Discurso durante a 129ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a necessidade de uma reforma tributária no País.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Considerações sobre a necessidade de uma reforma tributária no País.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2014 - Página 98
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, REALIZAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, MOTIVO, CONFLITO, INTERESSE, ESTADOS, MUNICIPIOS, REFERENCIA, PAGAMENTO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, INVESTIMENTO, PROGRAMA DE GOVERNO, DEFESA, REDUÇÃO, TRIBUTOS, OBJETIVO, MELHORIA, ECONOMIA, AUMENTO, CONSUMO, AGILIZAÇÃO, BUROCRACIA.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu tenho vindo à tribuna durante esta semana falar dos grandes temas que, entendo, deveriam estar na pauta de debate entre os candidatos à Presidência. É claro que eles estão falando, mas eu me dou o direito também de, da tribuna, colocar as minhas opiniões - ontem eu falei sobre previdência e V. Exª, Senador Kaká também estava presidindo. Hoje eu venho falar um pouco sobre a reforma tributária.

            Um dos pontos mais relevantes da agenda prioritária do desenvolvimento nacional se constitui, sem dúvida, com o debate da assim chamada Reforma Tributária. Isso porque a adoção de um modelo tributário mais efetivo e racional implica fortes e positivos impactos na capacidade de investimento nacional, na competitividade da economia e até mesmo no avanço daquilo de que falo tanto aqui, a justiça social - efeitos esses mais do que oportunos para promover a retomada do desenvolvimento.

            O tema, entretanto, tem grau de complexidade equivalente ao de sua importância, e é reconhecido, faz tempo, como um dos mais difíceis tópicos na agenda de desafios dos últimos governantes a ocupar o Palácio do Planalto - e também para nós, aqui do Legislativo.

            E os motivos dessa dificuldade são bastante simples de se entender, visto que qualquer ajuste no sistema vigente tende a interferir, de uma forma ou de outra, numa das três grandes interfaces de disputa que se pode identificar no contexto tributário.

            A primeira delas é a que contrasta os interesses dos contribuintes e os do Governo, em cada uma das esferas da nossa Federação: os interesses da União, Estados e Municípios.

            De um lado, são os recursos tributários que sustentam a maior parte das ações de governo, desde aquelas de manutenção da máquina e de custeio pessoal, títulos que, por vezes, escondem o importante universo da prestação de serviços públicos em educação, saúde, segurança pública, e até as relativas aos investimentos em infraestrutura, que são fundamentais para o crescimento do País.

            Não se podem esquecer, nesse particular, as importantes aplicações em programas sociais. Não tem como negar a importância do Bolsa Família, do salário mínimo, que retirou da miséria cerca de 30 milhões de brasileiros. Sr. Presidente, devemos lembrar, também, os Benefícios de Prestação Continuada e do pagamento das aposentadorias rurais, entre outros.

            De outro lado, temos a posição dos contribuintes, que certamente gostariam - e quem não gostaria? - de pagar o menos possível de impostos. Embora, em geral, tomada como egoísta e antissocial, essa atitude é muito positiva quando se considera o desempenho do conjunto da economia, uma vez que, do ponto de vista do valor final, o imposto é custo que se incorpora ao preço de produtos e serviços, sendo uma variável chave para a competição da produção nacional, principalmente no campo da exportação. Assim, o ideal é que se arrecadasse o mínimo possível de impostos, mas que esses recursos fossem suficientes para dar conta de financiar as inúmeras necessidades governamentais - uma equação que, convenhamos, é de difícil resolução prática.

            O Brasil, por exemplo, tem de carga tributária o equivalente, em percentual de PIB, àquilo que arrecadam os países da Europa Ocidental, mas não entregamos aqui, infelizmente, o mesmo nível de serviço público que é demonstrado naqueles países.

            A segunda grande interface a que me refiro, neste pronunciamento, é a que correlaciona os contribuintes entre si, não mais tomados como um bloco, mas compreendidos em seus diversos setores sociais e econômicos. Essa interface é, de fato, muito importante, porque é o seu equacionamento que define, ao fim e ao cabo, a distribuição dos encargos tributários entre pessoas e empresas, distribuição essa que concretiza, na prática, boa parcela do que se costuma designar por justiça tributária.

            Idealmente, mais uma vez, os impostos devem incidir proporcionalmente à capacidade contributiva dos diversos setores e áreas. Quem pode mais contribui com mais, de forma progressiva, como acontece no Imposto de Renda, por exemplo, e, em contraponto, não ocorre nos impostos sobre consumo, nos quais todos pagam em igual proporção.

            Com isso, uma reforma tributária será mais perfeita quanto mais progressividade acontecer, assim conseguindo incorporar em seu mecanismo de cálculo uma visão que favoreça os que ganham menos e que gastam, principalmente, no consumo diário, como alimentação, vestuário e transporte, só como exemplo.

            Esse fato é tão mais importante quanto mais um País é marcado, como o é o nosso, pela desigualdade de renda e de riqueza entre as diversas classes sociais.

            A terceira interface que deve ser arbitrada com muita competência, numa reforma tributária, é a que estabelece a disputa por recursos que se estabelece entre os diversos níveis de governo.

            A Constituição estabeleceu os impostos que cabem a cada uma das esferas de Governo - União, Estados e Municípios - e as competências a cujas despesas de execução esses impostos devem atender.

            Ora, é fácil perceber o quanto é delicado o equilíbrio que se estabeleceu, ao longo do tempo, entre recursos e responsabilidades de cada um dos entes federativos e, mais que isso, quão sensível é qualquer modificação que venha a desequilibrar o seu já precário quadro financeiro.

            Além do debate acerca dos recursos, temos também o importante tema da simplificação do sistema contributivo nacional, que, com toda certeza, está entre os mais complexos, burocráticos e onerosos de todo o mundo. Eu digo que sou simpático ao imposto único; claro, muito bem montado, muito bem discutido e vem depois da distribuição,

            No Brasil, o imposto, além de caro de pagar, é caro de calcular, de recolher e de controlar, não somente pela grande variedade de impostos e contribuições a que todos se sujeitam, mas, principalmente, pela imensa complexidade das leis, regulamentos e mecanismos os mais diversos que devem ser compostos para que o ciclo tributário seja encerrado e você pague aquilo que deve.

            Esse é, em grandes traços, o quadro que mostra hoje o ambiente em que Governo, Parlamento e sociedade negociam caminhos que viabilizem a elaboração de um novo modelo tributário mais benéfico ao conjunto da Nação e com menos trabalho no campo burocrático.

            Não é por certo uma tarefa fácil, mas ela precisa ser enfrentada, pelo bem do Brasil, e de uma forma que encaminhe, de modo mais conveniente e proveitoso possível, os diversos aspectos sobre os quais acabo de falar.

            O tema da complexidade, por exemplo, é um ponto importante, no qual tenho aqui insistido, e a sua relevância socioeconômica é cada vez mais percebida com maior acuidade pelas lideranças do País.

            Veja-se, a propósito, o exemplo do Supersimples, cuja vigência, além de reduzir a carga tributária, provocou uma imensa e oportuna simplificação no modo como as micro e pequenas empresas gerenciam as suas obrigações tributárias, reduzindo despesas com contador e com os controles contábeis, facilitando a vida do micro e do pequeno empreendedor, e, na prática, viabilizando os seus negócios.

            Não por outro motivo, o Presidente da Confederação das Associações comerciais e Empresariais do Brasil, José Paulo Dornelles Cairoli, declarou, em abril último, em audiência aqui, na Comissão da Câmara dos Deputados que discute o Projeto de Lei Complementar n° 221, de 2012, que é vital "aprovar as novas normas para universalizar o simples". O Projeto atualiza a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa. O substitutivo que ora se discute, da lavra do Deputado Cláudio Puty, pretende permitir a inserção no sistema de quase 500 mil empresas com faturamento de até R$3,6 milhões por ano.

            Segundo se calcula, isso permitirá uma redução média de 40% de sua carga tributária, além de simplificar procedimentos burocráticos, que aqui listei, a partir da unificação - por meio do Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, coordenado pela Receita Federal do Brasil - dos diversos registros estaduais e municipais que hoje são exigidos para o funcionamento das empresas, no Brasil. Com certeza, nós vamos diminuir a burocracia.

            Outra ideia que destaco é a de unificação dos impostos sobre consumo. Materializada, em conjunto com outros temas, na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 233, de 2008, de iniciativa do Executivo Federal, a unificação é outra medida que tende a melhorar significativamente o quadro de complexidade do sistema tributário nacional, simplificando procedimentos e normas, reduzindo o custo da gestão tributária das empresas e aumentando o nível geral de segurança jurídica, no que se refere aos tributos.

            A PEC, enviada ao Congresso Nacional no início de 2008 pelo então Presidente Lula, foi aprovada em Comissão Especial da Câmara dos Deputados, na forma de substitutivo apresentado pelo Relator. O debate, entretanto, apesar da imensa importância de seu conteúdo, não experimentou avanços significativos desde 2009, e seria importante retomá-lo.

            Registro, ainda, Sr. Presidente, para terminar, que a PEC também aborda um importante aspecto da realidade tributária nacional, que é a guerra fiscal. Essa guerra é uma realidade que vem influenciando negativamente as finanças públicas de diversos Estados da Federação, Estados esses que têm como estratégia de desenvolvimento a concessão de incentivos fiscais para a instalação de empreendimentos produtivos em seu território.

            Ao abrir mão de tributos, em contrapartida à localização dos parques produtivos nos limites do Estado, prejudicam suas próprias entradas financeiras e isentam esses chamados “novos entrantes” do pagamento de impostos que, mais à frente, certamente farão falta à Administração Pública estadual, afetando também os repasses aos Municípios.

            Reitero, com este meu pronunciamento, Sr. Presidente, a necessidade de uma imediata reforma tributária. Como acabamos de ver, nosso modelo pode ser, sim, aperfeiçoado. Mas, importante que seja, a reforma tributária não se fará sozinha. Por isso, relembro sua relevância aqui no plenário, ao tempo em que recomendo a atenção de meus pares, Senadores e Deputados, para esse tema.

            Espero ainda que, qualquer que seja o mandatário que se consagre nas urnas, no pleito presidencial que se aproxima, tenha ele a consciência da imensa importância que adquiriu, neste País, a superação de um sistema tributário pesado, oneroso, complexo e incapaz, a essas alturas, de cumprir sua missão junto aos grandes segmentos envolvidos: as Administrações Públicas e, naturalmente, o interesse do cidadão-contribuinte.

            Não há país desenvolvido sem o concurso de um modelo de arrecadação eficaz e bem orientado.

            Por isso, senhoras e senhores, a importância de que, rapidamente, o Congresso se debruce sobre o debate da reforma tributária.

            Era isso, Sr. Presidente. Agradeço a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2014 - Página 98