Discurso durante a 153ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com o controle da inflação no País; e outros assuntos.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. ELEIÇÕES.:
  • Preocupação com o controle da inflação no País; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2014 - Página 374
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. ELEIÇÕES.
Indexação
  • REGISTRO, APOIO, RELAÇÃO, DECISÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), REFERENCIA, AUMENTO, JUROS, TAXA SELIC, MOTIVO, CONTROLE, INFLAÇÃO, IMPORTANCIA, GARANTIA, ESTABILIDADE, VALOR MONETARIO.
  • CRITICA, PROPAGANDA ELEITORAL, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACUSAÇÃO, CANDIDATO, MARINA SILVA, MOTIVO, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente; Srs. Senadores; Senador Fleury, especialmente; Srªs Senadoras, vim aqui, Senador Paim, para uma coisa bem específica: manifestar meu apoio a uma decisão que, em geral, recebe apupos, vaias, críticas, que é o fato de o Copom ontem ter decidido elevar a taxa de juros. Sei que é muito mais fácil bater nessa decisão, mas estamos vivendo um período inflacionário e não podemos fechar os olhos à gravidade do desequilíbrio nos preços.

            Os juros não devem ser a ferramenta para o controle da inflação, mas é uma das ferramentas, que tem de ser usada quando for preciso. Eu vou mais longe: por falas minhas aqui, por análises minhas e de meus assessores, esse aumento já deveria ter vindo em agosto. E não veio, talvez, porque o Banco Central, não contando com autonomia no Brasil, tenha considerado que isso traria desgastes políticos para as forças no Governo.

            Eu quero aqui dizer que se discutiu muito nesse período eleitoral a continuação ou não da Bolsa Família. Cada vez que a inflação aparece, a Bolsa Família está sendo roubada, negada, tomada, acabada aos pouquinhos, até que venha o reajuste dela, é verdade. E aí se recupera um pouco o poder de compra.

            Há duas maneiras de acabar a Bolsa Família e de reduzir os salários. Uma delas é acabando, o que não acredito que seja possível, e ninguém o quer, até quando não for mais necessária, como nós desejamos que um dia aconteça. A outra maneira de acabar a Bolsa Família e de baixar os salários é o aumento dos preços, como nós já vimos no passado.

            Por isso, Senador Paim - e o senhor aqui é o grande defensor dos trabalhadores -, nada há mais importante para defender o interesse dos trabalhadores e dos pobres do que a garantia da estabilidade monetária.

            Não adianta, Senador Paim, o senhor lutar pelo aumento do salário mínimo - e o senhor tem sido um grande batalhador -, se a gente dá o salário num dia e o toma no outro. Por isso, lutar contra a inflação deve ser a bandeira de todos nós, mesmo que tenhamos de fazer alguns sacrifícios, o que tem de haver, porque é difícil controlar a inflação sem sacrifício. A inflação ilude, e a gente pensa que está ganhando, mas não está. Tirar a ilusão tem custo.

            Ontem, o Banco Central tomou uma decisão, a meu ver, correta. Entretanto, não posso deixar de vincular a decisão do Banco Central 48 horas depois das eleições, com o fato, Senador Fleury, de que, quase até a véspera da eleição, durante a campanha, a Presidente Dilma apresentava uma propaganda contra Marina Silva em que apareciam pratos sendo retirados da mesa de pobres trabalhadores, dizendo que isso iria acontecer se Marina Silva fosse eleita e desse autonomia ao Banco Central. E colocaram que, no lugar do pobre trabalhador comendo, os bancos enriqueceriam. Poucas horas depois da eleição, o que ela está fazendo? E estou apoiando, mas eu não faria aquela propaganda, até porque defendi a autonomia do Banco Central quando Marina Silva passou a defender.

            Aquela propaganda foi uma das coisas mais vergonhosas que já vi na publicidade eleitoral, manipulando, porque a gente sabe que a autonomia do Banco Central é uma situação da maior parte dos países onde há estabilidade monetária, base da distribuição de renda, inclusive. Não há como haver boa distribuição de renda com inflação, não há como! Quem ganha é quem faz os preços, e quem faz os preços são os mais ricos. Aquela propaganda foi vergonhosa, porque ali não refletia a verdade da fala de Marina Silva, das preocupações dela. Aquilo era uma mentira que os marqueteiros inventaram de maneira perversa. Até Goebbels, o marqueteiro de Hitler, era capaz de ficar envergonhado! Acho que nem Goebbels teria coragem de usar uma propaganda mentirosa como aquela. Ela foi usada e deu muito voto. Alguns dizem que foi ali que Marina Silva começou a cair nas pesquisas. E se dizia que isso era feito para atender a um banco, que era o Banco Itaú.

E se dizia isso porque uma senhora ainda jovem da família dos donos do Itaú, uma senhora que é considerada, de certa maneira, uma ovelha negra da família por ter posições bastante progressistas, estava ao lado de Marina Silva. Essa é outra vergonha.

            E agora o que se faz? Aumenta-se a taxa de juros. Isso é o que me deixa, Senador Fleury, preocupado com os próximos anos.

            A Presidenta Dilma começa um governo cansado. Os governos, quando começam, começam renovados, com mística, novos, sem críticas, sem denúncias ainda. O Governo da Presidenta Dilma começa com uma tonelada de denúncias, cansado de 12 anos, sob a desconfiança do povo que foi para a rua no ano passado. Isso se soma ao fato de que ela chega a um País dividido quase meio a meio. Bastava um milhão e meio ter mudado de voto de Dilma para Aécio que teria dado a vitória de Aécio. Bastava pouco mais de um milhão e meio; dois milhões bastariam. Ela chega a um País dividido meio a meio e, o que é pior, antagonizado por coisas como essa propaganda, por uso de instrumentos de marketing que não correspondiam à verdade, por acusações de ordem moral aos opositores sem comprovação.

            Chega, então, a um governo cansado num País dividido politicamente e, ao mesmo tempo, antagonizado, com raiva, até porque, como eu sempre disse, nos debates entre o PSDB e o PT, há mais raiva entre eles do que divergências. Se olharmos a proposta, veremos que há menos divergência do que a raiva que se construiu.

            Tudo isso é grave, mas imagine que, além disso, ela chega ao governo com uma economia desorganizada como está, com programas sociais insuficientes, apesar de generosos e positivos, e com uma política caótica, como Pedro Simon falou aqui mais cedo. É uma política com 28 partidos na Câmara, com uma divisão entre nós absurda, inclusive, não só por partidos, mas por ideias, por propostas, por interesses pessoais, com uma economia amarrada a diversos fatores que não nos deixam pensar livremente.

            Este é um momento em que não há pontes entre uns e outros. Política se faz com pontes, que unem as pessoas, que unem os partidos, que unem os políticos na busca de um caminho para o País. As pontes foram detonadas. É claro que vão ser reconstruídas em algum momento, mas vai haver um custo. Por isso, Senador Fleury, hoje, sou muito preocupado com o que vai acontecer nos próximos meses. Daí a nossa responsabilidade. Esta é a Casa da construção das pontes. Esta Casa, eu digo o Congresso, o Senado e a Câmara dos Deputados, nós somos o lugar de construção de pontes.

            E aí vem, eu não vou falar muito, eu disse, a outra preocupação que, talvez, seja a maior de todas: será que nós estamos preparados para isso, Senador Fleury? Será que nós estamos preparados para ocupar o espaço que a história nos exige e nos colocou? Será que nós estamos preparados para pensar mais como estadistas do que como políticos? Será que nós estamos dispostos a deixar de lado os preconceitos, a dialogar, a conversar, com princípios, sem abrir mão dos princípios? Será que nós estamos preparados para isso, ou nem princípios tem hoje a maior parte de nós?

            Essa é a razão da minha preocupação. Essa é a razão de, mais cedo, eu ter dito que o Senador Pedro Simon escolheu o momento errado para sair do Senado. A gente precisaria muito dele, como precisaria muito de Suplicy. E nós não vamos tê-los aqui. Vamos ter de encontrar um caminho. Creio que a história sempre encontra um resultado, sempre encontra um caminho. Sempre se constroem as pontes. O problema é que, às vezes, isso se dá depois de um terremoto político muito grande, que traz custos muito elevados.

            A população vai cobrar da Presidente o fato de ter elevado juros, não porque não fosse necessário - porque eu acho que seria -, mas pelo fato de ela ter dito que a outra candidata é que faria isso, e o faria para enriquecer bancos, não para segurar a inflação como ela está fazendo.

            Isso me preocupa, porque não há como pôr ordem na economia sem reajustar o preço dos combustíveis, sem reajustar as tarifas de energia elétrica, sem fazer programas de cortes de alguns gastos que fazem com que nossa dívida cresça, o que nos leva, inclusive, à necessidade de aumentar os juros também.

            Nós vamos ter momentos muito difíceis e temos de pensar qual é a melhor ação que vamos fazer para que o Brasil não sofra mais do que vai ter de sofrer, para que o Brasil encontre mais cedo do que parece um futuro que o leve outra vez para um bom rumo.

            Eu sinto satisfação de estar aqui num momento tão difícil, porque é nesta hora que a gente começa a descobrir quem tem e quem não tem condições de manifestar-se com patriotismo e com competência.

            Sentirei falta do Senador Simon, sentirei falta do Senador Suplicy, mas espero que os novos Senadores que aqui cheguem e alguns de nós que aqui já estávamos possamos nos entender na construção de um futuro em que a reforma política faça com que seja crime hediondo fazer uma propaganda daquela que foi feita contra a Marina, dizendo que ela ia tirar o prato de comida dos trabalhadores para colocar dinheiro no bolso dos banqueiros - aquele é um crime hediondo, um crime de lesa-pátria -, e, ao mesmo tempo, em que sejamos capazes de que, no futuro, nenhum Presidente, poucas horas depois de eleito, faça exatamente o que acusava sua opositora de que faria.

            Espero que o povo entenda, perceba, descubra o que houve na campanha eleitoral e como isso se choca hoje com o que está sendo feito e com o que vai ser feito ainda no futuro, mas entenda isso não apenas para ficar angustiado como eu estou, mas para encontrar um caminho, um caminho que o Brasil espera que nós aqui encontremos.

            Era isso, Sr. Presidente. Eu não queria deixar passar a ocasião de falar isso.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2014 - Página 374