Discurso durante a 149ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às supostas acusações caluniosas utilizadas contra figuras políticas do País durante as eleições presidenciais de 2014; e outros assuntos.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DEMOCRATICO, IMPRENSA. ELEIÇÕES, PRESIDENTE DA REPUBLICA. EDUCAÇÃO. CORRUPÇÃO.:
  • Críticas às supostas acusações caluniosas utilizadas contra figuras políticas do País durante as eleições presidenciais de 2014; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 23/10/2014 - Página 177
Assunto
Outros > ESTADO DEMOCRATICO, IMPRENSA. ELEIÇÕES, PRESIDENTE DA REPUBLICA. EDUCAÇÃO. CORRUPÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, TENTATIVA, CENSURA, VITIMA, JORNALISTA, ESTRANGEIRO, CUBA, DEFESA, LIBERDADE DE IMPRENSA, ELOGIO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, EDUARDO SUPLICY, SENADOR.
  • CRITICA, OCORRENCIA, DIFAMAÇÃO, VITIMA, ORADOR, MARINA SILVA, AECIO NEVES, EX SENADOR, CANDIDATO, ELEIÇÕES, TENTATIVA, DESTRUIÇÃO, REPUTAÇÃO, DEFESA, CESSAÇÃO, REELEIÇÃO, CARGO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUMENTO, INFLUENCIA, POLITICA.
  • COMENTARIO, DEBATE, LOCAL, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO E CULTURA, ASSUNTO, MELHORIA, LINGUAGEM, ORTOGRAFIA, LINGUA PORTUGUESA, PARCERIA, PAIS ESTRANGEIRO.
  • COMENTARIO, MATERIA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ASSUNTO, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, DESVIO, DINHEIRO, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), BENEFICIARIO, VEREADOR, DEPUTADO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), LOCAL, RIO GRANDE DO SUL (RS).

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Meu estimado Senador Eduardo Suplicy, que preside esta sessão, caros telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, eu vim aqui preparada para iniciar minha fala, Senador Eduardo Suplicy, sobre o que aconteceu ontem e hoje de manhã na Comissão de Educação, mas vou deixar isso como segundo tema, não menos importante, porque, como sou sua admiradora, e o senhor faz política com grande respeito aos seus adversários - com muita liberdade, com muita independência também -, eu fico sensibilizada com o registro que fez V. Exª a respeito da disputa eleitoral no Rio Grande do Sul.

            Eu o acompanhei antes, como jornalista. Muitas vezes o entrevistei, mas aqui, convivendo com o senhor como sua colega... E fui sua colega também na revista Visão.

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Em 1975.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Bons tempos, bons tempos! O seu cabelo não havia branqueado, e o meu, hoje, é desta cor porque eu boto uma quimicazinha. As mulheres têm essa facilidade. Éramos mais jovens, mas o tempo passou, Senador Eduardo Suplicy, e as nossas rugas nos deram muitas lições.

            A mesma admiração que eu tinha pelo senhor, em 75, hoje aumenta, porque, naquela época, era o professor, era o economista renomado, o jornalista que fazia análise econômica. E hoje, aqui, eu acompanho o Deputado, o ex-Deputado e o meu colega Senador; o Senador que todo mundo admira e aprecia exatamente pela retidão de caráter e pela forma respeitosa com a qual o caro colega Eduardo Suplicy se relaciona com seus adversários políticos. São adversários políticos. Não são inimigos, Senador Suplicy. E é assim que eu vejo V. Exª. Por isso, V. Exª merece meu inteiro respeito e minha inteira admiração.

            Aqui o acompanhei, quando a blogueira cubana Yoani Sánchez veio ao Brasil, com sua atitude absolutamente equilibrada, responsável, séria, independente, capaz de distinguir uma agressão de um cerceamento à liberdade de expressão daquela moça, que veio convidada. Ela não se ofereceu para vir aqui. Muitas vezes V. Exª até propôs que viesse. Ela veio convidada. A hostilidade com que foi tratada revelou uma forma inaceitável de censura em um País democrático como o nosso, mas a democracia pressupõe que também as pessoas que não concordam com ela possam manifestar sua oposição. Porém, não de forma agressiva e violenta, inclusive, tentaram - e como conseguiram - calar a voz da Yoani Sánchez.

            V. Exª, nesta tribuna, Senador Suplicy - porque sou testemunha -, teve aqui um ato de dignidade que honrou muito esta Casa, pela altivez, pelo equilíbrio, pela serenidade e pelo respeito. V. Exª pode não concordar com as opiniões emitidas pela Yoani Sánchez, mas, como um cavalheiro, como um Senador respeitoso e obediente às regras democráticas, V. Exª defendeu exatamente isto: o direito de ela se manifestar. Eu sou testemunha disso. E, quando V. Exª faz referência ao que aconteceu no Rio Grande do Sul, fico também muito feliz.

            Participei de uma campanha muito limpa e muito respeitosa. Respeitosa até com aquelas pessoas e aqueles líderes que postulavam - e postulam - o Governo do Rio Grande do Sul mesmo que não merecessem. Mas a minha obrigação era respeitá-los. E fiz isso até o último minuto da campanha. Na hora em que avaliei o resultado, afirmei que eu estava acolhendo, com enorme humildade e muito respeito, a decisão sábia dos eleitores e das eleitoras do Rio Grande do Sul, que decidiram que eu deveria continuar aqui, no Senado Federal. Mais do que isto: assumia, naquele momento, a responsabilidade e reafirmava o meu compromisso de lutar pela eleição de Aécio Neves à Presidência da República. Também independente até aquele momento, porque os nossos Partidos não haviam se manifestado, e eu não poderia me antecipar a uma decisão coletiva. A nossa coligação era formada por quatro Partidos: PP, PSDB, Solidariedade e PRB. Eu não poderia antecipar uma decisão que dependeria de uma consulta a esses quatro Partidos, o que foi feito no dia seguinte.

            Mas, no domingo à noite, eu disse: o meu compromisso é apoiar o Senador Aécio Neves, respeitar e ajudar o vitorioso nas urnas do segundo turno, fosse quem fosse, como Senadora do Rio Grande e como vejo V. Exª defender São Paulo com o Governador Alckmin, que é seu adversário político, mas não é seu inimigo. E V. Exª, com todo o zelo e a responsabilidade de um Senador de São Paulo, aqui, nesta tribuna, todas as vezes defende os interesses de São Paulo junto com o Senador Aloysio, com o suplente da Senadora Marta Suplicy, sempre na posição de cumprir a Constituição. Consta do art. 53: “Compete ao Senador defender os interesses do Estado.” Eu sou testemunha disso, Senador Suplicy. Então, cabia a mim dizer que, independentemente do resultado do segundo turno para o governo do Rio Grande do Sul, estarei a serviço dos interesses do nosso Estado.

            Dois dias depois, os nossos Partidos, coletivamente, democraticamente, reafirmaram, com o meu apoio integral, apoiar a candidatura de José Ivo Sartori no segundo turno, e é isso o que vai acontecer. Nós o estamos apoiando.

            O que aconteceu no Rio Grande do Sul foi apenas e tão somente aquilo que havia sido feito no Brasil com Marina Silva. A mesma Marina Silva que V. Exª, Senador Eduardo Suplicy, e eu, mesmo com algumas diferenças doutrinárias na votação do Código Florestal aqui, nesta Casa, defendemos. Quando foi para registrar o Partido da Marina Silva, eu vi V. Exª defender o direito dela. Ora, se o Kassab havia registrado o seu Partido, o PSD, como iríamos negar, como a Justiça iria negar à Marina Silva igual direito? E eu o vi também, mais uma vez, testemunhando.

            Veja como observo o seu trabalho, Senador, as suas atitudes, o seu empenho, seu zelo pelo equilíbrio, pelo direito e pela justiça.

            Aqui, V. Exª defendeu muito Marina Silva. E, ao fazer isso, V. Exª deu demonstração de dignidade, de equilíbrio, de respeito. Eu fiz a mesma coisa, mesmo que tivesse tido com a Senadora Marina Silva algumas divergências naturais na votação do Código Florestal. Vencido isso, eu estava aqui com o Senador Pedro Simon. Participei do abaixo-assinado para que a Rede Sustentabilidade fosse oficializada como partido político. Assinei. Fui uma das signatárias deste abaixo-assinado.

            A Marina Silva foi vítima daquilo que a eleição de 2014 vai deixar como uma triste lembrança do que não se deve fazer em política numa campanha eleitoral: uma criminosa calúnia, uma criminosa difamação do adversário. Estas eleições vão deixar uma triste lembrança: a lembrança da desconstrução da imagem e do patrimônio pessoal de figuras como Marina Silva. Tentaram antes com o Eduardo Campos. Tentaram! O Eduardo foi vítima da tragédia, e quando a Marina representou risco e perigo ao poder, ela foi a primeira vítima da ferocidade - da ferocidade! - da tentativa, bem exitosa, é claro, da desconstrução da figura desta grande Senadora Marina Silva, ex e primeira ministra do Governo Lula, Ministra do Meio Ambiente.

            Como jornalista, eu estava em Washington, cobrindo a visita do Presidente Lula, quando ele anunciou - e dei a notícia em primeira mão à Rádio Gaúcha - a primeira ministra convidada para integrar o seu governo: Marina Silva. E ela foi a vítima mais frágil, porque, com a sua serenidade, ela não reagiu. Acho que ela nem acreditava no que estava acontecendo. Depois de destruir a imagem da Marina, tirá-la da competição, agora acontece a mesma coisa com Aécio Neves.

            Mas, antes disso, lá no Rio Grande do Sul, Senador Suplicy, fizeram o mesmo comigo. Só que não mancharam nada da minha vida. As pessoas que me conhecem sabem que não cometi nenhum delito. Nenhum delito. E aí está exatamente a calúnia e a difamação criminosa. Tanto que, quando eu declarei nesses termos o que foi feito contra mim, como aconteceu com a Marina, impediram-me que eu fosse para o segundo turno. Porém, como eu tenho a humildade de reconhecer que o resultado foi o melhor que os eleitores entenderam - foi o melhor -, aqui estou trabalhando, para mostrar o que temos que fazer.

            Isto é o que V. Exª falou: ficha limpa. Temos que continuar nisso, temos que ter eleições limpas, temos que acabar com reeleição, Senador Suplicy. A reeleição não está hoje mostrando o poder de fogo que tem o detentor do poder que disputa a reeleição, seja no governo do Estado, seja na prefeitura municipal, seja na Presidência da República. O Governo parou, o Governo está parado. Eu fui aos Ministérios, e não há ninguém lá. Um está em tal lugar, outro em tal lugar. O que estão fazendo? Assinando contratos, convênios, inaugurando obras? Não há como tapar o sol com a peneira, Senador. Não há como tapar o sol com a peneira.

            Temos que aprender exatamente com as lições desta trágica campanha eleitoral de 2014. Trágica pela morte de Eduardo Campos, um grande e jovem líder político; trágica pela sujeira, pela desfaçatez, pelo desrespeito, pela agressividade, pela calúnia e pela difamação, que foram os elementos usados nesta campanha para tirar os concorrentes que disputaram eleição nos Estados e também no Governo Federal. Precisamos de um ordenamento jurídico, para evitar que, nos 45 minutos do segundo tempo, a Justiça Eleitoral entenda que esteja havendo difamação, calúnia.

            Só agora? Presidente, Presidente Toffoli, até o seu gesto, num primeiro momento, me pareceu imparcial!

            Mas o que aconteceu com a Marina? Quem vai recuperar o prejuízo que a Marina sofreu?

            O meu caso eu nem coloco a essa Mesa, porque já estou sendo julgada e estou muito feliz com o que aconteceu no meu Estado. Muito feliz. Às vezes, existem vitórias que são derrotas e derrotas que são vitórias. Eu entendo a vida nessa dimensão e vivo com a perspectiva de entender as mensagens que na democracia são dadas pelos eleitores, soberanos na hora em que, hoje, no Brasil, com a urna eletrônica, apertam o número e aparece o nome do candidato. E ali estão decidindo o futuro de nós políticos, o futuro da democracia do nosso Estado, do nosso País ou de uma comunidade, em uma prefeitura municipal.

            Senador Suplicy, precisamos aqui discutir formas de como proceder ao tal financiamento de campanha que está hoje em debate no Supremo Tribunal Federal. Temos que discutir claramente essa questão, sem hipocrisia. Sem hipocrisia! Porque, talvez, quem mais defenda financiamento público de campanha esteja hoje entre os que mais se beneficiam da máquina pública. Não vou nem entrar no caso da Petrobras, nem vou entrar nisso. Nem vou entrar.

            Temos que ter clara a necessidade de revermos o instituto da reeleição, porque, como eu disse, é uma concorrência desleal entre os que não detêm poder nessa disputa, nos três níveis. Então, poderíamos - imagino que seja mais conveniente à democracia no Brasil - ter um mandato de cinco anos, sem reeleição, e mais: ouso até sugerir coincidência de todas as eleições. Seria muito relevante para o País, porque a democracia, penso, ganharia. Se não der certo, como para mim a reeleição não está dando certo, vamos alterar a Constituição. A sabedoria está em reconhecer a inaplicabilidade ou a inconveniência de uma lei e mudá-la. É o que estamos fazendo hoje, aliás.

            Senador Suplicy, para encerrar, os meus cumprimentos renovados a V. Exª, pelo o que nós estamos fazendo lá no Rio Grande do Sul e nesta campanha. A lei, quando não é boa ou quando tem imperfeições, nós trabalhamos para mudá-la.

            Hoje e ontem, nós, na Comissão de Educação, Cultura e Esporte, discutimos intensamente. Eu acredito que foi a mais rica discussão em torno do Volp (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa), o famoso Acordo da Língua Portuguesa firmado por oito países de língua portuguesa, a pedido da própria Comissão, de parte dos Senadores, que sugeriu ao Poder Executivo - e quero agradecer ao Governo Federal por ter entendido a necessidade - adiar a entrada em vigor do Acordo Ortográfico, o que deveria ocorrer no início deste ano. O Acordo vai entrar em vigor em janeiro de 2016.

            Do que nós estamos tratando? Estamos discutindo as falhas, as lacunas do acordo firmado pelos governos de oito países que falam português, ratificado quase que pela maioria dos Parlamentos, como é necessário numa democracia - faltam dois ainda a serem ratificados -, mas um componente a ser observado.

            Para nossa felicidade, a Academia Brasileira de Letras, representada ontem e hoje pelo Prof. Evanildo Bechara, admitiu acolher as sugestões apresentadas por especialistas, entre os quais: Carlos André Nunes, excelente professor de Língua Portuguesa e Redação Jurídica da OAB de Goiás, que deu uma aula sobre alguns aspectos que não haviam sido abordados; a Profª Stella Maris Bortoni, da UnB; o colunista da Folha de S.Paulo, professor respeitadíssimo e admirado, Pasquale Cipro Neto; Antonio Martins de Araújo, que nos encantou pela sua verve, pela sua vivacidade e pelo seu conhecimento; o Prof. Ernani Pimentel, que também é um especialista e nos provocou na Comissão; e Thaís Nicoleti, revisora de Língua Portuguesa do jornal Folha de S.Paulo e do portal Uol.

            Essas pessoas deram uma contribuição valiosíssima no entendimento de que, sim, a Comissão de Educação, Cultura e Esporte, presidida pelo Senador Cyro Miranda - tenho a honra de ser Vice-Presidente da Comissão -, contribuiu com responsabilidade para a discussão do tema.

            Existem muitos furos, muitas dúvidas no Acordo, Senador Suplicy - V. Exª é professor de Economia -, mas o português é a nossa língua mãe. E existem muitas divergências também em relação a outros países de Língua Portuguesa; em Portugal, por parte de Deputados de vários partidos da esquerda e da direita, assim como do Ministério da Cultura.

            Existem muitas dúvidas sobre isso, para não parecer que o Brasil é hegemônico, que quer impor um acordo, dando-se aí uma visão neocolonialista de relação. Não é isso. Acho que o Brasil, pela sua generosidade, pelo seu tamanho, pela sua liderança, é o maior país de fala de Língua Portuguesa, os outros são, pela ordem de tamanho de população, Angola e Moçambique. Mas outros países, Guiné-Bissau, Cabo Verde, Timor-Leste, todos esses países estão nesse processo de debate, de construção de um consenso.

            Nós - como tenho repetido - não vamos acrescentar uma vírgula, saber se tem de haver trema ou hífen nas palavras. Não, isso não é missão dos Senadores. Os professores de português, os especialistas em linguística vêm e oferecem as contribuições, e nós as juntamos e encaminhamos para quem de direito. Esse é o nosso papel, com o apoio, claro, da Consultoria Legislativa do Senado Federal.

            Então, nós cumprimos o nosso papel, e a minha alegria é que hoje vimos uma intensa participação - inclusive pelo sistema Alô Senado - praticamente de todos os Estados, de todas as regiões brasileiras, Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste, para oferecer sugestões ou simplesmente opinar sobre o Acordo Ortográfico.

            Foi maravilhoso, Senador Eduardo Suplicy!

            Por fim, Senador, não menos importante... Volto a agradecer, em nome do Senador Cyro Miranda, a todos que participaram ontem e hoje desse muito rico debate. Sempre aprendemos muito.

            Para terminar, Senador Suplicy, vou falar de algo que o jornal Folha de S.Paulo publicou hoje - está aqui o jornal -: “Polícia investiga [...]”. Não é a Senadora. Estou me valendo do que o jornal publicou, e o jornal - o senhor conhece - é sério.

            “Polícia investiga se PT gaúcho usou recursos do Pronaf em eleições”.

            Inquérito da Polícia Federal levanta indícios se empréstimos a uma associação eram desviados para vereadores do partido e usados inclusive para beneficiar a campanha de um deputado federal eleito.

            Essa notícia é preocupante, porque atinge diretamente a vida e a rotina de quem produz alimentos, sobretudo no nosso Rio Grande do Sul, que contrata quase 25% de todo o crédito oficial do País destinado à agricultura familiar. Um quarto, Senador! E o Pronaf é um dos mais importantes programas.

            Até faço um elogio ao ex-Presidente Lula, porque o Pronaf nem mudou o nome, foi criado no governo Fernando Henrique Cardoso, quando era Ministro da Agricultura Francisco Turra, do meu partido e do Rio Grande do Sul. Foi um programa que deu tanto certo que Lula não mudou o nome. Esse foi um ato de sabedoria. O Pronaf não mudou de nome.

            Vinte e cinco por cento, portanto, de todo o volume do Pronaf para a agricultura familiar fica no Rio Grande do Sul.

            O jornal Folha de S.Paulo, com interceptações telefônicas, ou escutas telefônicas, feitas pela Polícia Federal... Polícia Federal, um órgão republicano. E no dia 28 teremos aqui a votação da MP nº 650, que terá meu inteiro apoio, que trata de reajustes aos policiais federais. Já assumi compromisso com eles e com os peritos agrários. Estarei aqui para votar, no dia 28, a Medida Provisória nº 650.

            Pois, com autorização judicial, a Polícia Federal fez escutas telefônicas detalhando e levantando indícios de que dinheiro desviado do Pronaf, importante programa de incentivo à agricultura familiar, foi usado em campanhas eleitorais do Partido dos Trabalhadores no Rio Grande do Sul.

            Penso que essas são práticas inadmissíveis e condenáveis não só no Rio Grande do Sul como em qualquer outro Estado atendido por programas sociais de grande relevância como o Pronaf. Nesse caso, o problema é gravíssimo, pois envolve empréstimos federais destinados aos agricultores, ao produtor rural familiar, que depende muito desse recurso para plantar, para produzir, para sobreviver nas suas agroindústrias, no seu Mais Alimentos, em todos os programas incluídos no Pronaf.

            A investigação da Polícia Federal, denominada Operação Colono, resultou no inquérito que passou a tramitar no Supremo Tribunal Federal por ter indícios do suposto envolvimento do Deputado Federal reeleito Elvino Bohn Gass, que tem foro privilegiado.

            O inquérito revela que dinheiro liberado na forma de empréstimos do Pronaf contraídos no Banco do Brasil e em nome de produtores rurais entrou nas contas de uma associação de Santa Cruz do Sul, a Associação Santa-Cruzense dos Agricultores Camponeses (Aspac), e de lá seguiu para contas pessoais de dirigentes e ex-dirigentes dessa entidade.

            Em seguida, segundo as investigações, houve saques em espécie e transferências para outras contas. A suspeita de fraude só começou a ser investigada porque produtores rurais procuraram a Polícia Federal e o Ministério Público para dizer que não haviam autorizado os empréstimos em seus nomes e que tinham assinado papéis em branco, que ficaram na associação.

            Foi preciso, por isso, que a Polícia Federal quebrasse o sigilo de 107 contas bancárias para concluir - tudo com ordem judicial - que a associação recebeu em créditos, repassados por 26 mil depósitos, um total - pasmem! - de R$104 milhões - R$104 milhões! - entre 2006 e 2012. Desse volume, R$85 milhões vieram do Pronaf - R$85 milhões do Pronaf!

            Laudos da Polícia Federal mostram, por exemplo, que dirigentes e familiares recebiam recursos da associação em suas contas bancárias pessoais. Está aqui no jornal Folha de S.Paulo. O Vereador Wilson Rabuske, do Partido dos Trabalhadores, segundo o laudo, recebeu R$700 mil, e a mulher dele, R$324 mil. Outro ex-candidato a vereador pelo PT recebeu R$126 mil.

            Conforme informações da Receita à Polícia Federal, o casal Rabuske anotou uma diferença de R$2,15 milhões entre o que foi declarado ao Fisco como renda entre 2007 e 2011 e o valor que entrou em suas contas. Dois milhões de reais para agricultura familiar?

            A Polícia Federal interceptou treze aparelhos telefônicos, incluindo os de Rabuske. Numa das conversas, um homem, que a Polícia Federal identifica como sendo representante da Aspac, disse a um produtor rural que a entidade tinha dificuldades para cobrir dívidas que atingiam R$1 milhão, mas que políticos estavam ajudando na arrecadação desse dinheiro. Segundo a interceptação, havia um motivo para esse esforço.

            Em uma das conversas gravadas, o homem que se identificou como representante da Aspac disse o seguinte - abre aspas -: "Muito dinheiro foi pra campanha do Wilson e pra campanha de Bohn Gass. [...] E essa dívida que existe está muito ligada a isso" - fecha aspas.

            Na mesma conversa, foi dito que Bohn Gass agiria para quitar dívidas com o Banco do Brasil.

            Abre aspas novamente -: “Vai ser uma espécie de caixa dois, mas o [Gass] é o cara que vai ajudar a resolver isso” - fecha aspas -, apontou a gravação.

            Em outra gravação, Bohn Gass teve uma conversa interceptada, ao telefonar para Rabuske. Ele contou que atuava junto ao então Ministro do Desenvolvimento Agrário Pepe Vargas - também do Partido dos Trabalhadores, ex-prefeito de Caxias do Sul -, para conseguir decretos que permitissem renegociação de dívidas de produtores. Ele agradeceu a Rabuske "pela parceria".

            Em 2007, o Ministério havia repassado R$642 mil à mesma associação para “palestras” e “visitas técnicas”. Caras essas palestras! Seiscentos e quarenta e dois mil reais para palestras e visitas técnicas!

            Ao enviar o caso ao Supremo Tribunal Federal, a juíza Karine da Silva Cordeiro disse que o relatório indicava, de forma clara e consistente, suposto envolvimento de Bohn Gass com o grupo.

            O Deputado Federal reeleito, Elvino Bohn Gass informou ao jornal Folha de S.Paulo que “confia na Justiça” e que ainda não teve acesso ao inquérito que investigou as fraudes contra o Pronaf, no Rio Grande do Sul. Ele protocolou no Supremo Tribunal Federal pedido de acesso aos documentos. Segundo foi informado à reportagem, Bohn Gass estranha a “coincidência” com o momento eleitoral. Disse ele que não deve nem teme.

            O Vereador de Santa Cruz do Sul Wilson Rabuske, disse não ter conhecimento “de nada” e afirmou, segundo a Folha, que não foi intimado e que todas as informações que sabe foram por meio da imprensa. O vereador contou que “desde abril” está tentando ter acesso aos autos sem sucesso. Ele disse ter feito petições às autoridades e até o momento não sabe os motivos das acusações à Aspac.

            O jornal entrou em contato com o presidente da Aspac. Ele atendeu ao celular, mas, em seguida, disse que havia problemas na ligação. Na sequência a ligação caiu, segundo informa o repórter Rubens Valente. Em seguida, o telefone do presidente da Associação não atendeu mais às chamadas, ninguém na Aspac atendeu aos telefonemas.

            Vale lembrar que, estranhamente, a Polícia Federal iria cumprir mandado contra o Deputado Bohn Gass, mas recebeu o comunicado para a ação ser feita somente depois das eleições. O adiamento da operação da Polícia Federal em Santa Cruz do Sul foi feito pelo Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot - e olha que tenho enorme respeito pelo Ministério Público.

            Como foi noticiado pela imprensa no início deste mês, antes do primeiro turno das eleições, o Procurador fez representação ao Supremo Tribunal Federal para evitar que mandados de busca e apreensão fossem cumpridos, em um trabalho que tem como um dos investigados o próprio Deputado Federal Elvino Bohn Gass, recém-reeleito.

            As buscas já deveriam ter ocorrido, mas uma decisão assinada pelo Ministro Teori Zavascki, Relator do caso no STF, sustou o trabalho. Por falar em pedido feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo, a polícia teria sido alertada de que só deviria cumprir os mandados de busca e apreensão depois de 6 de outubro. Segundo o trecho do pedido feito por Janot, "o prazo maior foi necessário para organizar a participação do Ministério Público Federal na diligência". A posição dispensa comentários.

            No documento, o Procurador-Geral da República também alegou que a Polícia Federal deu início a interceptações telefônicas sem avisar antes o Ministério Público Federal (MPF) e definiu a data para cumprimento das buscas de forma "unilateral", sem tempo hábil para que um membro do Ministério Público Federal acompanhasse. É importante lembrar que já havia autorização judicial para que essas buscas ocorressem. Se havia autorização judicial, por que não haver a execução de um dever, que tem a Polícia Federal, que é o de investigar, investigar: o Ministério Público denuncia; a Polícia Federal investiga. Essas são as funções. E o Supremo e a Justiça julgam. Penso que aí há, talvez, uma falta de compreensão das reais prerrogativas de cada instituição - e esse é o risco que estamos correndo cada vez que há uma judicialização na política, uma judicialização na saúde e em tantos outros casos. Por isso, me preocupa muito esse caso e forma como os desdobramentos têm sido feitos.

            O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, como é de conhecimento dos produtores, é destinado exclusivamente para estimular a geração de renda e melhorar o uso da mão de obra familiar. Isso deve ser feito por meio do financiamento de atividades e serviços rurais agropecuários em estabelecimento rural ou em áreas comunitárias próximas. Qualquer atividade diferente disso deve ser olhada com muita desconfiança - porque aí será desvio de função e de finalidade.

            Não bastassem as dificuldades climáticas, como tempestades, granizo - que são extremamente danosas à produção rural, especialmente à agricultura familiar - ou ainda as limitações financeiras e econômicas, muitos agricultores familiares têm sido penalizados com situações como essas. É importante lembrar que 77% dos empregos no setor agrícola brasileiro têm relação direta com a agricultura familiar, segundo dados do relatório 2014 sobre as "Perspectivas da Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Rural nas Américas".

            É um setor, portanto, muito relevante e sensível que merece respostas para todas essas graves denúncias.

            Espero também que as instituições não se melindrem e que cada uma cumpra seu papel rigorosamente, republicanamente, sem contaminação ideológica ou política. Elas não podem - nem Judiciário, nem Ministério Público, nem Polícia Federal - ter qualquer contaminação política nesses aspectos, político-partidária ou ideológica. Espero, sim, que esses episódios graves envolvendo o Pronaf sejam esclarecidos e os culpados, responsabilizados. É inadmissível que os recursos da agricultura familiar sejam usados, por uns poucos, para fins duvidosos e questionáveis.

            Obrigada, Senador Suplicy, por sua gentileza. Terei o prazer de ouvi-lo.

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Permita-me, antes que V. Exª deixe a tribuna, fazer alguns breves comentários.

            Primeiro, agradeço as suas palavras com respeito à minha atuação aqui no Senado Federal relembrando um pouco os diversos temas.

            Quando a blogueira Yoani Sánchez veio ao Brasil, depois de diversas tentativas, eu avaliei, lembrando até daquilo que está no Estatuto do Partido dos Trabalhadores desde a nossa fundação - que nós queremos construir uma sociedade mais justa através de meios democráticos, acreditando muito no aperfeiçoamento das instituições democráticas... Inclusive, àquela época não tínhamos eleições diretas para governador, para prefeito das capitais nem para a Presidência da República, hoje temos. Eu sempre considerei a defesa da liberdade de expressão e a liberdade de imprensa um ponto fundamental de meu Partido. E eu avaliava que a nova lei cubana, que, a partir de janeiro de 2012 salvo engano, permitiu que cidadãos pudessem visitar outros países e que permitiu, então, que a blogueira Yoani Sánchez viesse ao Brasil, era um bom sinal, inclusive para um dos principais propósitos daqueles manifestantes que objetaram contra a vinda dela. O passo no sentido de abertura democrática, justamente, propiciava sinais que a então Secretária de Estado Hillary Clinton e o próprio Presidente Barack Obama estavam aguardando para que finalmente os Estados Unidos acabassem com o chamado bloqueio contra Cuba. Então, eu ponderei que nós deveríamos avaliar que era importante o direito de defesa e, também, ponderei àqueles manifestantes: “Olha, eu tenho lido algumas das observações e crônicas da Generación Y, de Yoani Sánchez, e observo que as críticas que ela normalmente faz sobre o cotidiano da vida de Cuba, muitas vezes, são menos ferinas do que as críticas que os Senadores da oposição fazem, diariamente, lá, no Senado”.

            Agradeço as suas observações a respeito.

            Com respeito às questões das eleições, eu acho muito importante que nós, efetivamente, possamos aperfeiçoar com a reforma política, para valer, quem sabe, não havendo mais as contribuições de pessoas jurídicas, mas precisaria haver uma contribuição mais significativa do Poder Público. E acredito que, conforme propõe o Movimento Eleições Limpas, possa haver um teto. Eu cheguei a propor aqui R$1,7 mil por pleito. Tivemos cinco pleitos nessas eleições. Então, o cidadão poderá contribuir, digamos, com cinco vezes R$1,7 mil para os seus respectivos candidatos, na forma da pessoa física. Mas acho que isso ficou para o futuro próximo.

            Com respeito a este caso que V. Exª menciona - eu li na Folha de S.Paulo hoje -, quero, primeiro, registrar que acho muito importante que a Presidenta Dilma tenha mencionado nos seus propósitos de não concordar com quaisquer malfeitos e que uma das cinco medidas que ela anunciou que encaminhou ao Congresso Nacional é para considerar crime eleitoral qualquer forma de caixa dois, de recurso não contabilizado. Eu acho que nós do Partido dos Trabalhadores devemos dar o exemplo nesse sentido, seguindo, até, a diretriz formulada pela nossa Presidenta. Se erros aconteceram no passado, em quaisquer agremiações, precisamos todos cooperar para que não mais exista isso. Acho que isso é muito sério e é preciso que, de fato, sejam inteiramente apurados esses desvios de procedimento. Acredito que a própria Presidenta Dilma Rousseff será a primeira a dizer, seja ao Ministério Público, à Polícia Federal e a todos órgãos responsáveis, à própria Controladoria-Geral da República, que se faça investigação, a mais completa, dando-se, obviamente, o direito de explicações, ...

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - De defesa.

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco Apoio Governo/PT - SP) ... de defesa dos parlamentares envolvidos, mas que isso seja totalmente esclarecido e com a rapidez necessária.

            Meus cumprimentos a V. Exª.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Obrigada, Senador.

 

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Se V. Exª puder fazer a gentileza de presidir, eu agradeço.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Com muito prazer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/10/2014 - Página 177