Discurso durante a 96ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da participação de S. Exª no XV Congresso Internacional da Rede Mundial da Renda Básica; e outros assuntos.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PROGRAMA DE GOVERNO, POLITICA SOCIO ECONOMICA. ATIVIDADE POLITICA :
  • Registro da participação de S. Exª no XV Congresso Internacional da Rede Mundial da Renda Básica; e outros assuntos.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2014 - Página 22
Assunto
Outros > PROGRAMA DE GOVERNO, POLITICA SOCIO ECONOMICA. ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • ANUNCIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, CONGRESSO INTERNACIONAL, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, CANADA, REFERENCIA, DEBATE, CRIAÇÃO, RENDA MINIMA, MUNDO, LEITURA, TEXTO, AUTOR, TEREZA CAMPELLO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, ASSUNTO, MENSAGEM (MSG), SAUDAÇÃO, CONGRESSO, COMENTARIO, HISTORIA, PROGRAMA ASSISTENCIAL, BOLSA FAMILIA, BRASIL.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, TEXTO, CONFERENCIA, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, EVOLUÇÃO, PROPOSTA, RENDA MINIMA, MUNDO, PROGRAMA, RENDA, CIDADANIA.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Ana Amélia, quero informar que, designado oficialmente para representar o Senado, eu sigo esta noite para Montreal, onde, de 26 a 29 de junho, participarei do XV Congresso Internacional da Basic Income Earth Network, Rede Mundial da Renda Básica, uma organização fundada em 1986 por inúmeros economistas e filósofos que, então, se reuniram na Universidade Católica de Louvain, na Bélgica.

            Ali o Prof. Philippe van Parijs, filósofo e economista, havia, em 1984, apresentado um trabalho no Colégio da Europa, em Bruges, que ganhou um prêmio do Rei da Bélgica por ser considerado o melhor trabalho.

            Eis que justamente Philippe van Parijs tinha apresentado um trabalho sobre as origens da proposta da garantia de uma renda mínima para todos, levando em conta desde pessoas do início da história da humanidade, a colaboração de grandes pensadores como Thomas More e, depois, Thomas Paine e dezenas de outros ao longo da História, como Bertrand Russell, que defenderam a proposição da garantia de uma renda.

            E, tendo convidado cerca de 50 economistas e filósofos com quem ele interagia, e isto ele fez depois de ter recebido um prêmio da ordem de US$4 mil que lhe possibilitou fazer essa reunião, eis que, em 1986, esses filósofos e economistas fundaram a Basic Income European Network, portanto, a Rede Europeia da Renda Básica, para se constituir um fórum de debate sobre todas as experiências de transferência de renda, de programas de garantia de renda, inclusive para propugnar que em cada nação se instituísse uma renda básica incondicional.

            Eu só vim a conhecer melhor este conceito depois de ter apresentado aqui, em 1991, o primeiro projeto de garantia de renda mínima através de um imposto de renda negativa. E contei, para isso, com a colaboração do Prof. Antônio Maria da Silveira, um dos pioneiros da proposição de uma garantia de renda no Brasil, no meio acadêmico, pois, em 1975, ele havia apresentado, na Revista Brasileira de Economia, a proposta de se instituir a garantia de uma renda mínima através de um imposto de renda negativo. E eu, que, desde os anos 70 e 80, sempre dialogava com Antônio Maria da Silveira, convidei-o para trabalhar comigo naquilo que veio a ser o primeiro projeto de garantia de renda mínima, que foi aprovado pelo Senado em 16 de dezembro de 1991, numa memorável sessão de debates em que, especialmente depois de um discurso extremamente bem feito e bonito do Senador José Paulo Bisol, do PSB do Rio Grande do Sul, um a um, todos os líderes, inclusive o então Líder do PSB aqui no Senado, Fernando Henrique Cardoso, encaminhasse a proposta, dizendo que o PSDB, mais do que um crédito em dinheiro, um crédito de confiança, vai votar a favor dessa proposta que ele considerou como uma “utopia realista” com os pés no chão e plenamente factível.

            Já naquele ano, em agosto de 1991, quando eu e Antônio Maria apresentamos essa proposta numa reunião de economistas simpáticos ao PT, em Belo Horizonte, José Márcio Camargo, Professor da PUC do Rio de Janeiro, disse: "Eduardo, é uma boa ideia, mas seria bom começarmos a garantia de uma renda mínima pelas famílias carentes que muitas vezes instam as suas crianças a trabalhar desde os sete, oito ou nove anos de idade, que, assim, deixam de ir à escola. Com isso, se nós garantirmos uma garantia de renda às famílias carentes e se as suas crianças estiverem indo à escola, estaremos contribuindo para quebrar o círculo vicioso da pobreza."

            Eis que, aqui na Universidade de Brasília, o ex-Reitor, Professor e hoje Senador, já Governador de Brasília, começou também a levantar a proposição.

            José Márcio Camargo escreveu, na Folha de S.Paulo, em dezembro de 1991 e outra vez em 1993, a sua proposta tal como ele havia elaborado naquele diálogo. E eis que, então, ao final de 1994, José Roberto Magalhães Teixeira, em Campinas, o Prefeito, encaminhou uma proposta de garantia de renda mínima relacionada às oportunidades de educação, ao mesmo tempo que meu amigo Cristovam Buarque - acho que ele vai lembrar disso - disse a mim, eu era Senador: "Eduardo, eu vou apresentar uma proposta de renda mínima na minha campanha e gostaria muito que você viesse aos meus comícios." E eu, com muito gosto e alegria, fui aos comícios.

            Eis que, em janeiro de 1995, em Paranoá, uma das localidades de Brasília e, por forma administrativa, Cristovam Buarque dava início aos primeiros projetos de garantia de renda mínima, associados às oportunidades de educação, a que ele também denominou de Bolsa Escola. E, assim, no primeiro semestre de 1995, tivemos as duas experiências pioneiras. Por isso, eu sempre coloco como pioneiros Cristovam Buarque e José Roberto Magalhães Teixeira, porque ambos iniciaram, em 1995, a aplicação dessa proposição que passou a ter resultados tão positivos e rápidos que fizeram com que, já em outubro, Antonio Palocci, Prefeito de Ribeirão Preto... Mas, depois, seguiram-se os Prefeitos de Belo Horizonte, de Belém, de Mundo Novo e de tantos outros Municípios que levaram adiante a proposta, até que surgiram aqui, na Câmara dos Deputados e no Senado, três posições em cada uma, para que o Governo Federal viesse a financiar os Municípios que adotassem programas naquela direção. E, então, aconteceu que, em 1996, eu propus ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que pudesse receber o Prof. Philippe Van Parijs que, inclusive, tendo vindo a Brasília, visitou o Governador Cristovam Buarque e tiveram um diálogo muito frutífero.

            O Prof. Philippe Van Parijs, então, levado a uma audiência, por mim, junto ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Paulo Renato Souza, momento em que disse ao Presidente que o importante seria o dia em que pudéssemos chegar (do seu ponto de vista) a uma renda básica incondicional para todos os habitantes de cada país. Mas, iniciar a garantia de uma renda para as famílias carentes, desde que suas crianças estejam indo à escola, é um bom começo, porque isso significará, afirmou Philippe Van Parijs ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, um investimento em capital humano. Foi, então, que, o Presidente Fernando Henrique deu o sinal verde para a aprovação daqueles seis projetos que foram apensados aos projetos do Deputado Nelson Marchezan, mais o do Pedro Wilson, o do Chico Vigilante e, aqui no Senado, os de Ney Suassuna, José Roberto Arruda e Renan Calheiros. Assim se iniciou a Lei nº 9.933, que financiava em 50% os Municípios que adotassem programas naquela direção.

            No primeiro ano seria um quinto de menor renda per capita dos Municípios; e no segundo, terceiro, quarto e quinto anos. Mas antes que se chegasse ao quinto ano, em 2001, através de medida provisória, o Presidente Fernando Henrique Cardoso simplesmente baixou a nova legislação segundo a qual o Governo Federal financiaria em 100% os gastos dos Municípios em programas de renda mínima associados à educação ou também denominados Bolsa Escola, em homenagem ao Senador Cristovam Buarque. Essa lei foi batizada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso de Lei José Roberto Magalhães Teixeira, porque o ex-Prefeito de Campinas foi, ao lado de Cristovam Buarque, pioneiro nessa trilha.

            Depois veio o Programa Bolsa-Alimentação, o Auxílio-Gás. No primeiro semestre de 2003, já no governo Lula, ele criou o Cartão Alimentação e eis que, em outubro de 2003, a equipe interministerial coordenada por Miriam Belchior, que trabalhava então no Palácio do Planalto, com a cooperação de pessoas que estavam nos diversos Ministérios - o do Combate à Fome, de José Graziano; o de Desenvolvimento Social, da Ministra Benedita da Silva; o do Planejamento; o da Fazenda; e outros -, resolveu unificar e racionalizar aqueles quatro programas no que veio a se tornar o Bolsa Família.

            Pois bem, eu quero dizer que, ainda no domingo, na Convenção Nacional do Partido dos Trabalhadores, ao encontrar a Ministra Tereza Campello, do Desenvolvimento Social, sugeri a ela que pudesse encaminhar uma mensagem do Governo brasileiro, em especial da Ministra do Desenvolvimento Social e do Combate à Fome, e também em nome da própria Presidenta Dilma Rousseff, de saudação ao congresso do qual eu participarei nesses próximos dias.

            E ela de pronto aceitou a sugestão e eu resolvi colocar como a introdução da minha palestra esta saudação da Ministra Tereza Campello ao Congresso Internacional da BIEN. E aqui o registro:

Gostaria de saudar a realização do 15º Congresso da Rede Internacional de Renda Básica nas figuras da Srª Sheila Regehr, Chair do Congresso (BICN) e do Sr. Karl Widerquist, Co-chair da Basic Income Earth Network. Quero também parabenizar a iniciativa de colocar a democratização da economia como o centro das discussões. Todos nós sabemos que, em primeiro lugar, políticas de proteção social devem ser a garantia de direitos para todos e possuem uma função humanitária de justiça aos povos. Numa segunda dimensão, especificamente em relação à garantia de renda, essas políticas são mecanismos estratégicos de estimulo à própria economia dos países e se apresentam como poderosos instrumentos de ação anticíclica de governos em tempos de crise. Mas, mais profundamente, esse conjunto de políticas aponta para um modelo de sociedade diferente da que vivemos hoje. Visam estimular que nossas nações sejam mais justas e nesse sentido, têm um papel central naquilo que o congresso aponta, de redemocratizar a própria economia. Foi isso que a Presidenta Dilma Rousseff definiu quando colocou o combate à pobreza como primeira prioridade de seu governo definindo o lema: País Rico é País sem Pobreza.

            E prossegue a Ministra Tereza Campello.

Em função disso, o Brasil teve a honra de ser colocado na condição de exemplo para muitos outros países e organismos internacionais. Foram os resultados obtidos em programas como o Bolsa-Família que, após 10 anos de existência, produziram dados, estatísticas e estudos e provaram as diversas dimensões de sua importância, A criação da iniciativa do WWP (World Without Poverty), entre muitas outras, somam-se na defesa deste caminho. A realização do 15° Congresso da Rede Internacional de Renda Cidadã e a escolha de seu tema como a "Redemocratização da economia" são iniciativas que precisam ser brindadas com toda a ênfase, pois também reforçam aquilo que queremos para nosso país e para todo o mundo.

Parabéns pelo Congresso e desejo a todos um excelente trabalho.

            Assim conclui a Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

            Vou ler essa mensagem a ela, logo antes de iniciar a palestra, que então irei fazer, a respeito dos 10,5 anos de experiência do Programa Bolsa Família no Brasil, desde que se iniciou, em outubro de 2003, até hoje, e também a respeito da perspectiva da Renda Básica de Cidadania incondicional no Brasil e no mundo.

            Eu aqui ressalto que, em outubro de 2003, o Presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva lançou o programa de transferência condicional de renda Bolsa Família como forma de erradicar a pobreza absoluta.

            Houve alguns ajustes desde então. Em junho de 2014, todas as famílias - portanto, hoje - com renda mensal de até R$154,00 per capita (o que implica uma situação de pobreza), com filhos dependentes menores de 15 anos e 11 meses de idade, bem como com adolescentes dos 16 aos 18 anos de idade são elegíveis para o programa. Famílias com gestantes ou mães amamentando são também elegíveis.

            Se a renda da família per capita não ultrapassar R$77,00 (indicando uma situação de extrema pobreza), ela recebe um pagamento básico de R$77,00 mais - e isto para todas as famílias com renda mensal per capita abaixo de R$154,00 por pessoa - então, R$35,00 por criança de até 15 anos e 11 meses, para até cinco ou mais filhos, além de R$42,00 para cada um ou dois adolescentes dos 16 aos 18 anos de idade. Para receber a transferência de renda, as famílias têm que demonstrar que os seus filhos de até seis anos de idade estão vacinados, de acordo com as regras do Ministério da Saúde, e estão indo regularmente aos postos de saúde do governo para os exames médicos. Além disso, crianças com idades entre seis e 16 anos devem frequentar a escola em pelo menos 85% das aulas. Os adolescentes devem apresentar a frequência de pelo menos 75% das aulas. Os pais, sempre que possível, devem participar de cursos de alfabetização ou cursos profissionalizantes.

            A criação do Bolsa Família unificou aqueles quatro programas de renda que mencionei. No momento de sua unificação, cerca de 5 milhões de famílias foram registradas no Bolsa Escola; 1,7 milhões no Bolsa Alimentação, 774 mil em Cartão Alimentação e 9,7 milhões no Auxílio-Gás. Muitos participantes estavam recebendo mais do que um benefício: em média, cada família participante era registrada em 1,8 programa.

            Em dezembro de 2003, o Programa Bolsa Família alcançou 3,5 milhões de famílias; em dezembro de 2005, 8,7 milhões; em junho de 2006, 11,2 milhões de famílias. Em dezembro de 2012, o programa registrou 13.902.155 e, em dezembro de 2013, 14.086.199 famílias beneficiárias. Em maio de 2014, último dado disponível no sítio eletrônico do Ministério do Desenvolvimento Social, as famílias beneficiárias eram 13.940.270, portanto com ligeiro decréscimo em relação a dezembro de 2013. Isso significa que, se levarmos em conta uma média de 3,5 membros por família, cerca de 50 milhões, ou um quarto da população atual do Brasil de 202 milhões de habitantes, estão sendo beneficiados pelo Programa Bolsa Família.

            Desde 2011, a Presidenta Dilma Rousseff lançou um esforço, apelando a todos os governos estaduais e municipais, bem como a todas as organizações e cidadãos na sociedade para exercer a busca ativa, ou seja, se soubermos de alguma família que receba até R$140,00 per capita por mês até maio de 2014, ou até R$154,00 per capita por mês a partir de 1º de junho de 2014...

            Vamos dar um exemplo: pai, mãe, oito crianças, oito filhos e filhas, dez pessoas na família. Se a sua renda não atingir dez vezes (R$1.540), é nosso deve informar a esse pai e a essa mãe dessa família: “Você tem o direito de se inscrever. Vá lá ao Centro de Referência de Assistência Social ou à Secretaria de Desenvolvimento Social do seu Município e se inscreva, porque, por lei, a sua família tem o direito de receber esse benefício.”

            De acordo com o sítio eletrônico do Ministério do Desenvolvimento Social, em janeiro de 2014, havia 18.618.493 famílias registradas em maio de 2013, com renda mensal per capita de até R$140,00. Dessas, 14.086.199 famílias, correspondendo a 75,66%, estavam sendo beneficiadas pelo programa.

            Já em fevereiro de 2014, havia 18.753.362 famílias, no Brasil, segundo o cadastro do próprio MDS, com renda mensal per capita de até R$140,00, que era o valor do Bolsa Família então. Dessas - o valor limite era de até R$140,00 -, em maio de 2014, havia 13.940.270 famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família, correspondendo a 74,33% das 27 Unidades da Federação.

            Em dezembro de 2013, existiam quatro Estados com uma proporção de mais de 80%; 16 Estados, entre 70% e 80%; e sete, entre 59% e 70%. Ao final desta palestra, estão as tabelas mostrando a cobertura do Bolsa Família nos Estados, no Distrito Federal e nas capitais.

            Ademais, desde 2013, a Presidenta Dilma Rousseff lançou o Brasil Carinhoso do Bolsa Família, por meio do qual, se a renda familiar mais o benefício do Programa Bolsa Família, dividido pelo número de membros da família, não chega a pelo menos R$70,00 (cerca de US$30,00), R$77,00 a partir de 1o de junho de 2014, então o Governo Federal complementará o necessário para a família receber pelo menos R$70,00 per capita até maio ou R$77,00 a partir de junho de 2014.

            Junto com outros instrumentos de políticas econômicas e sociais, tais como o aumento de 72% acima da inflação no valor do salário mínimo nos últimos dez anos, o esforço para aumentar as oportunidades de trabalho, 21,5 milhões de novos empregos foram criados em dez anos, bem como a expansão das oportunidades de assistência à saúde e à educação pública, o Programa Bolsa Família contribuiu significativamente para a diminuição da pobreza absoluta e da desigualdade no Brasil.

            O coeficiente de Gini de desigualdade, que havia alcançado 0,599, em 1995, e 0,601, em 1996, quando o Brasil estava entre os três países mais desiguais do mundo, diminuiu gradativamente a cada ano, de 0,594, em 2001; 0,587, em 2002; 0,581, em 2003; 0,569, em 2004; 0,566, em 2005; 0,559, em 2006; 0,544, em 2008; 0,530, em 2009; 0,529, em 2010; e 0,519, em 2012, o último coeficiente de Gini publicado pelo IBGE.

            Devido aos resultados positivos do Programa Bolsa Família, o Governo brasileiro, durante o Fórum Global da Segurança Social, em 13 de novembro, recebeu o Prêmio de Realização Extraordinária na Segurança Social. Nesta cerimônia, representando a Presidenta Dilma Rousseff, a Ministra Tereza Campello, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, enfatizou que o objetivo do programa é aliviar a fome e a pobreza, incluir as crianças na educação e reduzir a evasão escolar, e dar cobertura e acesso à saúde aos beneficiários, principalmente as crianças, as mulheres grávidas e as que estão amamentando.

            De acordo com o pronunciamento de Tereza Campello naquela oportunidade, a engenharia social do Bolsa Família pode ser resumida em três itens: um cadastro de famílias feito de forma simples, com informações declaradas pelas famílias, organizadas por cada um dos 5.570 Municípios do Brasil; cartão magnético e um sistema financeiro que permite a transferência de dinheiro diretamente aos beneficiários, sem intermediação, com controle e transparência; prioridade para as mulheres para serem as responsáveis pelo cartão. Elas decidem no que gastar, e a pesquisa do Ministério indica que elas são responsáveis pelo destino mais eficiente dos recursos: os filhos e filhas. E 83% dos titulares dos cartões são mulheres.

            A estratégia do Brasil Sem Miséria tem o Programa Bolsa Família como o principal veículo, juntamente com as outras ações, como cursos de qualificação profissional, o acesso à energia nas áreas rurais, os programas de habitação popular, como Minha Casa, Minha Vida, que já construiu mais de 3 milhões de casas ou apartamentos financiados em parcelas de longo prazo, ao longo de 10 anos, com taxas de juros relativamente baixas para a população de baixa renda - de até R$5 mil por mês.

            Apesar desses esforços e progressos, o Brasil, Presidente Ana Amélia, é ainda o 16º país mais desigual no mundo, de acordo com o Relatório do Banco Mundial, em 2012. De acordo com o Censo do IBGE de 2010, os 10% mais pobres viviam com 1,1% da renda nacional, enquanto os 10% mais ricos detinham 44,5% da mesma.

            Hoje, proporcionar o mínimo básico para brasileiros carentes requer um processo de verificação meticulosa de elegibilidade ao programa. Muitas vezes, como a imprensa tem relatado, é difícil verificar a renda de cada membro da família, especialmente aqueles que trabalham na economia informal.

            Como funciona o controle do Governo para possíveis variações sobre a situação econômica e a sua renda? Seriam suficientes os dados fornecidos pelas observações dos vizinhos e da imprensa, que monitoram os benefícios tangíveis do Bolsa Família a cada família? Existe uma maneira de resolver este problema e simplificar o processo de verificação? Sim, justamente na forma da Lei nº 10.835/2004, aprovada por todos os partidos no Congresso Nacional, em 2003, e sancionada pelo Presidente Lula em 8 de janeiro de 2004.

            E a lei menciona que Renda Básica de Cidadania será implementada por etapas, a critério do Poder Executivo, começando pelos mais necessitados, como, portanto, o faz o Bolsa Família, que atende hoje um quarto da população brasileira, até o dia em que todas as pessoas, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou socioeconômica, passarão a receber uma renda suficiente para atender, na medida do possível e com o progresso da Nação, as suas necessidades vitais. Até mesmo para os que temos mais, sim, obviamente os que temos mais vamos colaborar para que nós mesmos e todos os demais venham a receber.

            Com isso, eliminamos inteiramente a burocracia envolvida em ter que se saber quanto cada um ganha no mercado formal e informal. Eliminamos qualquer estigma ou sentimento de vergonha de uma pessoa precisar dizer: só recebo tanto, por isso mereço tal complemento de renda. Eliminamos o fenômeno da dependência, que acontece quando se tem o sistema que diz: quem não recebe até certo patamar tem o direito de receber tal complemento. E a pessoa está por decidir: “Vou ou não iniciar essa atividade que vai me render esse tanto? Mas, se eu iniciá-la, vem o Governo e me retira o que eu estava recebendo naquele programa. Talvez desista ou entre na armadilha da pobreza ou do desemprego”. Mas, se todos iniciarmos a Renda Básica em diante, sempre haverá o estímulo ao progresso.

            E, do ponto de vista da dignidade, da liberdade do ser humano, para aquela jovem que, às vezes, por falta de alternativas para dar o sustento adequado em casa, para a sua família, resolve vender o seu corpo, ou para o jovem que, pela mesma razão, resolve se tornar o aviãozinho da quadrilha de narcotraficantes, para essas pessoas, com a Renda Básica para si próprios e para todos na sua família, poderão passar a ter o direito de dizer: “Não, agora não vou aceitar essa única alternativa que vai ferir a minha dignidade, colocar minha saúde e vida em risco. Agora, posso aguardar um tempo, quem sabe fazer um curso aqui na minha cidade, até que surja uma oportunidade, mas de acordo com a minha vocação.”

            É nesse sentido, pois, exatamente o sentido de que nos fala Amartya Sen, em Desenvolvimento como Liberdade, que a Renda Básica de Cidadania vai elevar o grau de dignidade e liberdade para todos.

            Srª Presidente, vou pedir que possa ser inserido nos Anais da sessão a palestra completa, que é bastante longa, está com mais de 50 páginas e mostra toda a evolução da proposta da Renda Básica, fala das experiências positivas existentes, especialmente no Estado do Alasca, nos Estados Unidos, onde desde o início dos anos 80, de 1982 até hoje, se paga a cada ano - antes eram trezentos mil habitantes; agora, são setecentos e poucos mil habitantes - um dividendo igual para todos os seus habitantes, desde que eles residam ali há um ano ou mais. E qual foi o resultado? Em 1980, o Alasca era o mais desigual dos 50 Estados norte-americanos; agora, o Alasca é o mais igualitários dos 50 Estados norte-americanos.

            Então, do ponto de vista de se caminhar em direção à maior equidade, não há dúvidas, mas, nesse congresso a que irei, vou ouvir palestrantes, nos dias 27, 28 e 29 de junho, em Montreal, que falarão de como essa proposta vem ganhando cada vez mais respaldo intelectual. Com base nas pesquisas e nos estudos de um número crescente de economistas, filósofos e estudiosos, tanto do Canadá, dos Estados Unidos, quanto da Itália, da Indonésia, do Japão, e de diversos países da Ásia, da Coréia, do México, ali haverá um grande debate sobre a obra de Thomas Piketty, O Capital do Século 21, que tem alcançado enorme repercussão no mundo.

            Falar-se-á da política de gêneros, de o quanto que, por exemplo, para a mulher, a Renda Básica significará algo de extraordinária relevância. Estão inscritos e falarão ali também pessoas que descreverão a experiência de renda básica que houve nas vilas rurais da Índia, de Madhya Pradesh. Por dois anos, pagou-se uma renda básica de 300 rúpias, uma modesta renda básica, talvez em torno de US$20 a US$30 por mês, a todos os seus seis mil habitantes, e se compararam os efeitos desse pagamento de uma modesta renda igual para todos com o que aconteceu com seis mil habitantes de semelhantes vilas rurais da região de Madja Pradesh, na Índia. E os resultados da organização Self Employed Women’s Association, da Srª Renana Jhabvala, que vai expor ali, juntamente com o Prof. Guy Standing, são altamente positivos.

            Tanto eu quanto a Profª Maria Ozanira Silva e Silva, da Universidade Federal do Maranhão, iremos falar sobre a experiência da renda básica, especialmente no Brasil, mas também da Argentina e de outros países. Estará presente o Prof. Ruben Lovolo, do Centro Interdisciplinar para o Estudo das Políticas Públicas, que, há 20 anos, defende a renda básica na Argentina, juntamente com outros economistas e intelectuais.

            Haverá uma mesa redonda de debates para, por exemplo, estudarem-se as perspectivas para o gênero da renda básica, em que se discutirão, inclusive, os efeitos da renda básica para diminuir significativamente a prostituição em cada um dos países.

            Também se discutirá a crise econômica em países da Europa, como a Espanha, e como poderá a renda básica instituída contribuir enormemente para se resolverem os problemas dramáticos que ali têm acontecido, inclusive com efeitos positivos sobre o emprego.

            E também se estudará a renda básica numa cidade pequena...

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - ... com os efeitos que têm ocorrido. Ali eu vou falar como, em Santo Antônio do Pinhal e em outro Município do interior de São Paulo, já foi aprovada uma lei para iniciar uma experiência local.

            Também no Estado de Manitoba, no Canadá, está se considerando uma garantia de renda básica numa província do Canadá.

            Eu vou pedir também, Srª Presidente, que seja inscrita aqui na íntegra o Programa da Renda Básica de Cidadania. Ao final da minha palestra, eu concluo com a carta que encaminhei à Presidenta Dilma Rousseff, cuja resposta ainda estou aguardando, que foi apoiada aqui pelos 81 Senadores de todos os partidos no sentido de que ela crie um grupo de trabalho para estudar as etapas previstas na Lei 10.835, de 2004, para instituir a Renda Básica de Cidadania.

            Conforme V. Exª pôde notar - Senador Cristovam Buarque, com muita honra -, eu, nesses três dias do Congresso da BIEN, terei uma oportunidade de aprender ainda muito mais, de maneira a enriquecer os argumentos que eu aqui tenho falado.

            Senador Cristovam Buarque, com muita honra e prazer, concedo-lhe o aparte.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Primeiro, Senador, quero dizer que o senhor nos representa a todos nesse congresso, e ninguém melhor do que o senhor para nos representar. E fico feliz. Ao voltar, eu gostaria de não apenas conversar, mas ouvir discurso seu sobre o que foi conversado, decidido, e a troca de experiências. Mas eu lhe pedi aparte para lhe dizer que, no livro em que eu sugeri a ideia da Bolsa Escola, que então se chamava Renda Mínima Vinculada à Educação, eu ponho, com clareza, a inspiração na sua ideia de renda mínima. Então, foi a sua ideia de renda mínima que me trouxe a ideia de vincular à educação, que é uma coisa que não nos separa, mas apenas dá enfoques diferentes sobre o papel do pagamento de uma renda às famílias. Então, eu só quero aqui, de público, dizer que esse meu reconhecimento está no livro que se chama A Revolução nas Prioridades: da Modernidade Técnica à Modernidade Ética, Senadora Ana Amélia, que, na verdade, são 100 medidas para mudar o Brasil. Essas 100 medidas para mudar o Brasil, esse livro foi escrito no final dos anos 80 e começo dos anos 90. Foi distribuído e debatido muito em pequenas plaquetas e, em 94, saiu como livro publicado pela Editora Paz e Terra. Essas 100 medidas para mudar o Brasil foram divididas em 10 temas, 10 capítulos, e o primeiro capítulo é Educação, e a primeira medida é a implantação de uma renda mínima vinculada à educação. E foi nos seus discursos em que eu me inspirei, ainda como Reitor da Universidade de Brasília, ainda fora da política, para pensar nessa alternativa - não vou dizer que foi graças ao senhor apenas, nem graças a mim, nem graças ao Prefeito Magalhães - que hoje, graças a muita gente, incluindo Fernando Henrique Cardoso, o Presidente Lula e todos, transformou-se no programa da dimensão do Bolsa Família, sobre o qual cada um de nós pode ter críticas pontuais - eu mesmo tenho -, mas nenhum pode deixar de dizer que é um grande sucesso do ponto de vista da assistência imediata aos pobres e também da gestão de um programa tão grande, tão vasto, que abrange tantas pessoas. Esse programa, portanto, se eu dei uma contribuição, teve origem, no Brasil pelo menos, na sua firme defesa da renda mínima.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Muito grato, Senador Cristovam Buarque.

            O que eu espero é que nós possamos continuar colaborando, interagindo para o aperfeiçoamento da garantia de renda às pessoas no Brasil, para inclusive contribuir para que nosso País se torne uma Nação efetivamente fraterna, solidária. Quando isso ocorrer, tenho a convicção de que a instituição da renda básica contribuirá enormemente para a diminuição da violência criminal, que ontem aqui foi tema da reflexão de tantos - 56 mil assassinatos no último ano, uma coisa extraordinária. Certamente, os roubos, os assaltos, os assassinatos serão muito diminuídos.

            Eu também acredito muito que a instituição da renda básica, com tanto sucesso ali no Alasca, poderá ser um exemplo notável para que haja efetiva redemocratização e paz no Iraque.

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Eu estive lá em 2008, e, ainda mais, eles disseram que era uma ótima proposta, mas ainda não a implementaram, e eu vejo o Iraque novamente em erupção, em guerra civil.

            Eu quero dizer que inclusive tenho hoje a honra de receber um amigo, Obieben, dos Estados Unidos da América. Ele mora em Nova York com seu filho George, veio visitar o Brasil mais uma vez, ele é amigo do Brasil, da minha família há muitos anos, de meus filhos, da Marta, e veio mostrar o Brasil e a Copa do Mundo. Eles estão entusiasmados, mas o Obieben é um dos que se preocupam com a situação do Iraque, e tenho conversado com ele sobre como seria bom se, tal como o Irã começou a aplicar uma renda básica nesses últimos três anos, também o Iraque e outros países pudessem caminhar na direção de instituir uma renda básica para que pudéssemos ter a efetiva realização de justiça e paz, em nosso país e em todos os outros países.

            Muito obrigado pela atenção, Senadora e Presidenta Ana Amélia, querida colega nesta longa jornada por justiça.

            Senador Cristovam Buarque, muito obrigado por suas palavras.

 

DOCUMENTOS ENCAMINHADOS PELO SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

Matéria referida:

- Palestra da Ministra Tereza Campelo dirigida ao 15º Congresso BIEN;

- Programação do Congresso BIEN.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2014 - Página 22