Comunicação inadiável durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pelo anúncio da aposentadoria do Presidente do STF, Joaquim Barbosa, com destaque para as ameaças desferidas contra o ministro.

Autor
Jarbas Vasconcelos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PE)
Nome completo: Jarbas de Andrade Vasconcelos
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
JUDICIARIO, CORRUPÇÃO.:
  • Lamento pelo anúncio da aposentadoria do Presidente do STF, Joaquim Barbosa, com destaque para as ameaças desferidas contra o ministro.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 04/06/2014 - Página 55
Assunto
Outros > JUDICIARIO, CORRUPÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, JOAQUIM BARBOSA, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ANUNCIO, APOSENTADORIA, MOTIVO, OCORRENCIA, AMEAÇA, ELOGIO, ATUAÇÃO, MINISTRO, REFERENCIA, COMBATE, CORRUPÇÃO.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco Maioria/PMDB - PE. Para uma comunicação inadiável. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, quero hoje, prestar o meu tributo ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Joaquim Barbosa, que, na última quinta-feira, 29 de maio, anunciou sua aposentadoria antecipada, mesmo podendo permanecer mais uma década na Corte Suprema do País.

            É triste e aterrorizador que essa decisão tenha sido motivada por causa das ameaças e ataques que o Ministro sofreu. Ameaças de morte e de agressões, inconcebíveis e inadmissíveis num país que pretende fazer parte das nações mais desenvolvidas do Planeta. A sensação que nos causa uma atitude extremista e criminosa como essa de ameaçar o Presidente do Poder Judiciário é que, se os Poderes constituídos, especialmente o Congresso Nacional, não se levantarem em repúdio a essas agressões, o cidadão comum perderá qualquer esperança que possa ter de que a ética, a probidade e o zelo combativo pelo respeito à lei valha qualquer esforço da sua parte.

            Esse desfecho, Sr. Presidente, deve ser debitado na conta do Partido dos Trabalhadores, que estimulou de forma irresponsável seus apaniguados a não aceitarem o resultado do julgamento do escândalo do mensalão. Acharam pouco os recursos protelatórios e resolveram recorrer ao terrorismo e à perseguição política e pessoal ao Presidente do Supremo.

            Os petistas acreditavam que, pelo fato de Joaquim Barbosa ter sido indicado ao Supremo Tribunal Federal pelo ex-Presidente Lula, estava em débito com o partido. Subestimaram o espírito republicano desse mineiro nascido na cidade de Paracatu.

            A indicação à Suprema Corte de um país, Sr. Presidente, não pode servir de moeda de troca. É triste, muito triste observar quando esse tipo de acordo espúrio ganha espaço e passa a ser considerado como algo normal, que faz parte da paisagem de Brasília, haja vista as consequências trágicas das mais recentes indicações àquele Tribunal, que, ao mudar o entendimento dos magistrados anteriores, jogaram por terra anos e anos de trabalho que visava punir os malfeitores e criminosos do chamado Mensalão do PT, reduzindo-lhes as penas a pouquíssimos anos de prisão em regime de semiliberdade.

            O Partido dos Trabalhadores aparelhou as estatais, os fundos de pensão, as agências reguladoras, a Administração Pública Federal e agora direciona seus tentáculos para o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal de Contas da União, pensando, talvez, em dar andamento a uma possível revisão geral da Ação Penal nº 470, que condenou os seus mensaleiros. Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, poucas vezes antes, na história do Brasil, a alternância no poder foi tão necessária como agora, antes que o País se transforme em uma Venezuela ou uma Bolívia, admiradas pelo PT e mergulhadas em autoritarismo político e retrocesso econômico advindos da abominável figura bolivariana de Hugo Chávez.

            Srªs Senadoras e Srs. Senadores, qual a maior contribuição do Ministro Joaquim Barbosa durante esse período em que esteve no Supremo Tribunal Federal ao desenvolvimento do Brasil como nação? Como relator do processo do escândalo do mensalão e, posteriormente, como Presidente do Supremo Tribunal Federal, ele trabalhou para que a Justiça também funcionasse contra os poderosos, contra os chamados crimes do “colarinho branco” Não importa se esses criminosos se considerem de “esquerda”, de “direita” ou de “centro”.

            Os corruptos, Sr. Presidente, só professam a ideologia do dinheiro, do benefício pessoal em detrimento do interesse coletivo da sociedade, em especial dos mais pobres, que são aqueles que mais precisam das obras e dos serviços públicos de saúde, segurança, educação e transporte.

            Menos corrupção implica mais recursos disponíveis para os programas e ações sociais dos governos. O crime não pode compensar. Foi por isso que Joaquim Barbosa se tornou sinônimo de justiça contra os poderosos.

            A impunidade pode e deve ser combatida, mesmo quando estão no banco dos réus figuras importantes da República; mesmo que elas sejam defendidas por advogados experientes e pagos a preço de ouro.

            O Presidente do STF não é unanimidade, nem fez questão de ser. Devo reconhecer que, nesse aspecto, comungo da sua maneira de ser. O mestre Nelson Rodrigues cunhou uma frase que se transformou em chavão: "Toda unanimidade é burra". Quem a busca flerta com a mentira e com o totalitarismo político ou, no mínimo, quem sabe, com o "malandrismo” político, que ainda seduz muita gente neste nosso Brasil.

            Ataques como os desferidos contra Joaquim Barbosa já foram direcionados a outras figuras da história recente do Brasil, como os saudosos Ulysses Guimarães, Mário Covas e Itamar Franco. Cada um, à sua maneira, peitou os consensos, recorreu à ousadia e à teimosia como resistência aos poderosos de plantão. Entraram para a história como modelos a serem seguidos.

            Como disse a jornalista Eliane Cantanhêde, a passagem de Barbosa pelo Supremo foi "além de rápida, fulgurante e fora do padrão - como sua própria biografia".

            Não tenho noção dos obstáculos que Joaquim Barbosa teve de superar ao longo da vida, para chegar aonde chegou, mas admiro a forma como ele enfrentou tudo: sempre de cabeça erguida, sem fazer concessões, sem ceder aos caminhos fáceis daqueles que sempre concordaram com tudo e que evitam enfrentar as divergências.

            A verdadeira democracia não é construída de consensos imortais e irremovíveis. Na política, em determinados momentos, você pode se ver falando sozinho, mas estará tranquilo com a sua consciência.

            As principais características do Ministro Joaquim foram registradas no editorial que o jornal O Estado de S. Paulo publicou no último sábado, dia 31 de maio, intitulado "Dever cumprido".

            Passo a ler, Sr. Presidente, porque considero importantíssimo, um de seus trechos.

“Apesar disso, e ficando em evidência durante o julgamento do mensalão, Joaquim Barbosa esteve sempre longe de ser uma unanimidade nacional.

Isto se deveu, em parte, à aspereza de seu temperamento, sempre pronto a confrontar com contundência e, não raro, deselegância as divergências e as provocações. Mas deveu-se, também, à virulenta orquestração dos interesses político-partidários contrariados por sua meticulosa e sólida condução, na condição de Relator do julgamento do mensalão.”

            Srªs Senadoras, Srs. Senadores, quero encerrar esta minha homenagem ao Ministro Joaquim Barbosa lendo parte do texto-análise do pernambucano, seu xará, Joaquim Falcão, publicado na Folha de S.Paulo da última sexta-feira, 30 de maio.

“Sua estratégia jurídica no mensalão a todos espantou. Como toda boa estratégia, que nunca se anuncia, só ficou evidente depois. Manteve o julgamento no Supremo. Dividiu os acusados em grupos. Pareceu conhecer as 60 mil páginas melhor do que seus colegas. Capitalizou essa vantagem. Inovou nas doutrinas. Opôs a visão do todo aos advogados de cada réu. Focou no colocar na prisão, dispensou as condenações sem pena. Evitou prescrições. Venceu.

Não foram poucos os que, antes de ele ser presidente, diziam que o Ministro não gostava de trabalhar, que não estava preparado para o cargo e que não conhecia direito. Diriam hoje?

Denunciou como falta de honestidade intelectual os que acreditam que o Brasil não é racista. Se Lula o escolheu pelo regime de cotas, ele optou por não ser cota. Quando Lula o convidou para ir à África na comitiva presidencial, o que nunca antes fizera com nenhum presidente do Supremo, recusou o convite. Não se prestaria a marketing racial global.

Conduziu o Supremo com mão de ferro e obsessão casmurra. Na vida pública, é seco. Não se comunica por adjetivos, mas por atitudes. Diálogo não houve com as associações de classe dos magistrados. Contrariou colegas. Muito agiu unilateralmente. Por detrás dessas atitudes estaria a convicção de que a cordialidade do brasileiro é uma tática de conciliação dos poderosos. Não é homem de diplomacia e negociações.

            Assino embaixo, Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, tudo aquilo que meu amigo Joaquim Falcão escreveu.

            Peço permissão ao presidente, Senador Eduardo Suplicy, para ouvir o Senador Cristovam Buarque, que é conterrâneo de Joaquim Falcão e que, inclusive, trabalhou com ele.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Somos amigos. Senador, o senhor traz um tema muito oportuno, que a gente precisa discutir aqui. Primeiro os méritos do Ministro Barbosa. Não há dúvida de que ele foi um homem e é um homem de grandes méritos: sua combatividade, sua persistência, sua honestidade. Mas ao mesmo tempo eu gosto de analisar que o mérito dele seria insuficiente para fazê-lo a figura que é hoje se não fosse a debilidade nossa, dos políticos. Ele se transformou no símbolo que aí está por falta de outros, além do seu próprio mérito, sem dúvida alguma. É isso que merece uma reflexão, porque um Ministro do Supremo, que em geral deveria ser uma figura discreta na República, se transforma numa das figuras mais fulgurantes, como diz a jornalista Eliane Cantanhêde. É porque os outros se apagaram, nós nos apagamos. Então ele fulgura usando o seu talento, seu mérito, sua persistência. E isso exige uma reflexão, como eu disse. O senhor é daqueles que estava aqui no Congresso na época dos autênticos. A sensação que eu tenho hoje, Senador Jarbas, da maneira como o povo nos vê é como o povo via os militares no final da ditadura. Uma certa raiva, um certo desprezo até, um certo asco.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É essa a sensação que eu tenho da maneira como o povo nos vê, por não estarmos dando respostas às coisas concretas que precisam ser feitas. O Joaquim Barbosa fez, ele fez a coisa concreta. Ele esteve presente na hora certa, ele não se omitiu e ele deu a resposta. Nós não estamos dando respostas, nem à corrupção - que ele deu -, nem aos outros problemas desta Nação. Entramos num período de fingimentos. Nós estamos fingindo, nós fingimos que as coisas vão bem. Não vão bem, o povo está na rua. Muita gente achava que, quando os cem mil manifestantes de junho saíssem das ruas, as coisas se acalmariam. No lugar de uma de cem mil, hoje nós temos mil manifestações de cem. E mil manifestações de cem são mais demonstradoras da raiva, do...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) -... descontentamento... (Fora do microfone.) Por favor. Mil manifestações de cem são mais demonstradoras do descontentamento do que uma só de cem mil, a que todo mundo vai e volta para casa. Manifestações como essas mil de cem pessoas estão na rua todos os dias. Liga o rádio, e está ali: manifestação em tal lugar, em tal lugar, em tal lugar, em tal lugar. Esse sentimento de desconforto, de descontentamento e de raiva, de nós todos, pode levar a acontecer o que aconteceu com os militares, só que, com os militares, a gente sabia o que botar no lugar, que era a democracia. No regime atual, que é democrático, muito imperfeito, a gente não sabe exatamente o que colocar no lugar. Os próprios candidatos que estão aí não estão dizendo exatamente para o que vêm. As mensagens são do presente, que não vai mudar nada. E mais quatro anos disso vai ser muito ruim. De mudar para o passado em algumas coisas, o que não vai ser bom; cortar alguns pontos, como falou ontem aqui o Senador Requião. Ou uma proposta de futuro, que não chegou ainda, a gente não está vendo.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - O seu discurso traz a figura do Joaquim Barbosa, que merece, sim, que o Senador suba aqui para falar sobre a sua fulgurante, brilhante e enfática carreira, mas é um motivo para refletirmos por que é que ele, e não os políticos, é hoje a grande figura da República. Por quê? Porque a gente não está dando a resposta que o povo quer. E ele deu a resposta ao condenar os condenados pela corrupção. Ele deu a resposta. Nós não estamos dando. Essa é a grande diferença entre ele e nós. (Palmas.)

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco Maioria/PMDB - PE) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque. Suas contribuições sempre são muito valiosas e essa enriquece a minha fala.

            O País se encontra em uma situação de profunda mediocridade. Veja V. Exª que aqui, um só Senador preside duas comissões parlamentares de inquérito: uma comissão de Senadores e outra mista, de Senadores e Deputados, quando o Senado tem 81 Senadores. Tudo isso para atender a Base do Governo, para blindar a presidente Dilma, para não se investigar as acusações de corrupção na Petrobras.

(Soa a campainha.)

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco Maioria/PMDB - PE) - Esse símbolo em que se transformou o Ministro Joaquim Barbosa é porque ele cumpriu o dever. Fez o que deveria ser feito por qualquer homem de bem, que prezasse a ética, a honestidade; e, pela ausência de figuras públicas decentes e pela prática de corrupção desenfreada no Brasil, a figura do Ministro tornou-se ainda mais importante nesse cenário. Agora, quando ele deixa o Supremo Tribunal Federal, depois de uma grande contribuição, vai fazer muita falta. Muita falta!

            Espero, sinceramente, que o Ministro Joaquim Barbosa não deixe de contribuir com a causa pública do Brasil.

            Sei que ele não deseja participar do processo eleitoral deste ano e compreendo sua cautela e sua precaução diante de todos os ataques que sofreu e continua sofrendo, mas as eleições vão passar, e tenho certeza de que, independentemente do resultado das urnas, o País permanecerá carente de pessoas com a coragem pessoal e cívica do cidadão Joaquim Barbosa.

            Tenha a minha solidariedade e o meu respeito, Ministro.

            Era o que eu tinha a dizer. (Palmas.)

            Presidente, muito obrigado pela sua tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/06/2014 - Página 55