Discurso durante a 151ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre as eleições de 2014 e críticas ao baixo número de propostas apresentadas pelos candidatos.

Autor
Kaká Andrade (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Porto de Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • Comentários sobre as eleições de 2014 e críticas ao baixo número de propostas apresentadas pelos candidatos.
Publicação
Publicação no DSF de 29/10/2014 - Página 146
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, ELEIÇÕES, CRITICA, FALTA, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, PLANO DE GOVERNO, EXCESSO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, DEFESA, NECESSIDADE, EXTINÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.

            O SR. KAKÁ ANDRADE (Bloco Apoio Governo/PDT - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho ouvido aqui e por onde tenho andado as mais diversas e profundas manifestações sobre o resultado do pleito ocorrido neste último domingo, dia 26 de outubro, quando a Presidente Dilma Rousseff foi reeleita para o segundo mandato de quatro anos à frente do Palácio do Planalto.

            Eu gostaria de tecer algumas considerações gerais sobre a disputa desse segundo turno. Foi, todos pudemos constatar, a mais parelha eleição havida nesse ainda curto período de redemocratização do País.

            Dois candidatos chegaram ao segundo turno, duas pessoas honradas, ricas em história pessoal, cada um a seu modo, com uma inesgotável folha de serviços prestados ao País.

            Por um lado, o Senador Aécio Neves, Deputado Constituinte e de outros mandatos, Presidente da Câmara dos Deputados, duas vezes Governador do Estado de Minas Gerais, e Senador com mandato até 2019. Do outro lado, a Presidente Dilma Rousseff, com história de luta pela redemocratização desde sua adolescência. Foi ainda Secretária de Estado no Rio Grande do Sul, Ministra das Minas e Energia e da Casa Civil do Governo Lula, além de Presidente da República agora reeleita.

            Cada um deles trilhou todos os caminhos do País, divulgando sua candidatura e mostrando um pouco do que pretendia fazer caso saísse com vitória do pleito. De mesmo ideal, cada um teve um modo próprio de conduzir-se nesta eleição.

            Aécio Neves encontrou um caminho mais difícil. Cristalizado com percentuais de votos na casa dos 20% no início do primeiro turno, foi ultrapassado pela candidata Marina Silva logo após o acidente aéreo que ceifou a vida de Eduardo Campos. Nesse momento, a intenção aferida dos votos no candidato tucano diminuía muito, baixou para cerca de 15%, menos da metade da projeção de votos em cada uma das duas candidaturas postadas à sua frente.

            Enfrentou, ele, momento dos mais adversos. Ameaçado de não disputar o segundo turno, precisou conviver até com boatos de que abandonaria sua candidatura. Teve que trabalhar arduamente para segurar aliados ao seu lado, pois havia a perspectiva de migrarem para candidaturas com mais chances de êxito. Muito se dizia que, pela primeira vez, o PSDB estaria fora do segundo turno.

            Nada disso intimidou Aécio. Dono de uma coragem cívica impressionante e de uma invejável determinação pessoal, manteve sua candidatura e a ela dedicou-se com uma intensidade tal que conseguiu assento na cédula do segundo turno com percentual muito acima do que previam os últimos levantamentos de intenção de votos do primeiro turno.

            Aécio, a seu modo, repetiu a trajetória de Tancredo Neves, que, mesmo após a derrota da Emenda Dante de Oliveira, que resgataria as eleições diretas no País, não desistiu do seu projeto cívico e venceu, no campo do adversário, a disputa pela Presidência da República, com Aécio lá, a seu lado.

            A Presidente Dilma já largou na dianteira. Enfrentou também dificuldades após o fatídico acidente com o Presidente do PSB, mas manteve incólume sua candidatura mesmo com as turbulências econômicas que o País vem enfrentando e mesmo com as denúncias de corrupção em seu governo avolumando-se a cada dia.

            Pessoa também de admirável coragem e dedicação ao que faz, a Presidente Dilma Rousseff buscou superar todas as adversidades nesta campanha, inclusive dos debates duríssimos dos quais participou.

            O resultado da eleição não poderia ser outro, vitória de uma candidatura por uma diferença muito pequena em um universo de mais de 100 milhões de eleitores. Cada candidato teve mais de 50 milhões de votos. O eleitorado do País não aderiu maciçamente a nenhuma proposta, foi um resultado quase de metade com metade.

            Todo processo eleitoral em que uma recandidatura chega ao segundo turno revela a opção entre duas propostas claramente delineadas: a continuidade, consubstanciada pelo candidato que busca o segundo mandato, ou a mudança, cristalizada em seu oponente. Não se pode pensar que é diferente, que é mudança contra mudança, pois, se assim fosse, a candidatura oficial estaria em oposição a si mesma, o que não ocorre.

            E este quadro foi ofertado ao conjunto de eleitores brasileiros, a opção entre manter os parâmetros atuais ou a possibilidade de um novo rumo. O resultado, com pequena margem de frente, foi a opção em manter no cargo a atual Presidente Dilma Rousseff.

            Já tivemos ocasião em que um Presidente da República não passou a faixa ao seu sucessor, saiu do Palácio do Planalto pela porta dos fundos. A rigor, também assim nele entrara, pois não foi o povo que o colocou lá. Agora não, nosso nível de civilidade tornou-se exemplar. Ontem mesmo, os dois postulantes conversaram e falaram de união do País, o que tem que se buscar. Mutatis mutandis, esse pleito agora está encerrado. Suas lições, contudo, permanecerão e poderão ser úteis nos próximos pleitos.

            Um dos ensinamentos é que jamais poderemos repetir campanhas políticas como as presenciadas nestas eleições. Por todo o País, em praticamente todas as disputas estaduais, sobretudo na eleição presidencial, o que se viu foram campanhas essencialmente de desconstrução de adversários. Denúncias de todo tipo, de caráter político e até pessoal, muitas delas sem nenhum compromisso com a verdade, foi isso o que vimos.

            Faltaram propostas. Quase não se viu candidatos revelarem seus planos de governo, informarem ao eleitorado quais as políticas públicas para vários assuntos de maior relevância para a população, para o País e para o futuro.

            Vejamos, por exemplo, a questão ambiental, tema de reflexo imediato na vida das pessoas. Pouco se viu acerca do assunto, pouco se pôde aferir de como seria enfrentada pelas várias candidaturas surgidas nos vários Estados e no plano federal.

            Estamos vivendo um momento dramático, a crise hídrica instalando-se onde menos se poderia esperar tempos atrás. O volume de chuvas está alterado em todas as regiões. Rios e nascentes estão secando. Municípios estão desabastecidos de água. O Rio São Francisco, que banha o meu Estado de Sergipe, já perdeu, momentaneamente, sua principal nascente. Seu nível está em patamares baixos e sinalizando difícil recuperação.

            Várias vezes, neste plenário, tive a oportunidade de falar sobre o Velho Chico, mostrar as dificuldades que está enfrentando, e, até mesmo, sinalizei possíveis abrandamentos para o caso. Já, inclusive, apresentei o Projeto de Lei do Senado n° 288, de 2014, que se encontra na Comissão de Infraestrutura, na tentativa de aprimorar a maneira como são feitas as alterações de vazão do Rio São Francisco. Continuarei neste assunto, que diz respeito não apenas a Sergipe ou ao Nordeste, mas a todo o País.

            Pois bem, o que vimos sobre este tema do meio ambiente? Quase nada, a não ser utilizá-lo para atacar candidaturas adversárias. Nada houve de propositivo, o povo está à mercê da natureza, que, há muito, vem emitindo sinais de que não tem mais forças para resistir às demandas humanas descontroladas. A natureza não se defende, mas ela se vinga.

            Outro tema que esteve ausente dos debates foi a política externa, em um momento novo no relacionamento entre os povos. Não temos claro como o Brasil irá se comportar no concerto das Nações. Mesmo temas imprescindíveis, como educação, saúde, segurança, controle da inflação e combate à corrupção, não tiveram a ênfase necessária nos debates e nos guias a que assistimos.

            Mesmo assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de apresentar os meus cumprimentos, os meus agradecimentos aos dois candidatos. Cumprimentá-los, pela coragem pessoal de se submeterem a um período tão desgastante, sob os aspectos físico e emocional, pelo sacrifício imposto aos seus familiares, e agradecê-los por manterem de pé a nossa democracia, que precisa de um governante e precisa da vigilância da oposição.

            A cada um foi reservado um papel a partir de agora. Dilma Rousseff haverá de bem conduzir o País até o final de 2018, e Aécio deverá - creio - exercer o papel de opositor, apresentando um contraponto construtivo para as propostas do próximo governo.

            Desejo ao Senador Aécio, Presidente Nacional do PSDB, que continue a ter o equilíbrio e o espírito público que nunca lhe faltaram.

            À Presidente Dilma Rousseff desejo pleno êxito até o final de seus mandatos. Terá ela que levar o Brasil à superação dos desgastes havidos nestes últimos meses; é preciso agora a união nacional para a construção de um futuro melhor.

            Seus esforços também haverão de se concentrar em evitar qualquer tipo de preconceito advindo da liberdade de escolha que a Constituição assegura a cada eleitor.

            Precisamos conter um preconceito de que está sendo vítima a população nordestina, por alguns acusada de ser a responsável pelo resultado da eleição, pelo temor de perderem o Bolsa Família. Repudio esse preconceito com todas as forças. Nós, nordestinos, temos o mesmo direito de votar em quem quisermos.

            Srªs e Srs. Senadores, o grande conjunto de denúncias apresentado terá que ser investigado com a isenção e a profundidade necessárias, sejam quais forem os assuntos e os acusados. O País precisa de respostas às várias suspeitas levantadas nos planos estadual e federal.

            O Senado Federal, o Congresso Nacional como um tudo, tem grande responsabilidade neste momento. É preciso fiscalizar o encaminhamento das providências que ora solicito. É hora, mais que tardia, de passarmos o Brasil a limpo, retirarmos do nosso cotidiano tudo o que esteja a tisnar a nossa história. Precisamos de um país melhor e mais justo para as próximas gerações e para nós mesmos.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/10/2014 - Página 146