Discurso durante a 115ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso de oito anos de existência da “Lei Maria da Penha” e comentários sobre outra propostas de defesa de gênero.

Autor
Ana Rita (PT - Partido dos Trabalhadores/ES)
Nome completo: Ana Rita Esgario
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO, LEGISLAÇÃO PENAL, SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Registro do transcurso de oito anos de existência da “Lei Maria da Penha” e comentários sobre outra propostas de defesa de gênero.
Aparteantes
Anibal Diniz.
Publicação
Publicação no DSF de 07/08/2014 - Página 30
Assunto
Outros > FEMINISMO, LEGISLAÇÃO PENAL, SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • REGISTRO, ANIVERSARIO, LEI MARIA DA PENHA, OBJETIVO, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, DEFESA, IMPLANTAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, BENEFICIO, FEMINISMO, INCENTIVO, INDEPENDENCIA, COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, AUMENTO, PENA, APLICAÇÃO, AUTOR, CRIME, IMPORTANCIA, EXTINÇÃO, VIOLENCIA DOMESTICA.

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, colegas Senadores, colegas Senadoras, expectadores e ouvintes da Rádio e TV Senado, público aqui presente, estou vendo que temos aqui a presença de muitos alunos, com certeza aqui, do DF, acompanhando a sessão de hoje, nesta quinta-feira, 7 de agosto, completam-se oito anos da sanção da Lei Maria da Penha pelo ex-Presidente Lula. A Lei nº 11.340, de 2006, dá cumprimento à Convenção para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, da OEA, bem como à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, da ONU. Ela é uma das mais importantes conquistas da nossa sociedade e das mulheres brasileiras, fruto das pressões do movimento feminista, dos movimentos de direitos humanos e de milhares de mulheres e de homens que lutaram e lutam para que a chaga da violência contra a mulher seja seriamente tratada.

            Reconhecida pela ONU como uma das três melhores legislações do mundo, a Lei Maria da Penha é inovadora. Uma das suas grandes inovações é tratar a violência doméstica e familiar como um tema complexo, é prever uma rede de atenção e assistência às mulheres em situação de violência. A lei sustenta-se em um tripé: prevenção, assistência e contenção. Se faltar um dos pés fica comprometida.

            Também foi a primeira resposta jurídica ampla a romper com o paradigma de que a violência doméstica é privada, ou seja, que em briga de marido e mulher não se mete a colher. Em briga de marido e mulher se mete a colher, sim!

            A lei, como muitos sabem, leva o nome da farmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que, em 1983, recebeu um tiro de seu marido e protagonizou um caso simbólico de violência doméstica e familiar.

            Embora com apoio significativo, dados do Instituto Patrícia Galvão e Data Popular mostram que 98% da população dizem conhecer a legislação. A implementação da lei trouxe à tona muitas resistências, e resistências que revelam e que revelaram a aceitação da violência doméstica como crime de menor poder ofensivo e reforçavam as relações de dominação do sistema patriarcal. É importante lembrar que a Lei Maria da Penha representou uma verdadeira guinada na história de impunidade e na cultura jurídica tradicional.

            Por meio da lei, vidas que seriam perdidas são salvas; mulheres em situação de violência ganham direito e proteção. Isso aliado ao fortalecimento da autonomia das mulheres. Contudo, a efetivação da lei e da sua aplicação ainda enfrenta muitos desafios.

            É importante entender que o tema da violência ou violências contra mulheres não diz respeito apenas às mulheres. O engajamento dos homens é fundamental, porque contribui para mostrar que uma nova masculinidade está em curso. Se os homens não reproduzirem relações violentas, avançaremos muito mais rapidamente para relações de afeto baseadas na igualdade e reconhecimento.

            É necessário também ampliar as políticas públicas que permitam restaurar a harmonia familiar e emancipar as mulheres social, econômica e psicologicamente. Além disso, intensificar e fortalecer o apoio às mulheres e oferecer serviços públicos gratuitos, para romper com o ciclo da violência doméstica e familiar, são fundamentais, assim como é necessária a aplicação pelos Estados e Municípios de mais recursos para a criação de secretarias estaduais e municipais, de políticas para as mulheres, mais delegacias especializadas, centros de referência, expansão das promotorias da mulher, entre outras estruturas públicas. Tudo isto mostra que ainda há muito trabalho para extirpar de vez do mapa a chaga da violência contra as mulheres.

            Dentro deste esforço, lembro que tramitam no Congresso Nacional 14 projetos apresentados pela CPMI da Violência Contra Mulheres, da qual fui Relatora. São propostas altamente importantes para conseguirmos avançar no enfrentamento à violência contra mulheres. Entre elas, destaco o importante PLS 292, de 2013, que inclui o feminicídio como qualificador do crime de homicídio no Código Penal - o projeto está pronto para ser votado em plenário.

            Outra proposta que considero muito importante, já aprovada aqui no Senado, encontra-se em tramitação na Câmara Federal. Trata-se da criação do Fundo Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher. Além do fundo de enfrentamento à violência doméstica, outras propostas da CPMI estão prontas para o Plenário da Câmara, como a que torna crime de tortura a violência doméstica, o PL 6.293, de 2013; a que determina que, em até 24 horas...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senadora Ana Rita, na linha do que V. Exª fez, cumprimento a moçada, já que eles estão saindo.

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES) - Sim.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - V. Exª já destacou: são estudantes do Centro de Ensino Fundamental nº 1, de Brazlândia, Distrito Federal. Sejam todos bem-vindos!

            A Senadora Ana Rita, uma das mais brilhantes Senadoras da Casa, preside a Comissão de Direitos Humanos e é do Espírito Santo.

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES) - Muito bem. Sejam sempre bem-vindos e bem-vindas ao Senado! É um prazer receber tantos alunos e professores do Distrito Federal e do entorno do Distrito Federal. Muito obrigada pela presença.

            Conforme eu ia dizendo, existe a proposta que também determina que, em até 24 horas do encaminhamento da vítima a abrigo, a Justiça e o Ministério Público devem ser comunicados para análise imediata dos requisitos de prisão preventiva do agressor - trata-se, Sr. Presidente, do PL 6.294, de 2013. E a que institui auxílio-transitório da Previdência para mulheres em risco social provocado por violência doméstica e familiar, o PL 6.296, de 2013.

            São todas matérias que não podem esperar. Todos os dias mulheres são assassinadas, são violentadas. Faço um apelo para que o Congresso Nacional aprove o mais rápido possível esses projetos, em especial, aos colegas Senadores e Senadoras para que aprovemos o projeto que inclui o feminicídio no Código Penal brasileiro.

            No Brasil, uma em cada cinco mulheres, 20%, já sofreu algum tipo de violência física, sexual ou outro abuso praticado por um homem. Nosso País é o sétimo que mais mata mulheres no mundo. Segundo o Mapa da Violência no Brasil, um estudo patrocinado pelo Instituto Sangari, com base em informações fornecidas pelo banco de dados do Sistema Único de Saúde, o Datasus, nos últimos 30 anos, foram assassinadas 91 mil mulheres, sendo 43 mil só na última década.

            Conforme o Mapa, as mulheres estão morrendo predominantemente no espaço doméstico. O lar, o doce lar, não é mais seguro: 68,8% dos homicídios ocorrem dentro de casa e são praticados pelos cônjuges. E, entre os Estados da Federação, o meu Estado, o Espírito Santo, ocupa o lamentável primeiro lugar em assassinatos contra mulheres: o nosso Estado responde por 9,8 homicídios em cada 100 mil mulheres, mais que o dobro da taxa nacional; e Vitória é a Ia capital mais violenta do País, com 13,2 homicídios para cada 100 mil mulheres.

            Já a pesquisa Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado, realizada pelo Sesc e a Fundação Perseu Abramo, projeta que a cada dois minutos, Sr. Presidente, cinco mulheres são agredidas violentamente no Brasil. Srªs Senadoras, Srs. Senadores, são dados alarmantes. Sem que a lei seja tomada como uma política de Estado, continuaremos a ter problemas.

            Só iremos superá-los, se, efetivamente, a legislação for assumida por todas e todos. Se não criarmos mecanismos eficientes, para colocá-la em prática, a legislação se torna inócua e continuamos vulneráveis. Enfrentar a violência contra mulheres requer tomar em sério o tema.

            Lembro que, em nosso relatório final da CPMI da Violência contra as Mulheres, apontamos medidas concretas de superação ao atual estado de banalização da violência. Fizemos sugestões aos Governos Federal e estaduais, ao Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública. Conforme diagnosticado pela CPMI, é necessário que Estados e Municípios elaborem políticas públicas destinadas a enfrentar essa chaga social.

            Dentro deste contexto, quero elogiar ações do Governo da Presidenta Dilma, e merece destaque o Programa Mulher, Viver sem Violência executado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres: um investimento de R$226 milhões para prestar todo o tipo de assistência às mulheres em situação de violência, na chamada Casa da Mulher Brasileira. A casa é um espaço que reúne Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams); juizados e varas; defensorias; promotorias; equipe psicossocial, com psicólogas, assistentes sociais, sociólogas e educadoras, para identificar perspectivas de vida da mulher e prestar acompanhamento permanente; e equipe para orientação ao emprego e renda; e a estrutura física conta com brinquedoteca e espaço de convivência para as mulheres.

            Sem dúvida, Sr. Presidente, é uma grande iniciativa do Governo da Presidenta Dilma para o enfrentamento a todas as formas de violência contra mulheres. Compromisso e atitude, este é o caminho para superarmos a violência contra mulheres.

            Era isso, Sr. Presidente, que eu gostaria de lembrar nesta data de hoje, sendo que amanhã, dia 7, estaremos aqui celebrando o aniversário da Lei Maria da Penha.

            O Sr. Anibal Diniz (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Senadora Ana Rita.

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES) - São oito anos de sanção da lei pelo Presidente Lula. E é importante, Senador Anibal, vou conceder a palavra a V. Exª, lembrar que a legislação é necessária.

            Nós temos uma legislação importante, que é a Lei Maria da Penha, altamente elogiada pelos demais países do mundo, construída com a participação de diversas mulheres, dos movimentos sociais de mulheres. No entanto, ela ainda não está sendo implementada do jeito que precisa ser. Para que ela seja, de fato, implementada, é preciso compromisso - é preciso compromisso! - cada vez maior não só do nosso Governo, que tem feito a sua parte, mas é preciso, sobretudo, compromisso dos governos estaduais e municipais. Se não houver um comprometimento do Poder Executivo, do Poder Judiciário, do Ministério Público, das defensorias públicas, a lei vai continuar no papel.

            É importante registrar que já tivemos alguns avanços em diversos Estados, com contratação de profissionais, contratação de defensores públicos, constituição de novas varas especializadas. Mas o nosso País é imenso, e a violência contra as mulheres ainda é muito grande. Então, nós precisamos que haja um olhar atento, preferencial, prioritário por parte dos nossos gestores.

            Investir no enfrentamento da violência contra as mulheres é salvar vidas, inclusive, Sr. Presidente, de crianças e adolescentes, que muitas vezes convivem com um ambiente de violência permanente dentro de casa. E nós contribuiremos para termos adultos também violentos se nós não enfrentarmos essa chaga.

            Então, fica aqui o nosso apelo, nosso pedido. É um pedido de alguém que fala em nome de várias mulheres, porque, como Relatora da CPMI, eu me sinto responsável por continuar cobrando e exigindo que a Lei Maria da Penha seja aplicada, porque tive a oportunidade de dialogar, de presenciar diversos depoimentos, e depoimentos que nos marcaram durante o período da CPMI, Senador Paulo Paim, de mulheres que vivem num tormento imenso por causa da violência, que é muito constante em suas vidas. Então faço esse apelo.

            Contamos aqui com a colaboração, com o apoio, com o compromisso dos nossos colegas Senadores e Senadoras, para que aquilo que está ainda tramitando nesta Casa possa ser aprovado. E aí poderemos cobrar com firmeza a implementação dessas leis e desses projetos que conseguimos elaborar, por meio da CPMI, que vão fortalecer a implementação da Lei Maria da Penha.

            Eu concedo a palavra, meu tempo já está se esgotando, ao Senador Anibal Diniz.

            O Sr. Anibal Diniz (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Obrigado, Senadora Ana Rita, por me conceder este aparte. Eu quero cumprimentá-la pela qualidade e precisão de seu pronunciamento, fazendo um esforço histórico no sentido de resgatar, desde o surgimento da Lei Maria da Penha, desde a situação causadora dessa nomenclatura, e dizer que esse aumento ou permanência da violência contra a mulher no Brasil é algo a que nós temos de estar permanentemente nos opondo. A gente tem de se contrapor a isso, porque, verdadeiramente, não se admite, ainda, com todos os instrumentos que foram criados - a própria Lei Maria da Penha -, com toda a evolução educacional e cultura de nosso País, a gente não tem como conviver passivamente com essa escalada da violência contra a mulher. Eu sou da opinião de que a gente... Todos os esforços são bem-vindos, todos os esforços precisam ser empreendidos no sentido de combater a violência, mas também a gente precisa criar instrumentos para maior equilíbrio de gênero e maior representatividade da mulher nas instâncias de poder, porque, quanto mais a gente tiver equilíbrio de gênero, eu acredito que menos violência haverá e menos discriminação haverá. Inclusive, Senadora Ana Rita, eu tenho feito muita questão de fazer menção ao projeto que apresentei aqui no Senado, que tenta contribuir para esse equilíbrio de gênero, para que, nas eleições com duas vagas para o Senado, a gente possa ter equilíbrio de gênero com uma vaga destinada às mulheres e outra vaga destinada aos homens. Senador Siba Machado também apresentou uma proposição na Câmara dos Deputados...

            (Soa a campainha.)

            O Sr. Anibal Diniz (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... no sentido de que os 30% hoje assegurados, digamos assim, às chapas proporcionais, possam se converter em vagas efetivas no Parlamento. Dessa maneira, a gente pode contribuir para tirar o Brasil desta situação vexatória: o Brasil hoje está na 158ª posição no ranking mundial de presença da mulher no Parlamento. E nós temos de dar uma resposta a isso, abrindo a possibilidade para que haja maior presença da mulher no Parlamento. Eu tenho certeza de que, dessa maneira, a gente estará contribuindo também para diminuir a violência e para diminuir a discriminação contra a mulher no Brasil. Parabéns a V. Exª pela precisão do pronunciamento.

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES) - Agradeço profundamente ao Senador Anibal Diniz que tem sido um parceiro, juntamente com outros Senadores e Senadoras, como o Senador Paulo Paim, Senadora Maria do Carmo, Senador Mário Couto e diversos outros que se fazem presentes aqui e são parceiros nessa luta. Mas o Senador Anibal Diniz tem uma preocupação com a representação política das mulheres, e o Projeto de V. Exª vem fortalecer essa luta das mulheres brasileiras. Então, muito obrigada, Senador Anibal, pela intervenção.

            Eu finalizo minha fala, fazendo aqui um apelo ao meu Estado do Espírito Santo: não dá mais para as instituições públicas trabalharem em políticas públicas com cada um em seu próprio espaço. É preciso que haja, cada vez mais, um entrosamento, uma articulação, um diálogo entre os Poderes Judiciário, Executivo, o Ministério Público, a Defensoria Pública, para que, juntos, de forma integrada e articulada, possamos, realmente, romper com esse ciclo de violência.

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES) - Vitória e o Espírito Santo como um todo têm matado muitas mulheres. A cada dia que nós abrimos os jornais, são muitas mulheres que morrem assassinadas. Recentemente, uma mulher de Santa Maria de Jetibá teve todo o seu cabelo arrancado, extirpado, ficou em carne viva o couro cabeludo em função de uma violência praticada, possivelmente, pelo seu ex-companheiro. E essa mulher está sendo acompanhada.

            Nós precisamos que a Justiça do Estado do Espírito Santo faça o seu trabalho de forma séria, correta, juntamente com a Secretaria de Segurança, para, de fato, esse caso ser investigado do jeito que precisa ser investigado, com a seriedade que precisa ser dada a essa situação. Precisamos dar um basta à impunidade. Precisamos enfrentar a violência com muita seriedade e com muita responsabilidade.

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA RITA (Bloco Apoio Governo/PT - ES) - Então, é esse o nosso apelo, Sr. Presidente.

            Muito obrigada pelo tempo que me foi concedido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/08/2014 - Página 30