Discurso durante a 155ª Sessão Especial, no Senado Federal

Celebração dos 100 anos de nascimento do cantor e compositor Lupicínio Rodrigues.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Celebração dos 100 anos de nascimento do cantor e compositor Lupicínio Rodrigues.
Aparteantes
Fleury.
Publicação
Publicação no DSF de 04/11/2014 - Página 7
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, MUSICO, COMPOSITOR, POETA, NEGRO, ORIGEM, RIO GRANDE DO SUL (RS), COMENTARIO, RELEVANCIA, OBRA MUSICAL, AMBITO, MUSICA BRASILEIRA, CULTURA, HISTORIA, ENTE FEDERADO, REGISTRO, CONCESSÃO HONORIFICA, AUTORIA, CAMARA MUNICIPAL, PORTO ALEGRE (RS).

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro amigo, Senador Paulo Paim, que aqui também tem um símbolo muito especial, porque celebra a negritude de Lupicínio Rodrigues. Àquela época, há cem anos, no seu nascimento e quando já adulto, essas questões não eram tão visíveis. V. Exª representa bem aqui essa questão, porque é autor do Estatuto da Igualdade Racial. Então, tudo a ver com a cerimônia.

            Queria agradecer muito a presença do Senador Valdir Raupp; claro, do Lupicínio Rodrigues Filho, que representa a família desse festejado compositor e intérprete do nosso Estado, o Rio Grande do Sul; o Vilmar da Silva Fogaça, que é o Cônsul do Grêmio aqui em Brasília, por estar aqui também celebrando a família tricolor - Lupicínio foi o autor do Hino do Grêmio -; à presença do amigo, o ex-Deputado João Batista Fagundes; mas, de maneira muito especial, aos alunos dos cursos de Direito e de Engenharia Civil da nossa querida Universidade de Passo Fundo, a famosa UPF. 

            A presença de vocês aqui abrilhanta muito, porque, mesmo sendo de estudos de ensino superior voltados às ciências jurídicas ou à área mais técnica, que é a Engenharia Civil, este momento tem uma grandeza muito especial para vocês todos, porque tem a ver com a história do Rio Grande, com a história da cultura gaúcha, que aqui está representada por esta homenagem que estamos fazendo. Também o Senador Valdir Raupp, porque a mãe dele está ligada ao Rio Grande. Ela mora em Capão da Canoa. Então, tudo a ver com esta cerimônia.

             Agradecemos muito a sua presença aqui.

            Queria agradecer também as referências que recebi do Ministro Mendes Ribeiro Filho, que está adoentado, mas mandou uma mensagem verbal, e ao Deputado Eliseu Padilha, Presidente da Fundação Ulysses Guimarães, que, da mesma forma, também saúda esta iniciativa.

            Cinco adjetivos resumem bem a personalidade, a biografia e as obras deste gaúcho boêmio e talentoso, Lupicínio Rodrigues: passional, brilhante, original, corajoso e perene. E imortal, como é a sua obra.

            Nascido há cem anos, no dia 16 de setembro de 1914, na nossa querida capital, Senador Paim, Porto Alegre, no nosso Rio Grande do Sul, Lupi, como era chamado desde criança, calou cedo a voz e o coração apaixonado. Morreu pouco antes de completar 60 anos, muito jovem, tempo suficiente para que ele pudesse se tornar, a nosso ver, mais do que um símbolo da chamada dor de cotovelo e do samba-canção. Com talento e muita paixão, o meigo e sereno poeta usava as letras e as melodias para expressar sinceros sentimentos e compor canções verdadeiramente emocionantes.

            As declarações de amor e as filosofias de Lupicínio Rodrigues, cantadas em forma de verso e prosa, foram interpretadas por ilustres figuras da música popular brasileira: Ângela Maria, Caetano Veloso, Cauby Peixoto, Elis Regina, Elza Soares, Gilberto Gil, Linda Batista, Maysa, Maria Bethânia, entre outros. Até hoje, as suas composições, muitas motivadas por inúmeras desilusões amorosas, influenciam, inclusive, ritmos e rimas nas vozes das novas gerações de cantores e artistas.

            Lupi, você conheceu bem seu pai. Ele certamente não narrava apenas as suas próprias dores, mas as dores dos amigos, que usavam o ombro amigo de Lupi para contar as suas mágoas. E o grande escritor e compositor tinha essa habilidade, uma espécie de psicólogo das dores da paixão não correspondida ou da paixão traída.

            Lupicínio falava de Loucura, Fuga e Castigo. Cantava também sobre Remorso, Vingança e sabia o que era uma Caixa de Ódio. Gostava de cantarolar para Os Namorados e de dar conselhos para Esses Moços - tão bem aqui interpretado pelo seu filho Lupi -, seja nas ruas, nas esquinas ou em qualquer lugar, ou, especialmente, num bar.

            Não lhe importava se era a Dona do Bar, ou os Dois Tristonhos, ou a Ex-filha de Maria, ou o Amigo Ciúme. Lupi não escondia de ninguém seus sentimentos, pois ele sabia que não tinha Nervos de Aço. Na política, ao contrário, é preciso, sim, ter, muito, nervos de aço. Toda hora precisamos ter nervos de aço, por motivos diferentes, pelo aspecto político.

            Por isso, Lupicínio respeitava a Felicidade, gostava do Exemplo, admirava Um Favor e sabia, como ninguém, tirar lições de uma Briga de Amor.

            É preciso lembrar que todas essas histórias de inspiração do compositor negro tinham como cenário o nosso Rio Grande do Sul dos anos de 1936, quando ele começou a se dedicar, com grande afinco, às composições. Naquela época, o nosso Estado não era o berço da Música Popular Brasileira nem tampouco do samba. Para se deslocar de Porto Alegre para o Rio de Janeiro ou São Paulo, só, gente, mesmo, a cavalo, de trem ou de navio. Genialidade, coragem e ousadia são, portanto, as outras qualidades desse boêmio compositor, de quem, hoje, estamos celebrando, aqui, os cem anos de nascimento.

            Mesmo sem estar ligado à política, Lupicínio foi preso, em 1964, permanecendo meses trancafiado em um presídio em Porto Alegre. Contam alguns poucos familiares que, enquanto estava na prisão, Lupicínio foi humilhado, torturado. São lembranças que, segundo os parentes mais próximos, Lupi evitava comentar.

            Muito admirado por outros imortais poetas, entre eles o inesquecível Vinícius de Moraes, Lupicínio era também estimado por lideranças políticas. Dizem que Getúlio Vargas gostava muito das músicas de Lupi. Gostava tanto que, antes mesmo do sucesso nacional do nosso compositor, Getúlio indicou a contratação do poeta pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, estimulando a nomeação do Lupi como bedel, uma espécie de estafeta, ou servidor, inspetor da secretaria da Faculdade de Direito. Lupicínio era bedel da UFRGS, em Porto Alegre, por indicação de Getúlio Vargas. Na época, Lupi tinha cursado só até o terceiro ano primário.

            Isso não o impediu, porém, de compor, anos mais tarde, em 1950, um jingle para a volta de Getúlio à Presidência da República, a famosa marchinha de carnaval, escrita por Haroldo Lobo, gravada também por Francisco Alves, que dizia o seguinte: "Bota o retrato do velho outra vez, Bota no mesmo lugar, O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar". O marketing daquela época, como hoje, funcionava, e funciona muito bem, só que era de outra forma, eu diria mais poética e mais singela. Hoje, tem muitos efeitos especiais.

            As homenagens a Lupicínio não param. Em maio deste ano, Lupi virou um musical chamado Uma Vida em Estado de Paixão. A estreia do espetáculo, dirigido por Artur José Pinto e Mathias Behrends, ocorreu no histórico e belíssimo Theatro São Pedro, lá em Porto Alegre.

            E a Rádio Senado produziu, homenageando o centenário, o programa “Eu quero um samba”, prestando uma homenagem ao centenário de Lupicínio Rodrigues, um dos maiores cantores e compositores da música popular brasileira. O programa, disponível na página da Rádio Senado, na internet, mostra um pouco da intensa trajetória do pai da dor de cotovelo e apresenta uma seleção dos sambas de Lupicínio que estão entre os preferidos de nossos convidados: o filho do compositor, que está aqui presente conosco, Lupicínio Rodrigues Filho, e os jornalistas Deraldo Goulart , Luís Cláudio Cunha, Giovana Teles e Paulo André Batista Louzada.

            A ser lançado em breve nos cinemas, Nervos de Aço deve ser o longa-metragem dirigido por Maurice Capovilla sobre a história de Lupicínio Rodrigues. Até o fim deste ano, Lupi será também uma escultura em bronze diante do Centro Municipal de Cultura, que leva o nome dele, como parte das homenagens da Prefeitura de Porto Alegre. E amanhã, às 17 horas, em uma sessão especial, em uma sessão solene, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre vai conceder o título de cidadão emérito de Porto Alegre, proposto pela Mesa Diretora, presidida pelo Professor Garcia. Parabéns pela sessão que a Câmara de Vereadores concede a Lupicínio Rodrigues

            Creio, entretanto, que todos os brasileiros, sobretudo os políticos da atualidade, são quem mais ganham com os cem anos de Lupicínio Rodrigues.

            Nas palavras e frases das composições de Lupicínio, sobram lições de democracia e sugestões para as melhores práticas políticas. Dizia ele que "o pensamento parece uma coisa à toa, mas como é que a gente voa, quando começa a pensar". É a reflexão, é entender o sentido das coisas. Valores como hombridade também estavam implícitos nas canções: "Homem que é homem faz qual o cedro que perfuma o machado que o derrubou". E mais: "A vergonha é herança maior que o meu pai me deixou".

           Não sei se sabiam, Lupicínio foi quem compôs o hino do Grêmio - por isso a presença aqui do cônsul do Grêmio - e fez também uma composição para o arquirrival Internacional - o meu time, o seu é o Grêmio, não é Senador Paim?

           O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O meu é o Caxias. Eu sabia que todo mundo iria rir, principalmente a gauchada.

           A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Eu sabia que ele ia sair pela tangente. Pois é, então estamos aqui, eu, com muita honra, convidando o cônsul do Grêmio.

           Ele fez uma música para o Internacional, que não foi aceita pelo Tricolor gaúcho por motivos alheios à vontade futebolística. Gremista fanático, Lupi dedicou tempo e foi tolerante, em relação ao time rival, para.compor também uma letra para os torcedores colorados. Idolatrava o "azul", mas respeitava o "vermelho". Quer atitude mais democrática do que essa? Que grande lição nos deixou no futebol que valeria para a política. Grande Lupi!

           Como ele mesmo disse sobre a honra, em um dos trechos do hino do Grêmio, "Lara o craque imortal, soube seu nome elevar, hoje com o mesmo ideal, nós saberemos te honrar".

           Para encerrar, quero lembrar um "lúcido" trecho musical, criado por Lupicínio, que também serve de reflexão para nós, políticos e para todo cidadão. É uma lamentável e recorrente prática na política brasileira: a calúnia! A música, inclusive, tem esse nome. E todos sabemos, neste passado muito recente, como a calúnia esteve presente.

           Parte da letra diz assim: "Deves encher de flores os caminhos, mais canto aos passarinhos, à vida maior prazer, e, assim, a humanidade seria mais forte, o mundo teria outra sorte, outra vontade de viver''. Sem calúnia, é claro!

           Muito obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/11/2014 - Página 7