Discurso durante a 115ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre os avanços alcançados após a promulgação da Lei Maria da Penha; e outro assunto.

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO. LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Considerações sobre os avanços alcançados após a promulgação da Lei Maria da Penha; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 07/08/2014 - Página 132
Assunto
Outros > FEMINISMO. LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, PROMULGAÇÃO, LEI MARIA DA PENHA, OBJETIVO, PUNIÇÃO, AUTOR, AGRESSÃO, VITIMA, MULHER, COMENTARIO, AUMENTO, NUMERO, DELEGACIA, REGISTRO, IMPORTANCIA, DENUNCIA.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, URGENCIA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, CRIME, HOMICIDIO, VITIMA, MULHER, OBJETIVO, REDUÇÃO, VIOLENCIA, IMPUNIDADE.

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Apoio Governo/PCdoB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

             Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, companheiros e companheiras, amanhã, dia 7 de agosto, nós completaremos oito anos da data em que foi promulgada a Lei Maria da Penha.

            Não apenas como Procuradora da Mulher aqui no Senado, mas como Senadora mulher e como militante feminista, eu não estando aqui no dia de amanhã, fiz questão de vir hoje para fazer um pequeno balanço acerca da importância e dos avanços que obtivemos em nosso País com a Lei Maria da Penha.

            Oito anos atrás, este novo dispositivo, a Lei Maria da Penha, seria responsável por significativas mudanças nas relações de gênero, no mundo, em que a opressão contra a mulher, alicerçada em uma cultura machista, era considerada uma infração menor.

            Eu lembro, Sr. Presidente, que nós não dispúnhamos de nenhum dispositivo legal que classificasse aquela violência que acontece contra a mulher dentro de sua própria casa, no âmbito doméstico. E a Lei Maria da Penha veio exatamente para suprir essa lacuna, tipificando o que é e colocando uma série de questões em torno dessa violência que a mulher sofre, sobretudo, no âmbito familiar.

            Eu aqui digo, Sr. Presidente, que, há um tempo não muito distante, a violência que as mulheres sofriam não eram muito valorizadas, sequer vistas pela sociedade, que não se preocupava como deveria se preocupar e como se preocupa hoje.

            As mulheres, também em um tempo não muito distante de nossa história, eram obrigadas, após o casamento, a receber o nome do homem. Hoje não há essa obrigação, mas, até há pouco tempo, as mulheres eram obrigadas.

            Até há pouco tempo, também, a legislação brasileira previa a possibilidade de defesa da honra, o que muitas vezes justificava e mantinha impunes aqueles que agrediam suas mulheres, suas companheiras, porque alegavam a legítima defesa da honra e não eram enquadrados em crime algum.

            Os tempos mudaram, e há exatos oito anos, contados a partir do dia de amanhã, o Brasil promulgou a Lei Maria da Penha, que hoje é um modelo de legislação para todo o mundo, reconhecido pelas Nações Unidas e reconhecido, inclusive, pela ONU Mulher.

            A Lei Maria da Penha, Sr. Presidente, é fruto do grito de milhares de brasileiras vítimas de violência doméstica familiar. Até 2006, não era possível encontrar um respaldo legal adequado que coibisse e reprimisse as brutalidades realizadas. E, infelizmente, foi necessário uma grave injustiça contra uma delas, Maria da Penha Maia Fernandes, para que hoje possamos estar aqui, celebrando e falando dos oito anos de existência da Lei Maria da Penha, que faz parte de toda uma luta pelo fim da violência de gênero.

            Desnecessário, Sr. Presidente, aqui falar sobre a história de Maria da Penha, uma cearense, uma heroína que poderia ter dedicado a sua vida a cultivar a própria dor, a se trancar em si própria, mas não o fez, preferiu transformar o seu inferno pessoal em exemplo de resistência, trazendo luz às demais histórias de mulheres no País. Sua experiência se assemelha à vivida por outras cidadãs brasileiras, anônimas, cujo perigo está não fora, mas dentro do seu próprio lar, dentro da sua própria casa.

            Maria da Penha ficou paraplégica, após ser baleada na coluna pelo seu marido, sendo vítima não só, fisicamente, de seu marido, mas também vítima da inoperância das leis. Os crimes ocorridos em 1983 tiveram suas primeiras sentenças proferidas apenas no ano de 1991. O ex-marido foi preso por apenas dois anos, somente em 2002. Foram 19 anos de impunidade, Senador Paim!

            Com o clamor do caso Maria da Penha, o Governo e o Congresso movimentaram-se, a Bancada Feminina, sobretudo, para editar normas mais rígidas contra a violência doméstica. Conforme pesquisa feita pelo DataSenado, em 2013, o índice de conhecimento da Lei Maria da Penha era de 99%, ou seja, a Lei Maria da Penha, sem dúvida nenhuma, é uma das legislações mais conhecidas em todo o País - mais conhecida! O povo conhece. Pode não conhecer a fundo, mas sabe que existe uma lei chamada Lei Maria da Penha e que essa lei é para proteger a mulher em relação à violência que está sujeita, a violência dentro da sua própria casa, a violência doméstica. E o sentimento de proteção pela legislação alcançava, Sr. Presidente, de acordo com o DataSenado, 60% das mulheres.

            Quanto à efetividade da Lei Maria da Penha no combate à violência doméstica, nós temos em conta que ela vem contribuindo muito para coibir esse tipo de violência, tem ajudado muito as mulheres a viverem num mundo e num ambiente mais seguro. Entretanto, avaliamos que ainda há muitos desafios a serem superados, porque a lei é uma lei muito boa, como eu disse aqui, é exemplo no mundo inteiro. Não é uma lei que pune apenas, é uma lei que protege também a vítima e é uma lei que trabalha o agressor, uma lei que busca e pretende também que o agressor seja recuperado e tratado - recuperado e tratado. Ou seja, é uma lei completa, Sr. Presidente. E exatamente por ser uma lei completa, que trabalha a prevenção, que trabalha a assistência e também a punição, é uma lei que nós precisamos trabalhar muito para que ela tenha efetividade e prática na vida das pessoas, sobretudo, na vida das mulheres.

            Um dos principais desafios, sem dúvida nenhuma, é aumentar a conscientização das mulheres em denunciar. Estima-se que 700 mil brasileiras sofrem agressões físicas, psicológicas ou as duas coisas juntas e que 13 milhões de mulheres, ou seja, 18% da população acima de 16 anos, já foram vítimas de algum tipo de violência em nosso País.

            Outros importantes avanços oriundos da Lei Maria da Penha foram a criação e o fortalecimento de Varas e Juizados Especializados em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a criação de mais Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher, a criação e a implementação de Núcleos Especializados para Mulheres, além também de Defensorias Públicas e de Casas-Abrigos.

            E foi nesse contexto, Presidente Paim, que concluímos, no ano passado, a CPMI da Violência Contra a Mulher, presidida, com muita presteza, com muita capacidade e com muita dedicação, pela Deputada Jô Moraes, do meu Partido, e relatada, também com muita competência, pela Senadora Ana Rita, Senadora que, hoje, preside também aqui, no Senado, a Comissão de Direitos Humanos.

            Na ocasião, foram propostos, no Relatório aprovado da CPMI da Violência Contra a Mulher, 13 projetos de lei e um projeto de resolução. E quero aqui, Sr. Presidente, cumprimentar o Senado Federal, cumprimentar, em especial, o Presidente Renan Calheiros, mas também todos os Parlamentares homens e Parlamentares mulheres, Senador Eduardo Suplicy, Senador Odacir, porque nós, aqui no Senado, fizemos o nosso dever de casa: até o momento, dos sete projetos que iniciaram a tramitação aqui no Senado, cinco já foram aprovados - restando aprovar dois - e um dos seis projetos que estavam na Câmara, que, aliás, foi o único que chegou ao Senado Federal, que é o que estabelece regras para o 180 como uma central de chamadas, que também foi aprovado.

            Aprovamos também o projeto de resolução que criou uma Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher, uma comissão permanente, composta por Senadoras e por Deputadas Federais.

            Entre os projetos apresentados, Sr. Presidente, pela CPMI, eu quero aqui ressaltar um projeto que ainda não foi aprovado - e temos aqui várias companheiras servidoras do Senado presentes neste plenário, assistindo à sessão, que são colaboradoras da Procuradoria da Mulher -, mas, logo quando tivermos a próxima convocação, sessões deliberativas, eu vou transitar por aqui com um requerimento de pedido de urgência para que a gente possa votá-lo em Plenário, o Projeto de Lei nº 292, de 2013, que, para nós, é fundamental, muito importante. Este projeto institui o feminicídio como qualificador do crime de homicídio. Aí dizem: Mas só isso? Isso é muito importante, isso é muito importante. Segundo pesquisa do IPEA, de 2013, a cada hora e meia, uma mulher morre vítima de violência; a cada dia, são 15; a cada mês, são 472. E essa estatística tem sido crescente, infelizmente. O Brasil, hoje, ocupa a vergonhosa sétima colocação, entre 84 países, na taxa de feminicídio.

            A importância de tipificar esse crime, Senador Paim, é reconhecer, na forma da lei, que mulheres têm suas vidas ceifadas pela razão simples e pura de serem mulheres. São os maridos, são os namorados, muitas vezes são os pais, os padrastos que, por ciúmes, por sentimento de posse, sendo contrariados ou achando-se contrariados, acham-se no direito de violentar, de agredir e, muitas vezes, de matar. Então, qual foi o crime cometido pela mulher? Nenhum. E por que ela sofre a agressão? E por que ela é violentada? Porque ela é mulher.

            Eu vou trazer aqui para o plenário, também vamos distribuir em cada gabinete de cada Senador, o relatório da ONU Mulheres, e faremos isso por intermédio da Procuradoria da Mulher. O relatório da ONU Mulheres mostra a importância e a necessidade de aprovar esse projeto e quantos países já avançaram, tipificando o crime contra a mulher como feminicídio.

            Ao aprovar a lei estabelecendo, tipificando o crime de feminicídio, nós estaremos, portanto, reconhecendo, na forma da lei - como eu já falei -, que mulheres estão sendo agredidas só por serem mulheres. Isso significa também combater a impunidade de feminicidas que são beneficiados por interpretações jurídicas anacrônicas e moralmente inaceitáveis, como a de terem cometido crime passional - crime passional!

            Quero concluir, Sr. Presidente, dizendo que a luta pela superação da violência contra as mulheres é dever de todos os poderes constituídos e de toda a sociedade. A violência contra as mulheres é um atentado à própria democracia, favorece a discriminação e compromete o desenvolvimento das futuras gerações.

            Como salientado pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, "há uma verdade universal, aplicável a todos os países, culturas e comunidades: a violência contra a mulher nunca é aceitável, nunca desculpável, nunca tolerável”.

            Então, Sr. Presidente, neste momento, estamos às vésperas de comemorarmos o oitavo aniversário da promulgação da Lei Maria da Penha, Lei nº 11.340. Quero dizer que nós mulheres continuamos na luta, inclusive estamos organizando inúmeras atividades, juntamente com o Poder Judiciário, com o Conselho Nacional de Justiça, com o Conselho Nacional do Ministério Público, com a Secretaria de Política para as Mulheres do Poder Executivo, do Governo Federal, com órgãos e entidades nacionais e estaduais, no sentido de organizarmos, este ano, como temos feito todo ano, mas em especial este ano, uma grande campanha de 16 dias de ativismo contra a violência que as mulheres sofrem.

            Muito obrigada, Senador Paim.

            Agradeço e fico feliz de fazer este pronunciamento com V. Exª dirigindo a sessão, V. Exª que tem sido um exemplo não só para os homens e para os trabalhadores, mas também um exemplo de luta para as mulheres, um aliado de primeira hora, uma voz que defende muito a democracia e os nossos direitos.

            Muito obrigada, Senador Paim.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/08/2014 - Página 132