especialistas que fizeram parte desse diálogo foram a Presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama, Femama, Drª Maira Caleffi, mastologista, o Diretor Jurídico do Instituto Oncoguia, Tiago Farina Matos, e a Coordenadora-Geral de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas do Ministério da Saúde, médica Patrícia Sampaio Chueiri.

            Ficou claro, Senador Paulo Paim, nesse debate intermediado pelo Legislativo, que o efetivo funcionamento das novas leis para os pacientes com câncer depende, em grande parte, de gestão, portanto do trabalho do Poder Executivo, incluindo aí a União, os Estados e os Municípios. Por isso a importância da regulamentação dos dispositivos com textos claros e precisos, afinados com a intenção dos legisladores e com a expectativa sobretudo dos pacientes em relação aos seus direitos.

            Esse regramento, que também é de responsabilidade do Governo Federal, deve evitar a judicialização da saúde em nosso País.

            Aliás, Senador Paulo Paim, eu renovei publicamente, hoje, a sua generosidade em ter permitido que a sua audiência pública, que estava marcada para hoje, fosse feita em outro dia para que nós pudéssemos fazer hoje, dia 22 de maio, essa audiência, em função de ser hoje a data do primeiro ano da Lei dos 60 Dias. Então, eu fiz esse registro publicamente lá e o repito aqui, porque essas coisas precisam ser ditas como elas são, em reconhecimento à sua forma de entender que essa era uma questão muito séria e merecia o atendimento.

            Então, mais uma vez, muito obrigada, Senador Paulo Paim.

            Por isso, acordamos que o Ministério da Saúde fará ajustes, Senador Ruben Figueiró, ajustes na portaria que regulamentou a Lei dos 60 Dias.

            Precisaremos, ainda, manter um diálogo construtivo e proativo, pois os pacientes não podem ser os mais afetados por interpretações equivocadas sobre os marcos legais vigentes, como foi o caso do art. 3o da referida portaria. Aliás, é muito importante a admissão, pelo Ministério da Saúde, na palavra da Dra Patrícia, de que o Ministério está examinando a retirada desse art. 3o, o que vai dar mais tranquilidade e maior efetividade à implementação da lei para o acesso ao tratamento até 60 dias após o diagnóstico. Quanto mais burocrática e complexa for a regulamentação, maior a demora, menor seu entendimento. “Quem tem câncer não pode esperar”. Isto foi o que repetiram, em coro, os representantes do Ministério Público Federal ali presentes, com uma valiosíssima contribuição pelo trabalho que vêm realizando no resgate do direito da sociedade, um direito que a lei assegura ao cidadão.

            É nítido que os modernos marcos legais contra o câncer precisam do empenho de todos os representantes do setor público, cada qual com a sua atribuição, e da intensa participação do setor privado. Só deste modo os pacientes com câncer conseguirão aumentar de fato as chances de sobrevida. É preciso derrotar essa doença que tanto preocupa e amedronta não só as mulheres, mas também os homens, afetados pelo câncer de próstata.

            A legislação e seus devidos regramentos precisam ser aliados da população, principalmente quanto às políticas nacionais de saúde.

            Nesta quarta-feira, inclusive, ontem, foi divulgado um preocupante estudo internacional da revista JAMA Surgery, dos Estados Unidos, que mostra o seguinte: a maioria das mulheres que optam por fazer uma dupla mastectomia, depois de serem diagnosticadas com câncer de mama, não tem indicação clínica para fazer o procedimento, porque apenas uma mama está contaminada. A possibilidade de retirar as duas mamas após o diagnóstico de câncer em uma delas só é apresentada pelas equipes médicas para aquelas mulheres com histórico familiar da doença ou com mutação genética, que determina maior risco de o câncer vir a aparecer nas duas mamas. Este foi o caso da festejada atriz Angelina Jolie. Aliás, eu me referi a esse tema hoje, na audiência pública. No caso dela, a cirurgia foi recomendada. É uma exceção, e não uma regra. Todos os antecedentes familiares... A avó e a mãe tiveram câncer de mama. Então ela tinha maiores chances de também contrair o câncer de mama e tomou a decisão radical porque disse que queria cuidar dos filhos e estar viva para essa missão tão nobre.

            Apenas para um pequeno grupo há evidências científicas de que a retirada dos dois seios prolonga a sobrevida livre da doença. O estudo, entretanto, apontou que 68,9% das mulheres que optam pelo procedimento de retirada das duas mamas não se enquadravam nesse perfil.

            É aquilo que a Drª Maira Caleffi falou: já que estamos tirando uma, vamos tirar a outra. Quer dizer, é uma atitude simplista demais em se tratando de uma coisa tão séria quanto a saúde. Então, se não há risco de contaminação de uma das mamas sadias, não há por que retirar essa mama sadia. Tira-se a contaminada, faz-se a quimioterapia, a radioterapia, a quimioterapia oral, e recompõe-se, restitui-se, recupera-se essa mama, e segue a vida normal. Seria uma dupla mutilação, portanto desnecessária.

            Lamentavelmente, lamentavelmente, quando questionei a Drª Maira Caleffi, que é mastologista, Presidente da Femama, ela admitiu que o Brasil também já está, lamentavelmente, neste mesmo caminho. Ou seja, muitas cirurgias não são necessárias, o que é agravante para a saúde das mulheres.

            Esse estudo, feito nos Estados Unidos, avaliou 1.447 mulheres americanas diagnosticadas com câncer de mama, com idade média de 59 anos. Do total, 7,9%, quase 8%, optaram pela retirada das duas mamas. De acordo com os médicos, ao retirar uma mama saudável, a paciente aumenta as chances de ocorrência de infecção e de necrose. Existe o risco, inclusive, de a mulher ter de retirar a prótese caso haja complicação. Além disso, é possível que ocorra a perda de sensibilidade da mama, o que pode afetar até as questões relacionadas à sexualidade.

            Vale lembrar, ainda, que o Parlamento brasileiro já trabalhou em favor de outra legislação sobre o tratamento do câncer de mama: é a Lei nº 12.802, de 2013, da qual participei como relatora, que garante às vítimas de câncer a reconstituição imediata das mamas.

            Essa lei era de iniciativa da Deputada Rebecca Garcia e eu fui relatora aqui no Senado. E, da mesma forma, a Presidente Dilma Rousseff, com sensibilidade social, a sancionou sem vetos.

            Por isso, reforço a importância da clareza quanto à regulamentação das leis. A legislação é uma referência, um parâmetro. Por isso, deve ser regulamentada como tal, sem erros ou chances para duplas interpretações.

            Isso é importante para todos indistintamente, para que a compreensão da lei seja não só para os advogados, os doutos senhores da lei, para os cientistas das ciências jurídicas, mas para o cidadão comum, que pode ler uma lei e saber ali o que está escrito, como direito seu.

            Esse artigo sobre a regulação da Lei dos 60 Dias, por exemplo, traz dúvidas sobre a eficácia dessa própria lei. Por isso, a importância de agilizar a revogação do dispositivo, o art. 3º, uma vez que a própria representante do Ministério da Saúde admitiu que esse artigo fosse inadequado. Essa foi a melhor notícia que foi dada. A Drª Patrícia Chueiri também se prontificou em agilizar a retirada do art. 3º dessa portaria.

            Enquanto a ciência e as pesquisas se modernizam, a legislação e suas consequentes regulamentações também precisam de ajustes. Como sempre tenho dito, com base nas análises e pesquisas médicas, a agilidade para tratar o câncer é o que fará a diferença entre a vida e a morte dos pacientes diagnosticados com essa doença.

            É importante recordar, Presidente, outras leis sobre o câncer que estão em vigor, como a Lei nº 12.880, de 2013, de minha autoria, que trata de estabelecer a quimioterapia oral em casa. Esse marco legal legitima e estabelece, de modo definitivo e irrevogável, o direito aos doentes de câncer de todo o Brasil que têm plano de saúde para o tratamento com medicamentos orais em domicílio, permitindo melhor acompanhamento dos pacientes por familiares e amigos e, portanto, ampliando o acesso às opções mais eficientes de tratamento contra o câncer. Nesse caso, a lei é específica para os clientes dos planos de saúde, que terão de fornecer a quimioterapia oral. A quimioterapia oral é o comprimido que ele toma em casa, portanto, sem riscos de algum efeito colateral.

            Como lembrou, neste plenário, o Presidente desta Casa, Renan Calheiros, essa iniciativa...

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - ... legislativa teve amplo e absoluto apoio das duas Casas do Congresso Nacional, tanto na Câmara quanto aqui, no Senado, em vigor desde o último dia 12 de maio. É um marco legal que deve beneficiar mais de um milhão de pacientes com câncer que têm planos de saúde no Brasil. Também nesse caso, a Presidente Dilma Rousseff sancionou a minha lei sem vetos, permitindo, então, que ela entre em vigor agora, neste mês.

            A partir de 13 de maio, uma data simbólica, todos os procedimentos obrigatórios de novos medicamentos contra o câncer definidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar ficam acessíveis aos usuários de planos de saúde.

            Também neste debate, Senador Ruben Figueiró, o Dr. Paulo Hoff teve um papel muito importante, porque ele mostrou que, hoje, o percentual de quimioterapia oral indicado num receituário para o tratamento de câncer já é bastante grande, comparado com duas décadas atrás. A tendência é que 70%, 80% de todo o controle terapêutico seja através da quimioterapia oral, graças ao avanço que a ciência e a indústria de medicamentos vêm fazendo nesse âmbito.

            A Agência Nacional de Saúde tem, segundo a nova lei, que estar obrigatoriamente controlando e tornando acessível ao usuário de planos de saúde, essa medicação, que é a quimioterapia oral. É, a meu juízo, um avanço importantíssimo para melhorar as políticas públicas de saúde em nosso País e compartilhar os gastos não só com o SUS, mas também com o setor privado

            As "sementes" dessa lei foram plantadas em 2011, em audiência pública realizada na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, por sugestão do Oncoguia, presidido pela Drª Luciana Holtz. Nesta audiência, o Dr. Paulo Hoff esteve presente. Passados, portanto, mais de dois anos, em vez de uma norma com pouco tempo de validade, como costumam ser as resoluções ou portarias das agências reguladoras, o Legislativo decidiu aprovar, em tempo incomum e recorde, uma lei com mais força e, portanto, com durabilidade, que sensibilizou a Presidência da República, que sabiamente acatou sem vetos esta lei da quimioterapia oral.

            Isso demonstra a importância do Legislativo, em conjunto com as demais instituições públicas, para o melhor atendimento às necessidades básicas de saúde das pessoas.

            Temos, portanto, conseguido superar as barreiras da burocracia, dos fortes lobbies e das limitações de tempo, para aprovar um dos anseios mais destacados pela população, que é melhor qualidade dos serviços de saúde.

            É importante relembrar - estou terminando, Presidente - que aproximadamente 40% dos tratamentos oncológicos empregam medicamentos de uso domiciliar, como eu referi há pouco. Em 15 anos, 80% dos casos serão tratados em casa, reforçando a importância dos marcos legais sobre o câncer. Cito avaliação do cirurgião Wanderley Fernandes, da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), da Universidade de Brasília e membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica.

            Segundo esse especialista em câncer, a sobrevida aos tumores é diretamente proporcional ao tratamento precoce e sob evidências científicas comprovadas. Ele cita, inclusive, Bruce Minsky, renomado radioterapeuta da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, que costuma dizer o seguinte: "Em oncologia, o tempo é o senhor da razão entre a cura e o sofrimento. Diagnostica câncer quem nele pensa frente a qualquer sintoma".

            Para encerrar, cito a declaração da gaúcha Rita de Cássia Mascarenhas, que foi diagnosticada com câncer de mama aos 39 anos.

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Como ela mesma disse, em vídeo exibido na audiência pública da manhã de hoje, ter sido diagnostica com câncer foi a pior notícia que ela recebeu na sua vida. Compreende-se isso, é claro. Por isso, segundo essa paciente, todos têm o direito de fazer o tratamento contra o câncer pelo Sistema Único de Saúde.

            Ajudar para que os doentes de câncer atravessem esse momento de uma forma mais digna e humana é, portanto, uma responsabilidade de todos nós. Da mesma forma, o Ministério da Saúde também já admitiu alterar as portarias que tratavam de fazer limitações às mamografias com a variação de idade das mulheres.

            Com isso, estamos entendendo que prevenção também é um bom remédio para a cura de uma doença tão grave como é o câncer.

            Muito obrigada, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/05/2014 - Página 163